Um mercado que está sempre por cima

Safras pujantes de grãos fazem a festa da sacaria plástica para fertilizantes

O Departamento de Agricultura dos EUA prevê o Brasil na liderança da geração mundial de alimentos até 2026/2027, com aumento de 41% em sua produção durante o próximo quinquênio. Do plano mundial para o local: a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) vislumbra colheita de 262 milhões de toneladas de grãos este ano e, por tabela, o mercado interno de fertilizantes deve pular 12% na safra 2021/2022, emplacando 43 milhões de toneladas dos produtos NPK (à base de nitrogênio, fósforo e potássio). Sacos de polietileno (PP) e de ráfia soltam suas asas e entram com tudo nessa festa em fertilizantes, deixa claro nesta entrevista Marco Valério Antunes, gerente de operações comerciais da MVA Consultoria Empresarial, engenheiro agrônomo com passagens pela petroquímica (Braskem e Solvay) e arquidisputado para assessorar indústrias de fertilizantes.

Valério: peculiaridades técnicas traçam linha divisória para ensaque com PE e PP.

1Por que o saco liso não tem conseguido avançar a contento em tipos de fertilizantes além dos nitrogenados e micronutrientes?
Todos os fertilizantes minerais NPK (à base de nitrogênio, fósforo e potássio) apresentam graus variáveis de higroscopia e começam a absorver umidade em função disso ou sob determinada pressão de vapor d’água. A absorção de umidade durante o armazenamento e manuseio vai reduzir a qualidade física do fertilizante. No geral, a curva de absorção de água sobe com lentidão sob umidade baixa. No entanto, a um certo patamar ou faixa de umidade, ela começa a aumentar vertiginosamente, em especial no período chuvoso. Essa umidade é chamada de umidade crítica do fertilizante e cai quando a temperatura aumenta. Uma absorção significativa de água tem consequências indesejáveis para os fertilizantes: aos poucos, as partículas ficam moles e pegajosas, o volume delas se eleva e começam então a rachar. Ocorre mudança de cor e diminuição da dureza da partícula e cresce a tendência ao empedramento. A formação de poeira e partículas finas também aumenta, o piso do galpão do estoque fica úmido e escorregadio e a qualidade da distribuição do fertilizante no campo pode ser comprometida. Aliás, o incremento da desconformidade do fertilizante às especificações técnicas pode causar entupimento no equipamento de sua aplicação.

Vale ressaltar que uma combinação de dois fertilizantes pode ser mais higroscópica que a desses elementos em separado, a exemplo de ureia agrícola com cloreto de potássio. A sacaria lisa de polietileno de baixa densidade (PEBD) oferece uma barreira contra a umidade externa, preservando as características agronômicas dos fertilizantes. Dado isso, seja na forma de sacos de 25kg, 50kg e na forma de liner de sacaria e big bags de ráfia, PEBD é fundamental para conservar fertilizantes especiais de alta solubilidade e com alto teor de nitrogênio.

O armazenamento de tipos específicos de fertilizantes requer maior estabilidade da embalagem, daí a existência de um modelo para cada segmento. O saco de PEBD tem alta penetração em fertilizantes especiais de alta solubilidade e/ ou de alto grau higroscópico, caso dos nitrogenados. Por sua vez, os atributos mecânicos e econômicos de PP fazem da ráfia uma solução muito adequada para acondicionar fertilizantes minerais fosfatados e à base de cloretos.

2Pela sua estimativa, qual o reajuste total aferido em 2020 no preço do saco de ráfia e do tipo liso para fertilizantes?
No ano passado, os preços domésticos de PP e PE subiram, respectivamente, 35% e 42%. De janeiro a junho último, computamos incrementos acima de 30 % nos preços das resinas para o ensaque de fertilizantes. A diferença de preços entre sacos de PE e PP é um elemento tão decisivo na escolha da embalagem quanto a já mencionada conveniência técnica. Dessa maneira, PEBD domina nos fertilizantes de alta solubilidade e de elevado teor de nitrogênio, enquanto a ráfia impera nos fosfatados e cloretos.

3Como avalia as perspectivas no agronegócio, sob pressão da economia circular, para coleta e reciclagem de sucata de sacaria de ráfia e PE para reúso na produção dessas mesmas embalagens? E quais as chances dos sacos de papel kraft neste mercado?
As embalagens de fertilizantes trazem no seu DNA dois pontos muito importantes: o design e a matéria-prima. Portanto, a reutilização dessas embalagens no campo se dá enquanto possível. O mercado de big bag é superaquecido, promovendo sua reciclagem pós-consumo e contribuindo para que esse resíduo entregue o máximo de valor enquanto viável. O movimento de coleta dessas embalagens de fertilizantes é incipiente e as instituições setoriais trabalham nesse tema. No entanto, devido às características da sacaria, o mercado se encarrega de promover o reúso e ainda gera receita para a cadeia. Por seu turno, o papel, é uma solução que ocupa nichos no mercado de fertilizantes minerais NPK. O uso do papel em larga escala ou mesmo seu posicionamento como um sucedâneo para o plástico não me parece promissor, devido às características do material da embalagem e dos esforços mecânicos requeridos para a movimentação e armazenagem dos fertilizantes NPK nos galpões de estocagem e áreas de plantio. •

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