Um percurso mais tortuoso

Sofrência hídrica e econômica resvala nas caixas d’água de PE

Fossem outros tempos, sem inflação, carestia, desemprego recorde e crédito tão caro quanto dólar e combustíveis, uma pane hidrológica convergiria em linha reta para a quentura nas compras emergenciais de caixas d’água de polietileno (PE). Embora a procura pelos reservatórios prossiga como sempre, por motivos de força maior e pelo mega déficit nacional de água encanada, uma atípica junção este ano da estiagem física com a econômica vem tornando mais tortuoso o percurso das vendas desses tanques rotomoldados. “Crise hídrica é sinônimo de paralisação de obra”, associa Waldir Abreu, superintendente da Associação Nacional do Comércio de Material de Construção (Anamaco). “Ou seja, o município ou região em dificuldades para assegurar abastecimento de água tem como reflexo o atraso nos planos de crescimento habitacional, dada a impossibilidade de construir ou reformar moradias nessas circunstâncias”.

Entra ano sai ano, a Anamaco constata que, por falta de capacidade para ampliar o fornecimento de água, muitos municípios deixam de ser prioridade para sediar novos habitantes. “Apenas em São Paulo, são exemplos Itu, Franca e Bauru”, ilustra Abreu. “E como a situação gera incertezas nos habitantes, há sempre nesses locais um movimento de compras adicionais de caixas d’água”. No entanto, coloca, o impacto negativo do abastecimento a desejar é imediato no comércio de material de construção. “Ele impede vendas em proporção muito maior do que as realizadas para a população ampliar a armazenagem de água”, constata Abreu.

No plano geral dos materiais de construção, a Anamaco traça três cenários para o desempenho de cerca de 148.000 lojas do ramo no exercício atual. “A projeção pessimista é de crescimento de 1% a 1,5% sobre 2020; a realista, de 3% a 3,5%, e a otimista, de 5% para cima”, expõe Abreu. “A despeito das muitas incertezas pendentes, nosso comércio vai faturar 10% acima dos R$150,55 bilhões aferidos em 2020. A crise hídrica nos preocupa sempre, mas o aumento das vendas ainda resulta da necessidade de reformas e melhorias há muitos anos adiadas pelos cidadãos”.

Se a pane hidrológica não integrasse o quadro, pondera o superintendente, haveria espaço para vendas maiores de materiais de construção nas regiões onde os efeitos da carência de abastecimento de água é muito flagrante. “No geral, porém, o comércio de materiais de construção ainda vive sob o impacto das necessidades de reformas em locais sem problemas de suprimento de água”.

Braskem

Quando a excelência enche o tanque

A Associação Brasileira da Indústria do Plástico (Abiplast) atribui à rotomoldagem de resinas fatia de 0,7% na produção de 7.3 milhões de produtos transformados no ano passado. Estimativa da Braskem, produtora de polietileno, o polímero mais utilizado na rotomoldagem, o consumo da resina neste segmento, cujo carro-chefe no Brasil sempre foi a caixa d’água, beirou 105.000 toneladas em 2019. Sem abrir projeções da demanda para 2020 e 2021, Renato Yoshino, diretor dos negócios de agro, infraestrutura e indústria da empresa, comenta que a estiagem que marca o exercício atual não afetou o movimento de seus grades para reservatório e argumenta que a possibilidade de um impacto relevante depende de o stress hídrico persistir até 2022, como aliás antevê o consultor Roberto Kishimani, mesmo com incidência de chuvas acima da média nos próximos meses. Para Luiz Carlos Ciocchi, diretor geral do Operador Nacional do Sistema Elétrico, o cenário é preocupante e o país deve permanecer mobilizado para enfrentar a próxima temporada de seca. A Braskem acompanha o desenrolar do impasse acenando com cinco grades talhados para a rotomoldagem, todos contendo aditivos antioxidantes e estabilizadores à luz. O mais recente, um tipo de PEAD codificado como HD 4601 U e dotado do selo Maxio, especifica o diretor, assedia tanques grandes e cisternas com os chamarizes da produtividade, acabamento, balanço de propriedades mecânicas (impacto/deformação) e a possibilidade de reduzir o gasto energético e a emissão de gases.

Balcão oscilante
Abreu deixa claro que uma conjuntura na qual o varejo de seu setor depara com economia à deriva trombando com a perspectiva de estiagens mais severas e recorrentes, efeito das mudanças climáticas, é adversa para uma clientela padrão de classe média e renda em regra insuficiente para reformar, modernizar ou adquirir imóvel. “Por causa dessas vulnerabilidades, um ano de excelente movimento de materiais de construção não assegura aos comerciantes a continuidade do sucesso no exercício seguinte e, muitas vezes, por erro de interpretação do cenário econômico, esses empresários perdem o controle da gestão e passam muito sufoco após experimentarem bons resultados nas vendas”, observa o superintendente da Anamaco.

A oscilação do giro e, em particular, das margens de lucro, acentua Abreu, “é cruel para muitos comerciantes, mesmo sem crise hídrica no cenário”. O êxito no varejo da construção, reitera Abreu, depende bastante da oferta de crédito, capacidade de pagamento do comprador e disponibilidade de produtos nas lojas. “Preços muito altos limitam a capacidade de compra e todos setores do comércio são muito sensíveis à falta de confiança do público. Se isso se vê em produtos de consumo essenciais, como alimentos, imagine o que significa para o nosso ramo, em que o desembolso necessário, alto para o orçamento familiar do consumidor padrão, pode levar ao adiamento de reformas ou edificações”. Como contrapeso, Abreu sustenta que o otimismo do comerciante de materiais de construção não esmorece. “É por causa da constatação de que sempre haverão moradias carentes de reformas e lançamentos imobiliários para minimizar o descomunal déficit habitacional do país”.

Pallmann

Trocando (e ganhando) em miúdos

A rotomoldagem de caixas d’água mobiliza em torno de 70¨% da demanda nacional de equipamentos atrelados ao processo, calcula Marcelo Moura, gerente comercial da operação brasileira da alemã Pallmann, última palavra mundial em micronizadores de resinas. Pela sua percepção, o colapso hídrico deste ano tem ricocheteado direto na produção de caixas d’água, a ponto de ele projetar salto aproximado de 25% na procura por seus equipamentos para moer polietileno tendo em vista a produção desses reservatórios. Entre melhorias mais salientes no portfólio da Pallmann, Moura distingue modificações no perfil dos dentes que conferem perfil mais cilíndrico ao material micronizado. “São ajustes que aprimoram a fluidez a seco, benefício aliás extensivo ao processo de rotomoldagem como um todo”. O gerente reforça os aperfeiçoamentos recentes em seus micronizadores com sistemas de maior produtividade na classificação do material trabalhado. “Com esse recurso, só retorna ao moinho o material fora da faixa granulométrica requerida para a rotomoldagem”, ele completa.
A fabricante de máquinas para rotomoldagem Rotoline negou entrevista.

Compra emergencial
A Anamaco não monitora preços no comércio de materiais de construção. Abreu comenta, porém, que informações colhidas em pontos de venda situam em 30% o aumento médio nos preços de caixas d’água de PE de janeiro a setembro nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, com alta ainda maior no Norte/Nordeste. “O encarecimento decorre não só do reajuste de matérias-primas, mas de adequações de custos industriais e elevação do custo logístico das fábricas aos varejistas”, ele atribui.

Abreu considera a Fortlev (negou entrevista, tal como Acqualimp, Amanco Wavin e Extrafort) a marca de caixa d’água mais presente no varejo da construção. Ao final de outubro, aponta o superintendente, suas fontes situavam o preço de uma caixa de 310 litros em torno de R$ 270,00 e o do modelo de 500 litros em cerca de R$ 315,00. “Não são valores exorbitantes para o mercado na capital paulista e Grande São Paulo”, ele comenta. “A propósito, caixa d’água não é item de compra diária, como alimentos, e o consumidor não deixa de levar material de construção em função do preço, pois se o cano estourou e a rede elétrica interna caiu, a compra desses produtos é inevitável”.

Raposo

O pó da hora

“Nos últimos dois anos, a rotomoldagem de caixas d’água mobilizou perto de 54% do mercado de polietileno micronizado e, ainda no tocante a reservatórios, cisternas participaram com 10% desse consumo total”, expõe Arthur Felipe dos Santos Andrade, vice-presidente de operação da Raposo Plásticos, pitbull da reciclagem que estendeu o braço este ano na micronização de polietileno, material ofertado à praça nas vestes da linha Rotorap. A seu ver, a pane hidrológica deste ano não tende a reconfigurar de forma contundente o movimento nacional da resina em pó. “Mas o novo marco legal do saneamento básico, ao estender o serviço à população mais carente, pode incrementar muito o consumo de PE micronizado para rotomoldagem de reservatórios, tal como ocorreu na implantação programa Água para Todos no governo Dilma”, rememora o dirigente. Pulando do plano geral para o novo negócio da Raposo, Andrade calcula que as vendas dos seus dois grades Rotorap para transformadores de caixas d’água subiram 6% na garupa da estiagem descomunal. “A crise hídrica contribuiu para o nosso volume mensal de vendas a ponto de já cogitarmos passar no ano que vem nossa capacidade de micronização de 10.200 t/a para 24.000 t/a”, adianta Andrade. Na retaguarda dessa meta, ele destaca atuação de um laboratório de ponta para comparecer com ensaios-chave na atividade, como os de controle de impacto, fluidez a seco e densidade aparente. A fabricante de máquinas para rotomoldagem Rotoline negou entrevista.

Sem respiro
Amilton Shimabukuro, gerente administrativo da Rotogine, fabricante de caixa d’água de PE na Grande São Paulo, considera que o colapso hídrico deste ano pega mais pesado que as calamidades anteriores. Por sinal, a periodicidade dessas intempéries tem aumentado em várias regiões. No embalo, analistas reputam a estiagem esperada para findar em dezembro a pior sofrida pelo país em 91 anos. Shimabukuro justifica sua visão sobre esta seca não só pela sua intensidade turbinada pelas pioradas climáticas, mas por transcorrer num momento de economia fragilizada, marcada por poda nos investimentos ambientais e no saneamento e que também reflete ainda diversos efeitos remanescentes da pandemia, mesmo com o corona hoje esboçando despedida com a marcha da vacinação.

Shimabukuro engrossa o sufoco enxergado em seu segmento com os preços cada vez mais inflacionados da energia elétrica (decorrência da estiagem), gás liquefeito de petróleo e insumos como PE. “Não há perspectiva de melhora a curto prazo desses indicadores econômicos e ainda continuaremos enfrentando muitas dificuldades, entre elas a demora nas entrega e aumentos de preços no âmbito das matérias-primas”.

Embora a procura por reservatórios como caixas d’água venha empinando, todos esses entraves conjunturais pesarão para frear a subida, ele julga. “Acreditamos na possibilidade de um incremento nas vendas de caixas de grandes volumes, acima de 5.000 litros, dirigidos a um mercado de classe média, condomínios e empresas, uma clientela com propriedades sujeitas a maior risco de desabastecimento de água”, nota Shimabukuro. “A parte da sociedade identificada com a aquisição de caixas menores (classes de baixa renda) não conta no momento com chances melhores de compra”. A título de referência, ele comenta que regiões próximas da planta da Rotogine, em Cotia, já deparavam no fim de outubro com racionamento de água por parte da rede pública e clientes da empresa nessas áreas informam estarem recorrendo à alternativa de poços artesianos, por sinal castigados pela estiagem com níveis menores no fluxo de lençóis freáticos. “As caixas d’água maiores tornam-se então uma escolha de armazenamento mais segura para esse perfil de consumidor”, nota o gerente.

Na maioria dos casos, ele reconhece, caixas d’água não são objeto de compras recorrentes e a aquisição seguinte pode tardar. “Marcas tradicionais levam vantagem por causa disso, pois são mais lembráveis pelo mercado, além de contarem com extensa capilaridade”, pondera Shimabukuro. “Como empresa de pequeno porte, a Rotogine aposta muito mais na qualidade do portfólio e no esmero do atendimento. Aliás, muitas vezes é o nosso suporte pós-venda que motiva os clientes ao marketing boca a boca”.

Olho no clima
Marca top of mind em materiais de construção, a Tigre impregna com este renome sua linha de caixas d’água rotomoldadas de PE. “Nos últimos anos, o mercado desses reservatórios tem crescido de forma significativa, impulsionado por constantes melhorias no produto e, possivelmente, por condições climáticas como fortes estiagens provocando crise hídrica em várias regiões”, analisa Vinícius Miranda de Castro, diretor de desenvolvimento de negócios com clientes da Tigre. Por sinal, ele acrescenta, a insuficiência na armazenagem de água potencial acentuou-se na primeira onda da pandemia, em 2020. “Foi quando doamos, em parceria com companhias de saneamento, 2.700 caixas d’água a comunidades em situação de risco em São Paulo, Paraná e Pernambuco”.

Castro distingue as leves caixas d’água da Tigre pelo fechamento seguro, barrando insetos e impurezas, e pela aditivação anti UV que as protege contra intempéries e zera perda de resistência e risco de descoloração. “A superfície lisa evita incrustações, facilitando a limpeza, e os rebaixos na lateral e marcação para tubulação de entrada e saída simplifica a instalação, realizada por sinal sem possibilidade de erro, pois as marcações para furos e as instruções de montagem constam do corpo do reservatório”. O portfólio abrange caixas abertas de 310 a 5.000 litros e fechadas, de 310 a 1.000 litros. “O carro-chefe é a de 310 litros, devido ao custo/benefício e instalação descomplicada”, atribui o diretor. No site Mercado Livre, este modelo era ofertado a R$ 310,00 na primeira quinzena de novembro.
A frequência crescente de sobressaltos climáticos, sejam estiagens ou invernos mais intensos, já garantiu lugar entre os drivers do planejamento da Tigre para suas caixas d’água. “Estamos preparados para atender a demanda até em condições mais severas”, atesta Castro. “Na eventualidade de uma seca prolongada ou economia de inflação mais acentuada, avaliaremos o que for possível para estreitarmos a proximidade das nossas revendas”. •

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