Pesquisa de Opinião – Reciclagem

Braskem parte este ano sua planta recicladora de poliolefinas pós-consumo. Quais os efeitos esperados com essa entrada da maior petroquímica brasileira no setor de reciclagem e na qualidade-padrão de PP e PE recuperados?

Ricardo Mason
Diretor da recicladora Plastimil

O fato de a Braskem começar a vender material reciclado no Brasil é uma coisa positiva para o setor. O mercado de materiais reciclados não é novo no país e, embora com muitos atores, poucos se dedicam a um trabalho mais meticuloso, voltado à qualidade padronizada do produto, caso também da minha empresa. Por sua vez, a entrada da Braskem à frente de uma recicladora, no mínimo despertará a atenção de algumas empresas que sempre viram com restrição a aplicação de material reciclado em suas plantas e produtos. A solução para a reciclagem nacional de plástico exige trabalho conjunto de várias empresas; não há agenda exclusiva capaz de preencher as necessidades existentes e por vir.


 

Décio Boschetti
Diretor da recicladora Sulpet

A entrada do setor petroquímico na reciclagem é caminho sem volta, devido à demanda do mercado por materiais mais sustentáveis. Hoje em dia, a cadeia brasileira da reciclagem sofre em razão da falta de logística reversa eficiente e separação mal feita dos resíduos pela população. Com a entrada de grandes players, como a Braskem, a captação e logística dos plásticos pós-consumo ficarão mais difíceis, em virtude dos grandes volumes trabalhados. Com isso, desponta a possibilidade de aumento do preço desse reciclado, em termos de matéria-prima e produto final. Por outro lado, a identificação da Braskem com a tecnologia exemplar em suas operações deve levar esta sua nova planta a contribuir para puxar o mercado todo para um reciclado de melhor qualidade.


 

Bruno Igel
CEO da recicladora Wise

O envolvimento de grandes empresas na reciclagem é positivo para este setor. Ao longo dos últimos anos, a reciclagem vem migrando da periferia para um local privilegiado no segmento plástico. Para nós, entusiastas que esperam um mundo mais circular, com índices muito superiores de reciclagem de resinas, é impossível obter este resultado sem a participação mais profunda de companhias de maior porte. É discutível se elas têm o melhor efeito para o setor quando incentivam a reciclagem e a economia circular ou quando efetivamente entram no mercado com capacidade produtiva. No caso da Braskem, a decisão foi tomada e o investimento, mesmo que inicialmente tímido em termos de tecnologia ou capacidade, gera certo desconforto para as empresas integrantes do setor de reciclagem de plásticos, nenhuma com poder de fogo comparável ao dessa petroquímica e algumas, por sinal, mantêm relações comerciais com ela.
Num primeiro cenário, a incógnita é se as grandes companhias, como gestores de resíduos e petroquímicas, encararão a reciclagem como um mercado, protegendo à sua maneira os resultados econômicos necessários. Tal atitude gera benefícios para o setor – mais escala, qualidade e eleva a barra da governança e práticas de mercado. Já o segundo cenário, com risco real de acontecer, ocorre quando empresas maiores encaram estes mercados (pequenos se comparados com seus negócios primordiais) como uma licença de operação, simplesmente necessária para manterem rodando suas atividades principais.
Se der o primeiro cenário, a concorrência de alto nível só vai gerar benefícios e aumento do índice de reciclagem com mais eficiência, competitividade e qualidade. Se der o segundo, podemos até enxergar um aumento de volume e redução de preços de curto prazo, mas haveria grande prejuízo no médio/longo prazo para a evolução da reciclagem no país com riscos também para o impacto social e ambiental desse segmento.


 

Alan Mani
Diretor da Deink Brasil

A cadeia recicladora de plástico já demonstra efeitos desse movimento da Braskem de estender o braço numa planta sua para recuperar poliolefinas pós-consumo. Em conversas com cooperativas e gestores de resíduos, constatei que a entrada no ramo de novos players, como esta petroquímica, já causa uma valorização maior do resíduo plástico. Isso confirma minha expectativa de que, tal como sucedido em outros países, esta destinação de ‘upcycling’ para rejeitos tende a acabar com a premissa que o plástico reciclado não passa de uma alternativa ‘econômica’ ao virgem. Trata-se de um caminho sem volta. Recicladoras como a minha empresa hoje presenciam grande demanda, a cargo de companhias donas de marcas de produtos finais (brand owners), por resina reciclada de alta qualidade para ser incorporada às suas embalagens. Essa procura traz à cena novos e poderosos fornecedores num mercado que ficou tecnologicamente estagnado por quase 30 anos. O aumento da oferta de poliolefinas para segundo uso de alta performance, impulsionado por grandes companhias focadas em inovação e tecnologia vai gerar um revolução muito rápida e benéfica não só na cadeia recicladora, mas na própria imagem pública do plástico.


 

Carina Arita
Diretora Comercial da Tomra Recycling Brasil

A Braskem nos procurou primeiramente em 2015 para conhecer as tecnologias de seleção de resíduos baseada em sensores e suas aplicações possíveis. Desde então mantemos contato e, em 2017, a empresa criou uma divisão dedicada aos temas de economia circular, o que acelerou significativamente a atuação dela na reciclagem. Considerando seu porte e abrangência, a Braskem se cercou de especialistas para montar com tecnologia de ponta a sua unidade recicladora que parte este ano. Estamos com ela nessa jornada através do nosso sistema de triagem Autosort Flake para garantir, nessa nova planta, a maximização da pureza dos flakes de PE e PP ao final da linha de lavagem. Esse sistema utiliza uma combinação de sensores de alta resolução NIR (infravermelho próximo) munidos de câmera RBG e capazes de identificar os tipos de polímeros por suas corres e características espectrais. A entrada em campo dessa fábrica vai direcionar o mercado de reciclagem de poliolefinas para o aumento no volume disponível no Brasil de material pós-consumo recuperado de alto padrão, alargando em decorrência a sua gama de aplicações, em linha com essa evolução mundial.


 

Edilson Gomes
Gerente de negócios da recicladora Barreflex

Vejo como muitíssimo positivo este movimento da Braskem, muito incentivador para toda a cadeia de reciclagem.É um nome de peso entrando no setor vai despertar o interesse de grandes transformadores e indústrias finais e pela aplicação de plástico pós-consumo reciclado (PCR) em seus produtos, em linha com o apoio à circularidade. A Braskem também vai puxar para cima, com esta sua unidade recicladora, a régua do nível de qualidade e padronização de lotes de poliolefinas recicladas. Com isto, acredito muito que se abrirão portas e possibilidades de aplicação em diversos produtos nos quais antes as resinas recicladas não eram aceitas e bem-vistas.


 

Marcelo Guerreiro Mason
Head de marketing e sustentabilidade da transformadora Greco & Guerreiro

No mundo inteiro vigora a tendência de petroquímicas, gestores de resíduos e grandes players da cadeia estendida do plástico entrarem no mercado de reciclagem. O objetivo é ofertar material de alta performance, em linha com as metas de sustentabilidade traçadas para suas embalagens por companhias donas de grandes marcas de produtos finais (brand owners). No Brasil, predomina há muito tempo a cultura de uso de material reciclado apenas como uma alternativa economicamente competitiva de matéria-prima para players de alcance nacional e regional.
Presenciamos então duas vertentes diferentes. De um lado, vivemos num país em desenvolvimento onde 35 milhões de pessoas não têm acesso à água potável e cerca de 100 milhões carecem de serviço de coleta de esgoto. No mais, o país pena sob recessão desde 2016 e, para piorar, o alastramento da pandemia desde 2020 influiu para relegar, até o momento, perto de 27 milhões de habitantes à linha da pobreza. Neste cenário agravado pela inflação fica muito difícil crer que as classes de baixa renda toparão pagar mais por algum produto em nome da sustentabilidade. Do outro lado, porém, acredito que movimentos como este da Braskem são benéficos para a cadeia recicladora como um todo e torcemos pela retomada econômica o quanto antes para viabilizar a valorização do plástico pós-consumo recuperado (PCR) de qualidade premium.


 

 

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