Ninguém nasce sozinho

Para a economia deslanchar, o governo precisa rever como trata o investidor privado
Para a economia deslanchar, o governo precisa rever como trata o investidor privado

O governo Lula 3 fechou 2023 com apenas 18 leilões de infraestrutura efetuados (modais viários, terminais portuários, energia e petróleo), certames de baixa disputa em sua maioria, registra o site Poder 360. Do total de licitações federais, sete tiveram lance único e duas ficaram no zero. Analistas entrevistados justificaram o desinteresse com Selic de dois dígitos e “incertezas econômicas”, termo pau para toda obra onde cabe tudo e nada se diz.

Com caixa no chão e uma infraestrutura à míngua, manda a lógica que o Brasil não dê as costas ao setor privado. No entanto, em apreço pela ideologia denominada “capitalismo de Estado”, o governo Lula 3 tem se esmerado em distanciar do país os financiadores particulares. Também no ano passado, o governo federal tentou deformar o marco do saneamento básico, regulamentação aprovada com fanfarras pelo Congresso em 2020 com metas traçadas de universalização do acesso a água potável e esgoto até 2033, um avanço cujo potencial para tubos extasiou a indústria de PVC. Pois para esticar a sobrevivência de companhias públicas estaduais de notória inépcia na prestação desses serviços, o Executivo tentou aprovar decretos que teve de revogar sob pressão irada do Legislativo. No editorial “Manual para afastar investidores privados” (10/2), o jornal o Estado de São Paulo comentou esta frustrada interferência presidencial: “Como explicar essas idas e vindas para o investidor que se pretende atrair?” Leva o Nobel do Convencimento quem provar que aqui se preza a segurança jurídica e a clareza nas regras.
Mas os exemplos desse contrassenso seguem a jorrar. Em linha com a ideologia do Executivo e fora da realidade, a Petrobras buzina reinvestimentos bilionários na Refinaria Abreu e Lima, de construção de 2005 a 2014 flagrada com propinodutos na Lava Jato. Discursos exaltaram a retomada apregoando geração de empregos e de 260.000 barris/dia de petróleo em 2028. A retórica estatal passa ao largo da onda global de desinvestimentos e fechamento de refinarias, sob previsões de baixa no retorno com a transição em curso para a energia limpa. Outra mostra recente da Petrobras relativa a risco para o capitalista privado no Brasil: sua decisão de rescindir a venda formalizada da refinaria cearense Lubnor ao Grupo Grepar, alegando não cumprimento de cláusulas contratuais, argumento que o comprador promete levar à Justiça. Afronta similar à segurança jurídica dá o tom a entrevero de peso na esfera privada. A holding J&F vendeu em 2017 a indústria Eldorado Celulose à indonésia Paper Excellence, transação que agora o grupo brasileiro cismou de desfazer. Trecho do comunicado da Paper Excellence postado no portal Poder 360: ”A Paper ainda confia que as autoridades agirão de modo a garantir a segurança jurídica no Brasil, visando ao respeito dos contratos e da Lei, sem criar uma situação inédita contrária aos investimentos no País”.

Outra bola fora: pelo visto inconformado com a privatização da companhia, o Executivo pressionou em vão o conselho da Vale do Rio Doce a trocar o presidente atual pelo ex-ministro Guido Mantega, que dispensa apresentações. “Decisões desse tipo são uma das razões da queda da taxa de investimentos em 2023”, comentou na mídia José Márcio Camargo, economista-chefe da Genial Investimentos.

Para içar investimentos privados, o governo lançou o Programa Nova Indústria Brasil. Foi aplaudido pelos setores contemplados, mas a recepção do mercado foi fria, pois viu apenas mesmice no lance: mais um programa para deter a desindustrialização com subsídios e empréstimos. A visão do governo é de que a industrialização é questão financeira, quando o buraco é mais embaixo. Envolve também, por exemplo, a melhora educacional/profissional; a sedução de novos talentos para a indústria, hoje atraídos para postos em serviços e no mercado financeiro; abertura econômica e um ambiente de negócios que cative o industrial com horizonte previsível e regras compreensíveis e que não mudam durante o jogo, a bel-prazer de quem se julga o dono da bola. •

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