Com todo gás

Economia puxa votos para Trump e ampara salto na produção de PP da Braskem nos EUA

Nos últimos anos, o moderado aumento da sua capacidade instalada global acarinhou polipropileno (PP) com uma rentabilidade degraus acima das margens de polietileno (PE), resina assolada por descomunal e incessante expansão da sua produção. Mas o horizonte azul celeste para PP periga enevoar a partir deste ano, pois diversas âncoras desse versátil polímero acusam enfraquecimento global, entre elas a indústria automobilística e, linchados pela economia circular, os descartáveis e embalagens de uso único. Para engrossar o fuzuê, antes mesmo do advento do coronavírus a economia internacional já cambaleava. Pois é justo nessa maré baixa que um esquadrão de novas plantas de PP começam a dar as caras na Ásia e EUA. Entra aqui a fábrica de 450.000 t/a que a Braskem programa partir no segundo trimestre e cuja principal escora é a economia norte-americana em êxtase, o melhor login de Trump para acessar seu segundo mandato na Casa Branca.

Projeto orçado em US$ 675 milhões e de construção iniciada em 2017 em La Porte, Texas, a unidade denominada Delta, adepta da tecnologia Unipol da W.R. Grace, produzirá homopolímeros, termoplásticos olefínicos e copolímeros random e de impacto. A Delta integrará o efetivo formado nos EUA por três plantas de PP no Texas, uma na Pensilvânia e outra na Virgínia do Oeste. “Com essa sexta unidade, nossa capacidade chegará a 1.950 milhão de t/a da resina, reforçando a liderança no mercado norte-americano”, assevera Christopher Bland, vice-presidente de projetos estratégicos da Braskem América do Norte. Sem desnudar tonelagens, ele estima em 1,5% o avanço no consumo norte-americano de PP entre 2018 e 2019.

John Richardson, analista e blogueiro do portal da consultoria Icis, projeta que a capacidade de PP da China suba 13% este ano, para a casa de 31.5 milhões de t/a e, mesmo assim, as importações devem rondar 4.1 milhões, mercado por ora afastado da resina norte-americana, sobretaxada por Pequim na guerra comercial deflagrada por Trump. Para engrossar o caldo, Richardson assinala que a capacidade chinesa de PP engordará 14% em 2021, ao pular para 35.8 milhões de t/a. No Vietnã, o ano abriu com a estreia de uma planta de 300.000 t/a da resina e a Malásia deve exportar 590.000 toneladas de PP no exercício atual e mais de 600.000 no seguinte. Para 2021, está prevista a entrada em funcionamento nos EUA de uma fábrica de 250.000 t/a de PP da Formosa; outra de 450.000 t/a da ExxonMobil; dois desgargalamentos em dois sites da Ineos, somando em torno de 70.000 t/a e, uma vez aprovadas as requeridas licenças oficiais e confirmada a sua construção, uma planta de 600.000 t/a de PP da Formosa deve partir antes de 2024.

Essa chuva de novas produções de PP não amorna as expectativas de Christopher Bland para a planta Delta. Ele justifica sua confiança com a diversidade de aplicações da resina e com a alta octanagem do mercado norte-americano. “Hoje em dia, ele demostra uma insuficiente oferta interna de PP, exigindo importações para atender por completo a demanda doméstica”.

Excedente a caminho
No momento, os EUA ostentam uma capacidade instalada na faixa de 8.4 milhões de t/a de PP, calcula Javier Ortiz, diretor da divisão de plásticos da consultoria norte-americana IHS Markit. Com base no ano fiscal de 2018, ele projeta a produção local no período ao redor de 7.2 milhões de toneladas de PP, exportações por volta de 1.6 milhão e importações na faixa de 580.000 toneladas. “Em 2018, as importações compuseram cerca de 8% do consumo de PP nos EUA e, por sinal, embalagens flexíveis respondem por volta de 15% da demanda da resina no país”, estima o analista. “Mas 2018 foi um período atípico, pois o mercado dos EUA esteve especialmente aberto a importações de PP devido ao encarecimento do monômero (propeno) e à oferta apertada do polímero doméstico”.

Para Ortiz, o quadro assemelhava-se ao de 2016, quando os preços internos de PP subiram tanto que os transformadores nos EUA começaram a investir em equipamentos de desensaque para desfrutar a resina importada mais barata, remetida em sacaria lisa, em lugar do polímero nacional entregue em regra por vagões graneleiros ferroviários. “Já em 2019, melhorou bem o suprimento local de propeno e PP, justificando a projeção de declínio nas importações, embora vários compradores tenham mantido o relacionamento com fornecedores de PP do exterior e, entre eles, o Brasil (Braskem) exportou naquele ano volumes expressivos da resina para os EUA”.

O antevisto aumento da capacidade mundial de PP, pondera Ortiz, desperta preocupação com a possibilidade de um excedente, caso a demanda norte-americana e mundial não se portem à altura. “As margens do produtor de PP já estavam pressionadas ao final de 2019 e, com a partida da planta Delta, as transações com PP em 2020 estão sendo discutidas a partir de preços mais baixos, considerando o suprimento incremental e o atual enfraquecimento da demanda da resina”. Portanto, ele reitera, se a demanda destoar do esperado, os EUA serão forçados a ampliar as exportações para equilibrar o mercado interno de PP, intensificando assim o recuo dos preços internacionais e suas margens”. O diretor da IHS nota ainda que o mercado norte-americano permanecerá muito suscetível a mudanças provocadas nos preços e margens por novas capacidades de PP espocando em locais como a Ásia. “Do lado positivo, este problema para PP não tem a mesma magnitude do quadro de PE”, ele compara. “Seu excedente mundial pode atingir 10 milhões de toneladas durante o próximo triênio, enquanto no caso de PP, o maior acréscimo de capacidade, da ordem de quatro milhões de toneladas, será presenciado em 2020. No entanto, se considerarmos que a demanda da resina deve se recuperar, esta sua nova capacidade poderá ser absorvida de modo mais fácil nos próximos dois anos”.

10 produtores
Se incluída no saldo uma pequena fábrica texana de grades para especialidades e compostos, os EUA hoje dispõem de 10 produtores de PP, dos quais quatro controlam 2/3 do mercado doméstico, estabelece Fabrizio Galiè, expert no mercado global de polímeros da consultoria britânica Icis. “Em 2019, a capacidade norte-americana da resina foi estimada em algo abaixo de 8.4 milhões de t/a”, ele crava. Um ano antes, prossegue, a produção de PP rondou 7.550 milhões de toneladas, enquanto as exportações somaram 1.6 milhão e as importações fecharam em 600.000 toneladas. “Pelo banco de dados do Icis, cujo histórico remonta a 1978, os EUA têm permanecido um país exportador regular de PP e essas vendas externas tendem, mais à frente, a superar com sobra as importações norte-americanas, embora estas prossigam por razões como preços e conveniências logísticas”. Nos últimos quatro anos, detalha Galiè, as importações de PP pelos EUA recrudesceram em particular no segundo semestre, “pois o material remetido de origens como Oriente Médio, Coréia do Sul e América do Sul andava muito mais barato que a resina local, devido a prolongadas restrições na oferta interna dela e de propeno”.

O porta-voz do Icis não vê razão para alarmismo com a legião internacional de novas plantas de PP. “Os EUA já produzem muito mais PP do que consomem e suas capacidades adicionais terão que voltar-se primordialmente para o exterior, embora o risco de superoferta deva ser avaliado no contexto global”, pondera Galiè. A maioria das exportações norte-americanas de PP, ele nota, é mobilizada pelo Canadá e México, sendo que este último membro do Nafta tende a elevar suas importações da resina. “Já o Canadá caminha, em tese, para uma capacidade excedente de PP em poucos anos”. Desse modo, amarra as pontas o pesquisador, ao lado do incremento da demanda dos EUA, os produtores de PP no país terão de atentar mais para oportunidades de remessas tanto para destinos distantes como próximos, como a anêmica América do Sul. “O recente esfriamento da economia internacional é um fator de risco para as projeções de aumento da demanda de PP”, assinala Galiè. “Condições difíceis de mercado são esperadas a curto prazo com o surgimento de mais plantas dentro e fora dos EUA, em especial na Ásia. Mas, no final das contas, a demanda deve ampliar e, a longo prazo, mais capacidades de PP serão necessárias para corresponder ao aumento do mercado global”.

Entre 2013 e 2018, dimensiona Galiè, foi de 2,5% a taxa média de crescimento anual de consumo nos EUA, mesmo com o consumo estagnado no biênio 2016-2017. Pela segmentação do analista, 56% do movimento norte-americano de PP cabem a produtos injetados acabados e semi-acabados, enquanto uma parcela aproximada de 17% é território de ráfia, nãotecidos e fibras extrusadas. No térreo dessa edificação, Gailiè coloca filmes e chapas com 16% de participação e os 11% restantes são atribuídos a aplicações como tubos, compostos e recipientes soprados.

Para Simone de Faria, responsável pela América Latina da consultoria norte-americana Townsend Solutions, preço e disponibilidade de matéria-prima compõem as razões para a expansão na capacidade norte-americana de PP transcorrer com afã muito menor do que se presencia em PE, por sinal o termoplástico mais consumido no planeta. “A mudança da nafta para a rota dos crackers à base de gás natural liquefeito criou enorme desvantagem para o propeno, pois sua produção cai cerca de 16 vezes perante o processo anterior, já que a corrente de gás é muito mais rica em eteno”, compara a respeitada consultora. “Em paralelo, a redução no consumo da gasolina também contribuiu para diminuir a oferta de propeno de refinaria”. Hoje em dia, dimensiona Simone, o investimento em plantas de PP só se viabiliza a partir de 400.000 t/a de capacidade.

A analista da Townsend orça em 8.170 milhões de t/a a atual capacidade instalada de PP nos EUA. “Braskem, LyondellBasell, ExxonMobil, Total e Formosa Plastics respondem por 76% desse potencial”, reparte Simone. Em 2018, ela segue, o país consumiu 6.640 toneladas de PP e importou 300.000. Já a capacidade da resina em toda a América do Norte é fixada pela pesquisadora em 8.760 milhões de toneladas versus consumo de 8.100 milhões. Mesmo considerando este descompasso, ela sustenta haver espaço para desgargalamentos na região. “De 2019 a 2024, o consumo de PP na América do Norte deve aumentar 1,3%, passando a 8.620 milhões de toneladas”, ela prevê. “Se as novas capacidades hoje anunciadas na região se materializarem antes de 2024, isso resultará em torno de 25% de capacidade excedente, bem menos que o atual índice de 40% no caso de PE”.•

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