Nada será como antes

Escalada dos desembarques consolida o Brasil entre os principais destinos para superofertadas poliolefinas
Importações PP e PE

O primeiro semestre fechou com a economia mundial em desmaio preocupante e em circunstâncias que, em boa parte, ignoraram peculiaridades locais. Afinal, o perfil básico da demanda pouco destoou, entre janeiro e junho, entre os países desenvolvidos e emergentes. Em ambos os quadrantes, as vendas de bens duráveis, caso de carros e eletroeletrônicos, fecharam os seis meses iniciais anêmicas e, no tocante a bens essenciais, presenciou-se no varejo o reinado das compras movidas a preços e a primazia dada pelo público a alimentos em detrimento de outros produtos finais de giro rápido. Essa sarabanda põe trilhando o fio da navalha o negócio global de PE e PP. Afinal, 2/3 do mercado da primeira e 1/3 no caso da segunda resina referem-se a embalagens de bens de consumo. A situação preteja porque ambas as poliolefinas padecem de mega excedente mundial que continua a inchar e não há, por enquanto, previsão de respiro desse sufoco. A superoferta é alimentada por expansões da petroquímica nos EUA e Ásia e, aliadas ao advento da guerra na Ucrânia, elas praticamente varreram a Europa do mapa dos produtores relevantes de termoplásticos.
A China é o mercado mais exposto a essa ventania contrária. Seu cacife de capital da industrialização mundial vem caindo, empurrado pela fraca demanda internacional e, preocupação para a cadeia dos plásticos, pela sustentabilidade substituindo a globalização como a ordem do dia no planeta. Em frente: o poder aquisitivo per capita chinês permanece o de país pobre (US$ 13.000/a); sua população idosa disparou e a taxa de natalidade despencou; sua bolha financeira imobiliária estourou e o governo de Pequim agora corre com subsídios e créditos para tentar baixar a poeira e repor a economia nos conformes.
Resumo da ópera: a retração da China, os aumentos em curso de de suas capacidades de PP e PE e os volumes dessas resinas que seus ex-fornecedores, para compensar a perda daquele senhor mercado, tratam de redirecionar a outros países agravam as sobras dos dois termoplásticos na praça. Nesse tumulto, o Brasil, mesmo atolado em carestia e inflação desde 2022, desponta entre os destinos palatáveis para o comércio internacional de PE e PP porque: não forma preços em petroquímica, seu mercado interno é respeitável e sua produção de determinados grades de poliolefinas é insuficiente e não há perspectiva de expansão. Meandros e reflexos desse cenário são dissecados a seguir nas entrevistas de três influentes revendedores de PE e PP importados: Roberta.Duarte, head of business da Conecta Resinas; Marcos Prando, dirigente da distribuidora Replas, e Ricardo Rezende, gerente comercial da Place Resinas Termoplásticas.

Pelos indicadores do primeiro semestre, acha que, mesmo com a economia brasileira enfraquecida, as importações de PE e PP caminham ou não para superar este ano os volumes desembarcados em 2022?

Ricardo Rezende: Ao analisarmos o primeiro semestre, destacam-se duas tendências significativas. A primeira diz respeito à trajetória de queda do dólar, o que resulta em maior competitividade das matérias-primas importadas. E a segunda tendência é uma pequena redução nos preços internacionais da resina. Ao considerar a interação desses dois fatores, observa-se um cenário favorável para as matérias-primas importadas, pois sua atratividade e viabilidade econômica são ampliadas. Essas tendências impulsionam a possibilidade de aproveitar as oportunidades proporcionadas pela conjuntura atual.
No entanto, é importante ressaltar que esse cenário é volátil e representa apenas uma fotografia momentânea. É preciso considerar outros fatores e acompanhar a evolução dessas tendências ao longo do tempo. A possibilidade de uma recuperação na demanda da indústria no segundo semestre é uma perspectiva positiva. Se isso ocorrer, há uma chance de superarmos os volumes de importações alcançados no ano passado. No entanto, é necessário reconhecer que essa possibilidade ainda é incerta. É cedo para traçar estimativas precisas e é por isso que a postura da minha empresa, Place Resinas, permanece a mesma. Continuaremos trabalhando de forma séria e estabelecendo parcerias duradouras para garantir o suprimento de matéria-prima nas instalações dos clientes.
Nossa posição nos convida a sermos otimistas e a enxergarmos o copo meio cheio. Ainda assim, é importante ter cautela e estar preparados para lidar com qualquer cenário que se apresente. O mercado é dinâmico e pode se recuperar de maneira surpreendente. Devemos estar atentos às tendências e necessidades dos consumidores, em busca constante de inovação e oferecendo soluções que atendam às demandas do mercado. Por meio de estratégias adequadas e uma visão positiva, podemos enfrentar os desafios e alcançar resultados extraordinários. É importante lembrar que, mesmo diante das dificuldades, sempre há oportunidades a serem exploradas.

Marcos Prando: Acredito que as importações de PE e PP devem ficar este ano levemente acima de 2022. Afinal, a maioria das empresas consumidoras dessas resinas está comprando somente o necessário, ou seja, com estoques baixos. Como o segundo semestre costuma ser mais aquecido, a entrada de materiais deve superar os números dos seis meses iniciais para atender a demanda.

Roberta Duarte: De janeiro a maio último, tivemos quase 168.000 toneladas de PE desembaraçadas no Brasil. Apenas em maio, entraram quase 40.000 toneladas e isso nos indica um aumento de 33% em relação ao número de abril deste ano. Em relação ao mesmo período dos cinco meses iniciais de 2022, constatamos expansão de 25% nos volumes de PE importado. Se pegarmos os últimos 12 meses imediatamente anteriores a maio de 2023, o aumento atinge 29%.
Em relação ao PP, observamos que, de janeiro a maio deste ano 199.000 toneladas foram desembarcadas no Brasil. Considerando somente o mês de maio último, mais de 45.000 toneladas forma internadas, indicando aumento de 22% em relação aos números das importações da resina em abri passado.
De volta aos cinco meses iniciais do ano passado como base, deparamos com um aumento de 47% em PP importado. Se pegarmos os últimos 12 meses imediatamente anteriores a maio último, chegaremos a um incremento de 35%.
Todos os indicadores evidenciam, portanto, que estes são os novos patamares de participação do material importado no mercado brasileiro e esta já é uma tendência concretizada, uma realidade que não tem volta. Eu acredito que as importações de PE e PP caminham e irão superar em 2023 os volumes de 2022.

O ciclo de expansão dos excedentes globais de PE e PP continua firme. Em função desse aumento da produção mundial, quais países produtores de PP e PE que praticamente hoje não exportam ou exportam timidamente para o Brasil devem fortalecer seus desembarques aqui, na garupa de seus novos complexos de poliolefinas?

 

Ricardo Rezende: Os países que estão ampliando sua capacidade de produção de PP e PE em condições competitivas são os que, provavelmente, aumentarão suas exportações para o Brasil. A crescente demanda por PP e PE, em especial no Oriente Médio e Sudeste da Ásia, impulsiona o aumento da produção global desses materiais, o que abre oportunidades para os países produtores dessas regiões expandirem os negócios no mercado brasileiro. Além disso, a disponibilidade de matérias-primas essenciais, como gás natural ou petróleo, confere uma vantagem na produção de PP e PE, favorecendo países como Catar, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos, grandes produtores desses recursos naturais.
Além da disponibilidade de matérias-primas, é relevante considerar a capacidade de investimento em infraestrutura e tecnologia. Países que estão construindo complexos de produção de PP e PE e investindo em tecnologias avançadas têm maiores chances de fortalecer as exportações para o Brasil. Cingapura, Malásia e Tailândia são exemplos de nações que têm realizado aportes de recursos significativos nesse sentido, com a implementação de complexos petroquímicos e adoção de tecnologias inovadoras na produção de PP e PE, o que pode impulsionar suas exportações para o Brasil.
Considerando essas tendências, é possível vislumbrar um futuro em que os países com capacidade de produção ampliada e custos competitivas em PP e PE terão uma posição favorável no mercado brasileiro. A demanda crescente por esses materiais e as oportunidades de investimento e inovação na indústria petroquímica são fatores que impulsionam o aumento das exportações para o Brasil, estabelecendo novos fluxos comerciais e fortalecendo as relações internacionais no setor.

Marcos Prando: No momento, vejo mais acesso ao mercado brasileiro de produtores/traders chineses e vietnamitas, um movimento que casa com a questão de partida de novas capacidades de poliolefinas na Ásia.

Roberta Duarte: O ciclo de expansão dos excedentes globais de PE e PP desacelerou um pouco, em função da baixa demanda mundial e valores adicionados (margens) cada vez menores. Isso não significa que vai faltar resina! Ao contrário, continuo enxergando um cenário de excedentes de PE e PP, com uma ‘vontade’ dos produtores de não perder tanto valor e, por este motivo, as estratégias são variadas. Em alguns momentos reduzem capacidade, em outros decretam alguma razão para parada de força maior, seguram vendas; enfim uma tentativa incansável para evitar mais quedas de preços. Sobretudo, a lei da oferta e demanda é soberana e, nos mercados internacionais, os preços de PEs nos EUA ainda estão em queda, porém, próximos de um quadro de estabilidade. Demanda global continuou fraca em junho, quando a China também permaneceu com pouca atividade. O desenrolar da sazonal temporada de furacões nos EUA, de junho a novembro, pode gerar instabilidade nos preços nos próximos meses.

Desde 2021 a China ganhou autossuficiência na produção de PP homopolímero e, com isso, os países que a atendiam têm de redirecionar suas vendas da resina buscando compensar a perda do grande cliente. Como o Brasil é visto entre esses destinos? E mais: o Brasil foi o 4º maior cliente de PP chinês em 2022 e o 5º de janeiro a abril (fonte: Icis). Quais as chances de o Brasil subir mais nesse ranking de importadores da China, devido às limitações de sua produção de PP para satisfazer a demanda doméstica?

Ricardo Rezende: Apesar da atual fragilidade da demanda interna por PP homopolímero, o Brasil continua uma opção atrativa para nações em busca de compensar a redução nas vendas para a China. As empresas transformadoras brasileiras, cientes dessa realidade, estão constantemente em busca de maior competitividade, desenvolvendo a utilização de matérias-primas importadas para aproveitar as vantagens econômicas e tecnológicas oferecidas pelos fornecedores estrangeiros, com o objetivo de aprimorar a eficiência e qualidade dos produtos, garantindo, assim, sua competitividade. Neste contexto, é válido afirmar que o Brasil possui reais oportunidades de ascender no ranking de importadores de PP homopolímero chinês. Tais oportunidades estão fundamentadas na diversidade da indústria nacional, que demonstra uma demanda crescente por esses produtos, bem como na disposição do país em estabelecer parcerias comerciais internacionais, impulsionando, assim, seu posicionamento no mercado global. Além disso, Brasil e China mantêm relação comercial de longa data; natural, portanto, que direcionem excedentes a parceiros consolidados.

Marcos Prando: Apesar de outros países, neste momento, atenderem parcialmente a China, que era um grande mercado para eles, não vejo um desespero em vendas e preços baixos de PP homo a qualquer custo. O próprio material chinês vem para cá mais competitivo e com ofertas cada vez mais agressivas.

Roberta Duarte: O Bloomberg Commodities Index já caiu 12% no acumulado até junho deste ano e não mostra sinais de reversão. A situação econômica na China e demanda fraca e o medo de recessão nos EUA pressionam o índice. A corrida das commodities, iniciada há três anos, quando os preços dos produtos atingiram preços inimagináveis, entrou em colapso e vivemos uma nova realidade mundial.
No Brasil temos muitas ofertas de PP e PE origem China. Prevejo um cenário de completa mudança no comércio internacional de PP. Antes da pandemia, a China representava mais de 40% das importações globais da resina. A conjuntura mundial deste ano, obriga os produtores a buscarem outros mercados para compensar em parte essa enorme perda com a autossuficiência chinesa em PP (em especial homo) e o Brasil está no radar de todos os maiores produtores mundiais do polímero.

Pela sua avaliação desde 2021, quais os tipos específicos de PEBD, PEBDL e PEAD que têm similares domésticos e cujas importações brasileiras mesmo assim continuam a subir, impulsionadas pela superoferta internacional?

Ricardo Rezende: Uma das principais causas desse incremento nas importações reside na competitividade dos preços dos produtos importados em relação aos equivalentes nacionais. A superabundância global resulta em uma pressão nos preços internacionais, conferindo às importações uma maior atratividade do ponto de vista econômico para as empresas brasileiras. Essa dinâmica é reforçada pela disponibilidade de matéria-prima abundante e de baixo custo em outros países, o que contribui para a redução dos preços dos polietilenos importados. Além do mais, é imprescindível considerar a qualidade e a tecnologia empregadas na produção dos polietilenos importados. Em muitos casos, os produtos provenientes do exterior apresentam qualidade superior e são fabricados por meio de tecnologias mais avançadas, o que pode resultar em um desempenho e características específicas superiores, atendendo às exigências do mercado brasileiro, em especial em relação a polietilenos de alta densidade bimodais (PEAD) e tipos dessa mesma resina com maior rigidez. Vale o mesmo para polietilenos lineares metalocênicos e soluções com melhor desempenho mecânico em polietilenos de baixa densidade (PEBD). Essa busca por produtos de alta qualidade e com tecnologia de ponta impulsiona o aumento das importações, mesmo quando há opções similares de produção doméstica disponíveis.

Marcos Prando: Acredito que todas as linhas de PE estão com oferta e preços atraentes e o Brasil vai continuar aumentando essas importações, pois, reitero, os preços estão competitivos.

Além do mega excedente norte-americano, a sobra mundial de PE e PP é acentuada este ano por novos complexos na China, Oriente Médio, Índia, Vietnã, Tailândia, Coreia do Sul etc. Isso aumenta a disputa por clientes em países importadores expressivos dessas resinas, caso do Brasil. Quais as novidades implantadas em sua empresa para diferenciá-la da concorrência?

Ricardo Rezende: Para diferenciar nossa empresa dos demais importadores de poliolefinas, temos buscado aprimoramentos na estrutura logística e na oferta de soluções personalizadas de suporte técnico e comercial, inclusos representantes e canais de comunicação. Investimos em transporte e infraestrutura logística para agilizar os recebimentos e as entregas, reduzindo o tempo de espera e aumentando a eficiência operacional.

Marcos Prando: Em minha empresa, a Replas, o tempo de entrega, apoio técnico e treinamento de vendas têm sido essenciais para melhora da estrutura e atendimento ao cliente neste momento de oferta maior que a demanda de PE e PP.

Roberta Duarte: Melhorias na assistência técnica, logística e comercial são inerentes ao negócio de importações e minha empresa, a Conecta Resinas, não destoa desse padrão. Mas introduzimos recentemente um avanço sem similar no ramo: um aplicativo inteligente que indica para toda a equipe, em tempo real, a localização precisa do percurso do navio com nossas cargas. Hoje em dia, tornou-se impraticável para um importador trabalhar com estoques a longo prazo. A Conecta opera com estoques de 15 a 20 dias no chão e o aplicativo nos possibilita facilidades como vender a mercadoria em trânsito na água nos dando flexibilidade para delimitar um preço mais competitivo para a resina em meio a seu transporte. •

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