A perna que faltava

Para Lirio Parisotto, 2014 fica como um ano denso e encorpado como os vinhos que ele mais aprecia. Afinal, foi quando ele fechou uma página e abriu outra em sua vida. De um lado, pingou o ponto final no negócio de mídias ópticas e, em meio à cerimônia do adeus, um punhado de injetoras vipíssimas e exclusivas para CD/DVD foi parar no ferro velho e desfalcou a Videolar de uma operação que foi seu cartão de visitas antes da chegada abrupta de entes como MP3 e Netflix. Em contrapartida, a compra da Innova, transação aprovada em 1º de outubro pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), deu ao saci Videolar, comenta o empresário, a outra perna de que tanto carecia. Ela se chama estireno. Na entrevista a seguir, Parisotto justifica o arremate da concorrente, até então controlada pela Petrobras, e delineia suas projeções para os negócios com o monômero e poliestireno (PS), bem como em frentes como EPS e ABS.

PR – Sua decisão de entrar em PS foi para se desforrar do tratamento que recebia de seus então fornecedores de resina. Qual a racionalidade para adquirir a Innova em um momento em que o PS é um muro de lamentações no mundo inteiro, há quase 15 anos seu consumo está parado no Brasil e seus mercados são cada vez mais atacados por outros materiais?
Parisotto – Não estamos entrando em um mercado novo. Estamos, na verdade, nos consolidando em um segmento que já teve quatro fabricantes (Videolar, Dow, Basf e Innova), todos com capacidades muito parecidas e com plantas construídas em um período de dois anos, entre 2000 e 2002. Evidentemente, houve um equívoco dos quatro naquele momento em não acreditar que os outros iriam erguer suas fábricas. O fato é que a capacidade brasileira era do dobro do tamanho do consumo. Com a Innova temos um namoro muito antigo. Essa intenção existe há mais de uma década, desde que a Petrobras adquiriu parte da operação do grupo Pérez Companc e junto com ela veio a Innova. Naquele momento, queríamos tentar uma fusão das duas operações, uma com unidade de PS no Norte e outra no Sul, uma com monômero de estireno outra sem. Por vários motivos o negócio não evoluiu, mas o desejo ficou latente. Ficamos, então, aguardando a oportunidade de comprar esse ativo e ela surgiu quando a Petrobras, por motivos estratégicos, decidiu sair de áreas que não prioritárias. Não é vocação dela atuar em resinas, mas no upstream. A Petrobras contratou um banco, o Crédit Agricole, para conduzir o negócio. Na primeira oferta não vinculante houve mais de dez interessados. No final ficaram menos e a Petrobras nos vendeu porque fomos quem mais pagou.

PR – Qual foi o investimento, afinal? R$ 800 milhões ou R$ 1,2 bilhão na Innova?
Parisotto – Foram pagos R$ 870 milhões, mais alguma correção de valor. Temos também de entregar o resultado de dois anos. Está sendo feito um balancete dos dois últimos exercícios porque a oferta foi feita com base no balanço de 31 de dezembro de 2012.

PR – Pela sua projeção, isso deve acrescentar quanto ao montante?
Parisotto – De R$ 300 milhões a R$ 400 milhões. Considerando esses ajustes, com dividendos já distribuídos, o total será de mais ou menos R$ 1,3 bilhão.

PR – Por que não incluiu no pacote de compra da Innova as plantas de 140.000 t/a de  estireno e 66.000t/a de PS da Petrobras na Argentina?
Parisotto – Essa foi uma decisão estratégica da Petrobras. Visitei essas plantas 10 anos atrás e vislumbrávamos unir operações da Argentina, Triunfo (RS) e Manaus (AM). A Petrobras colocou à venda a operação do Brasil. Na Argentina, até onde sei, esses ativos não estão separados, mas dentro de toda a operação, com refinaria, monômero, resina e borracha. Há vários negócios em uma empresa só e isso, de certa forma, é um entrave.

PR – Se eventualmente a Petrobras decidir se desfazer desse negócio na Argentina, a Videolar é candidata a comprar?
Parisotto – Não há essa possibilidade hoje porque os ativos não foram oferecidos. Mas alguém esperto não escapa de um bom negócio.

PR – Por que resolveu pagar a Innova vendendo R$800 mi de suas ações em vez de recorrer a financiamentos conforme praxe no ramo, em especial do BNDES? Não crê em melhora da Bolsa?
Parisotto – Por que não tinha dinheiro. Uma parte foi financiada, sim.

PR – Muitas vedetes da sua famosa carteira de ações têm saído recentemente  na mídia como empresas  atoladas em problemas – por exemplo, Eternit, Celesc e CSN. É por isso que decidiu vender as ações para pegar a Innova?
Parisotto – Alguns setores da economia estão apanhando mais que outros. A siderurgia, e não só a CSN, está sofrendo, assim como a mineração devido à queda do preço do minério de ferro. As empresas estão dentro do contexto do país. Se o país vai bem, elas vão bem. Fora desse escopo, todas as empresas têm seus problemas devido à complexidade de legislação, impostos e envolvimento ambiental.

PR – Você sempre disse em entrevistas que transformação de plástico é um negócio difícil, mas investiu no superofertado segmento de BOPP, chapas para termoformagem de PS e numa pequena operação de tampas de PP em Manaus. Agora fala até entrar em EPS. Afinal de contas, qual é a sua?    
Parisotto – O plástico está cada dia mais presente nas nossas vidas e no meio da cadeia há o transformador. É um setor de margens muito apertadas, por isso é um negócio muito duro e que não desperta mais interesse de investidores.

PR – Qual a conveniência da compra da Innova para sua carreira política? Por que se filiou ao PMDB como suplente de senador pelo Amazonas?
Parisotto – Não tenho carreira política, sou segundo suplente. Filiei-me porque fui convidado. Seis anos atrás, quando Eduardo Braga decidiu se candidatar ao Senado, ele queria colocar junto de si alguém que tivesse afinidade com a indústria. Não é novidade que o Amazonas depende essencialmente do polo industrial de Manaus.

PR – Sua cabeça bate com o ideário do PMDB?
Parisotto – Nós temos que avaliar as pessoas. Infelizmente, o Brasil é um supermercado de partidos políticos. É difícil, inclusive, governar o país assim. Dentro do PMDB há pessoas boas e outras nem tanto, como em todos os partidos. Isso faz com que o eleitor não vote no partido, mas no candidato. Além de o voto não ser distrital, seis meses depois do pleito a população não lembra mais em quem votou. Eu nunca fui político, mas acho que na vida já dei a minha parte e, na eventualidade de ser chamado, poderia oferecer minha contribuição sob a perspectiva do empresário. Falta isso no Congresso. Falta alguém que mostre a complexidade de gerir uma companhia, com legislação trabalhista obsoleta, guerra fiscal absurda, problemas de logística e segurança.

PR – Como a Videolar pode desfrutar melhor, na prática, do braço agora estendido em estireno com a compra da Innova? É mais compensador suprir de monômero gerado em Triunfo (260.000 t/a) a planta de PS em Manaus (dependente  de estireno importado) ou continuar a vender a terceiros o excedente de estireno não aproveitado na capacidade 155.000 t/a de PS da Innova?
Parisotto – Temos que analisar a situação detalhadamente. O Brasil consome cerca de 700.000 t/a de monômero. A grosso modo, metade desse volume é consumido na fabricação de PS e a outra é vendida em mercados específicos, como de borrachas, tintas e solventes. Existe hoje capacidade instalada de estireno de 250.000 t/a na Innova e 260.000 t/a na Unigel. Há, portanto, um déficit aproximado de 200.000 t/a de monômero. Metade desse volume é importado pela unidade da Videolar em Manaus. Ainda assim, faltam 100.000 t/a. Nesse momento, se o produto está em falta, não faz sentido mandá-lo do Rio Grande do Sul para o Amazonas. Mas vislumbramos no futuro, à medida que tenhamos matéria-prima a preços competitivos, dobrar essa planta de estireno em Triunfo.

PR – Com que matéria-prima?
Parisotto – Eteno está disponível no Sul, isso eu asseguro. O que falta é benzeno. 24% do monômero (resultante do etilbenzeno) é eteno e 76% é benzeno. Para fazer 250.000 t/a de estireno seriam necessárias 60.000 t/a de eteno e 190.000 t/a de benzeno. Porém, só agora vamos começar a avaliar e entrar em negociação com a Braskem. Até onde sei, há 60.000 t/a ou 70.000 t/a de benzeno que a Braskem exporta para a Argentina. Não tenho 100% de certeza, mas parece que se a Braskem fizer ajustes no craqueamento, poderia produzir mais benzeno. O benzeno que falta poderia, então, vir de Camaçari (BA). Nesse caso, sim, Manaus entraria no radar para ser suprido com monômero nacional.

PR – Com eteno mais barato obtido do gás de xisto, o estireno dos Estados Unidos tende a ampliar presença na América do Sul?
Parisotto – É do  benzeno a maior participação na composição do monômero (resultante do etilbenzeno), cerca de 74% e o restante é do eteno. Não faz diferença.

PR – Como avalia a hipótese de a Videolar adaptar o complexo de PS em Triunfo ou a planta em Manaus para produzir ABS se vai bater de frente  com o projeto de sua fornecedora de eteno e benzeno?
Parisotto – Temos intenção de nos envolvermos na produção de ABS e EPS. Na verdade, anunciamos isso muito antes da Braskem, porém nosso projeto de ABS está até hoje no Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) aguardando aprovação. O plano de EPS é ainda anterior.

PR – E vai competir com seus clientes de estireno ao produzir EPS?
Parisotto – Não quero competir com ninguém. Para EPS temos um projeto aprovado. Nossos clientes comprarão nosso monômero se tiverem interesse. Queremos manter um bom relacionamento. É nosso princípio básico de trabalho. Hoje existe importação de 50.000 t/a de EPS e temos intenção de substituí-la. Em BOPP também há importação de 40.000 t/a a 50.000 t/a. ABS, da mesma forma, é todo importado. EPS é mais crítico na importação porque tem um prazo de validade. O gás existente em sua composição com o tempo vai perdendo rendimento. Quanto mais velho for o EPS, mais matéria-prima o transformador precisará usar para fazer a expansão necessária. De EPS, seria uma fábrica do tamanho do que é importado, cerca de 50.000 t/a.
No caso de ABS, quem tem matéria-prima quer vender para quem compra e paga. Nosso fornecedor tem participação minoritária do projeto de ABS na Bahia, liderado pela Styrolution. Nós não podemos ainda fazer ABS em Manaus porque não foi aprovado, mas, de qualquer forma, isso não é prioridade agora. Por ordem de importância temos a ampliação da capacidade de monômero de estireno, depois EPS e ABS por último. Compondagem de ABS pode surgir também. Vamos avaliar, uma vez que somos agora uma empresa petroquímica e de plásticos. Esse é o último ano que participamos em mídias ópticas. Saímos, no fim das contas, da atividade inicial da companhia.

Parisotto: Innova é complemento vital para operação petroquímica.
Parisotto: Innova é complemento vital para operação petroquímica.

PR – A Whirlpool está fazendo desenvolvimento a quatro mãos com a Braskem para deslocar PS de geladeira e colocar polipropileno (PP). Como encara a posição de depender de matérias-primas supridas por um concorrente?
Parisotto – É mais fácil a geladeira ir para ABS do que para PP. Na cadeia petroquímica ninguém faz nada sozinho. Tudo faz parte de negociações. Por exemplo, a Braskem precisa nos vender benzeno.

PR –  Innova e Videolar seguem como empresas independentes, embora sob o guarda-chuva do mesmo controlador. Qual a conveniência dessa estratégia?
Parisotto – Elas seguem independentes como empresas, com CNPJ diferentes. Mas o controle é da Videolar. Em um primeiro momento será assim. Vamos tomar algumas decisões baseadas no dia a dia do negócio. Nossa primeira decisão foi diminuir, ao máximo possível, o passeio molecular. Uma empresa está no extremo Norte e a outra, no extremo Sul. Estamos focados em diminuir o frete e iremos dividir a produção para melhorar a eficiência logística. Além disso, produzimos vários grades de PS, muitos dos quais similares. Faz sentido, principalmente em grades de menor demanda, que uma só fábrica produza. A troca de um grade para outro gera o off grade, que tem o mesmo custo de fabricação, mas é vendido de 5% a 10% mais barato. A racionalização de grades e logística é nosso primeiro passo. A conveniência de, daqui a um tempo, usarmos uma só marca para PS é uma possibilidade, mas não é uma decisão tomada. Temos compromisso com o CADE para fazer investimentos em eficiência, tecnologia e produção.

PR – Um dos compromissos com o CADE, para aquisição da Innova, é o investimento em inovação para PS. Mas trata-se de uma resina madura, sem novas frentes. Que tipo de inovação pode surgir?
Parisotto – A Innova sempre trabalhou no desenvolvimento de grades específicos. Nosso compromisso é investir em PS e em outras resinas.

PR – A Innova é menos dependente de distribuidores do que a Videolar. Como conciliar os dois modelos?
Parisotto – Ambas estratégias comerciais serão mantidas. A Innova sempre trabalhou de forma mais próxima ao consumidor final. Ela tem um laboratório de desenvolvimento e queremos aproveitar essa tecnologia. Na Videolar, como não tínhamos um laboratório nem uma força grande de vendas, optamos primeiramente por atender Manaus, que absorve 30% dos volumes produzidos. O distribuidor tem, portanto, um trabalho muito importante, o trabalho formiga. As duas políticas comerciais têm sentido. A Innova vai continuar no atendimento técnico e especializado e a Videolar vai continuar a trabalhar com produtos mais comoditizados. Estamos muito satisfeitos com nossos distribuidores, que movimentam até 25% de nossas vendas.

PR – Não havia negócio melhor para aplicar R$ 800 milhões?
Parisotto – Com certeza tinha, mas nossa ideia é concentrar. A Innova é complemento vital para nosso negócio. A Videolar, como operação independente, seria sempre saci-pererê por não ter monômero. A queda simultânea das mídias ópticas fez com que optássemos por outro negócio que trouxesse sinergias. Não estamos entrando em outro produto, outra área. Estamos complementando a perna que nos faltava.

PR – O mercado de PS deve cair 2% esse ano. Qual perspectiva vê para 2015?
Parisotto – O mercado não cairá este ano. Acho que ficará igual. A Videolar hoje opera com 80% de ocupação da capacidade, considerando que não é uma planta integrada. O PS é de fato uma resina madura. Mas o consumo de monômero cresce, tal como EPS e ABS. Isso gera mais necessidade de estireno e há possibilidade de novos negócios. Há potencial de crescimento, sim. Na nossa visão, não é PS o principal negócio. O principal é o monômero. •

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