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Com a compra da Globalpack, a Deckel ganha o mando do jogo do sopro de PEAD, PP e PET

O noticiário recente da transformação de plásticos tem sido recheado pela compra de indústrias nacionais por múltis, atraídas, à margem da crise, pelos bíceps do consumo no país e os ativos locais baratos em dólar. Pois um conglomerado mineiro fera no sopro de PET, o Grupo Deckel, acaba de quebrar este serviço com a compra finalizada em julho, por R$ 280 milhões, de uma potência nos frascos de polietileno de alta densidade (PEAD), a Globalpack. “O negócio em embalagem é sempre acelerar e olhar para frente”, pondera Joacir Lopes Borges, sócio de Renato Luiz Caruso na Deckel e na nova corporação, o Grupo Globalpack, com efetivo de 10 fábricas em regiões-chave (NE, SE e CO) e faturamento orçado pelo dirigente em R$ 500 milhões para este ano cinzento. “Hoje em dia, o Grupo Globalpack é o único peso-pesado brasileiro restante no sopro de PEAD e PP”, enxerga Borges.

Borges e Caruso: conglomerado de 10 fábricas e receita de R$ 500 milhões.

Grupo Deckel é a denominação bem mais conhecida da holding STT, comandada em partes iguais por Borges e Caruso. Egressos da extinta operação de PET graus fibra e embalagem da Rhodia, em Poços de Caldas, os dois engenheiros sentiam pulsar a veia do empreendedorismo – Borges, com expertise comercial e Caruso, identificado com a área industrial. Da ideia ao ato, juntaram as forças e constituíram, no mesmo município no sul mineiro, a transformadora Deckel (tampa, em alemão), destinada a especialidades em injeção. “Mas logo o nosso know-how falou mais alto e desviamos o foco do negócio para embalagens de PET e dois anos depois fomos pioneiros no país na reciclagem bottle to bottle (BTB)”, assinala Borges. Esta atividade segue acesa até hoje, estribada em certificados da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e da agência regulatória norte-americana Food and Drugs Administration (FDA). A reciclagem de PET BTB se assenta num tripé: em São Paulo, a planta da controlada CNP recupera o material das garrafas pós-consumo, a seguir mandado para Minas, onde é granulado nas instalações de outra empresa do grupo, a Viscotech e dali ruma para a fábrica de injeção de pré-formas da Deckel, em Poços de Caldas.

Entre 2000 e 2010, o Grupo Deckel alçou voo a ponto de adquirir na surdina a atividade de sopro de PET em dois estágios da Tapon Carona, em São Paulo, depois renomeada Neopet. No embalo, pintou outra aquisição em PET no mesmo Estado: a unidade de injeção/ sopro em um estágio da Plasticase, razão social preservada. A cereja do bolo, fecha Borges, é a operação de sopro in house de frascos PET nas dependências da filial goiana da Sakura Nakaya, fabricante de alimentos como molhos shoyo, pimenta, mostarda, catchup e temperos. “Convencemos este cliente a substituir vidro por PET nos frascos”, sublinha o transformador.

A Globalpack surgiu no horizonte do Grupo Deckel na antessala da recessão atual, nos idos de 2014. “Apesar do seu poderio em PEAD, ela não conseguia deslanchar em PET com a nossa desenvoltura”, expõe Borges. A fome juntou-se com a vontade de comer mediante o negócio aprovado pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). “Por esse acordo, criou-se uma sociedade na qual a Deckel repassou todo o seu know-how do negócio de embalagens de PET para a operação da Globalpack”, ele sintetiza. Em decorrência natural, afloraram as afinidades e entrosamentos entre os parceiros e tudo corria no sétimo céu até que, como diz Borges, “o Brasil parou em 2015”.

Como meio mundo corporativo sangrado pela recessão, o Grupo Itavema, presidido pelo empresário Mário Sergio Moreira Franco – não deu entrevista – e acionista majoritário (80%) da Globalpack desde os anos 1980, imergiu em revisão com lupa do seu perfil, para amortecer o impacto da crise no conglomerado, narra Borges. A selfie mostrava uma companhia fortalecida no setor automotivo, mérito da rede de concessionárias de veículos e da montagem das motos Dafra no Polo Industrial de Manaus. “Nessa avaliação, a presença no setor plástico deixou de ser considerada pela Itavema um negócio estratégico, enquanto nós víamos na Globalpack a chance de dar um salto grande”.

Antes de baterem o martelo, os dois sócios debruçaram-se sobre os piores cenários para o futuro do negócio. “Há desestímulos de sobra”, concorda Borges . “Aí estão a inadimplência recorde, incerteza política, o déficit fiscal, o desemprego e tantos outros fatores”. Mas no outro peso da balança, ele aponta, não há quem remova uma constatação. “Por mínima que seja, qualquer medida para melhorar a situação da economia impacta direto no nosso negócio, pois está voltado para bens de consumo”. Ele não fica apenas nessa declaração de fé. “O mercado interno continua grande e os investimentos múltis na aquisição de transformadores daqui ou em novas fábricas estão acontecendo”. No arremate de sua defesa, Borges vislumbra pista aberta para o Grupo Globalpack progredir sem gastos adicionais em equipamentos, apenas ocupando a parcela atual de 35% de ociosidade hoje disponível na capacidade instalada da companhia.

Por essas e outras, Borges e Renato Caruso esperam recuperar em sete anos os R$ 280 milhões pagos ao Grupo Itavema e sua sócia minoritária (20%) na Globalpack, a família Leal Passos. A transação envolveu o repasse de 7 fábricas: quatro em quatro Estados – Minas, Pernambuco, Bahia e Ceará –; uma em São Paulo e duas unidades no Rio de Janeiro – uma delas para injeção in house de potes da Nestlé. Borges amarra as pontas. “Se incluímos no cômputo o sopro e reciclagem, a Deckel hoje transforma em média 18.000 t/a de PET, enquanto a Globalpack faz o mesmo com 30.000 t/a de PP e PEAD”, ele calcula. “Como ambos os lados hoje rodam com 65% de ocupação, temos um potencial de crescimento pelo preenchimento da capacidade instalada que nos levará rapidamente a um consumo total de 75.000 t/a”.

Pelo novo organograma, Borges e Caruso passam para o conselho administrativo e Cristiano Leal Passos, membro da família fundadora e ex CEO da Globalpack, permanece neste cargo e como acionista da nova corporação. Outra meta a curto prazo: divulgar a imagem institucional do conglomerado, abandonando a discrição que caracterizava os movimentos da Deckel. Por fim, Borges e Caruso já acalentam a internacionalização do Grupo Globalpack. Está descartada a linha de raciocínio de que, acenando com esse intento e à frente de um trator no sopro de PET e PEAD, os dois sócios estariam enfeitando a noiva para algum pretendente múlti a levar ao altar. “Vender o grupo não está em cogitação”, rechaça Borges. “Compramos a Globalpack para fazer o negócio continuar a crescer. É a nossa vocação”. •

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