Quando o plástico desabrocha

Flexíveis no campo colhem os frutos do persistente cultivo da demanda
Quando o plástico desabrocha

Nos últimos anos, a segmentação do mercado brasileiro de embalagens plásticas flexíveis saiu da pasmaceira, efeito da intensidade do crescimento no ranking do consumo dos agrofilmes. Entre as turbinas dessa alta, silos bolsas se firmam como alternativa para estocagem de grãos mais acessível que o tradicional galpão metálico num país onde safras monumentais de grãos acusam perdas maiúsculas com um déficit entranhado na sua armazenagem. Já no cultivo protegido, estufas e mulching encaram, tal como o silo bolsa, um crescimento linear da demanda entrelaçado a uma pressão pelo aprimoramento célere desses produtos: o impacto das mudanças climáticas sobre a produção e qualidade dos grãos e hortifrútis. Em vários casos, elevações de temperaturas médias diurnas e noturnas mesmo moderadas, podem prejudicar o desempenho dos cultivos e o temor do agricultor com os imprevistos do clima piora sob o risco de eles se tornarem habituais em áreas do seu interesse. Promissor e desafiador, este panorama para agrofilmes dá o tom da entrevista concedida por notória sumidade na área, Paolo Prada, secretário do Comitê Brasileiro de Desenvolvimento e Aplicação do Plástico na Agricultura (Cobapla) e diretor técnico da distribuidora de especialidades químicas Tiken.

Paolo Prada: uso de silo bolsa deve ter crescido mais que o de estufa e mulching.
Paolo Prada: uso de silo bolsa deve ter crescido mais que o de estufa e mulching.

Segundo a Associação Brasileira da Indústria do Plástico (Abiplast), a agricultura mobilizava apenas 2,9% do consumo interno total de plásticos transformados em 2015, e em 2020 (último ano com estas informações) este indicador subiu apenas para 3,3%. Qual a explicação para esta performance incipiente num país de PIB puxado pelo agronegócio?

3-5% também é a porcentagem de plástico usado na agricultura no mundo todo. O Brasil não foge à regra. Os grandes segmentos industriais consumidores de plástico são a construção civil, indústria automotiva e bens de consumo/embalagens.
O PIB brasileiro é, sim, puxado pelo agronegócio, no caso aquela parte integrada por mega cultivos de sementes como soja, milho etc. Não são grandes consumidores de plástico no comparativo, por exemplo, com os cultivos protegidos de hortaliças.
Em geral, o consumo de plástico no mundo continua crescendo, devido à substituição de outros materiais, como vidro, metal, madeira. Segundo relatório publicado em 2021 pela agência de alimentação e agricultura (FAO) da Organização das Nações Unidas (ONU), a produção mundial de plásticos foi então estimada em 359 milhões de t/a, volume no qual agricultura comparecia com 3-5%, incluindo filmes, contêineres de defensivos, e aplicações diversas, entre elas componentes da pesca e da proteção florestal.

Em 2019, o Cobapla estimava a produção brasileira de silos bolsas em 100.000 unidades. Qual a projeção para 2023?

Considerando um crescimento do mercado da silo bolsa de 10% ao ano, bem acima do PIB, devido ao aumento de credibilidade deste método de armazenagem entre os agricultores e devido à falta crônica de espaços de armazenamento dos grãos, chegamos num valor aproximado 150.000 unidades no ano passado.
Um saldo com certeza positivo, demonstrando como as aplicações plásticas contribuem à inovação na agricultura.

Para 2024 o consenso no agronegócio aponta para redução da safra de grãos e dos preços internacionais de commodities agrícolas. Estes fatores podem ou não influir na produção/vendas brasileiras de silos bolsas este ano?

Não acredito que a redução da safra possa influir na venda de silo bolsa. Afinal a quantidade de grãos nele armazenada é uma mínima fração do total do volume de grãos estocados. O crescimento de vendas de silo bolsa ainda independe da produção de grão e se deve a um único motivo: a troca dos sistemas tradicionais de armazenagem pelo silo bolsa. Continuamos acreditando num crescimento de 10% ao ano.

A Electroplastic vendeu em 2023 sua operação de silos bolsas ao grupo agro Vaccaro. Esse movimento de verticalização no negócio de silagem plástica por um grande agricultor pode ou não configurar nova tendência no ramo no Brasil?

Não acredito que seja um movimento de back integration na produção da silo bolsa por grupos atuantes na estocagem de grãos. O caso Vaccaro parece-me mais uma exceção. Este grupo já adquiriu produtores de big bag de ráfia de polipropileno, portanto tem certa vocação para o mercado das embalagens plásticas de alimentos a granel.
A produção de silo bolsa é complexa e depende de profissionais atuantes e experientes no segmento. No Brasil, por sinal, todos os produtores de silo bolsa possuem linhas de produtos de filmes de polietileno de uso variado – desde estufas, mulching e silo fardo a sacolas de supermercado, sacos de lixo, sacaria industrial etc. Quem deseja adquirir uma capacidade exclusiva para silo bolsa teria, com muita probabilidade, de comprar todas as outras aplicações de flexíveis do portfólio do vendedor.

Como quantifica o aumento de fornecedores de silos bolsas no Brasil nos últimos cinco anos, no rastro de safras recordes de grãos e estocagem insuficiente? A quantidade de fornecedores de estufas e mulching de PE, assim como a área plantada submetida a cultivo protegido, também cresceu?

Nos últimos anos aumentou a oferta de silo bolsa nacional, justamente contando com o contínuo crescimento desta aplicação em intensidade acima do PIB. Provavelmente, o uso do silo bolsa cresceu mais que aplicações mais tradicionais no campo como os filmes para mulching ou estufa. Infelizmente, a área de cultivo protegido no Brasil, permanece uma informação sem base sólida, devido à falta de coleta de dados. O Cobapla desenvolveu junto com a Embrapa um projeto para monitoramento por satélite da área coberta com estufas, mas o plano não saiu do papel, devido à falta de interesse e investimento da cadeia da plasticultura.

A transformadora Extraplast investiu em fábrica de filme de silo bolsa na Zona Franca, à sombra dos incentivos fiscais e de polietileno importado pelo porto livre de Manaus. Sua iniciativa tende ou não ser seguida por concorrentes? E por transformadores de filmes para estufas e mulching, hoje inexistentes no polo de Manaus?

A instalação de capacidades produtivas para flexíveis em Manaus andou aumentando nos últimos anos. O objetivo é aproveitar os preços internacionais do polietileno, fugindo dos fornecedores regionais (nota: Braskem e Dow) e adquirir sem impostos os caros equipamentos de última geração que permitem a produção de filmes altamente técnicos e performantes. Aliás, junto com as novas plantas de filmes, a produção de masterbatches também ampliou na Zona Franca.

As perspectivas de baixa internacional nos preços de commodities agrícolas este ano prejudica ou motiva o investimento do agricultor em silo bolsa no Brasil, como meio de estocar grãos por mais tempo à espera de melhora na flutuação dos preços?

O aproveitamento da flutuação dos preços dos grãos, graças a uma armazenagem independente, é a essência da oferta de valor do silo bolsa. Quanto maior a flutuação de preços, maior o interesse no campo por usar silo bolsa para disponibilizar grãos no mercado no exato momento que os preços estão em subida.

Como avalia os efeitos sobre a imagem de tecnologia de qualidade dos silos bolsas, estufas e mulching causada no mercado pela concorrência movida apenas a preço?

Aplicações diferentes têm desafios tecnológicos diferentes. Em geral, podemos dizer que silo bolsa e filmes para estufas precisam de resistência mecânica diferenciada. É muito elevado o valor dos grãos contidos no silo bolsa para o sistema de estocagem quebrar à primeira solicitação mecânica. Da mesma forma, filmes para estufas protegem valiosos cultivos e precisam enfrentar ventanias e chuvas sem rasgar. Em mulching, a pressão no preço é maior, devido à menor solicitação mecânica do filme na aplicação da cobertura do solo e os atributos técnicos menos exigentes podem permitir, com mais sucesso, uso de filmes de baixa qualidade e/ou espessura baixa. A regulamentação é um caminho para o combate a produtos fora dos padrões determinados. Já temos normas brasileiras para filmes de estufa, mulching e redes de sombreamento. No entanto, elas precisam ser atualizadas, tal como o foram as normas europeias inspiradoras das brasileiras. Por seu turno, para o Cobapla se tornar uma entidade emissora de selo de qualidade e controle nacional para agrofilmes são necessários uma vontade em comum da cadeia de procurar este monitoramento e um significativo investimento. A falta de investimentos da cadeia de plasticultura para objetivos de interesse em comum continua o nosso maior desafio.
Nesse sentido, uma ajuda pode chegar da FAO, que, a pedido da ONU, está elaborando um Código de Conduta Voluntário para uso agrícola e sustentável do plástico. A iniciativa, divulgada pelo Cobapla em setembro passado, num workshop específico, visa estimular governos, instituições e a cadeia do segmento para criar regras para a produção e o descarte dos plásticos em questão. O primeiro rascunho do documento internacional já foi enviado pela FAO para validação a vários governos – entre eles o do Brasil (Ministério da Agricultura). Mais informações em: http://cobapla.com.br/index.php/workshop-codigo-voluntario-de-boas-praticas-de-gestao-do-plastico-agricola

A região centro-oeste, Mato Grosso à frente, lidera o déficit nacional de estocagem de grãos. Por que até hoje não atraiu a produção local de silos bolsas?

Silo bolsa deve ser produzido em regiões industriais, com melhor acesso à mão de obra especializada e disponibilidade de insumos com custos de transporte baixo. Implantar uma fábrica longe do circuito brasileiro das matérias-primas para plasticultura, mesmo próxima dos agricultores, pode acarretar estruturas de custo não competitivas.

Quais as principais melhorias nas propriedades exigidas para os filmes de silos bolsas, estufas e mulching pelas condições de trabalho mais extremas trazidas ao Brasil pelas mudanças climáticas?

Filmes adequados a estufas são procurados devido à maior transmissão de luz e resistência aos rasgos aliados à menor espessura. O aumento de ocorrências de chuvas volumosas pede um incremento dos desafios mecânicos dos filmes para estufas, em especial. Nesse sentido, muitos progressos nas características físicas continuam a ser apresentados em grades mais avançados pelos principais produtores de poliolefinas. No âmbito da produção dos filmes, também seguem evoluindo os sistemas multicamada, para melhorar propriedades mecânicas com a mesma espessura. O mesmo conceito é válido para filmes de mulching, aplicação em que se busca conciliar a diminuição da parede com a manutenção de propriedades anti-rasgo no momento da sua retirada do terreno após uso. Aliás, a limitação de espessura do mulching está entre os pontos de atenção do já mencionado relatório da FAO, por causa do elevado impacto ambiental (poluição plástica no solo derivada da retirada parcial dos filmes). Por fim, quanto ao silo bolsa, além dos desafios essenciais de aumento da propriedades mecânicas e encolhimento da espessura, toma corpo a procura por maior barreira ao oxigênio e melhorias em atributos como a eficiência para repelir roedores e pássaros.•

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