Nevoeiro persistente

China em baixa dificulta previsões sobre diluição dos excedentes de PP e PE
Nevoeiro persistente

O Momento Minsky, assim chamado em honra ao economista Hyman Minsky, ocorre quando enfim se instaura no mercado de capitais o reconhecimento unânime de que uma dívida ficou mesmo insustentável. É uma situação resultante de prolongada prosperidade e investimentos crescentes e, por tabela, contaminada pelo aumento da especulação com dinheiro emprestado. Minsky também achava que a estabilidade é a mãe da instabilidade, pois, a certa altura em fases exuberantes, os investidores topam correr mais riscos para aumentar os lucros até então comedidos. Aí o sistema degringola.
Pois nos últimos meses, vingou a percepção de que a China, segunda economia mundial, importador nº1 e exportador nº 2, entrou em Momento Minsky. A manufatura e exportações encolheram e, em clima de deflação, o desemprego entre jovens bate recordes e fazem correr um frio na espinha do mercado financeiro o zilionário fiasco imobiliário, endividamento de governos locais e a demanda doméstica colapsada pela perda de confiança do consumidor e supremacia da população idosa.
Em sua edição de 20 de agosto último, baixou a visão do Momento Minsky no Wall Street Journal ao lascar este título para reportagem de peso: “Acabou o boom de 40 anos de crescimento da China. O que virá agora?” Paul Hodges, CEO da consultoria New Normal e blogueiro do portal Icis, engrossa o caldo situando a dívida da China em 265% do PIB, hoje impactada em 29% apenas pelo estouro da bolha imobiliária. “Nos últimos 30 anos”, pondera em artigo John Richardson, outro blogueiro do mesmo site, “aprendemos que a cada tropeço da sua economia, a China responde com grande dose de estímulos para repor o avanço do PIB nos eixos. Mas isso ficou impossível agora”.
O Momento Minsky da China assombra, em particular, a indústria petroquímica mundial, em especial a cadeia das poliolefinas, os polímeros mais consumidos. Afinal, o prolongado ciclo de expansões de capacidades, ainda em vigor, é comandado pela América do Norte e Ásia, com China à frente. Dessa rodada vieram à luz mega excedentes de PE e PP cujo término da digestão, rumo a uma relação mais palatável entre oferta e demanda, ninguém ousa prever quando se dará. A incerteza sobre a diluição dos volumes sobrantes já campeava antes de a guerra na Ucrânia minar a Europa e piorou com a recente projeção do FMI de crescimento anual de 4% para a China daqui por diante, longe dos saltos de dois dígitos nos findados tempos áureos.
O caso de polietileno de alta densidade (PEAD) sintetiza como o nevoeiro das incógnitas da China hoje envolve e complica as previsões sobre o desenrolar dos citados excedentes. O governo de Pequim é notório pela aversão a números transparentes. Ao combinar os concisos dados oficiais com os cálculos de sua consultoria, John Richardson registra que, após aumentar 21% em 2022, a capacidade de PEAD da China, com consumo hoje anêmico, sobe 12% no exercício atual, totalizando 15 milhões de t/a. As importações, que culminaram em 9 milhões de toneladas no pandêmico 2020, devem fechar 2023 com 4.3 milhões de toneladas, efeito mesclado da gradual autossuficiência produtiva e maré baixa interna. O consumo da China deve totalizar até dezembro 16.9 milhões de toneladas contra 17.3 milhões no ano passado. Um efeito óbvio é que os países que formavam entre os grandes exportadores de PEAD para a China terão de compensar o encolhimento desse clientão com outros canais de desova – e nenhum deles no planeta se equipara à demanda chinesa. Entre esses exportadores, estão os EUA às voltas com um nó cego: o excedente entre sua capacidade e a demanda interna de PEAD alcançou 2.4 milhões de toneladas em 2022, 3 milhões estão previstos para este ano e 3.6 milhões para 2024. Em contraste, o consumo interno deve avançar 1%, pressionando portanto os EUA a exportarem com agressividade redobrada para rodar com ocupação aceitável num período de retração do maior importador, a China, e com o resto do mundo em fogo brando.
Daqui a pouco vão começar a chamar os excedentes de PP e PE de “novo normal”. •

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