Enfim um porto seguro

Não há economia circular que tire o filme de polietileno do papel higiênico

Nesses tempos em que embalagens plásticas flexíveis são mais sovadas que massa de pizza pela economia circular, há ao menos um senhor mercado para filmes de polietileno (PE) de uso único que permanece surdo ao clamor ambientalista: o empacotamento automático de papéis higiênicos. As razões dessa imunidade de uma embalagem plástica, tão rara hoje em dia, são dissecadas nesta entrevista de Pedro Vilas Boas, presidente da consultoria Angusti Estatística e fonte de informações sobre o mercado para clientes do naipe da Associação Brasileira de Fabricantes de Papel e Celulose e Associação Brasileira de Celulose e Papel.

Vilas Boas: embalagens plásticas primárias e secundárias permanecem insubstituíveis.

1A economia circular pressiona contra embalagens plásticas de uso único, descartáveis. É o caso das embalagens flexíveis de plástico que acondicionam papéis higiênicos. A seu ver, a pressão ambientalista embute um risco para a continuidade delas no setor?
Existem dois tipos de embalagens plásticas utilizadas no acondicionamento do papel higiênico. A embalagem primária vai em contato direto com o produto e, neste caso, a utilização do plástico trouxe inúmeras vantagens, ensejando a boa comunicação de imagem sem esconder o produto. A visualização é importante para o consumidor poder avaliar aspectos como a alvura do papel. Além disso, a embalagem primária permite o fracionamento do produto (4 rolos/8 rolos/12 rolos etc), sempre em adequação às necessidades individuais, uma conveniência difícil de se conseguir com embalagens como as de papel. Não vejo alternativas dessa embalagem com as mesmas vantagens do plástico e mais apelo ambiental.

Em frente: também em plástico, as embalagens secundárias acondicionam as primárias e, como elas, apresentam trunfos que dificultam sua retirada. É o caso, em especial, das vantagens conferidas à logística do produto, pois o plástico é leve, tem maior resistência e grande facilidade de manuseio. Esta embalagem secundária é aberta e descartada nos supermercados, o que favorece seu encaminhamento à reciclagem, processo que também ganha com a ausência de impressão neste filme.
Portanto, é complicado substituir o plástico para acondicionar papel higiênico. De qualquer forma, sua indústria, antenada na questão ambiental, vem tomando providencias para baixar o consumo do material, caso da redução da gramatura do filme e da compactação dos rolos, este um recurso hoje generalizado no setor e que proporcionou economia de 13% no consumo de plástico e no espaço ocupado no transporte.

2No Reino Unido, a fabricante Aldi anunciou em julho estar substituindo, em ação ambiental, a embalagem flexível por papel cartonado para seus papéis higiênicos de luxo em 174 supermercados britânicos, economizando assim 993 t/a de plástico. E se essa moda pega no Brasil?
A embalagem cartonada é utilizada no Brasil em produtos da linha institucional, em especial o papel toalha de mão. Seu uso em papel higiênico, mesmo os de alto luxo, torna-se difícil pelo aumento nos custos que poderia impactar o ainda pequeno consumo per capita brasileiro. Assim como nos demais países, a ideia é possível para produtos de maior valor agregado, mas seria interessante o desenvolvimento de embalagens cartonadas específicas ou mais apropriadas. Como já disse, visualizar o papel é fator-chave de tomada de decisão de compra.
A propósito, acho que devemos falar mais na consciência ambiental do fabricante que na do consumidor, esta ainda não muito sentida. Vale notar que todas as medidas de esclarecimento sobre as embalagens são escritas (tipo de plástico, seu símbolo de reciclagem e tipo de descarte). Além disso, a celulose utilizada na produção é certificada, o que garante procedência ambientalmente adequada. No entanto, é provável que a principal contribuição ambiental da categoria seja a produção de papel a partir da reciclagem de papéis brancos de imprimir e escrever. Em 2018, cerca de 500.000 toneladas de papéis de fins sanitários tiveram origem nessa reciclagem.

3Como a economia nacional retraída desde 2015 tem afetado as vendas de papel higiênico?
A indústria brasileira desses papéis sanitários vem crescendo acima do PIB e, mesmo nos anos de crise, a expansão foi mais robusta nos produtos de maior qualidade, com destaque para o papel higiênico de folha dupla que, em 2018, tornou-se o tipo de maior participação no setor. No segmento de papel, a categoria dos sanitários lidera o crescimento com ampliação de 126% neste milênio. Em 2018 foram produzidas 1.349,3 milhão de toneladas de papel sanitário de todos os tipos e, para este ano, projetamos crescimento próximo de 1,5%. •

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