Dos meandros da coleta e triagem de resíduos à caixa preta da química para aperfeiçoar as rotas da reciclagem e o biotipo dos polímeros para segundo uso, é buscar agulha em palheiro desencavar um nicho da circularidade dos plásticos, caso em particular de poliamidas (PA) sem intervenção da Basf. Uma panorâmica dos desenvolvimentos recentes do grupo alemão nessa direção, cujo alcance já chega ao mercado brasileiro, aflora nesta entrevista dada por Alejandro Bossio e Fabrício Soto, respectivamente diretores de monômeros e de produtos químicos de performance da empresa na América do Sul.
Quais os principais avanços desenvolvidos internacionalmente pela Basf para assegurar a excelência do seu processo da reciclagem química ChemCycling® e garantir a alta qualidade do polímero recuperado obtido?
Alejandro Bossio: Os plásticos reciclados quimicamente pelo ChemCycling® demonstram a mesma qualidade e segurança do material virgem. Em termos de embalagens, temos a linha de poliamidas (PA) Ultramid® Ccycled®, com a mesma qualidade do polímero convencional, o que também a recomenda para as mais diversas aplicações. É um produto sustentável e que permite o uso de matérias-primas alternativas a partir da reciclagem química, inclusive de resíduos difíceis de reciclar, como pneus em fim de vida ou embalagens plásticas domésticas mistas, mantendo-os assim no ciclo produtivo.
A matéria-prima reciclada é introduzida no início da produção da Basf pelo conceito Verbund (integração física da produção, das plataformas de mercado e tecnologias que unem os negócios do grupo) e atribuída aos produtos Ultramid® Ccycled® através de uma abordagem de balanço de massa. Assim, as matérias-primas fósseis são substituídas e poupadas. Para o transformador, a vantagem é que possui as mesmas características dos produtos tradicionais, usuários de recursos fósseis. Trata-se de um ganho para o cliente, pois não há necessidade de realizar qualquer tipo de alteração na linha de transformação. Além disso ele poderá incluir o requisito de sustentabilidade no seu rótulo.
Basf está empenhada em participar do desenvolvimento de soluções sustentáveis. Poderia dar exemplos de desenvolvimentos já completados na Europa com a participação da empresa, tendo em vista a criação de embalagens em linha com a economia circular?
Alejandro Bossio: Uma das parcerias recentes foi firmada com a israelense StePac, detentora da certificação sustentável REDcert2, para incorporar os grades Ultramid® Ccycled® em suas soluções flexíveis. A aliança dessa transformadora com a Basf focaliza embalagens sustentáveis do tipo sensível ao contato para o acondicionamento específico de alimentos frescos. Os primeiros clientes foram os exportadores colombianos de maracujá Jardin Exotics, SAS. Consta de um filme para máquinas de empacotamento verticais automáticas e suas propriedades de atmosfera modificada (MAP) retardam o amadurecimento e preservam a qualidade da fruta na longa viagem marítima da Colômbia a Europa. A embalagem na origem já está no formato adequado ao varejo final, eliminando portanto a necessidade de reembalagem após a chegada ao mercado europeu.
No mundo inteiro proliferam investimentos na reciclagem química por pirólise de plásticos pós-consumo. A Basf participa desse movimento com seu projeto ChemCycling em andamento na Europa. Em qual estágio ele se encontra?
Alejandro Bossio: O projeto ChemCycling® já atingiu escala comercial. Já dispomos, aliás, de alternativas viáveis para quase todo o portfólio convencional de poliamidas Ultramid®. Trabalhamos com parcerias, principalmente de fornecedores de óleo de pirólise, respaldando seus desenvolvimentos para que a disponibilidade desse material continue aumentando. A reciclagem por pirólise permite o trabalho com diversos tipos de plásticos pós-consumo como matéria-prima e a Basf apoia de forma consistente esses recicladores seus aliados para que mais misturas de resíduos poliméricos possam ser utilizadas no processo de pirólise.
Em PAs Ultramid para filmes, quais as melhorias mais recentes nas características do polímero para que ele contribua, ao participar de flexíveis multimaterial, para facilitar a reciclagem mecânica desse resíduo?
Alejandro Bossio: O mercado tem compreendido cada vez mais que as embalagens multicamada polietileno/PA são recicláveis em diversas proporções de composições. Portanto, não é necessário abrir mão das propriedades de PA para se obter embalagens recicláveis. Nossa equipe auxilia clientes a obter o melhor filme reciclável para proteger o alimento, caso do suporte dado na realização de eventuais ajustes, em prol da reciclabilidade, no desenho da composição das embalagens multicamada com PA.
A propósito. Em estudo publicado no ano passado, duas entidades alemãs, o Instituto cyclos-HTP GmbH e o Stiftung Zentrale Stelle Verpackungsregister (Agência Central de Registro das Embalagens), reclassificaram PA no padrão mínimo de reciclabilidade. Trata-se de importante primeiro passo para incorporar os benefícios das embalagens contendo barreira de PA e as últimas descobertas sobre a reciclabilidade desses polímeros na base regulatória. Continuamos trabalhando forte para alterar o conceito errado sobre PA existente em algumas organizações.
Transcorre forte pressão mundial para, na medida do possível, substituir flexíveis multimaterial pelo tipo monomaterial (PE ou PP), em prol da reciclagem mecânica mais simples. Pelas lentes da Basf, quais os típicos exemplos de alimentos que ainda não têm condições de terem suas embalagens multimaterial (caso de filmes com barreira de PA) substituídas por estrutura monomaterial?
Alejandro Bossio: Os alimentos que mais utilizam embalagens com PA são carnes, queijos, embutidos e derivados. O polímero é importante para o desempenho em máquinas de empacotamento e para prover barreira a gases, contribuindo para o aumento de tempo de prateleira e proteção do conteúdo envasado através da sua resistência mecânica.
É possível utilizar filmes multicamada PE/PA, ajustando a composição para que fiquem prontos para a reciclagem mecânica, através de tecnologias de compatibilização.
No Brasil, catadores em geral menosprezam o recolhimento de resíduos flexíveis devido à baixa remuneração, um dos motivos da baixa quantidade de flexíveis pós-consumo reciclados. Qual a sua sugestão para tornar esses refugos mais atraentes para coleta?
Alejandro Bossio: Para tornar os resíduos flexíveis mais atrativos, é necessário conscientizar as partes interessadas de que estes materiais possuem valor e possibilidades reais de reciclagem. É interessante também apoiar os catadores na utilização de equipamentos de separação automática dos resíduos plásticos, com o objetivo de gerar interesse de toda a cadeia nos resíduos pós-consumo flexíveis para sua posterior reciclagem.
Quais os principais desenvolvimentos em materiais auxiliares introduzidos no Brasil pela Basf para aprimorar a limpeza e separação prévia dos resíduos plásticos pós-consumo para destiná-los a seguir à reciclagem mecânica?
Fabricio Soto: Desenvolvemos um portfólio para resolver desafios de cada etapa da reciclagem mecânica de plásticos: desde a triagem, passando pela lavagem, até a extrusão e conversão. Pois bem, a separação dos tipos de plásticos é uma etapa que tem ficado cada vez mais complexa, por causa da variedade enorme de materiais utilizados. Com o uso do trinamiX NIR, um dispositivo portátil de espectroscopia de infravermelho próximo, é possível identificar com precisão a composição dos plásticos e ainda receber uma sofisticada análise de dados no aplicativo. Dessa forma, os inúmeros tipos de plástico pós-consumo podem ser facilmente identificados em segundos, facilitando a triagem de resíduos. No contexto da reciclagem, uma separação por tipo de material tem efeito favorável na qualidade do reciclado, além de reduzir de forma importante refugos antes destinados ao rejeito por falta de identificação possível.
Já para a etapa de limpeza dos materiais, além dos materiais Chemetal, lançamos este ano uma solução criada pelo negócio de Home Care da Basf. Sujeira, matéria orgânica e gordura, são resíduos que comprometem a qualidade do produto reciclado, geram mau cheiro e acabam exigindo grande esforço para serem debelados na etapa de lavagem. Com base nisso, desenvolvemos uma formulação específica, o Soluprat Superfície, que melhora a qualidade do material reciclado. Consta de um produto 3 em 1 biodegradável com ação detergente, antiodor e antiespuma.
Por fim, na extrusão e conversão, oferecemos aditivos que evitam degradação oxidativa e térmica. Desse modo, contribuem para garantir a qualidade e preservar as propriedades do material reciclado.
Quais os mais recentes avanços marcantes em aditivos da Basf para assegurar a excelência do processo da reciclagem mecânica e aprimorar propriedades como mecânicas e ópticas, do polímero recuperado?
Fabricio Soto: Os aditivos para reciclagem mecânica IrgaCycle®, série integrante do portfólio sustentável B-Cycle, podem maximizar o conteúdo reciclado pós-consumo em uma embalagem plástica de uso final. Além disso, mitigam os desafios comuns de processamento, como a formação de gel e defeitos ao se usar reciclados, e rejuvenescem o pacote de estabilizadores cuja eficiência pode ter sido esgotada durante o primeiro ciclo de vida de uma embalagem.
Os aditivos IrgaCycle® possibilitam a máxima utilização do plástico reciclado pós-consumo, pois auxiliam na resolução dos principais desafios da reciclagem mecânica. Entre eles, a manutenção da resistência mecânica, redução da formação de géis, remoção de odor etc. Além disso, a estabilização gerada pelo pacote de aditivos auxilia na transformação do plástico, aumentando a produtividade e, por extensão, viabilizando maior circularidade para os plásticos aditivados com a linha B-Cycle. •