Um excedente sem drama

Rodopios da demanda não desviam mercado mundial de BOPP do avanço em linha reta, atesta Aldo Mortara, da Vitopel

O foco primordial dos filmes biorientados de polipropileno (BOPP) em alimentos explica a resiliência do seu mercado mundial aos solavancos da economia. Lógico que não há blindagem contra a estagflação global acentuando a capacidade excedente desse filme joia da coroa de PP em embalagens. No entanto, o acesso a muitos alimentos industrializados estariam fora do alcance da população pobre não fosse sua oferta em grande escala viabilizada e acessível pelo empacotamento em BOPP, contribuição-chave para a qualidade de vida que mantém essa embalagem flexível atraente para investidores. Na entrevista exclusiva a seguir, Aldo Mortara, diretor comercial da Vitopel, trem-bala do Brasil em BOPP, e requisitado palestrante internacional sobre rumos da demanda e sustentabilidade no ramo, dá um rasante pelo atlas do filme e seus reflexos na América do Sul.

Aldo Mortara Vitopel 02
Mortara: domínio no Brasil de laminados com BOPP termosselável.

Depois da América do Norte e Ásia, a Europa é o terceiro mercado mundial de BOPP. Quais os principais efeitos causados na oferta e preços internacionais do filme com a Europa em recessão e sem custos competitivos de energia?
O cenário global da indústria de BOPP, segundo a consultoria AMI, mostrou equilíbrio entre oferta e procura em 2021, quando foram produzidas e consumidas em torno de 10 milhões de toneladas do filme. A Ásia lidera o setor em capacidade e consumo. China e SE e NE asiáticos somam cerca de 60% da capacidade produtiva e um pouco menos que isso do consumo mundial. Ainda no ano passado a Europa respondeu por cerca de, respectivamente, 13% e 12% da demanda e produção mundiais do filme. Trata-se de um continente importador regular de BOPP, em particular filmes convencionais, devido aos custos competitivos de outras origens produtoras, sobretudo Oriente Médio e Índia.

A guerra na Ucrânia não afeta esse panorama?
Predominam na Europa produtores de BOPP mais focados em aplicações de alto valor agregado. Embora andem hoje com custos operacionais bem desfavoráveis, em particular na energia, a matriz de produtos da indústria europeia do filme é mais rica que a média global. Muitas especialidades em BOPP, como películas revestidas de alta barreira, filmes para capacitores elétricos ou tipos para separar baterias de íon de lítio são referências locais de qualidade. Por seu turno, convertedores ibéricos de BOPP, em especial de Portugal, trabalham com filmes standard e exportam bastante para as Américas, caso das portuguesas Polivouga e Casfil para América Latina.

Como a América do Sul sai na foto como canal de desova do atual excedente mundial se BOPP?
O excedente se concentra no Oriente Médio e Índia e, em menor proporção, no Sudeste Asiático. Seus produtores do filme vêm crescendo rapidamente em capacidade e exportações, dados os seus custos competitivos de matéria-prima e mão de obra. As Américas são os destinos mais usuais das exportações dessas regiões. A América do Sul, por sinal, marca por um excesso importante da capacidade em relação à demanda de BOPP. Assim, o Brasil, maior mercado de BOPP do subcontinente, é alvo das exportações desse excedente internacional.
A capacidade do maior produtor sul-americano de BOPP (N.R.-Oben Group) supera bastante a demanda das regiões que alojam suas operações. Assim, o Brasil acaba sendo o destino mais atraente para as exportações de volumes excedentes desse convertedor, seja de sua produção no Peru ou, mais recentemente, da Colômbia. Com frequência, porém, este fluxo de remessas para o Brasil, não se mostra sedutor, pois a concorrência doméstica faz com que os preços do BOPP no mercado interno fique abaixo dos internacionais (import parity negativa).

Qual a capacidade nominal e consumo interno de BOPP para este ano no Brasil?
O país vai fechar 2022 totalizando produção bruta ao redor de 200.000 toneladas para um consumo doméstico aproximado de 180.000. Em relação as importações de filmes, BOPP permanece na ponta das estatísticas, por uma questão de escala da indústria e nível de concentração. No plano mundial, películas de PE lideram em produção e demanda os filmes plásticos. Ocorre que a produção desses filmes é muito pulverizada e regionalizada, com pouco fluxo de importações e exportações entre zonas produtoras. Já para o BOPP, cuja escala de produção e concentração de produtores é bem superior aos indicadores de PE, o fluxo de importações e exportações é muito relevante por uma série de motivos. Afinal, os produtores da Índia e Oriente Médio são muito competitivos em custos de BOPP standard, enquanto os europeus e convertedores do SE asiático se impõem em filmes de valor agregado, o que alavanca suas exportações para o Brasil. Produtores chineses são muito ativos em filmes para fitas adesivas e atuam fortemente em exportações desses produtos para a Zona Franca de Manaus. No segmento de embalagens flexíveis, a presença da película chinesa é irrelevante, provavelmente em virtude da diferença de desenho das embalagens entre China, onde predominam os laminados de BOPP não selável com PE, e Brasil, onde prevalecem laminados com BOPP termosselável.

Antes da pandemia, a Oben alardeou plano de investir numa planta de 50.000 t/a de BOPP em São Paulo. Por que o projeto até hoje não saiu do discurso? (Oben recusa entrevistas)
Durante a pandemia, houve aumento muito expressivo na demanda doméstica e internacional de BOPP. No final de 2021 e durante 2022 aconteceu a crise sem precedentes de fretes marítimos internacionais e seus custos foram reajustados entre 600% e 1.000%, conforme a rota, e mesmo assim não havia disponibilidade de containers e espaços em navios. Isso impactou a indústria de BOPP. Regiões importadoras, como América do Norte e Europa, enfrentaram escassez de produto e preços em constante elevação. Este cenário fez com que os produtores latino-americanos redirecionassem seus esforços de exportação para essas regiões altamente demandadas. O quadro pode levar um investidor a reavaliar as alocações geográficas para novos aportes de recursos. Dadas as particularidades do Brasil, todo novo entrante enfrentará um desafio muito grande para entender essas questões e buscar um posicionamento genuinamente focado nas demandas locais.

Fabricantes de máquinas para BOPP comentam não vender linhas novas para o Brasil há mais de 10 anos. Qual a justificativa para a defasagem desse parque fabril?
A falta de investimento em novas linhas está bastante relacionada à estagnação do mercado doméstico em vigor desde a instalação da operação do player mais recente (N.R.-Innova, em 2012). Por outro lado, os investimentos na região do pacto andino foram muito agressivos e geraram uma capacidade produtiva muito superior à demanda regional. A indústria de BOPP é intensiva em investimentos, razão para a compra de máquinas ser amparada por uma previsão de demanda compatível com o gasto. Nosso mercado não tem escala de demanda para absorver a produção de linhas de BOPP de 10m de largura e 600m/min de velocidade, pois tais equipamentos são muito menos flexíveis em relação a trocas de produto na velocidade que o mercado exige. •

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