Sem gelo e com muito gás

Na contramão dos rumos da economia nacional em 2014, a Associação Brasileira da Indústria de Águas Minerais (Abinam) estima expansão acima de 30% para o setor, reduto de PET e, com base em garrafões retornáveis, de polipropileno (PP). Carlos Alberto Lancia, presidente da entidade, atribui o desempenho à ênfase hoje dada à segurança alimentar, combinada à chamada cultura da saudabilidade disseminada em todas as classes sociais. A velocidade da propagação de informações sobre os benefícios da água mineral, impulsionada ainda mais pelas redes sociais, ele frisa, é outro fator por trás dos saltos de dois dígitos anuais do consumo do produto, em vias de destronar a curto prazo os refrigerantes da pole de PET, garante o dirigente . Na entrevista a seguir, ele abre as projeções com sol sem nuvens para essa indústria e seus desdobramentos na cadeia de embalagens.

Carlos Alberto Lancia
Lancia: refrigerantes com dias contados.

PR – Mesmo em um período de crescimento baixo, o setor de água mineral avançou 14,5% em 2013 e sua previsão original, para 2014, é de faturamento da ordem de R$ 2 bilhões e aumento de 35% no volume de vendas. A crise atual exige ou não uma releitura dessa projeção?
Lancia – Não exige. O crescimento econômico do país foi baixo e o da água mineral foi alto. Temos o cuidado de, ao longo do tempo, fazer reserva para suprir o mercado. Como nossa reserva é três vezes maior do que o mercado, estamos preparados para suprir o aumento de demanda. Nossa água não é para abastecimento, mas para ingestão. Se houver desperdício, não é responsabilidade nossa.

PR – Mas o setor vai crescer mesmo com uma situação econômica difícil?
Lancia – Para nós o mercado está bom. O que impulsiona nosso setor, primeiramente, é a segurança alimentar. Nesse sentido, o consumidor está fazendo opções mais conscientes. O segundo ponto é a nova geração de pessoas mais preocupadas com a saúde, com a longevidade e, por isso, buscam produtos naturais. Em terceiro aparece a cultura. Quanto mais alta, maior o consumo de água mineral. Água mineral é 100% natural, orgânica e não recebe tratamento algum. Isso faz diferença com relação à água de consumo de outras origens. As redes sociais também têm disseminado os benefícios da água mineral, um fenômeno ainda mais recente. É um incentivo espontâneo.

PR – Quais são os efeitos esperados com a pleiteada mudança da água da categoria de bebidas frias para alimento da cesta básica? Qual a tramitação seguida pela proposta e quando deve ser definida a posição do governo?
Lancia – Primeiramente, as pessoas vão pagar só pelo produto com a diminuição do ICMS. Mas o que regula preço é oferta e procura, inclusive no mercado da água mineral. Mas agora o preço estará um pouco menor de acordo com a redução da carga tributária. Como o ICMS é estadual, a redução já existe em Santa Catarina e Minas Gerais. Estamos tentando, da mesma forma, implementar a redução em todos os Estados.

PR – Isso não deveria ser decidido por unanimidade pelos membros do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz)? As decisões de Santa Catarina e Minas Gerais não seriam, portanto, inconstitucionais?
Lancia – Não. Definir os produtos da cesta básica é uma atribuição dos Estados, não há lei federal para isso. A água sai da categoria de bebida fria e entra para alimentos. Se houvesse alteração dentro de bebida fria, aí sim seria inconstitucional.

PR – Em 6 de agosto, a Petroquímica Suape comunicou a partida de sua produção de PET. Assim, o Brasil passa a ter dois produtores dessa matéria-prima para garrafas de água mineral. O que o setor, cujas fontes sopram suas garrafas, espera desse novo quadro?
Lancia – A resina é uma commodity. A formação de preço no Brasil considera o preço internacional, mais taxa de importação, mais frete. Isso é histórico. Porém, esperamos que, com a nova planta, haja mais competição interna.

PR – Segundo a Abinam, mais de 400 marcas de água mineral atuam no Brasil. Pelo seu conhecimento, quais fontes já testaram e aprovaram o PET da Petroquímica Suape?
Lancia – Algumas empresas já testaram, mas a Abinam ainda não. Pela ficha técnica da resina está tudo nos conformes.

[quote_box_left]

Água viva

Esquadrinhamento da Associação Brasileira da Indústria de Água Mineral (Abinam) crava o mercado total em 11.644 bilhões de litros em 2013, volume correspondente a salto da ordem de 14% sobre os índices de 2012 que, por seu turno, expandiram 13% sobre o saldo (9 bilhões de litros) de 2011. O Brasil é o sexto mercado mundial de água mineral. Ainda na radiografia de 2013, São Paulo desponta como o maior produtor (21,4% do total) entre os Estados e, na sua esteira, o Sudeste lidera (49%) no mesmo ranking com base nas cinco regiões. No compartimento das embalagens, polipropileno (PP) sobressai com quinhão de 80% no acondicionamento da produção geral, seguido por PET (17%) e policarbonato (3%). A dianteira de PP é explicável por sua aplicação dominante nos recipientes mais volumosos e de maior tiragem no reduto, os galões e garrafões. Tomados todas as versões dessas embalagens, de dois a 20 litros, sua produção alcançou 7.393.940.000 litros de água em 2013, projeta a Abinam.

[/quote_box_left]

 

PR – Nos últimos anos houve novos entrantes nesse segmento ou o número de marcas permanece estável?
Lancia – Continua estável e não há muita mortalidade de empresas. O atendimento ao mercado é feito de forma regional. O garrafão de 20 litros representa um serviço. É preciso levar e trazer a embalagem das residências até a indústria. Quem pode realizar melhor esse serviço são empresas locais e de menor porte, portanto mais eficientes. Em descartáveis, as grandes marcas mundiais estão nas principais redes de varejo. Mas sempre haverá espaço para uma ou duas marcas regionais. É diferente da mortalidade no setor de refrigerantes. Nesse caso, a produção e distribuição precisam estar próximas aos grandes centros.

PR – Pela sua percepção, como está o custo da embalagem de PET hoje em comparação ao custo de cinco anos atrás?
Lancia – Caiu bastante. O PET foi lançado no Brasil em substituição a PVC e PP. Naquela época, pré-formas de 18 g para garrafas de 500 ml custavam R$ 90 por milheiro. Hoje, com pré-forma de 14,7 g, trouxemos o custo para R$ 75 por milheiro. Se considerar a inflação do período e redução da gramatura, o custo é um pouco mais baixo do que quando o PET foi lançado no Brasil.

PR – Devido ao culto à saúde e bem estar, acredita que a água mineral vem tirando mercado expressivo de refrigerantes no Brasil? Essa tendência tende a aumentar?
Lancia – Sem dúvida. Em minha opinião, a categoria de refrigerantes vai morrer. Hoje, como categorias, temos água mineral, refrigerantes e sucos. Vão sobrar somente as marcas. As indústrias de refrigerante, inclusive, passaram a vender água mineral. Não há como ir contra a tendência do consumidor. O mercado de água mineral daqui a cinco anos passará o de refrigerantes no consumo de PET. É uma tendência sem volta. Bebidas açucaradas são os vilões de hoje. O adoçante, que era visto como solução, contém sódio e tornou-se outro vilão. O nível de informação sobre os alimentos está aumentando entre a população. Por exemplo, quando a indústria fala em zero adição de açúcar, quer dizer que o produto que já tem açúcar não recebeu mais açúcar. Quando o consumidor percebe isso ele para de comprar.

PR – Mas para o consumidor de baixa renda, comprar o refrigerante não é realização?
Lancia – Pode ser. Mas ele deixa de comprar o produto barato e adquire o de grife. Só que isso não altera o volume. É apenas uma migração entre marcas.

PR – A redução do peso da garrafa de água mineral já chegou ou não ao limite máximo no Brasil?
Lancia – Ainda não. As embalagens para 500 ml têm hoje 14 g, mas no mundo há garrafas de 8 g.

PR – E o mérito é da resina ou da máquina?
Lancia – É do conjunto. Já existem máquinas brasileiras capazes de gerar embalagens de 12 g. O setor aqui não está parado. Não há, contudo, sopradoras nacionais para 8 g. Mas acredito que em quatro anos, em média, tenhamos esses equipamentos mais avançados no país.

PR – A Anvisa já certificou pelo menos duas recicladoras de PET bottle to bottle para venderem essa resina para embalagens de alimentos, água inclusa. Como vê o uso desse material em garrafas de água mineral?
Lancia  – Água não está inclusa nesse contingente. Para envase de água usamos somente resina virgem. Para utilizar resina reciclada em frasco de água mineral é preciso mudar a legislação. A resina pode ser usada? Sim. Não haveria problema para água mineral, mas é necessário regulamentar.

PR – A Abinam é signatária de um acordo empresarial sobre ações de enquadramento de indústrias à Política Nacional de Resíduos Sólidos. O que ele propõe?
Lancia – Existe determinação do governo para que todas as categorias de produto façam um trabalho de logística reversa. Os nossos garrafões, por exemplo, já são 100% reciclados. No descartável, reciclamos 50%.

PR – E de onde são esses dados?
Lancia – Foram compilados pela Associação Brasileira da Indústria do PET (Abipet).

PR – Na água mineral, qual é a participação dos garrafões?
Lancia – É de 55%. O restante é descartável. Em faturamento, garrafões detêm 40% de participação. Esse nicho, aliás, cresce cada vez mais.

PR – Como explica, então,  a visibilidade tão alta na mídia das embalagens descartáveis, apontadas como vilãs de enchentes, por exemplo?
Lancia – É um absurdo. Por sinal, requisitamos (N.R.- em 28 de fevereiro último) ao jornal O Globo direito de resposta a uma matéria cujo título era “Mercado de água de garrafa ameaça meio ambiente” (N.R.- publicada em 25 de fevereiro último) .

PR – A Política Nacional de Resíduos Sólidos também depende de o governo fazer sua parte, como implantar um sistema nacional de coleta seletiva. Esse tipo de deficiência crônica do poder público pode não tirar do papel o cumprimento da logística reversa?
Lancia – Não. É uma questão de cultura. A nova geração está mais preocupada com o meio ambiente. Santa Catarina, por exemplo, já cumpriu essas determinações. Todos os municípios do Estado fizeram seu trabalho porque o Ministério Público pressionou e fez um acordo com os prefeitos. Além do mais, hoje há muito poder nas redes sociais, onde informações fluem com mais rapidez. Não dá para esconder. A sociedade está mudando e vai cobrar a posição dos responsáveis. O poder público, assim, irá correr atrás. •

Compartilhe esta notícia:

Deixe um comentário

Dacarto Compostos de PVC, Blendas, Masterbatches e Especialidades Poliolefínicas
A Karina Plásticos desenvolve constantemente novas tecnologias e produtos do segmento de Fibras Poliolefínicas
Interplast 2024
Cazoolo Braskem
Piramidal - Resinas PP, PE, ABS - Resinas Termoplásticas
Perfil Abiplast 2022
Grupo Activas