Um mercado conjugado no passado

Consumo aparente de resinas retornou a 2011 no 1º semestre, constata MaxiQuim

Pelo andar bambo da carruagem na estrada esburacada pelo corona e recessão, o consumo aparente de resinas commodities periga fechar este ano de volta ao andaime de nove anos atrás, projeta a consultoria MaxiQuim com base nas escoriações aferidas em seus indicadores estimados para o mercado no primeiro semestre (ver quadro). No plano geral, o consumo aparente nos seis meses iniciais de 2020, calcula a analista Marta Loss Drummond, recuou 6% em relação ao mesmo período no ano anterior e, exceto polietilenos de baixa densidade (PEBD) e linear (PEBDL), os demais termoplásticos convencionais sucumbiram a déficits indigestos.

“Poliestireno (PS) e PET tiveram os piores desempenhos, enquanto polietilenos (PE) foram as resinas com menos avarias no saldo da primeira metade do ano”, distingue Marta. O segmento de PS, ela aborda, foi tragado pela prostração da manufatura da linha branca, “pois as indústrias de eletrodomésticos ficaram paralisadas em parte dos primeiros seis meses”, ela argumenta. Para azedar de vez o humor de PS, o segmento de descartáveis trombou com o fechamento de bares e a queda na realização de festas e eventos esportivos, completa Marta, deixando claro as forças que levaram PS a fechar no vermelho vivo (-9%) o consumo aparente de janeiro a junho. Em tênue contrapartida, acrescenta a analista, as exportações de PS bateram recorde no primeiro semestre, com salto de 20% sobre os resultados no mesmo período em 2019. A propósito, comenta Marta, diante do mega excedente global de resinas em geral, as exportações a preços internacionais deprimidos pelas petroquímicas brasileiras tornam-se este ano apenas um meio de impedir o declínio da ocupação das suas capacidades a níveis alarmantes. “As exportações devem ser uma forma de as empresas diminuírem estoques e manterem as vendas em níveis razoáveis”, reitera a analista.

PET na lanterna
No bojo das estimativas da MaxiQuim, PET foi o termoplástico de demanda mais esfolada no primeiro semestre, com saldo de -12% no fatídico período. “O resultado decorre, em especial, da performance do setor de bebidas, cuja produção industrial caiu mais de 17% de janeiro a abril último, em comparação com o mesmo quadrimestre em 2019”. Bebidas, puxadas por refrigerantes e água mineral, mobilizam perto de 70% do mercado brasileiro de PET, atribui Marta. “Mesmo que outros setores usuários de PET, como produtos de higiene e limpeza, tenham apresentado significativo crescimento recente, não conseguem compensar o volume de pré-formas destinado a garrafas de bebidas”. Por essas e outras, ela amarra as pontas, o consumo nacional de PET deve fechar 2020 na faixa de 450.000 toneladas, tendo ao fundo uma capacidade instalada de 1 milhão de t/a.

A versatilidade que consagra polipropileno (PP) como um coringa entre os termoplásticos, não livrou as poliolefinas de um colapso de -9% no consumo aparente do primeiro semestre, mesmo declínio infligido a PVC pela construção civil anêmica e secura de lançamentos imobiliários em ambiente de alto desemprego e poder aquisitivo descarnado, como demonstram as estimativas da MaxiQuim. Marta atribui o déficit de PP à sua dependência da produção de bens duráveis. “A produção automobilística caiu mais de 60% no primeiro semestre, abalando o mercado de PP a ponto de projetarmos um recuo em seu consumo doméstico da ordem de 8% este ano”.

Importações na guilhotina cambial
De 2017 a 2019, as importações brasileiras de resinas, em especial poliolefinas, tomaram corpo à sombra do câmbio relativamente estável e da esboçada retomada da economia. Um cenário varrido de cena este ano em que, além do corona, o dólar pulou cerca de 35% apenas nos seis meses iniciais. “Acho difícil as importações aumentarem, pois o dólar continua alto e, caso os preços internacionais fiquem competitivos, é possível que empresas brasileiras importem, mas não muito, pois há resina nacional em estoque e pesa na transação o risco cambial e do prazo de entrega”, julga Marta.

A MaxiQuim sustenta a projeção de queda de 6,5% no consumo aparente de resinas este ano versus 2019. “O volume deve ficar na faixa de 5,6 milhões de toneladas, em nível semelhante ao de 2011”, associa Marta.

Recessão, falta de capital de giro e acesso difícil a linhas de crédito também devem sacolejar o varejo do plástico, dominado pelas compras de transformadores de menor porte em revendas autônomas e agentes autorizados. “Os distribuidores devem reduzir as vendas e talvez alguns menores sejam absorvidos”, considera Marta. “Mas acreditamos que a participação no varejo das resinas comercializadas por grandes transformadores, clientes diretos das petroquímicas, poderá ser parcialmente abocanhada pela distribuição”.

Conforme explica, um efetivo de transformadores de peso passará, em função da recessão, a consumir um volume menor de resina, não conseguindo se manter na carteira de vendas diretas das petroquímicas e passarão a ser clientes da distribuição. “Pode ser uma oportunidade para estes varejistas”, pressupõe Marta.

Declínio amortecido
Presidente da Associação Brasileira dos Distribuidores de Resinas Plásticas e Afins (Adirplast) e CEO da distribuidora Activas, Laércio Gonçalves não se entrega ao desânimo com o desfecho do primeiro semestre. “Levantamentos preliminares mostram queda acima de 40% no volume de vendas da distribuição em março e abril com declínio menor em maio”, ele expõe. “Comparado ao mesmo período em 2019, o recuo do movimento no primeiro quadrimestre não chegou a 2,5% e o volume vendido então pelos associados totalizou 155.158 toneladas”, dimensiona o dirigente. A referida curva de diminuição nas vendas, ele pressente, traduz o início de reversão na queda dos volumes, à sombra do recomeço paulatino de atividades em muitas regiões e do retorno de diversos setores, como o automotivo. “Segmentos de embalagens a exemplo de produtos de higiene e limpeza, fármacos e itens médico-hospitalares se destacaram no primeiro semestre, devido ao seu cunho de bens essenciais e sua demanda deve crescer este ano, energizada principalmente pelo efeito corona.

Gonçalves acredita que a pandemia não alterou a participação habitual, na casa de 30% das importações no consumo aparente de resinas no Brasil. Embora reconheça a pressão dos grandes excedentes globais, ele contrapõe que o Brasil é um mercado de resinas cuja participação global não vai além de 2,5% a 3% e, além das peculiaridades do país, é preciso considerar que a pandemia virou de ponta-cabeça os planejamentos, custos e estratégia logística de petroquímicas no mundo inteiro. “Na conjuntura atual de dólar alto e risco de entregas do material trazido de fora, o cenário é mais positivo para a resina nacional”. Em paralelo, o presidente da Adirplast reconhece que a carência de fôlego financeiro sob recessão entre transformadores de pequeno porte pode penalizar o varejo do plástico. “O mercado pode diminuir e o volume de vendas de resinas deve chegar ao final do ano com queda de dois dígitos perante o saldo de 2019”.

Parada dura
Antes da pandemia, a Fortimyl, distribuidora de poliolefinas da Braskem de atuação circunscrita a São Paulo, Rio e Espírito Santo, antevia crescimento este ano ao redor de 10%. “O vírus bateu forte em vários mercados cobertos pelo varejo do plástico e agora, à entrada do segundo semestre, ainda estamos no meio da turbulência, o que dificulta uma nova previsão de vendas”, alega Ricardo Mason, CEO da Fortymil.

Durante o primeiro semestre, a passagem da pandemia pelas indústrias de bens duráveis foi devastadora, define o distribuidor. “Alguns produtores de autopeças ainda estudam agendar a volta à ativa para o início de julho”, ressalta Mason. “Numa estimativa por média, podemos dizer que alguns segmentos de PP em bens duráveis devem fechar 2020 consumindo 50% a menos da resina comercializada pela Fortymil do que o saldo registado em 2029. Na esfera de PP e PE, aliás, o desempenho a desejar nos primeiros seis meses de setores como eletroeletrônicos, materiais de construção e cosméticos deve convergir para uma redução aproximada de 30% de nossas vendas no período”. Mason salienta que sem os grandes canais de vendas físicas funcionando sob a quarentena, as vendas de transformadores clientes da Fortymil praticamente zeraram. “Alguns voltaram com timidez entre maio e junho e, mesmo quando retornarem com força total, a expectativa é de um consumo de resinas inferior ao do ano passado”. •

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