Ilusão do conhecimento foi como os cientistas cognitivos Steven Sloman e Philip Fernbach batizaram um típico comportamento humano: pensamos em conjunto estar ultra informados quando, no plano pessoal, na realidade mal temos noção do que se trata, por considerarmos como nosso o conhecimento dos outros. “Pensamos que hoje sabemos muito mais, mas, como indivíduos, sabemos muito menos”, explica o pensador israelense Yuval Noah Harari no livro 21 Lições para o Século 21. “Baseamo-nos na expertise de outros para quase todas as nossas necessidades”. Um experimento ilustrativo: pessoas foram solicitadas a mostrar o quanto entendiam o funcionamento de um simples zíper. A maior parte achou moleza, pois volta e meia manejava o fecho até de olho fechado. Foi então que pediram a elas para descrever em detalhes as etapas da operação de um ziper. A maioria embatucou.
A reportagem de capa desta edição desvenda um caso de ilusão de conhecimento na esfera do plástico. Pesquisa da Nielsen sobre a incorporação do conceito de sustentabilidade em artigos de higiene e beleza indagou ao consumidor brasileiro o que considerava como um produto sustentável. Entre as respostas predominantes, veio a afirmação de que produto sustentável é o que tem embalagem reciclável ou biodegradável. A Nielsen parou por aqui, mas, indo além, sobram levantamentos na praça constatando que o grosso do público não faz ideia do significado de termos como “reciclável” e “biodegradável”, tal como ignora o que é bioplástico ou economia circular. Essa ilusão de conhecimento pode ser transposta sem ajustes para o cenário das pressões ambientalistas que hoje excomungam o plástico como praga bíblica, passando ao largo de seus infindáveis benefícios para a evolução do padrão de vida, da democratização dos bens de consumo e para o progresso do dueto do desenvolvimento econômico com a proteção da natureza.
“O mundo está ficando cada vez mais complexo e as pessoas não se dão conta de quão ignorantes são”, retoma o fio o ensaísta Yuval Harari. “É raro que admitam sua ignorância, porque se fecham numa câmara de eco com amigos que pensam como elas e são alimentadas por notícias que se autoconfirmam, fazendo com que suas crenças sejam constantemente reiteradas e raramente desafiadas”.
Talvez esteja aí uma explicação para a cobertura quase nula que a grande imprensa internacional deu à K’2019, maior feira do plástico global num momento em que o material virou pauta recorrente, em regra de viés negativo, nas editorias de meio ambiente, tecnologia e noticiário geral. Basta uma múlti de produtos de consumo perorar ser devota da economia circular desde criancinha e apregoar intenções de reduzir seu consumo de plásticos em embalagens ou substituí-los por materiais nunca especificados que a mídia não especializada acorre abrindo espaço e tempo generosos a tais promessas sem mais perguntas. Em contraste, as soluções para fortificar o combate ao aquecimento global que a cadeia plástica desvendou em outubro na feira alemã passaram em branco para a opinião pública. Geraram pífio interesse pautas atreladas ao futuro do planeta como as rotas de reciclagem química, o uso de fontes renováveis na composição de polímeros e aditivos, o emprego de reciclado 100% ou em teores recordes na produção de embalagens. Jornalismo, afinal, não é dar voz às partes?
Yuval Harari julga improvável melhorar a situação provocada pela ilusão do conhecimento mediante a oferta de mais informações às pessoas. “A maior parte de nossas opiniões é formada por pensamento comunitário e adotamos essas opiniões por lealdade ao grupo”, ele argumenta. “Bombardear pessoas com fatos e expor sua ignorância individual provavelmente será um tiro pela culatra. A maioria das pessoas não gosta de dados demais e, certamente, não gosta de se sentir idiota”. Em contrapartida, Harari sustenta que os indivíduos pensam em forma de narrativas e não de fatos ou números “e quanto mais simples a narrativa, melhor”.
Os méritos do plástico são simples de narrar e cativar – desde que lhe dêem ouvidos. •