As mais de 20 montadoras no Brasil fecharam o primeiro semestre com produção de 1.091.7 milhão de unidades ou 5% abaixo da metade inicial de 2021. O saldo motivou a Anfavea a revisar para baixo, no início de julho, a projeção da produção total em 2022 para 2.340 milhões de unidades contra 2.248 milhões do exercício anterior.
Em reação à trágica ociosidade no setor, o reduto de plásticos de engenharia, cujo carro-chefe são as autopeças, luta para atenuar a paulada desta perda intensificando a diversificação de mercados. Como se vê em reportagem desta edição, vários fornecedores de soluções antes de olhos fixos em autos leves, agora proclamam o assédio a segmentos menores, em particular implementos agrícolas, em busca de um respiro até a retomada da economia, como sempre fez no passado, ninar a indústria automobilística.
Só que não. Dessa vez, as perspectivas destoam daquelas clássicas elucubrações de que a indústria automobilística brasileira engatará a quinta numa boa, uma vez vencidos estorvos pontuais, como a ruptura no fluxo mundial de suprimentos de insumos como semicondutores (sem término à vista) e a tão ansiada redução dos juros pelo Banco Central, voltando a ativar a venda de autos após apaziguar a inflação. Agora, porém, o buraco é mais embaixo e indica que o esforço do setor de plásticos de engenharia em tatear outros campos mais a fundo pinta como treino leve para o jogo duro que se aproxima.
Com mais de 50 fábricas e capacidade instalada de 4,5 milhões de autoveículos, excedente causado pela vinda de uma penca de montadoras atraídas por mimos fiscais, barreira às importações e a visão de um mercado de 3 milhões de unidades, a indústria automotiva brasileira derrapou no óleo da vida real. O setor anda de lado desde 2014, calmaria intensificada pela prostração da demanda sob a pandemia desde 2020 e piorada este ano pelos estilhaços da guerra na Ucrânia, a exemplo da alta do dólar, energia, petróleo e matérias-primas commodities (plásticos inclusos). Para engrossar o caldo, a transição energética no setor automotivo mundial, rumo à eletrificação, demanda recursos pesadíssimos das montadoras e a busca deles também passa pelo encolhimento da presença das empresas em regiões menos vistosas para o negócio. O Brasil é o nono produtor e sétimo mercado mundial de autoveículos. Provas de que esse status não impressiona mais: o recente fim das operações da Mercedes Benz e Ford no país; os últimos planos de investimentos locais da maioria das montadoras, estacando em 2025, e, por fim, a preferência da indústria por modelos de maior valor agregado, tipo SUV, abolindo o carro popular, em prol de ganhos na margem com menor volume de vendas.
Outro sinal de alerta para a cadeia de plásticos de engenharia é uma ruptura cultural. Antenadas na economia circular, as novas gerações dos principais centros urbanos vêm cada vez menos nos carros um objeto de desejo e símbolo de subida na pirâmide social. Em vez da posse de um veículo, preferem o transporte compartilhado e daí reflexos como a onda dos aps sem garagem e o desinteresse por tirar a CNH.
Um aparente respiro para as especialidades plásticas é que todas essas mexidas no cenário demoram para alcançar a plenitude, ainda mais numa economia emergente e carente de infraestrutura como a nossa. Mas são mudanças a caminho e não têm volta. Lunetas setoriais já contemplam carros elétricos, que usam bem menos plásticos nobres que os de motor a combustão, com 57% das vendas mundiais de autos em 2030. Essa futura participação no Brasil é estimada em 29% ou 650.000 unidades.
No meio do fogo cruzado e ainda sem desfecho à vista, o setor de plásticos avançados sente na carne e no bolso a urgência de se reinventar. Acabou a zona de conforto, mas quem procura acha. •
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