Andreia Ossig
Coordenadora de Pesquisa & Desenvolvimento da Innova
O principal motivo dessa inclinação das petroquímicas por investir na reciclagem química é a possibilidade de recuperar totalmente os plásticos, mesmo com a presença de resíduos contaminados ou mistura de resinas que hoje não podem ser recicladas mecanicamente. Vale frisar que a reciclagem mecânica continuará a existir de forma paralela à avançada (química), com investimentos em tecnologia para separação e purificação dos resíduos, assim como para superar as barreiras da logística reversa.
Irineu Bueno Barbosa Junior
Diretor Comercial da Global PET Reciclagem
Há muitos anúncios de investimento em reciclagem química porque os materiais de circularidade resolvida via reciclagem mecânica já atendem às necessidades desta economia de enfoque ambiental. Desse modo, investimentos têm sido concentrados na construção de mais plantas com as tecnologias já disponíveis para a reciclagem mecânica, um fato sem o atrativo de novidade para a mídia publicar. Mas há, sim, aportes pesados na reciclagem mecânica no mundo todo. De outro ângulo, são inúmeros os exemplos de materiais utilizados em embalagens, roupas, eletrônicos, veículos etc e a circularidade de seus resíduos tem sido continuamente posta à prova, apresentando inviabilidade técnica e/ou comercial na sua recuperação e reinserção na cadeia produtiva através da reciclagem mecânica. Aqui concordo que repousa um grande desafio para a indústria e humanidade solucionar. Ainda há espaço para inovações, principalmente as disruptivas, quando se avalia as possibilidades técnicas disponíveis via reciclagem química perante a mecânica. São percebidos maiores desafios, oportunidades, promessas de benefícios e soluções que podem ser decisivos para a manutenção do uso ou banimento de muitos materiais hoje utilizados. Devido a esses fatores, eu acho justo a reciclagem química desfrutar no momento de maior foco da mídia.
Fabio Bordin
Diretor da Ineos Styrolution para a América do Sul
A indústria petroquímica está investindo em ambas as tecnologias de reciclagem. Entretanto pelo fato da modalidade química ser mais recente, vem ganhando mais atenção e interesse do mercado.
O principal objetivo dos novos investimentos em reciclagem química, também chamada avançada, é aumentar as oportunidades de reaproveitamento de plásticos pós-consumo, somando-se aos préstimos da reciclagem tradicional. Esta meta cabe, em especial, para polímeros que possam exigir um processo de reciclagem mecânica mais desafiador. Desse modo, com a junção das duas rotas, pode-se aumentar a coleta de todos os plásticos, evitando-se o destino final em aterros sanitários. Entre as tecnologias relacionadas à reciclagem química, constam a depolimerização e pirólise. Elas visam incorporar os resíduos plásticos de volta ao ciclo de vida dos produtos acabados para alcançar uma economia circular. Importante ressaltar que a indústria plástica precisa de ambas as tecnologias para aliar os materiais a uma economia circular completa. Hoje em dia também são muitos os investimentos importantes em reciclagem mecânica, principalmente em tecnologia de triagem da sucata, em prol da produtividade na recuperação das resinas para segundo uso.
Paulo Francisco da Silva
CEO da Agora Vai Brasil, consultoria diferenciada em reciclagem
As petroquímicas perceberam que, para sobreviver como negócio dependente de insumos provenientes do óleo negro e seus derivados, os vilões nº1 no mundo ambientalmente correto e idílico imaginado por tantas pessoas, a única saída são as atitudes politicamente corretas, em linha com os pilares da sustentabilidade.
Em sua essência, o parque petroquímico tem aptidão inata para soluções respaldadas em tecnologias de ponta, nas quais a incidência de mão de obra é mínima se comparada à reciclagem mecânica, esta ainda dominante e que, apesar das conquistas tecnológicas constantes, ainda demanda intensa intervenção manual no processo.
A reciclagem química não tem, por enquanto, custo competitivo para produções em grandes escalas das resinas commodities mais utilizadas e cujo mercado final se caracteriza por acirradíssima disputa de preços, por vezes decididos na casa dos centavos de real. Ela está sendo direcionada para materiais de valor agregado maior, capazes de remunerar a cadeia como um todo, possibilitando a geração de um reciclado final premium, contemplado em determinados casos com certificação de grau alimentício.
Vejo com muito bons olhos a reciclagem química para direcionarmos a ela a parcela de plásticos não recicláveis mecanicamente, por motivos como tipos de material ou blends utilizados ou ainda as estruturas colaminadas. Uma referência concreta: estima-se que, em 2020, a produção mundial de plásticos virgens tenha atingido 367 milhões de toneladas. Levantamentos apontam que 30% desse volume constam de materiais inservíveis para a reciclagem mecânica e sua destinação não deve ser nem o aterro nem a queima, mas a reciclagem química. Em paralelo, a reciclagem mecânica, dependente de mão de obra qualificada, continuará com espaço em virtude da escala e progresso das tecnologias inerentes ao processos.
Existe um mercado internacional de sucatas, com regras próprias, em expansão e cada vez mais profissionalizado, por força inclusive de regulações como recente lei do Reino Unido que exige percentuais maiores de materiais reciclados na composição de artefatos transformados.
O que se espera agora é que as petroquímicas direcionem seus esforços para a recuperação da parcela descomunal de materiais de reciclagem mecânica inviável. Com este estímulo à reciclagem química, o material premium resultante vai melhorar a remuneração da cadeia envolvida. Daqui para a frente, aquisições e joint venture de petroquímicas com recicladoras maiores serão normais. Afinal, produtor de resina virgem não sabe operar a reciclagem mecânica como quem é do ramo.
Eide Garcia
Diretor geral da Borealis para a América do Sul
Petroquímica global player em poliolefinas, a Borealis trabalha intensamente para construir a revolução futura-positiva do plástico. Nesse sentido, a abordagem da companhia tem estes componentes principais:
- Tornar-se circular em plástico e carbono.
- Por meio do nosso modelo de cascata circular, implantaremos tecnologias que maximizarão o valor e a eficiência das poliolefinas, minimizando seu impacto no planeta.
- Mudaremos gradualmente de matérias-primas baseadas em fontes fósseis para nossas alternativas “A-B-C” – carbono atmosférico, carbono de base biológica e carbono circular de matériais-primas recicladas.
Nossa abordagem de circularidade integrada engloba as reciclagens mecânica e química como tecnologias essenciais para o fechamento do loop da cadeia do plástico. O ciclo começa a fechar com a reciclagem mecânica avançada, a cargo da nossa tecnologia Borcycle™ M, para transformar resíduos pós-consumo (PCR ou PCI) em plástico de qualidade quase virgem e com a menor pegada de carbono. Por sua vez, a reciclagem química, representada pela tecnologia Borcycle™ C, complementa a via mecânica. Ela valoriza ainda mais os resíduos de difícil recuperação pela rota mecânica e, não fosse a reciclagem química, provavelmente iriam para incineração, aterros ou, pior, para rios e oceanos contaminando o meio ambiente.
João Henrique Alves
Gerente de sustentabilidade do Valgroup
A reciclagem mecânica possui limitações para o trabalho com filmes e, entre elas, enfatizo os seguintes pontos:
- Até o momento, a reciclagem mecânica não consegue efetuar a a completa descontaminação de resíduos flexíveis monomaterial para gerar resinas aptas para compor embalagens primárias.
- Resíduos de filmes podem conter, em sua composição, materiais quimicamente incompatíveis, o que dificulta sua reciclagem mecânica.
- Resíduos plásticos altamente contaminados, caso daqueles rejeitos misturados encontrados em aterros e lixões, são de reciclagem mecânica inviável.
Com a reciclagem química, podemos considerar todos esses resíduos como fonte de matéria-prima, trabalhando apenas uma separação superficial para respeitar a presença de um maior percentual de plásticos poliolefínicos.
Cabe salientar que a reciclagem mecânica continuará relevante para a circularidade, pois sua tecnologia e mercado estão desenvolvidos e seguirá em evolução para acomodar a crescente demanda dos clientes. A propósito, petroquímicas também apostam na reciclagem mecânica para cumprir objetivos ESG, a exemplo dos recentes investimentos da Braskem e Indorama nesse setor no Brasil. Já a reciclagem química virá para somar na econômica circular, uma vez que tratará os plásticos que não podem ser recuperados mecanicamente.
Ricardo Jamil Hajaj
Diretor da Cimflex
Existem três formas de reciclar plásticos: a reciclagem mecânica, química e a energética. A primeira é a mais difundida no mundo, sendo utilizada no Brasil há muitos anos e onde configura um setor com mais de 1.000 indústrias, responsável por mais de 15.000 empregos diretos, receita anual acima de R$ 3 bilhões e tendo reciclado 884.000 toneladas em 2020. O que equivale a 23,1% dos resíduos plásticos. O cruzamento dos dados revela termos um potencial adicional superior a 2,9 milhões de toneladas de resíduos por serem recuperados.
A petroquímica, ao contrário da indústria de reciclagem mecânica, é altamente intensiva em capital e tecnologia. Ela precisar dar sustentabilidade a seu negócio, promovendo a economia circular em grandes volumes. As matérias-primas geradas pela reciclagem química serão incorporadas na produção de novas resinas para diversas aplicações, inclusas embalagens. Para viabilizar economicamente estes projetos, as petroquímicas dependerão de matéria-prima em grande escala e concentradas, buscando a aliança com os sistemas de coleta de resíduos urbanos e/ou a mineração de aterros sanitários.
A reciclagem química decerto competirá com a mecânica, mas o mercado fará a seleção dos resíduos pelo valor agregado que o material proporcionar. Evidente que rejeitos de recuperação mais complexa pela rota mecânica seguirão para a reciclagem química ou energética.