Sergio Carneiro Filho
Diretor do grupo S.R. Embalagens, controlador da Barreflex, recicladora de aparas e polímeros pós-consumo
“Sem dúvida e infelizmente, a pergunta traduz uma difícil realidade do setor de reciclagem, no Brasil e no mundo. Como é sabido, os custos inerentes às resinas recicladas, inclusos os de produção e, em especial, os das aparas, não oscilam na mesma proporção que os preços das resinas virgens, mas são, sim, balizados por eles. Preços de mercado de resina virgem em baixa, balizam igualmente para baixo os das recicladas que, com custos ‘fixos’, acabam por impor ao seu produtor margens muito apertadas – por vezes até inviáveis, desincentivando plenamente novos investimentos.
A conta tem de fechar, tanto para o reciclador, como para o cliente comprador de embalagem contendo material reciclado. Ele busca cumprir suas metas ambientais e correlacionadas, mas, na enorme maioria dos casos, desde que a viabilidade financeira esteja presente nesse esforço. Como para toda boa regra, para esta também existem exceções, como resinas recicladas de ‘melhor qualidade’, com aplicação bem desenvolvida, implantada e já incorporada no cotidiano de mercado do produto embalado – e para elas eu acredito que exista uma ‘salvaguarda’.
De qualquer forma, julgo que a conjuntura atual de preços pouco competitivos do reciclado seja pontual, uma fase talvez não muito curta. Mas, por pior que hoje seja, ela será superada e não mudará a tendência irreversível da sustentabilidade e circularidade dos materiais plásticos”.
Edilson Deitos
Diretor da Zandei Plásticos e vice-presidente do Sindicato das Indústrias de Material Plástico no Rio Grande do Sul
“As empresas usuárias de embalagens que assumiram um compromisso com a circularidade, com a adição de um percentual ou 100% de plástico pós-consumo reciclado (PCR), dificilmente irão retroceder. O cenário mundial aponta mesmo para um período mais longo de super oferta de resinas virgens, o que irá impedir a migração de novos projetos. Embora os preços dos materiais pós-consumo tenham baixado muito e o PCR vem acompanhando a queda, a preocupação maior é com o desestímulo das cooperativas de catadores, diante da baixa remuneração recebida pelo material coletado, o que poderá comprometer toda a cadeia da economia circular do plástico.”
Rafael Ramalli Da Silva
Gerente Técnico de Polímeros da Imerys para a América do Sul
“Os avanços das resinas pós-consumo, sobretudo no âmbito tecnológico, continuam a crescer. Já experimentamos cenários de resinas com menores preços, contudo consumidores de produtos como cosméticos e alimentos têm demandado opções de embalagens mais sustentáveis. Tratam-se de produtos em geral caracterizados por regulamentação e restrições técnicas mais complexas, porém esses desafios têm sido constantemente superados pelos produtores de materiais reciclados. Do ponto de vista dos produtores de aditivos, como minha empresa, insumos para a indústria da reciclagem permanecem um foco de desenvolvimentos, com constantes lançamentos para melhor atender às expectativas das indústrias usuárias. Aditivos minerais como talcos e carbonatos de cálcio ultrafinos vêm sendo aprimorados e acenam com soluções para aumento de índice de fluidez, resistência ao impacto e reforço mecânico. De toda a forma e independentemente de oscilações e sazonalidades, a demanda atual dos reciclados transcende a questão dos custos atuais de matéria-prima.”
Wilson Cataldi
Sócio e Diretor da distribuidora de resinas e aditivos Piramidal
“Temos notado que existe o mercado que compra ‘circularidade’ e ‘conceito’, constituído por brand owners como Natura, Ambev, Boticário etc. Eles continuam comprando material reciclado, independentemente dos preços, pois estão buscando o conceito. Porém, o mercado do reciclado tradicional, que é o de grande volume, compra preço e não conceito! Não paga de forma alguma pelo reciclado se for mais caro do que o polímero. Se não tiver uma diferença de – no mínimo – 20% do valor menor que o da resina virgem, esse cliente não compra e o produto precisa ainda ter boa qualidade, senão não vende.
A pergunta dessa pesquisa de opinião me fez refletir que, no passado, na época da tomada da decisão de aumentar a capacidade das plantas em geral de reciclagem no Brasil, o preço da resina virgem era o dobro de hoje e a taxa de juros entre 2 a 3% ao ano.
O ambiente mudou muito nos últimos dois anos.
Hoje em dia, a super oferta derrubou os preços de PE e PP virgens e eles devem continuar baixos este ano e em 2025. A taxa de juros chegou a 13.75% e agora declina, mas dificilmente ficará abaixo de 8,5%.
Acho que a vida não está sendo fácil para o empreendedor de plantas de reciclagem. A circularidade é um nicho e deve demorar bom tempo para o ‘conceito’ se sobrepor a preço do material.”
Ricardo Guerreiro Mason
Diretor da componedora e recicladora Plastimil e da distribuidora Fortymil
“Quando falamos em investimentos, temos de pensar sempre no longo prazo. Não há fórmula mágica nem receita de bolo para se imaginar que um investimento qualificado na área de reciclagem de plásticos possa oferecer retorno curto e garantido. A reciclagem, embora hoje acelerada pelo processo de consciência sustentável, que está trazendo e trará ainda mais oportunidades de desenvolvimento de mercado de resinas pós-consumo, além de outras iniciativas, não foge do ciclo de alta e baixa inerente ao mercado petroquímico. Por sinal, nesses 50 anos de ativa da minha companhia, o Grupo Fortymil Plastimil, a reciclagem sempre sofreu mais nos ciclos de baixa, quando há sobra de resina virgem e preços menores. Acredito que a agenda sustentável, focada em economia circular, pode amenizar esse efeito no médio e longo prazos, mas ainda há muito a se evoluir em um mercado que ainda é predominantemente focado em preço. Resumindo, cada um precisa saber quando e como investir, mas também tem de estar consciente de que sucesso antes do trabalho, é só no dicionário.”
Murilo Feltran
Gerente de contas especiais da componedora Termocolor
“A super oferta de PP e PE virgens tende a atrasar alguns projetos para uso dessas resinas recicladas por parte de grandes brand owners e fabricantes de peças originais (OEMs). Porém, é irreversível a tendência de substituição dos materiais devido às metas ESG desses players, que agem como influenciadores de peso do mercado. Até pode haver uma pressão de preços nos fornecedores de plásticos pós-consumo reciclado (PCR), mas para empresas dessa alta categoria já é bastante claro que a diferença de preço entre as opções PCR e a virgem não é grande como antigamente. Os projetos podem ser atrasados, mas não deixarão de acontecer.
Um ponto importante: PP e PE primam pela alta versatilidade de aplicações, por meio dos mais variados processos de moldagem. No entanto, essa versatilidade também é um desafio para a reciclagem, pois gera resíduos pós-consumo com uma variação muito grande em suas características físicas e mecânicas. Para garantir a qualidade do reciclado, é necessário selecionar fontes de resíduos mais homogêneas e realizar um processo de separação e limpeza mais detalhado. Esse cuidado redobrado leva a um custo maior do resíduo pós-consumo, mas confere estabilidade de propriedades lote a lote. Vale assinalar que PP e PE já chegam ao transformador aditivados pela fabricante petroquímica com um pacote de antioxidantes suficiente para um processo de moldagem. Quando a peça é reciclada, é necessário o acréscimo de outro pacote de antioxidantes para, em novo processo de moldagem, proteger o material da degradação térmica. Em determinados casos, pode ser necessária a incorporação de outros aditivos, como modificadores de impacto, agentes anti-odor, nucleantes ou anti UV.
Por fim, o principal desafio da reciclagem de PP e PE é a falta de homogeneidade de cor: os resíduos pós-consumo podem apresentar uma ampla gama de cores, o que pode afetar a cor final do reciclado PCR. A solução técnica mais adequada para esse problema é o tingimento do reciclado na cor exata que o cliente busca, garantindo assim estabilidade e uniformidade de cor, além de contribuir para estética e design diferenciados no produto acabado.”
Paolo de Filippis
Presidente da Wortex Máquinas
“Materiais reciclados de alta qualidade (PCR) já são uma realidade e, como sua demanda tende a aumentar, não dá mais para se pensar simplesmente em reciclagem do plástico de qualquer forma, sem qualidade e utilizando equipamentos sem tecnologia, com era feito antigamente e ainda hoje por várias empresas. Durante a pandemia, foi constatada a real importância do plástico para a sociedade, mas temos (a cadeia plástica) ainda um grande trabalho em conjunto a ser feito junto aos meios de comunicação, indústrias, sociedade e setor público para desfazer a imagem do plástico como poluente e vilão do meio ambiente. Se tivermos uma política com incentivo voltada à toda a cadeia de reciclagem do plástico pós-consumo, teremos a crescente diminuição de resíduos descartados, aumentando o índice de utilização de materiais recicláveis e, por extensão, gerando receita e emprego. Mesmo com o reciclado hoje com preços próximos ou até acima dos da resina virgem, o apelo de proteção ambiental será um fator cada vez mais preponderante na valorização do material reciclado. Falam por si o progressivo interesse e necessidade manifestados por indústrias de transformação em relação aio emprego de materiais reciclados em seus produtos.”
Wagner Catrasta
Head de operações da componedora actplus
“O mercado demonstra, ano a ano, a necessidade de as empresas se tornarem cada vez mais sustentáveis. Claro que, neste momento, apenas companhias que visam esse compromisso são quem dá maior importância ao consumo de produtos reciclados. Ou seja, pagam não só pelo produto, mas pelo apelo ecológico e social embutido nessa estratégia. Mas, por enquanto, estamos falando de uma parcela bem pequena do mercado, dominada por brand owners. Ainda assim, acho que esse mercado seguirá crescendo apesar da grande oferta global de poliolefinas virgens, pois suas versões recicladas precisam ser escoadas de alguma forma e já existem muitas empresas oferecendo produtos de qualidade no mercado brasileiro. Essa concorrência fará com que os preços dos reciclados se mantenham abaixo do preço do contratipo virgem, de modo independente da oferta nacional e internacional. Uma justificativa para o meu otimismo: a recicladora actcycle, integrada à minha empresa, a componedora actplus, partiu no terceiro trimestre de 2023 e já processa em torno de 150 t/mês de aparas industriais e a meta é chegar a dezembro próximo recuperando 500 toneladas no mesmo período, prova de que a procura por resina reciclada tem futuro.”
Luis Oscar Barros
Coordenador de desenvolvimento de mercado de PE da ExxonMobil na América Latina
“A economia circular é um grande desafio para a indústria plástica e minha empresa, a ExxonMobil, tem produtos e tecnologias que nos permitem trabalhar com clientes em outros quatro desafios relacionados a:
:: Alcançar ampla reciclabilidade dos produtos finais em comunidades que reciclam;
:: Aumentar a carga de material pós-consumo nas estruturas;
:: Dar suporte ao uso de resinas alternativas às de origem fóssil virgem;
Ter a reciclagem avançada como opção adicional à reciclagem mecânica.
Essas metas são trabalhadas dentro dos pilares de design para reciclabilidade e reciclagem avançada. Eles se traduzem nas estratégias para o desenvolvimento de embalagens expostas a seguir:
:: Fazer mais com menos, ou seja, reduzir espessuras das estruturas enquanto mantemos a funcionalidade da embalagem;
:: Desenhar embalagens para maior reciclabilidade, desenvolvendo soluções que entreguem alta qualidade de estruturas monomateriais, permitindo atender a critérios de reciclagem e necessidade dos donos de marcas (brand owners);
:: Aumentar a quantidade de material reciclado, com soluções que possibilitem incorporar um conteúdo reciclado por meio do uso de poliolefinas de alto desempenho, para garantir as propriedades mecânicas em vista para o produto acabado.
Essas estratégias de cunho sustentável são possíveis graças ao nosso portfólio de resinas poliolefínicas de alto desempenho. Para ilustrar essa viabilidade, destacamos o case de solução monomaterial (de reciclagem mecânica facilitada) aqui no Brasil, com o cliente Plastrela e com o dono de marca de pet food Adimax. Em suma, um trabalho em conjunto resultou no desenvolvimento de um stand up pouch no qual nossas resinas de PE proporcionaram a eliminação do substrato de PET biorientado da embalagem original.
Além disso, a ExxonMobil evidencia sua confiança na ascensão de materiais reciclados através de vários projetos em curso no Brasil. Desde 2022, por exemplo, damos respaldo à cooperativa YouGreen, dedicada à gestão integrada de resíduos, oferecendo soluções ambientais e econômicas. Ao todo, investimos mais de R$ 650.000 para melhorar a infraestrutura e capacitação dos catadores da Eco Cooperativa, filial da YouGreen em Manaus. Ela espera coletar mais de 100 t/mês de resíduos até 2025, podendo chegar a 1.200 t/a.”
Marcelo Mason
Head de sustentabilidade e ESG da recicladora Deink Brasil
“Temos que analisar sempre o tripé Sustentável/Social/Econômico. Sim, no viés econômico o business de reciclagem upstream (ou de melhor qualidade) tem sofrido bastante aqui e lá fora com a superoferta de resina virgem e, oscilações pontuais à parte, não é algo que deva mudar nos próximos dois anos. De outro ponto de vista, vivemos um momento em que globalmente tem se criado uma barra regulamentadora com foco na sustentabilidade (o Tratado dos Plásticos da ONU). Também deveremos ter um decreto nacional com foco no social. Trocando em miúdos, o futuro da economia circular passa diretamente pelo elo do poder público que, por sua vez, deve traduzir a realidade nacional e criar uma regulamentação com obrigatoriedade de uso e que deverá ser um motor propulsor para a cadeia plástica, a começar por catadores e cooperativas que também vêm sentindo este baque nos preços do reciclado. Cabe aqui um alerta vital para o setor: tanto o tratado internacional como as esperadas ações do governo brasileiro deverão ser acompanhados com lupa por nossas associações de classe ( Abiplast e Abiquim) e todos os demais elos da cadeia produtiva do plástico. Integrante dessa corrente, a minha empresa, a recicladora Deink Brasil, sempre acreditou e buscou novas tecnologias para reciclar plásticos antes destinados a aterros. É um caminho sem volta, é neste cenário que nascemos e é nele que iremos progredir. A velocidade dessa evolução decorre, sim, dos fatores externos já citados, mas a circularidade do plástico é obrigação de todos os envolvidos e o futuro do material depende disso.”