Ou nada ou afunda

Distribuidores de PE e PP nacionais se desdobram para resistir às importações
Distribuidores de PE e PP nacionais se desdobram para resistir às importações

Desde 2022, o primeiro ano sem resquícios da pandemia no planeta, os distribuidores de resinas nacionais de PE e PP, produzidas apenas pela Braskem, vêm tendo de matar um leão por dia para fechar 2023 no mais tímido azul e manter o pescoço acima d’água em 2024. A tensão no ramo provém da guinada de 180º causada nas feições do varejo de poliolefinas por fatores internos e externos interligados. O gatilho do abalo sísmico é o incessante mega excedente mundial de PP e PE, fruto de expansões ainda em curso em petroquímica dos EUA e Ásia, hiper oferta piorada pelo colapso da China, Europa à deriva, duas guerras (Rússia x Ucrânia e Israel x Hamas), petróleo volátil e o mercado global emperrado por inflação e juros nas alturas, resultantes das verbas emergenciais para reanimar as economias tomadas pela covid-19 em 2020 e 2021.
Com o medíocre PIB brasileiro dependente do agronegócio, os distribuidores de poliolefinas nacionais têm deparado com uma demanda em calmaria, muita sobra de resinas acessíveis do exterior e um elemento oponente impensável poucos anos atrás: transformadores do Sul/Sudeste, integrantes da nata dos clientes da Braskem, que montaram plantas filiais na Zona Franca para minar concorrentes de fora dali com o desfrute de privilégios fiscais e tarifários em três frentes: na internação de matérias-primas pelo porto livre de Manaus, na polêmica remessa dessas resinas importadas e no despacho lícito dos produtos ali transformados, em especial flexíveis, para o resto do país. Pois é no meio desse salseiro que os distribuidores de PP e PE nacionais têm hoje de se virar nos 30 para salvar o ano sem perder mercado. Na entrevista a seguir, essa parada dura é destrinchada por três expoentes do ramo: Wilson Cataldi, sócio executivo da distribuidora Piramidal; Ricardo Guerreiro Masion, diretor da Fortymil, e Laercio Gonçalves, presidente do Grupo activas e da Associação Brasileira dos Distribuidores de Resinas Plásticas e Afins (Adirplast).

Segundo consenso do setor, a distribuição de PP e PE nacionais abriu bem o ano, trombou em abril com preços em queda e, apesar das fortes importações e a economia retraída, fechou o primeiro semestre com vendas acima do mesmo período em 2022. Com base neste retrospecto e no desaquecimento notado nesta metade final do ano, qual a expectativa para o desempenho do seu setor no exercício de 2023 versus 2022?

Wilson Cataldi: Piramidal embarca na distribuição de produtos químicos que vão além da cadeia plástica.
Wilson Cataldi: Piramidal embarca na distribuição de produtos químicos que vão além da cadeia plástica.

Wilson Cataldi: O mercado de PP e PE cresce este ano na distribuição, revenda e transformação, puxado pelas resinas importadas, super ofertadas e com políticas agressivas de preços A Braskem, do seu lado, não tem planos previstos de expansão da sua capacidade. Desse modo, tudo caminha para a distribuição de PP e PE da Braskem ter em 2023 um desempenho em linha com o de 2022. Agora, os distribuidores e revendedores de PP e PE importados desfrutarão de um crescimento bem maior de seus negócios que os agentes das poliolefinas nacionais. Essa situação a favor das resinas importadas se acentuou de 2022 para cá. Em 2021 (nota: período final da pandemia), esse quadro ainda não era perturbador. O cenário mudou drasticamente a partir de 2022. A Piramidal, nessa conjuntura, mesmo ciente do quadro adverso para a resina nacional, segue de mãos dadas com a sua bandeira Braskem. Estamos juntos nos bons e maus momentos.

Ricardo Guerreiro Mason: Acredito que a distribuição deva fechar com números um pouco acima de 2022, dado que o segundo semestre do ano passado não foi positivo. O mercado continua muito disputado e com excesso de oferta, mas alguns fatores na segunda metade de 2023 devem ajudar o balanço do setor, entre eles o aumento no custo das matérias primas.

Laercio Gonçalves: A expectativa para o desempenho do setor de plástico em 2023 em comparação a 2022 é positiva. Apesar de 2023 ter apresentado flutuações na oferta e demanda ao longo do ano, quando comparamos com 2022, que foi um ano em que o setor petroquímico enfrentou desafios significativos, temos observado uma melhora no cenário. Estamos projetando um crescimento de cerca de 10% em comparação a 2022. Isso quando falamos de todo o portfólio de materiais da Activas, minha empresa.
Embora 2022 tenha sido marcado por dificuldades, incluindo a instabilidade no mercado e mudanças nas condições econômicas, os números de 2023 acabaram sendo mais otimistas. As empresas do setor de plástico estão se adaptando às condições pós-pandemia, implementando estratégias de gerenciamento de riscos e inovação. Isso e uma certa demanda represada que o final de 2022 causou têm contribuído para um aumento no desempenho geral do setor da distribuição. É importante ressaltar que a recuperação está ocorrendo em um contexto de mudanças constantes e a resiliência e capacidade de adaptação são fundamentais para o sucesso das empresas. Com as medidas apropriadas e a busca constante por inovação e sustentabilidade, a distribuição continuará a crescer nesse final de 2023.

Como interpreta a atípica retração do mercado em setembro/outubro, período tradicionalmente de maior aquecimento nas vendas de PP e PE e quais os reflexos desse quadro na reposição de estoques pelos clientes da distribuição?

Wilson Cataldi: Veja só, em setembro/outubro aconteceu uma subida nos preços internacionais e nacionais, da ordem de R$1.000 a R$1500 /t conforme o grade. É algo que se costuma esquecer, quando se tem em mente a imagem geral do viés de baixa internacional e nacional nos últimos tempos. Mas o fato é que esse aumento dos preços das resinas pegou o transformador num momento de mercado interno enfraquecido e, em decorrência, de maior aversão do seu cliente, fabricante de produtos finais, à ideia do repasse dos reajustes. Daí a parada pontual para renegociação de preços entre o transformador e seu cliente. No pano de fundo, a situação também é explicada por um PIB previsto para crescer 3% este ano puxado basicamente pelo agronegócio, enquanto o mercado interno padece com a inflação, juros altos e poder de compra engessado. Nesse contexto. a participação no PIB da indústria de manufatura (transformação de plástico inclusa) continua incipiente. Outro fator influente neste movimento frustrante no trimestre do ano que, tradicionalmente, marca pelo aquecimento das vendas de resinas, é o sentimento de incerteza e insegurança disseminado no mercado sob clima da guerra Israel x Hamas iniciada em outubro. Isso também influi para travar, psicologicamente, a disposição de investir do transformador.

Ricardo Guerreiro Mason: cenário de precificação de resinas diferente do ano passado.
Ricardo Guerreiro Mason: cenário de precificação de resinas diferente do ano passado.

Ricardo Guerreiro Mason: Como já disse, mesmo com um trimestre mais retraído, temos um cenário de precificação diferente do mesmo período em 2022, quando o material estava em seguidas quedas de preço, o que sempre leva a um processo de desestocagem da cadeia. Neste ano, após atingir a base da curva de preços, PE e PP ensaiaram um processo de retomada de preços no terceiro trimestre, um movimento que vem se alongando em outubro e novembro. Isso fez com que a cadeia repusesse uma parte de seus estoques, mesmo que parcialmente. Obviamente que o excesso de oferta e os movimentos de material (nota: resinas e filmes) vindo de Manaus têm poluído o mercado como um todo, o que minimiza o impacto dessa reposição de estoques, mas, mesmo assim, ela afeta o consumo aparente de poliolefinas.

Laercio Gonçalves: Nós não sentimos uma retração tão importante no meses citados. Sentimos que o mercado deu uma aquecida no período e que, talvez, essa retração possa acontecer durante o último bimestre – momento ja esperado historicamente para que isso ocorra. Ainda assim, comparando com os números do último trimestre de 2022, devemos ter um balanço melhor no ano de 2023. A propósito, cabe assinalar que a instabilidade macroeconômica mundial, principalmente com a guerra da Rússia x Ucrânia e a recente de Israel x Hamas, causam impacto significativo nos mercados. Essa instabilidade cria incertezas e traz mais inseguranças e receios em relação a decisões de grandes investimentos. As empresas estão cautelosas com suas estratégias de compras e estoques, tendo em mente o contexto volátil. Aqui na Activas, a nossa abordagem para este último trimestre é baseada no ajuste das estratégias à medida que as circunstâncias evoluem. Isso inclui atenção especial à gestão de estoques, para o caso de enfrentarmos possíveis retrações de mercado.

Pela sua estimativa, as vendas para o varejo de PP e PE devem fechar o ano com quais participações detidas pela revenda autônoma/importadores e pela distribuição da Braskem?

Wilson Cataldi: Eu não tenho condições de estimar com precisão as participações da distribuição de resinas nacionais e dos agentes e revendas das importadas no varejo brasileiro de PP e PE. Mas acho que a distribuição da rede Braskem não perdeu terreno perante 2022. Em contrapartida, a participação da resina importada aumentou a ponto de os dois lados fecharem o ano com participações muito próximas. Rememorando, aumento dos preços internacionais a partir do terceiro trimestre, o fator guerra inibindo gastos finais num cenário de demanda restringida e agravado também pela presença do núcleo de plantas da Zona Franca alimentadas por importações intensas de poliolefinas e cuja produção incentivada de filmes ganhou o restante do país, até a seca atípica desde outubro no Amazonas emperrar o recebimento de matérias-primas e o despacho de produtos finais de Manaus. Com este quadro, o segundo semestre, no varejo de PP e PE, supera o mesmo período de 2022, que foi horrível e, desse modo, a distribuição de resinas nacionais vai fechar este exercício de 2023 praticamente no zero a zero.
Ricardo Guerreiro Mason: A participação do material importado no mercado sem dúvida aumentou esse ano, seja pelo excesso de oferta e sua competitividade natural, seja pelo aumento de modelos de venda não muito ‘ortodoxos’ como algumas remessas de Manaus. Tudo isso tem, diretamente, um impacto negativo no volume da distribuição. Infelizmente não tenho os dados para precisar os índices de participação, mas não tenho dúvidas sobre o impacto negativo para o material nacional.

Laercio Gonçalves: instabilidade mundial inspira cautela nas compras e reposição de estoques por transformadores.
Laercio Gonçalves: instabilidade mundial inspira cautela nas compras e reposição de estoques por transformadores.

Laercio Gonçalves: É evidente que a revenda, particularmente na região de Manaus, tem impactado negativamente o mercado de PP e PE – isso vale tanto para os distribuidores do material nacional, quanto para a própria Braskem. Estamos sentindo esse crescimento, principalmente desde 2022, e a distribuição vem perdendo participação de mercado desde então. As vendas de oportunidade, embora possam parecer vantajosas em momentos específicos, geram incertezas e podem desestabilizar os negócio, criando flutuações imprevisíveis na oferta e na demanda. Esse cenário não deve piorar em 2024. As instabilidades mundiais enfatizam a importância de uma estratégia de compra de material doméstico com fornecedores estabelecidos. Essa abordagem oferece muito mais estabilidade ao transformador, pois estabelece relações consolidadas com fornecedores locais confiáveis, integrantes de uma cadeia de suprimentos mais previsível.

A oferta interna de determinados grades de PP e PE da Braskem tem estado aquém da demanda. Diante dessa limitação, como sua empresa pretende atuar para continuar atendendo a procura crescente por estes materiais?

Wilson Cataldi: A Piramidal envia à Braskem suas previsões de vendas com um mês de antecedência, o que explica porque não nos ressentimos da escassez ou ausência de determinados grades no nosso estoque. É uma política de abastecimento sem oportunismos e cunho imediato, diferente daqueles transformadores que compram direto da Braskem e esperam para negociar pedidos na última hora do fechamento do mês pela petroquímica, em busca de condições de preços ainda mais favorecidas e querendo grades que, por questões pontuais de produção e/ou demanda, podem não estar disponíveis para entrega naquele momento. No nosso caso, pode acontecer de, eventualmente, faltar no estoque determinado material para entregar em 10 dias, mas em 15 o cliente está com a resina na planta.

Ricardo Guerreiro Mason: A Fortymil não teve problema de disponibilidade de grades da Braskem em geral. O que existe logicamente em um mercado mais competitivo, em que a produção deve ser planejada de forma cada vez mais eficiente, é a necessidade de um planejamento de compras mais assertivo e uma política de estoques mais qualificada. Como trabalhamos com uma diversidade de grades muito grande, esse trabalho já é feito de forma minuciosa pela Fortymil. Já a Braskem tem buscado, através de ferramentas de gestão, melhorar o nível de serviço e a qualidade de atendimento a parceiros estratégicos e que corroboram com um processo de previsão de vendas alinhado à realidade complexa de produção de uma petroquímica possuidora de diversas plantas e centros de distribuição. Imprevistos acontecem e fazem parte de prática de qualquer processo produtivo, mas isso não é novidade nem peculiaridade de tempos mais desafiadores, em que a experiência de minha empresa, atuando há 50 anos no mercado, ajuda e muito. Para aqueles que não se planejam ou preferem atuar de forma mais especulativa e esporádica, sobra o reflexo de suas próprias escolhas, a incerteza de disponibilidade de produto.

Laercio Gonçalves: Não sentimos falta de grades em polipropileno e polietileno, assim como EVA – os itens da Braskem que comercializamos. Nosso contrato dá acesso a um amplo portfólio da empresa. Por sinal, este mostruário abrangente também evidencia um um ponto extremamente negativo da revenda autônoma e tradings de material importado. Como ela atua no cenário da compra por oportunidade, não conta com um portfolio completo de grades, muito menos estável mês a mês.
Sua empresa tem procurado reduzir a dependência do negócio majoritário de poliolefinas. Para isso, tem investido em outras frentes de materiais ligados à cadeia plástica. Para acentuar esta estratégia, o que acha de entrar na distribuição de produtos químicos fora da esfera dos polímeros?

Wilson Cataldi: O caminho é este mesmo. Com este objetivo, constituímos este ano a Unidade de Químicos e Novos Negócios. Ela nos qualifica para atender toda a cadeia plástica, desde a petroquímica à transformação e reciclagem. Á medida em que formos nos familiarizando com o mercado e aprendendo os meandros da comercialização desses materiais auxiliares, a intenção é de ultrapassar a esfera das soluções para resinas e ingressar em insumos como os para nutrição, saúde e cosméticos.

Laercio Gonçalves: Em nossa longa trajetória, temos constantemente procurado diversificar os negócios, com o objetivo de fornecer soluções completas ao mercado. No entanto, é importante destacar que o principal foco do Grupo activas permanece o setor plástico. Estamos empenhados em buscar inovação contínua em produtos e processos, inclusas soluções sustentáveis, a exemplo da oferta de serviços de logística reversa com nossa frota carbono neutro. Neste mesmo sentido, aliás, introduzimos este ano a linha ActCycle, dedicada de início à reciclagem de aparas encomendada por clientes. •

 


 

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