O design agora abrange da fabricação ao descarte

A pressão crescente da economia circular em favor de embalagens reutilizáveis e recicláveis exige...
Fabio Righetto

A pressão crescente da economia circular em favor de embalagens reutilizáveis e recicláveis exige que a formação do designer de embalagens seja reformulada, como vem ocorrendo. O ensino da tecnologia sempre esteve inserido na matriz curricular, como forma de instrumentar o designer a inovar com os olhos no futuro e pés na viabilidade técnica e comercial. No entanto, com a escassez de recursos naturais e a alta contaminação gerada pela sociedade industrial, houve uma mudança de valores e, se antes o conhecimento sobre materiais reciclados bastava para materializar uma consciência ambiental, hoje precisamos expandir estas noções para conceitos mais amplos, a exemplo da análise de ciclo de vida, utilização de recursos do berço ao berço (da natureza e para a natureza) e responsabilidade socioambiental.

Sob o ponto de vista técnico, a formação do designer em relação aos aspectos físico-químicos dos materiais e suas propriedades está muito avançada. Materiais que funcionam como barreiras para odores, luz e contaminação são combinados de forma a acondicionar praticamente qualquer produto. No entanto, esta combinação culmina em alta eficiência em relação à proteção, mas dificulta – e bastante – o descarte correto da embalagem. Afinal, a separação desses materiais muitas vezes inviabiliza o processo de reciclagem.

“A escassez de recursos naturais e a alta contaminação gerada pela sociedade industrial mudaram a formação do designer”

Hoje em dia, a maior dificuldade no ensino do design de embalagens é transmitir a compreensão sistêmica de toda esta tecnologia e cadeia de processos para aliar a excelência na fabricação e uso do produto com a facilidade e eficiência no processo do descarte. Em geral, acabamos com uma situação em que a solução ideal para um dos aspectos compromete o outro e as alternativas que se afiguram como “caminho do meio” resultam ruins para ambos.

Os cursos de design têm incorporado as questões relativas à reciclagem em seus currículos e desafios, fazendo com que os alunos não só assimilem essas noções através de conteúdos, mas pelo contato com empresas e a realidade de mercado, estimulando assim o debate, as pesquisas e novas explorações de soluções de produto, serviço e tecnologia. Desse modo, os cursos deixaram de enxergar o conteúdo ministrado de forma fechada, com tabelas e métricas que devem ser entendidas e decoradas para sua aplicação correta.

Trata-se agora, portanto, de entender a importância do desenvolvimento de uma visão sistêmica que aborde aspectos culturais, humanos, sociais, tecnológicos e ambientais em linha com a viabilidade comercial. Este volume enorme de informações torna o processo de aprendizagem uma corrida contra o tempo. Por isso, hoje falamos que as boas escolas, como a Faculdade Armando Alvares Penteado (FAAP), precisam ensinar o aluno de design a gostar de aprender, pois ele terá de se reinventar continuamente no exercício da profissão.
Já estreitamos os contatos entre o ensino de design e empresas como a Braskem, engajadas num trabalho educacional para formar um pensamento maduro em relação à economia circular. À primeira vista, os alunos poderiam considerar esta imersão na tecnologia do plástico complexa e austera demais. Na realidade, porém, eles demonstram interesse cada vez maior nessas questões.

“Os alunos mostram interesse cada vez maior pelas tecnologias do plástico”

Os cursos de design abordam com racionalismo a questão ambiental do plástico. Ensinamos que o material, em si, não é vilão nem mocinho deste filme. Trata-se de entender que devemos usar os materiais de forma adequada, proporcionando assim o melhor benefício ao sistema produtivo e ao natural. A sabedoria reside na escolha correta do material e dos processos de fabricação de acordo com o uso, tecnologia e sistema de descarte e coleta.

O setor plástico deve ter em mente que, no Brasil, temos uma cultura muito enraizada no uso de materiais adotados em países onde, não raro, o avanço tecnológico se apresenta de outra maneira. Precisamos entender que o que é bom em um lugar não é necessariamente bom em outro. Daí porque é primordial o desenvolvimento de tecnologias que empregam matérias-primas locais ou a concepção de soluções alternativas para atendermos as necessidades tão diversas em um país de dimensões continentais como o nosso.
Além disso, acredito que o caminho é o estímulo à formação qualificada em todas as camadas. Design, Engenharia, Produção, Departamentos Comerciais e outras frentes de trabalho conjunto devem entender a importância da verdadeira inovação em sua complexidade. Afinal, basta um dos elos da corrente ignorar a informação para uma nova cultura, uma nova referência de consumo, não florescer. Nessa trilha, concursos, desafios, ciclos de palestras e hackatons (maratonas de programação que movimentam a área de tecnologia de uma empresa), são exemplos de ações que podem ser intensificadas com a indústria, a academia e a sociedade, para estabelecermos um processo constante de exercício colaborativo com alunos, profissionais e seus segmentos.
Todos ganham e o mundo agradece. •


*Fabio Righetto é diretor das áreas de Artes Plásticas e Engenharia da Faculdade Armando Alvares Penteado.

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