Os números falam por si e são embriagadores: o volume de vendas da categoria ready to drink (RTDs), bebidas pré-misturadas de alto teor alcoólico, ignorou a economia na UTI e saltou por volta de 40% em cinco anos. É o que evidencia o pulo de 78.177,9 milhões de litros em 2013 para 130.587,6 milhões em 2018, atesta rastreamento da consultoria Euromonitor International. Na esfera dos plásticos, esta arrancada bafeja PET, quase absoluto em nichos como catuabas, corotes e uma febre crescente de coquetéis, boa parte na garupa de sabores fora da curva, como milho verde, açaí e blueberry.
RTDs frequentam as goelas dos brasileiros desde o século passado, mas ganham singular visibilidade desde os idos de 2014, infiltrando-se em todas as classes sociais e faixas etárias, em especial gente na flor da idade. Trata-se de uma reação em cadeia deflagrada pelo custo-benefício. Além de contemplados com carga tributária inferior à da cachaça, mérito do teor alcoólico menor, RTDs como catuaba e corotes são mais baratos que cerveja produzida em escala de massa e destilados nacionais como vodcas. Ainda no duelo com cerveja, pesa a preferência de jovens pelos RTDS pela graduação alcoólica maior, embriagando mais rápido em ocasiões como shows e festas universitárias e de rua, desde blocos de carnaval, pancadões e raves. Na mesma trilha, levantamentos da Euromonitor mostram que a renda média de consumidores de 20 a 34 anos recuou 5% ao ano, em termos reais, entre os nada memoráveis 2015 e 2017. Este corte no poder aquisitivo, múltiplos sabores e até a segurança e praticidade oferecidas pelos frascos soprados para a ingestão da bebida em movimento configuram um bar aberto dia e noite para PET mandar ver. Nesta entrevista, Angelica Salado, consultora especializada no setor de bebidas da Euromonitor, percorre essa ascensão ligada no turbo de RTDs e deixa claro a possibilidade deste segmento ganhar proeminência impensável há 10 anos entre os mercados de PET no país.
PET ferve na curtição
“PET domina em catuabas e corotes devido, em especial, à praticidade e segurança superiores à de outros materiais de embalagem, possibilitando a presença da bebida em diferentes tipos de eventos festas e pontos de venda”, interpretam Luis Bittencourt e João Nave, respectivamente gerente de vendas e coordenador de inteligência da Petroquímica Suape (PS), controlada da mexicana Alpek e o único produtor de PET no país integrado no componente ácido tereftálico purificado (PTA). Os dois analistas admitem ainda ser baixa a participação do poliéster no segmento “ice” da categoria de bebidas alcoólicas pré-misturadas e prontas para beber (RTD). “O principal motivo dessa discrição são as características das linhas de envase dos fabricantes”, eles atribuem. “Mas já existem iniciativas de acondicionamento em PET de drinques ‘ready to go’ com apresentação premium, a exemplo da linha de caipiroskas Caipi One da fabricante Natural One”. Nave e Bittencout complementam que RTD são a praia da resina CSD da PQS, méritos de seu primor em processabilidade e resistência química e mecânica.
Alheias à economia em crise, as vendas brasileiras de RTD subiram cerca de 40% entre 2013 e 2018. Por que a crise não afetou essa expansão e como explica a alta intensidade desse crescimento?
Na verdade, apesar do crescimento expressivo em volume total de vendas, a crise também afetou o mercado de RTDs, mas de maneira diferente. Enquanto todas as outras categorias de destilados sofriam para manter o patamar de preço das marcas premium em meio à economia em baixa, os consumidores descobriram os RTDs como alternativa mais barata que o destilado original e com graduação alcoólica semelhante. A grande diferença do impacto da crise nos RTDs, quando comparados aos destilados, é que seus fabricantes foram muito eficientes em alavancar as marcas por meio de comunicação com o consumidor, lançamentos de sabores, tamanhos e tipos de embalagem e, por fim, reinventando o conceito de “bebida acessível”.
Dados relatados em 2016 pela Euromonitor apontam vendas de RTD da ordem de 76.000 litros em 2011 com aumento comedido de 2.000 litros em 2013. Por que o consumo de 2013 a 2018 foi bem mais intenso que neste período anterior?
Entre 2011 e 2013, atestam nossas pesquisas, o Brasil ainda passava por maior estabilidade econômica, com ascensão da classe média, acesso a categorias e produtos inéditos e forte experimentação no mercado de bebidas alcoólicas. A categoria de RTDs, então vivendo um dos seus ciclos de queda em volume de vendas, carecia de apelo para o consumidor final e inovava pouco. Foi só durante a crise desde o final de 2014 que o choque na renda disponível da população obrigou os consumidores a buscarem outras opções e isso acelerou o processo de consolidação dos RTDs.
Quais as perspectivas para RTDs percebidas na conjuntura atual?
Segundo as previsões da Euromonitor International, a performance esperada nos próximos cinco anos para a categoria ainda é positiva, apesar de termos algumas marcas desinvestindo por questões estratégicas internas. Mas outras marcas e tipos de produtos começam a ganhar mais força – é o caso das bebidas mistas à base de gim, principalmente gim tônica pronto para beber.
Corote cai bem e sobe bem
“A palavra corote surgiu quando lançamos a Cachaça Corote em frasco de 500 ml em PET”, explica Rodrigo Marsicano de Souza, coordenador de marketing da indústria de bebidas paulista . “Constamos depois a necessidade de introduzir uma bebida de graduação alcoólica (13,5%) inferior à da cachaça (40%) e assim nasceu a linha Corote Sabores, à base de vodca, e viramos sinônimos da marca, pois os concorrentes comercializam essa bebida sob o nome corote acrescido da marca deles”. A propósito, os sabores dos corotes estendem-se dos convencionais morango e limão aos mais rebuscados,tipo canelinhas e blueberry. Souza acrescenta não haver campeão de vendas, pois a preferência do consumidor varia a cada região. O ponto em comum, deixa patente, é o perfil padrão do bebedor.” É um público jovem, universitário, formador de opinião e em busca de bebida de qualidade com bom custo benefício”. Para o coordenador de marketing, a supremacia de PET neste nicho de vodcas saborizadas provém da sua facilidade de transporte pelo consumidor, “principalmente em eventos”, ele destaca.
Quais as categorias de produtos que compõem o segmento brasileiro de RTD e quais os tipos mais consumidos?
Pela nossa metodologia de pesquisa, dividimos o mercado de RTDs de acordo com a base da bebida: destilados, vinho, malte ou outros alcoóis. Entre 2016 e 2018 vimos quase um equilíbrio entre destilados, vinho e malte, com a consolidação de bebidas à base de gim, catuabas (à base de vinho) e o lançamento de Skol Beats (à base de malte). De 2019 em diante, vemos uma consolidação mais forte da categoria de RTDs à base de vinhos, com a manutenção da performance das catuabas. O que leva cada um destes produtos a ganhar relevância é uma combinação de preço acessível, inovação em sabores e tamanhos/tipos de embalagens.
Por que PET tem forte presença em RTD nas embalagens de corotes e catuaba e tem participação ínfima nas demais categorias de RTD (em especial, bebidas “ice”), estas dominadas por garrafas de vidro e lata?
O padrão de embalagens na categoria de RTDs está diretamente associado ao padrão de embalagens nas outras categorias de alcoólicos em que cada fabricante atua. A própria ocasião de consumo dos RTDs, fora do lar, prioriza embalagens leves, fáceis de carregar e abrir e que ofereçam segurança aos usuários. Ainda existe no Brasil uma percepção de que o vidro é mais premium, um dos fatores responsáveis por manter a fatia de mercado desta embalagem no mercado de RTDs. No entanto, percebemos uma diversificação maior de marcas ocupando diferentes posicionamentos de preço. Isso abre espaço para que sejam explorados diferentes tipos e tamanhos de embalagens – e o plástico rígido tem conseguido aproveitar esta oportunidade.
Catuaba rompe com o passado
Rotulada no passado como bebida de baixo valor agregado, hoje em dia a catuaba tem passe livre em todas as classes sociais e sua aceitação pode ser medida pelo seu nome intitulando blocos de carnaval e festas noturnas. “O perfil majoritário do consumidor de catuaba passou para a faixa de 18 a 34 anos, deslocando o público antes dominante de 40 a 60 anos”, nota Sabryna Carvalho, assessora de marketing da catarinense Vinhos Duelo, há 87 anos na ativa fabricando catuaba, jurubeba, aguardente composta, coquetéis de vinho e bebidas de raízes amargas e não alcoólicas. Para diferenciar sua presença em catuabas, prossegue a executiva, a empresa acrescentou à sua tradicional marca Duelo a marca cativa. “Seu rótulo e limpo e vibrante, sem identidade de gênero e o apelo sexual tão adotado neste segmento”, distingue Sabryna. O reinado de PET em catuabas, ela atribui, é mérito da preservação da qualidade da bebida fornecida pela embalagem. “Mantém todas as características físicas, sabores e aromas da catuaba e é a alternativa que se destaca para locais de grande público como festas, inclusive naquelas que proíbem a venda de garrafas de vidro”.
Quais as suas sugestões para a cadeia de PET tentar ampliar seu espaço em RTDs, além de nichos como catuabas e corotes?
A diversificação nos formatos e tamanhos é um dos principais fatores para posicionamentos de produto e para a diferenciação e expansão de marcas para outras frentes de RTDs. Quanto mais as embalagens conseguirem traduzir os aspectos únicos do produto, maiores as chances de se consolidarem na categoria. Além disso, é importante que a indústria de plásticos esteja preparada para absorver a entrada de pequenos fabricantes e oferecer planos mais acessíveis de volume mínimo – inclusive por iniciativas de co-packaging. É a abreviação de contractor packaging ou contractor packer. Ou seja, empresas que envasam/embalam produtos para clientes. Podem ser especializadas em um ou mais tipos de embalagens e, em geral, são uma alternativa de acesso a novos tipos de recipientes para empresas que não querem ou não têm condições de desenvolver linha própria de envase naquele momento. É uma estratégia interessante e pode abrir uma vantagem competitiva em relação a outros materiais de embalagem. •