A partitura do futuro

As mudanças à frente exigem que o setor plástico saia do lugar comum
As mudanças à frente exigem que o setor plástico saia do lugar comum

A praxe na mídia para fim de ano é promover um arrastão no período, confrontá-lo no plano geral com o do balanço anterior e caçar previsões de figurões para o exercício prestes a rolar. Acontece, porém, que 2023 escapa dessa mesmice se a análise for transposta para o setor plástico – no mundo e no Brasil.

O retrospecto imediato mostra, no palco global, o choque entre os mega excedentes de resinas (poliolefinas, em especial) e a demanda por eles enfraquecida, devido às taxas elevadas de inflação e juros, sufoco agravado na Europa pela energia onerada pela guerra Rússia x Ucrânia. No meio do caminho, a China, maior importador e exportador de matérias-primas, imerge em colapso econômico e alto desemprego, por força do estouro da bolha imobiliária e dívidas públicas. Em contraste com seu PIB condenado a crescer bem menos doravante, a China continua a ampliar o poder de uma capacidade petroquímica que, em 2022, a brindou com autossuficiência em PP e a ser estendida em breve a PE. Com demanda declinante e capacidade bem acima de suas necessidades, tendem a engrossar as exportações mundo afora de resinas por parte da China e dos países que antes nela tinham seu cliente preferencial. A desova desenfreada é piorada pela super sobra norte-americana de PP e PE, intimando produtores locais a exportar com mais agressividade para rodarem com ocupação aceitável. O cenário global pende para fusões e aquisições de petroquímicas de custos mais avariados por não estarem integradas a montante da cadeia ou sem escala e tecnologia em dia.

Deu no que tende a continuar a dar no Brasil, pois em commodities como plásticos ganham os formadores de preços (price makers) e perdem os tomadores (price takers), como nós. 2023 saiu fora do quadrado no mercado nacional pela internação descomunal de PE e PP, a ponto de a participação de importações chegar bem perto da oferta doméstica na foto do consumo. Se a desindustrialização não for estancada e se a petroquímica nacional seguir estagnada, a evolução do consumo brasileiro de transformados está fadada a ser carregada por importações de resinas tipo PP, PE e PVC.

2024 e anos seguintes também trarão à luz dois potenciais abalos sísmicos para a cadeia plástica. Um deles é o movimento de nearshoring: realocação de cadeias produtivas para países perto de mercados consumidores apoiados em acordos de livre comércio. O nearshoring desponta para investidores como alternativa às incertezas da China e hoje floresce, em especial, na Índia e México, ambos os países com fortes lacunas estruturais e instabilidade política, mas com bons ambientes para negócios e próximos dos mercados da Ásia Pacífico e América do Norte. Para o setor plástico do Brasil, o nearshoring exige o traçado de uma estratégia para atrair investimentos com base na magnitude de seu mercado numa região afastada dos centros top globais de consumo.

O outro ponto nevrálgico para o futuro do plástico é o embate em torno da sua sustentabilidade. O setor não sabe aproveitar as inúmeras chances para mostrar as inúmeras contribuições das resinas virgens ao padrão de vida e ao desenvolvimento sustentável. Brand owners renegam o plástico como poluidor, como se tivesse vida própria e não fosse descartado errado por seus usuários, consumidores finais alheios à conscientização ambiental. Como não se pode repreender o cliente, culpa-se o plástico de uso único. É como se brand owners e opinião pública teimassem em ouvir só o que lhes interessa por headphones em vez de escutar a trilha sonora da realidade que, aliás, não existiria sem o plástico. É essa partitura que sua indústria precisa aprender a ler e tocar, •

Compartilhe esta notícia:

Deixe um comentário