A contraprova do plástico

Em tempos de banimento de itens de plástico, como acontece no Reino Unido, em países da União Europeia...

Em tempos de banimento de itens de plástico, como acontece no Reino Unido, em países da União Europeia e cidades brasileiras como Rio e São Paulo, é fundamental analisar de forma mais crítica e sensata se vilanizar o produto é a melhor solução para problemas ambientais. Vale considerar que os plásticos podem auxiliar a sociedade em soluções para as mudanças climáticas. Nesse sentido, a luta contra a poluição plástica não pode virar uma guerra contra o material em si.

Yuki Kabe Braskem
Yuki Kabe

Na construção civil, a invenção do cimento e do concreto revolucionou a forma como erigimos edificações. Entretanto, as tecnologias atuais de produção de cimento são grandes emissoras de gases do efeito estufa e a troca, nas áreas não estruturais, do concreto por outros materiais, em especial o plástico, reduz os custos e o impacto ambiental das obras.
No setor automobilístico, o emprego do plástico deixa o veículo mais leve, reduzindo o gasto de combustível e a queima de gases. Nas embalagens, os plásticos deflagraram uma revolução. Seu uso diminuiu o desperdício de alimentos e a relação entre volume de produto e de embalagem de 70% x 30% para 97% x 3%, respectivamente. Não podem passar em branco os benefícios proporcionados à área da saúde. O plástico tem sido fundamental para evitar contaminação, sendo utilizado em artigos que vão de bolsas de sangue a máscaras de proteção facial.

Mas como garantir um futuro com plástico e o equilíbrio ambiental? A desinformação é um grande problema, como exemplificam as famosas “ilhas de plástico no meio do Pacífico ou no mar do Caribe”. Servem sempre de ilustração sobre o que é despejado diariamente nos oceanos. Na realidade, elas resultam, na maior parte, de grandes fenômenos naturais que arrastaram lixo para os mares, como o furacão Katrina nos EUA em 2005 e os tsunamis no sudeste asiático em 2004 e Japão em 2011.

A presença de plásticos pós-consumo no meio ambiente é óbvio reflexo de ineficiência na gestão de resíduos, mas a origem do problema é muito mais complexa, com particularidades em cada canto do mundo. O Haiti, por exemplo, sofre com quase nenhuma infraestrutura de coleta de lixo e está situado na rota de furacões que, junto com a chuva, levam o refugo ao oceano. Lagos, maior cidade da Nigéria, comporta mais de 20 milhões de habitantes e não tem água encanada, razão do seu exorbitante consumo do líquido em garrafa PET. Já a Indonésia, constituída por quase 20 mil ilhas, encara o desafio de planejar o gerenciamento de resíduos para regiões geográficas muito distintas entre si. Por seu turno, o Chile convive com o mesmo problema durante o período de degelo que, aliado às mudanças climáticas, arrasta os rejeitos para o oceano. E na Europa, a indústria turística, um manancial de divisas, é um dos maiores geradores de resíduos plásticos.

O cenário converge para a necessidade de se acentuar os investimentos em pesquisa, em prol de um diagnóstico mais preciso, sem dados discrepantes. Precisamos saber o tamanho real do desafio e a eficácia das medidas mitigatórias para possibilitar a concepção de políticas públicas e não endossar uma luta contra algo que nos é favorável, caso do plástico. Esse processo pode consumir algum tempo mas, ainda assim, não é preciso esperar que isso aconteça. Além de adotar práticas de economia circular, a indústria mundial do plástico está se movimentando para gerar estatísticas, relatórios e guias para criadores de políticas públicas. Uma referência é sua adesão à iniciativa internacional Operation Clean Sweep, dedicada a reduzir a incidência de partículas de plástico no meio ambiente. Já o Plastic Leak Project, capitaneado pela consultoria europeia Quantis, visa reunir um grupo de interessados (multistakeholders) para criar uma metodologia de quantificação aplicável em níveis municipal e nacional. A intenção é identificar a perda de plástico em setores da indústria e desenvolver ações mitigatórias. O projeto já analisa dados dos setores de embalagem, têxtil e pneus. Como estudo de caso, uma empresa europeia atuante em laticínios identificou que a venda de leite em pó para a Nigéria, China e Bangladesh é responsável pela perda de 4% do volume total de plásticos utilizados e está definindo um novo tipo de embalagem.

Definir ações como esta só é possível a partir de uma metodologia consensual. Nem sempre o plástico será a melhor alternativa, mas, para muitos casos, ele é a solução ambiental mais viável. Não é possível pensar em um futuro sustentável sem o plástico.

*Yuki Kabe é especialista da Braskem em avaliação de ciclo de vida

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