Brasil: embalagens flexíveis marcaram passo em 2022

Continuidade da carestia iniciada em 2021 travou evolução do setor
Flexíveis para higiene pessoal: encolhimento drástico do mercado em 2022.
Flexíveis para higiene pessoal: encolhimento drástico do mercado em 2022.

Com os flancos expostos à Selic de 13,75%, inflação em brasa e dólar pregado na faixa de R$ 5,00, a indústria de embalagens flexíveis sentiu um gosto de mais do mesmo ao fechar o balanço de 2022. Em pesquisa encomendada à consultoria MaxiQuim pela Associação Brasileira da Indústria de Embalagens Plásticas Flexíveis (Abief), o clima de reprise permeou a maioria dos indicadores do ano passado versus 2021, além de confirmar a frase do escritor Luis Ruffato de que, no Brasil, o passado nunca passa. Cruzado os devidos dados, o consumo per capita de 9,76 kg de embalagens flexíveis aferido em 2022 configura o exato volume registrado pelo estudo em 2010.

A produção de embalagens flexíveis pairou em 2.167 milhões de toneladas no último período, muito de leve acima das 2.139 milhões cravadas em 2021 e das 2.130 milhões em 2020. O setor faturou R$39,8 bilhões em 2022, atrás da receita anterior de R$43,6 bilhões. Do volume produzido em 2022, um naco de 80% foi abocanhado por embalagens: 1.725 milhão de toneladas ou apenas 1.000 toneladas acima do saldo anterior. A seguir entra o quinhão dos flexíveis no agronegócio, com 247.000 toneladas produzidas no exercício passado contra 229.000 em 2021. Por fim, sacos/sacolas respondem pelo percentual restante, acusando produção de 194.000 toneladas em 2022, bem perto das 185.000 precedentes. Ao tomar o volume de produção de embalagens flexíveis por aplicação, a pesquisa da MaxiQuim reserva 284.000 toneladas para shrink, implicando subida de 3% em 2022 sobre o saldo anterior. Em stretch, foram 210.000 toneladas ou -2% diante do resultado de 2021. Já sacos e sacolas acusaram, com  já mencionada produção de 194.000 toneladas, uma alta de 5% sobre o período precedente. O cômputo fecha com a produção de 1.478.000 toneladas para os demais filmes, quantidade equivalente a um modesto avanço de 2% em 2022 sobre 2021.

O consumo aparente de embalagens flexíveis foi, em essência, um repeteco: 2.106 milhões de toneladas no ano passado, mísero progresso de 0,8% sobre o saldo de 2021. Na partilha de participação da demanda por segmentos, alimentos, para variar, responderam pela fatia do leão: 42% ou 879.000 toneladas do consumo aparente no ano passado, atesta o pente-fino da Abief. Já o segmento industrial, embolsou participação de 2% na demanda e fatia de 351.000 toneladas no consumo aparente. Agronegócio assinou parcela de 7% na demanda e 241.000 toneladas no consumo aparente, enquanto o segmento de bebidas deteve participação de 9% na demanda e cravou 211.000 toneladas na segmentação do consumo aparente. Por sua vez, sacos e sacolas configuraram participação na demanda de 2% e assinaram 183.000 toneladas em  seu quinhão no consumo aparente. Entre os dados de participações deploráveis na demanda em 2022, o segmento de limpeza doméstica levou 0% em 2022, assumindo fatia de 107.000 toneladas no consumo aparente, enquanto o segmento de higiene pessoal acusou redução de 9% em sua participação na demanda em 2022 versus 2021, comparecendo com 70.000 toneladas no total do consumo aparente. Por fim, o segmento de pet food penou com queda de 3% na sua fatia na demanda das embalagens flexíveis em 2022, respondendo por 35.000 toneladas do consumo aparente e, para completar, redutos diversos sofreram recuo de 22% em sua participação da demanda, contabilizando 28.000 toneladas no consumo aparente do último período.

Quanto à no ano passado, com base no consumo aparente de 2.106 milhões de toneladas, o levantamento atribui a alimentos participação de 42%, industrial, 17%; agronegócio, 11%; bebidas, 1%; sacos e sacolas, 9%; limpeza doméstica, 5%; higiene pessoal,3%; pet food, 2% e outros, 1%.

Um afago na sustentabilidade: o uso de reciclado em flexíveis somou 114.000 toneladas em 2022, salto de 9% sobre o resultado anterior. Sua participação correspondeu a 5% da produção de 2.167 milhões de toneladas de embalagens flexíveis no ano passado, volume que, aliás, traduz ocupação de 62% da capacidade total de 3.500 milhões de t/a dessa indústria transformadora no país.

A estabilidade nos resultados também transpirou da balança comercial. As exportações de embalagens flexíveis fecharam em 71.000 toneladas em 2022 ou meras 3.000 a menos que em 2021 e, quanto às importações, somaram 131.000 toneladas no ano passado contra 125.000 no período anterior.

No cercado das principais resinas para a produção de 2.167milhões de toneladas de flexíveis, PEBD e PEBDL  configuraram uso de 1.595 milhão de toneladas em 2022 ou 0,4% acima do saldo anterior. Já PP respondeu por 359.000 toneladas ou 3,5% sobre o volume computado em 2021.Por fim, PEAD compareceu com 213.000 toneladas ou 4,1% sobre o saldo precedente. A propósito, a importação brasileira de poliolefinas totalizou 1.555 milhão de toneladas no ano passado, volume equiparável a um complexo e meio de PE de capacidade de classe mundial.

Entrevista

“As importações de PP e PE para flexíveis não devem diminuir”

A carestia está fustigando a indústria de embalagens flexíveis, um dos segmentos da transformação de plástico mais resistentes aos solavancos da economia. Em paralelo, o reduto acusa o impacto da concorrência movida por resinas importadas pelo porto de Manaus e remetidas sem respaldo legal da Zona Franca para o restante do mercado nacional, expõe nesta entrevista Rogério Mani, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Embalagens Plásticas Flexíveis (Abief).

Rogério Mani
Mani: sem espaço para sobretaxas antidumping para resinas importadas.

12 anos depois, o consumo per capita de embalagens flexíveis iguala o de 2010. Como avalia esta volta ao passado?

Não acredito que o consumo per capita de embalagens tenha  estagnado ou retrocedido, apesar de todos os problemas socioeconômico que enfrentamos no Brasil. No meu radar e pelas movimentações de investimentos, o consumo per capita de embalagens cresceu, no mundo e aqui. Explico: ele cresce em unidades e não em peso. Se considerarmos que, há mais de 10 anos, a indústria emprega tecnologias para diminuir o peso e inovar os designs nas embalagens, é correto cravar que estamos aumentando os volumes em unidades e não em peso. O desafio será estudar esta métrica para obtermos o correspondente  balanço do consumo per capita.

Como reparte por porte de empresa a capacidade brasileira de 3,5 milhões de t/a de embalagens flexíveis e qual a sua estimativa da quantidade de indústrias empresas do setor?

Pelos números oficiais do governo (RAIS 2021), temos por volta de 4.000 indústrias de embalagens plásticas flexíveis no Brasil. Desse total 75% cabem a micro e pequenas empresas; 23% para médias e somente 2% para aquelas consideradas grandes. Nesses índices tomamos como referência o número de colaboradores.

A pesquisa da MaxiQuim indica que 1.555 milhões de toneladas de poliolefinas importadas foram utilizadas em 2022 na produção nacional de transformados como flexíveis. Qual a fatia desse volume total internada por Manaus? É o porto que lidera os desembarques de PP e PE importados?

Em 2022 foram internados via Manaus aproximadamente 38% das poliolefinas importadas pelo Brasil, sendo o material mais representativo os PEs, com participação de 42%, e PP deteve parcela de 25%. No caso de PEs, o porto de Manaus lidera os desembarques no país, porém para PP a liderança fica com os ancoradouros no sul do país, principalmente o porto catarinense de Itajaí.

Com o retorno da alíquota de importação à taxa de 11,2%, as importações de poliolefinas para flexíveis tendem a recuar daqui por diante ou, mesmo num ambiente recessivo, esses desembarques devem se intensificar sob pressão da superoferta mundial de PP e PE e da produção hoje insuficiente de determinados materiais pela Braskem?

Não acredito que os volumes que estão entrando de PP e PE importados tendam a diminuir enquanto houver demanda mais fraca e maior oferta globalmente. Também vale ressaltar como ponto importante que Manaus tem um peso significativo nas importações de PE. O mercado brasileiro é dinâmico e se mostra totalmente vulnerável a variáveis além do âmbito da oferta e demanda locais. O quadro muda muito rapidamente por forças exógenas, como sentimos nos últimos anos. Precisamos entender que o comércio global mudou e continuará em transformação. Também é muito importante salientar que o equilíbrio sempre será prudente.

O que acha da hipótese de o governo brasileiro abrir investigação tendo em vista sancionar sobretaxa antidumping para PE dos EUA e/ou China?

Seria mais uma ação para achatar a já combalida competitividade interna. Creio, definitivamente, que toda a cadeia produtiva do plástico deve sentar à mesa e discutir quais são os problemas na base para sermos competitivos, não há mais espaço para práticas que gerem mais aumentos de custo. Também já vimos que as indústrias estão se movimentando rapidamente atrás de competitividade, Manaus que não nos deixa mentir.

Qual a estimada participação dos transformadores da Zona Franca na produção e vendas nacionais de flexíveis em 2022? Compare essa participação com a de 10 anos atrás.

Estimamos hoje participação de 19% no caso de PEs e 6% em PP no total da produção nacional de flexíveis. Seguramente, saltamos em 10 anos da parcela de 5% para 19% nos PEs e de 4% para 10% no PP. Nos últimos anos, a Zona Franca é a região que mais tem crescido no Brasil em volumes de flexíveis produzidos proporcionalmente.

Diante da concorrência movida no mercado nacional pelas indústrias da Zona Franca em filmes de baixo valor agregado (shrink, stretch, sacos/sacolas etc) , quais as perspectivas para a sobrevida de concorrentes no mercado interno sediados fora de Manaus?

“Se o cenário não mudar e não houver lei impedindo que mais empresas de flexíveis se instalem em Manaus, muitas acabarão morrendo ou se tornando apenas convertedoras”

Podemos verificar que há uma mudança importante no cenário nacional, principalmente para os segmentos de produtos mencionados na pergunta. As indústrias de transformação nas demais regiões deverão sofrer muito mais, pois fica muito difícil competir com as sediadas em Manaus. Afinal, a questão envolve uma engenharia tributária legal que faz com que o produto transformado na Zona Franca seja muito mais competitivo que o fabricado fora dali. Se o cenário não mudar e não houver lei impedindo que mais empresas do setor de flexíveis se instalem em Manaus, muitas acabarão morrendo ou se tornando somente convertedoras. Mantido o quadro atual e sem vetos legais, mais empresas tendem a instalar plantas de flexíveis em Manaus.

 

A penetração nacional dos filmes de baixo valor agregado produzidos em Manaus com régios incentivos fiscais deve reduzir a tradicional prática de revenda de excedente de PP e PE por grandes transformadores de flexíveis para concorrentes menores fora da Zona Franca em filmes de baixo valor agregado?

Não posso generalizar, mas o que mais atrapalha, além das operações normais e legais de produção, é a prática ilegal de revenda dessas resinas importadas por Manaus  para o resto do Brasil. Se não houver uma intervenção rígida e imediata na fiscalização por parte da Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa), ficará difícil conter essa prática.  A entidade deveria ter como seu principal meio de desenvolvimento cadeias produtivas que fazem sentido com sua biodiversidade e, daquelas consolidadas no polo em sua essência – motos, linha branca, televisores etc. Há uma preocupação latente com a situação atual entre a maioria dos transformadores de flexíveis  espalhados pelo país.

A MaxiQuim fixa em 62% o índice de ocupação da capacidade instalada para a indústria de embalagens flexíveis no Brasil em 2022. Quais os tipos específicos de filmes e embalagens que rodaram com maior nível de ociosidade em 2022?

Aqui precisamos fazer o mesmo exercício realizado em relação ao consumo per capita. O índice de ocupação atual do setor está na casa dos 78% e pelo momento que atravessamos não é um nível de todo ruim. Muitos investimentos foram realizados nos últimos dois anos, invariavelmente para corresponder às novas demandas de embalagens com menor peso. Portanto, vamos precisar de mais máquinas e equipamentos para atender a nova ordem do dia: menor peso nas embalagens e maior utilização de conteúdo reciclado.

Por que indústrias de bens essenciais de consumo imediato, como produtos de limpeza e de higiene pessoal e pet food, formaram entre os segmentos de flexíveis de demanda mais prejudicada em 2022?

Quando a renda cai as necessidades de consumo se alteram com rapidez. As pessoas estão preocupadas primeiro em se alimentar. Não há outro fator prioritário em tempos difíceis de inflação, juros altos e diminuição na renda das famílias.

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