Ainda no berçário da petroquímica mundial, a reciclagem química pinta feito um salvo conduto para os polímeros sob a pregação da sustentabilidade. Mas o caminho pela frente é pedregoso e repleto de valas, a exemplo da busca de maior purificação dos resíduos encaminhados, por demais complexos para a tradicional reciclagem mecânica, e de uma infraestrutura de suprimento regular de refugo condizente com grandes escalas de plásticos quimicamente recuperados. Essas fragilidades ainda a descoberto não esmorecem o ânimo dos empreendedores da cadeia plástica, que se esforçam por viabilizar a reciclagem química como forma de silenciar os detratores de um material 100% reutilizável e passível de garantir o desempenho acalentado mesmo sendo empregado em quantidades cada vez mais reduzidas. No Brasil, dadas suas condições sócio-econômicas, culturais e estruturais, a reciclagem química de polímeros com envergadura ainda não emplacou, mas processos tradicionais desse tipo de recuperação de materiais são praticados sem alarde no país em operações diminutas, caso de pirólise restaurando poliolefinas de flexíveis pós-consumo, e da hidrólise fazendo o mesmo com plásticos de engenharia. Esta última via, por sinal, é a mais antiga na ativa no Brasil, embora sua produção de resinas nobres hoje praticamente inexista. O advérbio procede apenas pelas atividades do Grupo Solvay, descritas aqui na entrevista de Eduardo Girote, gerente de marketing do negócio de poliamidas (PA) e intermediários no país.
1Poderia descrever a atividade de reciclagem por hidrólise de PA pós-consumo, a capacidade nominal, desde quando opera e qual o produto recuperado ali gerado?
Temos na nossa unidade de Santo André (SP) uma polimerização descontínua que é responsável pela reciclagem química de PA 6.6 sem carga, gerada a partir do refugo interno das linhas de produção têxtil. Essa operação despolimeriza e repolimeriza a resina. Isso contempla o polímero resultante com propriedades muito próximas às de um polímero virgem. Essa unidade opera há mais de 40 anos (início coma Rhodia) e roda com capacidade acima de 300 t/ por mês e o polímero recuperado é destinado a uma série de aplicações têxteis e industriais internas. A propósito, este contexto fica mais compreensível com uma fundamentação histórica. Como parte da negociação internacional com a Basf, o Grupo Solvay vendeu o negócio no Brasil de compostos de engenharia, mas manteve as produções de intermediários de PA em Paulínia (SP) e as polimerizações de PA 6.6, em Santo André (SP), operações hoje utilizadas para a geração de polímeros para uso cativo em linhas de produção têxtil, fios industriais e fibras.
2Qual a origem do resíduo de PA 6.6 submetido à reciclagem química? E mais: devido ao apelo da sustentabilidade, como a Solvay avalia ampliar o volume desse material recuperado?
Trata-se de refugo pós-industrial gerado no próprio site de Santo André. Não há reciclagem de PA6.6 com fibra ou outro tipo de reforço e carga, apenas o polímero. Sim, o grupo pretende ampliar a fonte de PA 6.6 para reciclagem e estamos trabalhando com projetos que nos permitam reciclar pós-consumo, desde que seja PA 6.6 e sem mistura com outros materiais. Um dos projetos consiste no conceito de eco-design de uniformes, escolares e profissionais, fabricados 100% em PA 6.6. No fim de vida útil, esse refugo poderá retornar para a empresa, ser reciclado e potencialmente retornar à condição de um tecido.
3O Brasil pratica apenas a reciclagem mecânica de PA 6 ou 6.6 e a a reciclagem por hidrólise não atrai recicladores no país, já que proporciona material de maior grau de pureza mas a custos maiores. O Grupo Solvay cogita sair desse isolamento e abarcar também a reciclagem mecânica?
O grupo já possui essa unidade de reciclagem química há muitos anos (incorporada ao comprar mundialmente a Rhodia). Dada a qualidade superior do polímero produzido a partir desse processo de reciclagem química, um dos nossos objetivos é o de aumentar as fontes de insumos e a nossa capacidade de produção para continuar atendendo mercados que demandam reciclados com alta qualidade e consistência de propriedades.•