Após cincos anos seguidos de queda, a construção civil emergiu do vermelho avançando 0,4% no segundo trimestre de 2019, pavimentando o caminho para o PIB do setor fechar com expansão de 2% no último período. No embalo da esboçada virada, o consenso dos analistas cita inflação e juros baixos e a perda de rentabilidade dos investimentos rentistas para a construção crescer 3% em 2020, puxada por lançamentos imobiliários. As boas novas para o canteiro de obras bafejam o maior campo de PVC, a indústria de tubos e conexões, após o prolongado inverno que, por 20 trimestres, se abateu sobre sua capacidade instalada. A grande imprensa mantém a praxe de sentir o pulso da conjuntura em tubos vinílicos ouvindo apenas as duas marcas líderes, Tigre e Amanco. Mas é no concorrido escalão dos fabricantes ensanduichados entre os graúdos do topo e os miúdos do térreo da pirâmide que a realidade do mercado aparece em alta resolução, como demonstra nesta entrevista Marcos Batista Viana, gerente comercial da paranaense Pevesul, há 33 anos ativo fixo da classe média da transformação nacional de tubos e conexões de PVC.
Qual a sua estimativa do aumento acumulado de maio a dezembro de 2019 nos preços internos de PVC para fabricantes de tubos de médio porte, caso da Pevesul, no rastro do desastre geológico em Alagoas que afetou a produção da cadeia soda-cloro da Braskem?
O incidente em Maceió teve impacto não apenas nos preços, mas nas entregas da resina com dificuldades em sua produção. Estimo o reajuste de maio a dezembro último em torno de 8% a 10%, o que é bastante no contexto de uma economia retraída, inflação desacelerada e obras, em especial públicas, praticamente estagnadas. Dessa forma, não foi possível o repasse do aumento integral no custo da resina por transformadores de tubos da classe média como nós. A duras penas, tivemos que absorver grande parte desses reajustes, diríamos algo entre 4% e 6%.
Diante do encolhimento dos lançamentos prediais e reformas residenciais em 2019, quais as mudanças notadas nas políticas de preços dos líderes em tubos de PVC para desovar sua produção sob demanda em fogo baixo? E quais os efeitos disso na competitividade de concorrentes de médio porte?
Esta questão foi muito impactante em nosso segmento, pois as empresas líderes também sofreram com as mesmas (se não maiores) retrações de consumo/vendas. Assim, elas tiveram que, digamos, descer para outro patamar de negócios, atingindo um público/segmento não habitual em seu raio de alcance. Em outras palavras, para os fabricantes de tubos no meio da pirâmide, a situação lembra aquela frase “mexeram no meu queijo”. Ou seja, as marcas maiores ingressaram em redutos onde poucas vezes tínhamos concorrência direta com elas. Em decorrência, indústrias do escalão intermediário dos tubos, como a nossa, tiveram suas margens ainda mais achatadas e, então, o que já não estava bom, ficou ainda pior. Prova disso foi o fechamento de algumas unidades e até de empresas de tubos e conexões de vinil. Como outra referência desse desarranjo, veja que em regiões como Mato Grosso do Sul e interior de São Paulo, onde as empresas líderes reduziram drasticamente o preço do tubo para esgoto de 100mm de diâmetro, o carro-chefe do nosso ramo e trabalhando com margem negativa para desovar estoques de produtos na praça, enfrentar a disputa com marcas menores e tentar ampliar sua participação de mercado.
Nos últimos anos, a Tigre, um dos gigantes em tubos de PVC, entrou em metais sanitários e torneiras de plástico, fechou sua fábrica de tubos na Bahia e formou um tipo de aliança comercial inédita no seu setor com a metalúrgica Gerdau e a cimenteira Votorantim. Como as indústrias menores e médias de tubos de PVC interpretam esses movimentos?
São segmentos interessantes, estes de tubos e conexões, cimento e aço. Numa avaliação fria e calculista, tratam-se de três produtos considerados commodities. Afinal, desde que sejam fabricados conforme as normas que regulam seu segmento, não podem ser diferentes. Ou seja, se o meu tubo de esgoto com 100mm de diâmetro é fabricado em conformidade com a norma, estando aprovado pelas diretrizes do Programa Brasileiro da Qualidade e Produtividade do Habitat (PBQP-H) para a construção civil, ele não pode ser diferente de um tubo da Tigre da mesma norma, bitola e diâmetro, não é? A mesma reflexão vale para um vergalhão de aço de ½ polegada , ou uma saca de cimento portland CP II F- 32. Ou seja, se os produtos estão dentro das normas, então são tecnicamente iguais. É nesta hora que, em busca de diferenciação, grandes fabricantes de tubos esforçam-se para que a venda seja movida pela marca e não apenas pela qualidade, pois esta não é mais o diferencial. O tubo está enquadrado na norma e aprovado pelos canais competentes? Então é igual a qualquer outro com as mesmas credenciais. Em função disto, acredito que a Tigre tenha investido em outras linhas, para não ficar no terreno das commodities, já que produtos como uma torneira plástica e itens de metal sanitário, inclusive por integrarem a fase de acabamento, destoam dos tubos e conexões, vergalhão e cimento, que ficam sem visibilidade, escondidos na obra.
Como reparte as vendas de tubos e conexões da Pevesul em 2019 entre os segmentos predial, de irrigação e infraestrutura? Qual a perspectiva para suas vendas em 2020?
A Pevesul obteve, graças a Deus, um crescimento significativo em 2019, se comparado a 2018. Aumentou mais de 11% na produção e quase o mesmo índice no faturamento, já descontada a inflação. Apesar da retração do mercado, tivemos um desempenho melhor na linha de produtos para infraestrutura, acredito que pela qualidade final, atendimento pontual (fator primordial numa obra) e pela aprovação do nosso trabalho por novos clientes. Na divisão das nossas vendas em 2018, a linha de infraestrutura respondeu por 11%, a predial por 68% e a de irrigação, por 21%. No ano passado, a infraestrutura mobilizou 14% das vendas da Pevesul; a predial, 64% e produtos para irrigação detiveram 22% do movimento.
Para 2020, nossa estimativa é de um crescimento um pouco maior na área de infraestrutura, a partir das anunciadas retomadas dos investimentos, incutindo novo ânimo no setor. A linha predial é muito competitiva e complicada, pois seu mercado, infelizmente, busca preço baixo, não dando muita atenção ou se preocupando com a qualidade do produto. Quanto à área de irrigação, constatamos um campo bem aberto para atuar, mas precisaria dispor da mesma tratativa vigente para construção civil no PBQP, já que estes produtos não são submetidos à avaliação.
Quais os seus tubos, conexões e acessórios mais vendidos em 2019 e quais as novidades engatilhadas para este ano?
O crescimento melhor na área de infraestrutura também é mérito da aceitação dos tubos da linha Coletor de Esgoto – investimos com o início da produção do tubo coletor ocre de 200mm e do tubo DEFOFO DN 150. Para este ano, estamos avaliando introduzir o complemento dessas duas linhas bem como a linha de dutos DEFOFO para irrigação até os diâmetros de 300mm.
Em quais regiões do país a Pevesul vende seus tubos e conexões e onde planeja entrar em 2020?
Hoje em dia, atuamos no Sul, Sudeste e Centro-Oeste, mas não cobrimos essas regiões por completo. No Rio Grande do Sul, por exemplo, atuamos até Porto Alegre; em Minas, até Belo Horizonte; no Rio, apenas na área de Volta Redonda/Resende e, em São Paulo, dificuldades logísticas impedem nossa entrada na capital. Quanto às demais localidades e regiões, estão fora do nosso alcance devido à distância e frete caríssimo.Temos como aumentar a produção, mas queremos priorizar o atendimento de mercados mais próximos da empresa. Ou seja, fazer primeiro o dever de casa antes de partir para voos mais altos. No ano passado, começamos a atuar no Mato Grosso, apenas nas regiões de Barra do Garças e Rondonópolis. Estamos tendo bom retorno e, de imediato, não planejamos abrir novas áreas, apenas complementar onde já estamos e reforçá-las. O que mais dificulta o nosso avanço é a concorrência com marcas não homologadas de produtos totalmente fora das normas técnicas, sem qualidade alguma.
Qual a atual capacidade instalada da Pevesul e com qual nível de ocupação operou em 2019 e em 2018?
Nossa capacidade instalada para tubos e conexões é de 1.000t/mês. Operamos em 2019 com 50% a 55% de ocupação contra 40% a 45%, em 2018. Antes da recessão de 2015-2016, nosso nível de ocupação chegava a 75%. Para este ano, esperamos no mínimo manter o crescimento aferido em 2019 até porque analistas como FMI projetam avanço de 3,3% a 3,4% do PIB de 2020. Como também houve o fechamento de algumas empresas e unidades de tubos e conexões, é provável que haja espaço para a Pevesul expandir suas vendas. No entanto, reitero, o que nosso setor precisa para evoluir com solidez é de uma fiscalização capaz de inibir fabricantes que não seguem a regulamentação; isto também faria o mercado ficar mais qualificado. •