Câmbio e o pior dos mundos na economia do país empurram a cadeia do plástico para as exportações, um terreno já apalpado com vigor por polietileno e polipropileno nacionais, mas ainda por ser prospectado a contento por máquinas e artefatos transformados. Apesar da imagem externa do Brasil, de um país mau pagador e com contas públicas que não fecham, o mercado mundial está sempre receptivo a ofertas de produtos acessíveis e diferenciados, venham de onde vierem, deixa claro nesta entrevista Wagner Delarovera Pinto, dirigente da consultoria Maxitrade. Com milhagem platinum no comércio exterior de transformados, ele continua no ramo atuando na Europa e EUA, dois mercados vistos por ele como mais próximos dos transformadores brasileiros do que eles imaginam, mas desde que se preparem.
PR – Com base na sua bagagem internacional, qual a noção que os mercados da Europa e EUA têm hoje da indústria do plástico no Brasil?
Delarovera – Em termos de resinas, considerando a presença comercial e física (no México e EUA) de alguns produtores brasileiros, já existe um conhecimento a respeito, ao nível de marca do Brasil, desenvolvido no mercado norte-americano. A Europa, por seu turno, é suprida por produtores locais de resinas, além de grande volume importado do Oriente Médio e restante da Ásia. Quanto aos bens de capital brasileiros para transformação de plástico, ainda possuem baixa penetração na América do Norte e Europa. São mercados dominados pelos equipamentos locais, de alta sofisticação, e pelos chineses, em geral fortes nos segmentos de menor valor agregado. Já a indústria brasileira de transformação possui produtos reconhecidos na Europa e EUA como os filmes biorientados de polipropileno (BOPP) e poliéster (BOPET), masterbatches ou utensílios domésticos. Mas, no cômputo geral, os cerca de US$ 400 milhões que o Brasil exporta anualmente em transformados para esses dois destinos ainda são um valor inexpressivo frente às suas bilionárias importações.
PR – A visão da indústria brasileira do plástico na Europa e EUA é basicamente a mesma que percebia há 10 anos ou alguma coisa mudou de lá pra cá?
Delarovera – O movimento de internacionalização de empresas do setor plástico brasileiro alterou-se significativamente na última década. A começar pela forte presença da Braskem nos EUA e México. Além do mais, vemos transformadores, como Mega e FFS nos EUA, abrindo escritórios comerciais e centros de distribuição (CDs) no exterior. Também há indústrias fazendo acordos comerciais ou adquirindo empresas nos EUA, caso da incorporação de uma transformadora de filmes da Dow pelo Valgroup. A propósito, vejo uma mudança na capacidade empresarial e gerencial dos dirigentes da transformação, muitas vezes, fortalecida pelas ações pró-internacionalização por parte da segunda e terceira gerações de controladores.Nessa mesma trilha, tradicionais mercados sul-americanos das exportações brasileiras já atingiram um volume cujo salto para outro patamar envolveria outros formatos de internacionalização (CD locais, compra de empresas locais, p.ex.) e o enfrentamento de entraves como a restrição à importação vigente na Argentina e Venezuela, custos logísticos elevados como os do Chile e Peru e, a exemplo da Colômbia, desvalorização acentuada da moeda. Daí a percepção de melhores resultados em mercados maduros, a exemplo dos EUA e Europa, efeito do seu poder aquisitivo, baixas tarifas de importação, estabilidade da moeda, comércio exterior facilitado e custos logísticos muitas vezes inferiores aos da América do Sul.
PR – Quais as premissas básicas para transformadores brasileiros cultivarem a contento a demanda na Europa e EUA?
Delarovera – Para uma estratégia bem sucedida a longo prazo nesses dois mercados, é preciso ser uma empresa “local”. Ou seja, devidamente instalada fiscalmente e fisicamente. Sem isso, os resultados obtidos serão pequenos e frágeis diante de uma competição cada vez mais expressiva. As grandes multinacionais privilegiam fornecedores globais, mas percebo relutâncias em vários transformadores brasileiros quanto a acompanhar seus clientes mundo afora, seja através de licitações para exportação ou mesmo para instalação de unidades no exterior.
PR – A indústria brasileira do plástico tem sabido trabalhar sua imagem no exterior?
Delarovera – O trabalho da imagem requer ações contínuas e de longo prazo. É o caso do Programa ThinkPlastic, em vigor há mais de 12 anos e com inúmeros eventos (feiras, projetos vendedores etc) realizados na Europa e EUA, além de envolver um efetivo acima de 400 importadores em rodadas de negócios e superior a 50 jornalistas internacionais em ações coordenadas em prol da imagem dos transformados brasileiros. A chegada ao país de múltis transformadoras de plástico também contribui para difundir a imagem do setor no exterior, na medida em que se intensificam as transações intercompany e projetos conjuntos são implementados. Nos EUA e em maior intensidade na Europa, o tema da sustentabilidade na indústria do plástico tem impactado nos hábitos de compra da população. As empresas de transformação, produtores de máquinas e de resinas implementam constantemente políticas que resultam em menores efeitos ambientais. São iniciativas valorizadas pelos clientes inclusive com métricas de “rebates” em licitações de plásticos transformados. Com base nisso, acho que o setor brasileiro poderia ampliar a divulgação internacional do programa PicPlast, da Plastivida e do polietileno gerado pela rota alcoolquímica.
PR – Diante do agravamento da recessão, aumenta a pressão para transformação aproveitar o câmbio para exportar.Uma indústria que usa exportação como válvula de escape da crise está fadada ao sucesso ou ao fracasso no exterior?
Delarovera – A exportação deve ser uma decisão estratégica. A experiência demonstra que empresas ativas na exportação por longos períodos têm maiores oportunidades de sobreviver em cenários adversos, internos ou externos. É preciso entender que recebíveis em dólar também valorizam significativamente a empresa no momento de fusões ou aquisições. A exportação de curto prazo ou sazonal também pode ser interessante e bem sucedida – por exemplo, quando uma empresa precisa testar novos mercados ou adaptar cores e moldes aos gostos e hábitos locais. Em regra, crises internas são indutores da exportação e acabam auxiliando na tomada de decisão do empresariado que, após as vendas iniciais e bem sucedidas, acabam motivados a permanecer na exportação.
PR – A imagem atual do Brasil e de seu setor plástico favorece ou dificulta o esforço de exportação de transformados?
Delarovera – O importante no jogo mundial é a competitividade. Quanto mais inovação se conseguir (em produto, sistemas de comercialização, serviços etc), maior será o diferencial de um segmento. Hoje em dia,o Brasil dispõe de programas como PicPlast e ThinkPlastic que proporcionam condições efetivas e reais de exportação em termos competitivos. Além disso, o governo está alterando e agilizando as modalidades de drawback. Os transformadores precisam valorizar esse trunfo para vender lá fora.
PR – Quais lições de comércio exterior a nossa transformação precisa aprender com os concorrentes da China?
Delarovera – Primeiro, não achar que seu mercado interno é grande o suficiente. Lição número dois: exportação é o caminho mais fácil de aprender a competir (a empresa recebe para aprender).Tem mais. A experiência chinesa nos lembra que a busca incessante pela competitividade internacional cria músculos para se diferenciar no mercado interno. Outro ensinamento da China: muitos transformadores de cacife global tiveram um dia 10 funcionários e produziam 50 t/mês. Por fim, os chineses provam ser possível ter boas margens de contribuição quando se exporta. É aquele trinômio: redução do custo fixo x aproveitamento dos créditos fiscais x vantagem cambial. •