A indústria brasileira de masterbatches ainda tateia o potencial da conectividade. O uso de aplicativos de repasse instantâneo de informações, como WhatsApp, SMS ou Messenger, já é ativo fixo do kit dos negociadores para fechar pedidos. Mas há uma série de facilidades digitais, como o e-commerce, em passo acelerado para se tornarem cotidianas e assim mudarem a face do mercado de masters. Antenada nessas mudanças, Elisangela Melo, gerente nacional de vendas da componedora nacional Pro-Color joga no time da coexistência pacífica, enxergando vantagens para o setor no arsenal virtual sem prejuízo de quem gasta sola de sapato e fosfato para dar ao cliente o atendimento personalizado a que ele está acostumado. Nesta entrevista, ela se debruça sobre as linhas divisórias do comércio B2B com a negociação cara a cara e, no arremate, comenta a inapetência generalizada entre os componedores nacionais por conhecer a realidade dos mercados finais em que seus masters são utilizados.
PR – Os ativos no Brasil estão baratos em moeda forte e indústrias transformadoras nacionais têm sido adquiridas por global players. Por que os componedores brasileiros de masters mais competitivos não despertam, pelo visto, o interesse de concorrentes do exterior?
Elisangela Melo – De fato, o ambiente é favorável à aquisição e empresas no Brasil. Mas penso que temos um fator de timing, ou seja, algumas grandes componedoras chegaram ao Brasil quando o país surfava nos bons resultados da economia, impulsionado pela alta dos preços das commodities, aumento do poder aquisitivo da classe média e a ascensão da classe C. Àquela época, presenciamos múltis comprando empresas daqui defasadas em tecnologia ou pouco conhecidas. Elas tiveram que investir milhões na modernização de fábricas, acerto de passivos, reformulação do portfólio, montagem de equipe capacitada etc. Também houve a abertura de plantas e algumas fusões.
Hoje em dia, assim como as indústrias nacionais de masters acusam resultados financeiros cada vez piores, queda de margens e indicadores abaixo das metas como um todo, grandes múltis também padecem de resultados ruins no Brasil e, em alguns casos, até em seu desempenho global, com venda de negócios, queda no valor de ações e no movimento perante anos anteriores.
Assim, esse cenário adverso com o endividamento das nacionais, a baixa atratividade do mercado doméstico por culpa do cenário econômico, complexidade fiscal e concorrência local são possíveis fatores de desinteresse (inclusive de ordem cultural) das múltis.
PR – Como vê o futuro do vendedor externo de masters de cunho mais standard diante do inevitável avanço da conectividade e menos custos favorecendo cada vez mais as vendas pelos call centers?
Elisangela Melo – Temos no mercado vários perfis de clientes. A empresa que identifica cada perfil adequado ao seu canal e satisfaz plenamente a necessidade deste cliente é uma empresa smart, uma empresa que se esforça para conhecer a quem vende. Assim o canal de vendas internas, também chamado call center, e o canal de vendas externas terão demandas para atender de acordo com o porte, perfil, velocidade de atendimento, tipo de produto etc. Atuo há muito tempo no mercado de masterbatches e não encaro como um risco o avanço da tecnologia para a carreira do vendedor externo. O avanço da conectividade trouxe um comportamento de maior velocidade no retorno ao cliente; para isso a tecnologia é um grande aliado, principalmente para dar mobilidade a este vendedor. O canal de venda externa é fundamental para aumentar o relacionamento com o cliente, mesmo em mercados de materiais commodities e de menor exigência. Sem saudosismo algum por trás dessa linha de raciocínio, sustento que o cliente valoriza o “olho no olho”. Ou seja, o vendedor que está presente é um facilitador do negócio, que desenvolve um projeto com o cliente e troca informações com ele tem seu espaço garantido, mesmo diante das novas ferramentas e mudanças comportamentais da era da informação e da velocidade no retorno.
PR – Como as ferramentas da conectividade, TI e internet poderão contribuir para abreviar ou eliminar etapas na tramitação de desenvolvimentos de concentrados de cores ou efeitos especiais?
Elisangela Melo – Quando bem utilizadas e implementadas, essas ferramentas trazem competitividade e reduzem prazos para o atendimento ao cliente. Por exemplo, ferramentas de mobilidade para a força de vendas, como aplicativos nos celulares. O vendedor tem à mão informações relevantes sobre o cliente, status de pedidos, oportunidades em aberto etc. Ele consegue acessá-las remotamente e em qualquer lugar. Funcionam na forma de aplicativos de roteirização ou para enriquecer com inputs os relatórios de visitas enquanto o vendedor está em salas de espera, por exemplo.
Outros aplicativos de desenvolvimento de cores e catálogos on line são interessantes e pouco utilizados e eliminariam etapas burocráticas e de logística entre as interfaces do projeto.
E-commerce também é pouco explorado neste mercado que ainda quer o contato com o vendedor, seja interno ou externo, mesmo através de ferramentas de mensagens instantâneas, como WhatsApp, SMS ou Messenger, para fechar o pedido.
PR – São quase inexistentes as encomendas, por componedores brasileiros, de pesquisas de mercados usuários dos seus masters. Como explica esse descaso generalizado por uma ferramenta, a informação, vital para o componedor se atualizar, fidelizar clientes e se diferenciar da concorrência?
Elisangela Melo – Acredito que a cultura do segmento de masters é mais pragmática e conservadora do que inovadora e antenada no mercado de aplicação e do consumidor final. Uma possível razão desse distanciamento das pesquisas de mercado é o foco dessa indústria atrelada ao produto e à eficiência de sua aplicação. Claro que quando falamos de mercado B2B a venda mais técnica é um fator considerável, pois os clientes finais são atendidos pelos transformadores e estes estão mais na ponta e próximos ao consumidor.
Apesar do relevante fato de a venda B2B exigir maior conhecimento técnico e olhar para o produto, o movimento do mercado, comportamento do consumidor e o uso de pesquisas podem se tornar um diferencial competitivo. Não há mesmo, em grande parte dos componedores de master, investimento em pesquisa e inteligência de mercado. Aliás, a tratativa é de custo e não investimento. E como não há valorização da informação e seu uso, observamos ano após ano ser negligenciado pela área de planejamento estratégico o investimento em inteligência de mercado ou direcionado para o marketing de produto. Essa atribuição e responsabilidade ficam em segundo plano. •