Rupturas sincronizadas

Gargalos nas cadeias de suprimentos vão demorar a abrir

Deu no Financial Times. “Desde o início da pandemia, consumidores confinados no mundo inteiro construíram reservas estimadas em US$ 5.4 trilhões e, com o avanço da vacinação, estão se tornando cada vez mais confiantes na volta da economia ao crescimento, pavimentando assim o caminho para um forte repique nos gastos à medida em que os negócios vão sendo reabertos”. Do outro lado do ringue, espreita um porém, aponta John Richardson, analista blogueiro do portal Icis. “Se os gargalos nos suprimentos de insumos persistirem e impedirem a disponibilidade em estoque do produto final desejado pelo consumidor, a compra não vai acontecer”.

A recuperação da economia mundial depende de uma bem azeitada engrenagem das cadeias de suprimento, hoje espancadas por rupturas sincronizadas, definiu em artigo em abril Daniel Yergin, consultor guru da indústria petrolífera. Enquanto a economia caminha para reagir até dezembro, mediante estímulos despejados pelos governos, cresce a pressão sobre as cadeias de suprimento. Gargalos sem precedentes nelas devem se agravar a partir de julho, ele antevê. “As rupturas sincronizadas também causam choque simultâneo em dois pilares da nossa era: as cadeias de chips e plásticos”.

Yergin vê na “containerização” a casa das caldeiras da globalização. Pelas suas contas, cerca de 5.400 navios cargueiros cruzam os mares carregando por volta de 20 milhões de containers contendo os mais diversos produtos intermediários e finais e a Ásia é a origem predominante. “O gargalo nas remessas começou no início do ano passado, quando o corona fechou a China por dois meses e evaporou os embarques de produtos para o exterior. Quando a China saiu do lockdown. EUA e Europa entraram nele”, repassa o analista. Veio então a trombada entre o transporte interrompido e o surto de compras, pela população confinada e órgãos da saúde pública, como as de eletrônicos, mobiliário, equipamentos médico-hospitalares de proteção individual contra o vírus. Em mercados como os EUA, esse salto da demanda convergiu para um enrosco ainda pendente: o mega engarrafamento de navios aguardando nas orlas o ok para internar cargas. Para piorar as coisas, o frete encareceu como nunca. Yergin ilustra com a subida de 500% em um ano no custo da rota Ásia/Costa Leste dos EUA.

Algemado a este estrago logístico, o suprimento engasgado de chips chicoteia a indústria automobilística global, caso do Brasil. Mas o xis do problema, elege Yergin, está na embolada procura por chips para carros, eletrônicos e 5G, quadro piorado pela rápida recuperação chinesa. E pintou o imprevisto: uma grande planta japonesa de chips pegou fogo e uma seca prolongada castigou Taiwan, fonte do grosso do fornecimento mundial desse insumo cuja manufatura depende de água pura. Para John Richardson, a rejeição entre EUA e China reformulará a médio prazo o suprimento mundial de chips.

Com o alastramento da covid-19, a disponibilidade global de resinas foi cortada no talo, tanto pela escassez de frete como pela demanda incendiada nos mercados internos dos países que regem o comércio exterior de termoplásticos. É justo aí que Daniel Yergin bota dois ativadores da terceira ruptura sincronizada: a cadeia de suprimento dos termoplásticos abalada ainda mais pela inédita nevasca que paralisou em fevereiro a petroquímica texana, até o momento sem retorno com todas as suas forças, lacuna dura de fechar com a carência da alternativa dos fretes da Ásia. E um mês depois, o cargueiro Ever Given empacava o fluxo mundial de comércio ao bloquear o Canal de Suez, agravando o penoso restabelecimento ainda em curso das cadeias globais de suprimentos.

Quatro megatendências interligadas, alinha Richardson, norteiam o futuro do plástico: pandemia, geopolítica, sustentabillidade e demografia. As rupturas sincronizadas nas cadeias de suprimentos são sequelas da pandemia e a volta aos eixos demora. “Enquanto isso”, conclui Yertgin, “a retomada econômica via vacinação, demanda reprimida e programas oficiais de estímulos vão aumentar nos próximos meses a tensão entre os vínculos que ligam o mundo nas cadeias de suprimento”. •

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