Em 4 de janeiro, deu na mídia que o preço à vista para o frete da China ao porto holandês de Roterdã saía em média US$ 3.577 ou 115% a mais que na semana anterior. Em 15 de janeiro vigorava o preço inchado de US$ 6.000 por contêiner levado da Ásia para Europa e US$ 3.500 da China para o Brasil. Na voz corrente no setor de logístico, saltos nas tarifas, atrasos no transporte e risco de indisponibilidade de navios que cruzam o Canal de Suez na rota Ásia/Brasil perigam aflorar a partir de março, se os ataques a cargueiros no Mar Vermelho, iniciados ao fim de 2023 por rebeldes houthis, continuarem ou descambarem para um estado de guerra no Oriente Médio. Paul Hodges, dirigente da New Normal Consulting, já escreveu que a disruptura e o encarecimento do fluxo de cargas da Ásia causados pelas guerrilhas no Canal de Suez prenunciam o fim das cadeias globais de suprimento. O Brasil já sente o drama nos atrasos na chegada ao Oriente Médio de exportações suas, como proteína animal e açúcar, pela necessidade de mudar para rotas mais seguras, compridas e menos acessíveis. Se seguir inalterado, o perrengue logístico acarreta angústia para importadores brasileiros de resinas da Ásia, continente que divide com a América do Norte o comando da produção e preços da petroquímica internacional. Na entrevista a seguir, esse emaranhado de incertezas é digerido por Roberta Duarte, head of business da Conecta Resinas, distribuidora de poliolefinas importadas e integrante da holding nacional Grupo Melo Cordeiro.
Desde a segunda quinzena de dezembro militantes apoiadores do Hamas, na guerra contra Israel na Faixa de Gaza, atacam navios comerciais em trânsito pelo Canal de Suez no Mar Vermelho, terrorismo que tem levado transportadoras a navegar por trajetos alternativas mais caros e longos (a rota do sul da África) para o Ocidente. Como estes conflitos têm influído no preço e lead time (período do início ao término de uma atividade) do container de poliolefinas remetido da Ásia para o Brasil?
De dezembro até o momento os preços de fretes nas rotas pelo Mar Vermelho, que em regra usariam o trajeto pelo Canal de Suez, praticamente dobraram desde o início do conflito. Estou tentando descobrir se as tarifas atuais são condizentes com os custos adicionais das companhias marítimas e não são apenas um aumento geral indiscriminado das taxas, ou então, uma medida para compensar valores mais baixos em outras rotas ou ainda uma oportunidade de aumentar preços.
Não sei avaliar ainda sobre o lead time, pois estamos sem ofertas da região. As petroquímicas suspenderam as vendas há três semanas (nota: final de dezembro último) e eu não estou conseguindo comprar nada da região. Acredito que nas próximas semanas a situação tende a melhorar.
Quais os reflexos causados por esta conturbação na disponibilidade de navios para trazer resinas da Ásia ao Brasil?
No momento, o grande reflexo que sinto é a falta de ofertas de resinas asiáticas. Os produtores suspenderam as vendas com receio de não conseguir embarcar e por preocupação com os altos valores dos fretes. Acredito que não demorem a retomar as vendas, porém, com valores das resinas bem mais altos. Por outro lado, também acredito que as petroquímicas estão aproveitando essa oportunidade para forçar um aumento de preços.
Com a escalada do conflito Israel x Hamas, as importações brasileiras de PP e PE do Extremo Oriente e Oriente Médio tenderão a priorizar resinas de quais origens, além da América do Norte? Ou a oferta nacional de PP e PE é suficiente para dispensar essas importações?
O cenário ainda é muito incerto e não conseguimos afirmar quais origens serão priorizadas. Acredito numa noção mais clara após o feriado do Ano Novo Chinês, que começa no dia 10 de fevereiro. Ele se estende por 15 dias e é celebrado com festividades tradicionais na China e outras comunidades orientais ao redor do mundo.
A escalada da guerra no Oriente Médio favorece o aumento dos preços e spreads e preços de PE e PP, mesmo estando essas resinas atoladas em mega excedente global e crescente?
Insisto que o cenário ainda é muito incerto e os preços que recebo no momento andam bem mais altos. Ninguém sabe ainda se esses preços se sustentam ou não, tudo dependerá da demanda mundial e da retomada da China. Afinal, é fato que há um grande excedente de resinas mundial e os produtores estão fazendo pressão em prol do aumento de preços. O mercado chinês vai regular a precificação nos próximos meses.
Ao lado da China em crise política e econômica, a guerra no Oriente Médio contribui para engordar a hiper oferta mundial de PP e PE. As já bem altas alíquotas brasileiras para essas resinas conseguirão impedir que as importações delas, sob pressão do excedente ampliado, superem este ano o volume desembarcado em 2023?
Acho que as alíquotas brasileiras para PP e PE não conseguirão impedir as importações de resinas em 2024, pois o Brasil não é autossuficiente em relação à sua produção, para dar conta de atender toda a demanda local. A participação da resina importada é uma realidade sem volta para o mercado brasileiro.