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Transformador médio precisa despertar para o mercado global de resinas, adverte especialista.
Carneiro: transformador monoglota não tem mais vez.
Carneiro: transformador monoglota não tem mais vez.
Carneiro: transformador monoglota não tem mais vez.

A tempestade a desabar na política e economia faz o câmbio relampejar e as importações recuarem. Mas essa é a foto do momento e, quando o país entrar nos eixos e o dólar serenar, a volta às compras no mercado internacional são favas contadas. Desse ponto de vista, a hora é agora para transformadores de médio porte, em geral tão distantes das resinas do exterior que têm produção nacional quanto o Vasco e o Fluminense de qualquer caneco, começarem a abrir os olhos para o mundo, recomenda nesta entrevista Fabio Magalhães Carneiro, sócio executivo da Konver, empresa de assessoria na introdução, desenvolvimento e comercialização de polímeros no Brasil.

PR – Quais as categorias de importadores de resinas na ativa?
Carneiro – Vou focar as respostas nas famílias de polietileno (PE ) e polipropileno  (PP) e, a depender da ocasião, incluirei dados relativos a PVC. Começo por um parâmetro da magnitude das importações das três resinas: segundo a Braskem, tratam-se de 1,56 milhão de t/a, correspondentes a cerca de R$ 10 bilhões. Quem atua nos canais de vendas?
1) Produtores – Ou seja, produtoras e líderes mundiais em resinas, como Dow, Sabic e Exxon, que montam escritórios comerciais no Brasil munidos de assistência técnica, além de estruturas como logística para atender o cliente com produto entregue na fábrica dele.
2) MegaTraders – São empresas de estrutura global, capital aberto e receita bilionária em dólar. Costumam apresentar contratos de comercialização específicos, com garantia de volume para a região, de uma mesma base produtora. Também costumam ter um time de peso no Brasil, incluindo assistência técnica e logística. Um exemplo é a Noble, representante de PP da saudita NetPet nas Américas e Ásia.
3) Traders globais – Eles se mostram cada vez mais aptos a instalar escritórios no Brasil e a buscar espaço no mercado local. Isso faz parte do seu preparo para atuar na onda de maciças exportações para a América Latina, esperada para o período de 2016 e 2017, de PE norte-americano derivado do gás de xisto. Essas empresas compram e vendem diversos produtos, não necessariamente garantindo ao cliente final resinas produzidas nas mesmas plantas ou dos mesmos produtores que ofereciam um mês antes. Seus acordos devem ser mais flexíveis junto a um grupo maior e mais volátil de fornecedores de materiais. Praticam preços em dólares, custo e frete para um porto nacional e raramente arriscam-se a ter uma estrutura que lhes permita a venda em reais, sendo eles os responsáveis pela nacionalização da resina.
4) Traders nacionais – Empresas daqui e que primam pela atuação local. Compram de outro trader que tenha contrato ou relação com fornecedores ou traders globais, internam o produto e vendem em reais. O negócio é comprar em dólares e vender em reais. Em casos pontuais, compram resinas de petroquímicas globais para revender.
5) Agente – É  quem conecta as partes da transação. Por vezes, trabalha focado em um grupo de clientes. Sua função é saber quem precisa do quê naquele momento exato. No mundo inteiro, traders de commodities atuam com preços que variam em frações de horas, ou menos. No mercado global, quem não tem contrato pré-determinado, por escrito e assinado entre as partes, em regra está no mercado “spot” e seus preços e disponibilidades variam rapidamente.
6) O cliente importador – Parece tornar-se cada vez mais raro, tendo sido substituído por traders, ou então, passou a comprar de outros canais que lhe entrega materiais cotados em reais.
No médio prazo, todos terão espaço no mercado brasileiro. No plano imediato, claro que, numa conjuntura em que o dólar sobe de R$ 2,20 a mais de R$ 4,00 em 12 meses, há empresas em dificuldades – muito mais por apostarem no câmbio do que pela modalidade de comercialização escolhida. Se alguém compra resina em dólar sem mecanismo de defesa da volatilidade (hedge) ou venda também em dólar, o que está fazendo é uma aposta e não uma compra estrategicamente consciente. Retomando o fio, após tanta instabilidade teremos uma trégua, com câmbio em queda ou estável, rendendo lucros aos importadores. Um mercado com sequência de altas em dólares ou de quedas na relação real versus dólar é muito favorável a quem importa. Mas é preciso seguir no jogo para participar desses ganhos.

PR – À margem da crise, a rentabilidade dos transformadores menores tem estado frustrante.O que deve mudar na cultura deles em relação ao suprimento de resina?
Carneiro – O discurso ouvido é que o valor da resina impacta, no plano geral dos segmentos, em torno de 70% do custo final do produto transformado. Num setor onde margem de 8% é tida como ótima hoje em dia e que tende para 1% em 2015/2016 na visão de José Ricardo Roriz Coelho, presidente da Associação Brasileira da Indústrua do Plástico (Abiplast), qualquer centésimo pode significar 70% de ganho adicional ou mesmo um resultado positivo.
Creio não ser o caso de a cultura do transformador mudar, mas de voltar às origens. Há 10 anos, era dura a concorrência entre produtores de resinas locais.Ela gerava descontos, contratos de fidelidade, liquidações de final de mês, fora a fila de gerentes de contas seguidos por diretores comerciais, na porta de clientes médios e pequenos. Hoje, o contexto do setor plástico é outro. Em prol da política dos campeões nacionais e da globalização das empresas brasileiras, a primeira e segunda gerações da cadeia fortaleceram-se muito mais que a terceira. Em meio a este cenário, o transformador precisa revolucionar sua postura. Sua sina é seguir a dica do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). Foi quem aprovou essa revolução e precisa ser respeitado. Segundo ele, o mercado de resinas é global e regido pela comercialização entre países. Cabe ao transformador aprender a atuar dessa forma, como o fazia no passado. Agora,  precisa entender de câmbio, de índices globais de preços, da economia dos EUA e da Ásia e, de preferência, familiarizar-se com a língua global do comércio, o inglês. Também faz parte dessa revolução visitar as feiras internacionais não só para saber de lançamentos, mas para se inteirar sobre o mercado de resinas. Viagens a Houston, a meca do comércio mundial de resinas, deveriam ser anuais. Lembrem-se disso, transformadores: se 70% do seu custo está na resina, pelo menos, um terço do seu tempo merece ser dedicado à compra dela ou ao entendimento de sua comercialização. Tornou-se fundamental ter uma estratégia de fornecimento.

PR – Um transformador de médio porte não tem o poder de negociação que permite a um grande trazer PE e PP sem ficar vulnerável ao único produtor local. O que está ao alcance dele para desfrutar o acesso às importações?
Carneiro – Uma relação que temos como certa no Brasil, mas não real no mercado global dos plásticos, é que quanto mais se adquire de um tipo de resina, menos se deveria pagar pela unidade comprada. No mundo do petróleo, entretanto, quanto mais se “solicita” de volume, mais stress se causa ao fornecedor – efeito da concentração de risco de crédito, por exemplo. Muitas vezes, isso pode levar a um preço unitário mais elevado, ou então, como ocorre na maioria dos casos, em limitação de volume. Sendo bem direto: exportadores gostam de vender muito volume, mas preferem diversificar as entregas num grupo sólido de clientes, pois ele apresenta uma condição de crédito muito robusta para a quantidade comprada. Tem mais: exportadores não se preocupam em atuar de forma compartilhada em clientes. Isso lhes agrada, por garantir uma situação de saúde financeira diversificada, a salvo do risco de deixar todos os ovos numa única cesta. Quanto mais distante do cliente o fornecedor estiver, mais ele prefere repartir a venda.
Uma maneira de o transformador de médio porte embarcar na importação sem ficar vulnerável no contexto local seria a prática de compras regulares, mas com maior espaçamento. Em lugar de importar mensalmente, poderia fazê-lo a cada três meses, por exemplo. Se isso é colocado para as partes de forma clara e como um plano de evolução, o fato de não se comprar todos os meses soa como música para alguém que gostaria de conhecer melhor o comprador e criar as bases de um relacionamento com um ótimo entendimento dos detalhes, antes de evoluir para uma parcela mais significativa de volumes encomendados.
Considerando o previsto aumento do fornecimento de resina no país, a partir de remessas dos EUA nos próximos anos, e tendo ainda em vista o consenso na praça de que até 2020, no máximo, a participação dos importados no mercado brasileiro deve evoluir para 50%, antevemos que 50% das indústrias comprarão exclusivamente resinas importadas. Ou seja, sem ser maniqueísta, uma parcela muito significativa dos transformadores, talvez 80% ou mais, terá uma boa parte dos seus produtos fabricada com polímeros do exterior.
E como ser importador é um caminho que pode levar meses, quanto mais o transformador posterga essa intenção, mais atrasado ficará. •

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