Quando perder é ganhar

Os ensinamentos deixados por um natimorto projeto de bioplástico

editorialAnúncio de investimento é para ser berrado enquanto a saída de qualquer negócio deve transcorrer à francesa. Essa máxima, tão conhecida do setor plástico, emana dos cinco anos de mutismo acumulados pelo Grupo Guerra, pilar nacional em sementes de milho, desde o lançamento da pedra fundamental do que seu dirigente Ricardo Guerra definiu em discurso, disponível no You Tube, como “uma revolução no agronegócio”. Tratava-se do aporte a quatro mãos com a francesa Limagrain na produção inicial de 8.000 t/a do plástico biodegradável Biolice a partir de 2013, no complexo- sede do grupo em Pato Branco, no sudoeste paranaense. Realizada ao final de agosto de 2012, a solenidade seguiu o cerimonial de praxe no nosso grande empresariado, com curvaturas no microfone ao poder público presente – o governador e seu séquito, prefeito local etc- e endeusamento do visionário investimento em Biolice, derivado do amido de milho e acenado a aplicações como sacos de lixo e sacolas camiseta, dois segmentos movidos a preço. Ou seja, sem terem como arcar com bioplásticos, por maior que seja a boa vontade ambientalista.

À época, Ricardo Guerra sustentou para Plásticos em Revista não ver empecilhos no fato de Biolice, como qualquer bioplástico, ter preço muito acima das resinas petroquímicas. Disse também que o bioplástico era uma forma de valorizar uma commodity agrícola sob as bênçãos do desenvolvimento sustentável.

O mundo gira, a Lusitana roda e nada saiu até hoje sobre a produção do biopolímero. Procurados de novo por Plásticos em Revista, Ricardo Guerra e seu pai, Luiz Fernando Guerra, reagiram com aquela clássica saída à francesa mencionada lá em cima, sequer respondendo ao pedido de entrevista sobre o triste fim de Biolice no Brasil. É um comportamento compreensível; todo mundo prefere alardear vitórias e não reconhecer de público derrotas ou arrependimentos. No entanto, aprende-se bem mais com os fracassos que com os sucessos e muitas vezes perder é ganhar. Foi o que aconteceu com o Grupo Guerra. Para começar, ganhou no episódio uma experiência de vida e de mercado prezada por qualquer empresário. Não se sabe a causa oficial do aborto do projeto e a hipótese de desavenças entre as partes está afastada, pois a Limagrain permanece sócia do grupo paranaense.

Fica mesmo chato para qualquer um, após trombetear na mídia e entoar maravilhas para o poder público, declarar com todas as letras que fica o dito e redito por não dito e que “errei sim” é aquele samba canção imortalizado por Dalva de Oliveira. O bicho pega quando se começa a construir a casa pelo teto, deixando as fundações para depois. Fazer conta dá trabalho, mas evita prejuízo. Desse ponto de vista, o destino até pegou leve com o Grupo Guerra ao findar com Biolice antes de sua produção acontecer. É o que se depreende, por exemplo, do caso da água mineral Biota, marca norte-americana destacada pela garrafa de bioplástico, o ácido polilático. Seu marketing punha João Santana no chinelo. Culminou quando a garrafinha desfilou na mão de celebridades numa entrega do Oscar. Pois nem assim o negócio escapou em pouco tempo da quebra imposta pelos números da vida cruel. Aliás, o fosso das contas entre teoria e prática da sustentabilidade tragou este ano outro xodó dos ambientalistas, a Metabolix, badaladésima fabricante de biopolímeros dos EUA. Vergada pelo revés financeiro, ela vendeu em agosto, por US$ 10 milhões, seus ativos de bioplásticos para a CJ CheilJedang Corp, empresa sul-coreana do agronegócio. Tomara que as semelhanças com o Grupo Guerra e Biolice terminem por aqui.

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O Brasil escapou por um fio de ser praticamente alijado do comércio internacional de filmes biorientados de poliéster (BOPET). Atendendo a pedidos da subsidiária da norte-americana Terphane, monopolista na produção brasileira da película, a cargo de capacidade para 6.000 t/mês, os governos Lula e Dilma concederam sobretaxas antidumping para importações de BOPET da China, Índia, Egito, Emirados Árabes Unidos, México e Turquia. Como se não bastasse, a Terphane pediu investigação de suspeita de dumping sobre BOPET trazido ao Brasil do Peru e Bahrein. O processo de aferição das denúncias foi iniciado em julho e enfim engavetado pela Secretaria de Comércio Exterior (Secex) sem comprovação de ameaça de dano à produção da Terphane, conforme publicado no Diário Oficial da União.

Ficam no ar duas perguntas:
1) O governo concedeu antidumping para importações de BOPET de seis países. Por que mudou de posição em relação ao filme do Peru e Bahrein?
2) Todos os antidumpings para BOPET foram deferidos nos governos Lula e Dilma. Se Dilma não tivesse sido substituída por Temer a probabilidade de sair o antidumping para o filme do Peru e Bahrein seria menor ou maior? •

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