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Evento nº1 do setor plástico escancara o drama da indústria
Seminário: indústria de transformação preocupada com evolução dos custos acima das receitas.

Visite a indústria brasileira antes que acabe. Essa percepção emanou das palestras sobre as cacetadas do desgoverno na manufatura, tema dominante do Seminário Competitividade 2015: O Futuro Perfil da Transformação Brasileira de Plástico. Concebido a quatro mãos por Plásticos em Revista e a Associação Brasileira da Indústria do Plástico (Abiplast), a quinta edição deste que é o maior ponto anual de encontro do setor foi realizada em 24 de setembro último, em São Paulo, sob patrocínio da Braskem, Aditya Birla, M&G, Epema, FlexSystem e a Associação Brasileira dos Distribuidores de Resinas Plásticas e Afins (Adirplast).
Logo na abertura, José Ricardo Roriz Coelho, presidente da Abiplast, pôs o dedo na chaga viva. Pelas suas estimativas, uma fatia aproximada de 80% dos recursos utilizados pelos transformadores de plástico  corresponde a capital próprio. Presente ao evento, Sabrina Schneider, gerente do Departamento de Indústria Química do BNDES, confirmou a Plásticos em Revista que os financiamentos concedidos pela instituição a transformadores não chegam a 30 até hoje. Retomando o fio, Roriz afirmou que, por conta da queda do faturamento, o nível detectado de intenção de investimentos no setor encolheu 32% este ano. O dirigente engrossou o caldo ao lembrar o peso de 35,4% da carga tributária no PIB de 2014 e, como se não bastasse esse fardo, ele encaixou, a saída de Brasília para tirar as contas públicas do vermelho e pelo comodismo do aumento dos impostos, caso da CPMF. A propósito, assinalou Roriz, o fim da desoneração da folha do setor plástico ampliará a participação da carga tributária sobre o faturamento do setor.
Os custos viraram pedras carregadas pelos penitentes da transformação de plástico. De janeiro a julho último, delimitou Roriz para a plateia no hotel Meliá Paulista, foi da ordem de 32,5%  a projeção de aumento dos gastos de energia pelo universo transformador de plástico. Assim, segundo seus cálculos, um adicional de R$ 860 milhões nos custos de eletricidade sobrou para o setor. “A quantidade aferida de horas em interrupções da produção já superou os limites estabelecidos”. Uma parada não programada, por hora, acarreta prejuízo de R$ 33,6 milhões na receita da terceira geração do plástico. O tempo médio de retorno às atividades de processo, completou o presidente da Abiplast, é de 150 minutos em média no setor. As agruras do transformador, apimentou Roriz, prosseguem no aumento de 7% no custo de mão de obra rastreado nos primeiros sete meses do ano e no gosto amargo deixado pela demissão de 13.000 funcionários no mesmo período. No arremate, Roriz brandiu o constatado encarecimento em 10,5% dos bens intermediários para o transformador entre janeiro e julho último. Conforme especificou, houve reajuste de 10,6 no custo das resinas e de 9,7% nos demais produtos químicos empregados pelo setor.
Daí não deu outra. Pesquisa Fiesp/Abiplast calculou em 32% a redução nas intenções de investimento pela transformação de plástico, e praticamente metade das empresas entrevistadas descartou a possibilidade de aportar recursos em seus negócios este ano. Ainda de acordo com o mesmo levantamento, os investimentos em máquinas tendem a desabar 33% este ano versus 2014. E Roriz não amaciou no final, ao ponderar que, pelo andar da carruagem, os custos devem continuar evoluindo acima das receitas do transformador.

Petroquímica mundial
Sem projetos de expansão no horizonte, a América do Sul pinta no atlas da petroquímica como não mais que um canal auxiliar na desova do excedente de polietileno (PE) dos EUA, previsto para aflorar em questão de dois anos, evidenciou em sua palestra Rina Quejada, analista para a América Latina da consultoria norte-americana IHS. Embora o mercado latino-americano, por causa da logística, seja destino preferencial desses embarques dos EUA, o negócio global de PE não será arranhado pela produção da resina gerada pela rota do gás de xisto, pois a IHS trabalha com perspectiva de oferta internacional do polímero aquém de sua demanda mundial.
Rina engrossa o coro de analistas quanto à guinada em andamento nos pêndulos da competitividade da petroquímica. Ela é movida pela queda dos preços do petróleo e seu efeito dominó em muitas cadeias subjacentes. Para a analista, a cotação do barril não deve reagir de modo expressivo até 2017. “A energia vai nortear a competitividade das exportações de diversos petroquímicos”, ela julga. No plano geral dos químicos básicos, nota a consultora, EUA, China, Índia, Arábia Saudita e Coreia do Sul estão agregando, de 2010 a 2020, 231 milhões de toneladas à capacidade global desses materiais.
Rina observa que o mercado spot de eteno tem declinado este ano devido ao arrefecimento da economia da China e  desvalorização de sua moeda, fator que, aliado à estagflação europeia e a por ora não convincente retomada dos EUA, semeia incerteza nas projeções sobre a trajetória de preços e fornecimentos de eteno. Na foto atual, ela nota, têm sido elevados os índices de ocupação da capacidade internacional de eteno, ampliada inclusive por desgargalamentos nos complexos da LyondellBasell e Williams nos EUA. No período 2014-2019, Rina calcula, mesmo com a indústria de eteno cravando 10% de ociosidade, a demanda pelo petroquímico básico rondará a marca de 40 milhões de toneladas. No mesmo quinquênio, ela  emenda, o eteno adicional a ser servido pela América do Norte corresponderá a 25% do volume da demanda global projetada pela IHS. Com este acréscimo, aliás, Rina prevê que a capacidade norte-americana de eteno alcance 45 milhões de toneladas por volta de 2020, na garupa dos custos competitivos da tecnologia de eteno pela rota gás. Rina também considera remota a hipótese de, em virtude das incertezas no horizonte da economia e mercado globais, serem refreadas as partidas dos projetos de centrais de eteno em construção na América do Norte. “Alguns atrasos podem ocorrer, mas o crescimento geral da capacidade é inevitável”, ela atesta.
Escorada em indicadores preliminares da IHS, Rina chama a atenção para o salto de 5,3% da produção norte-americana de PE este ano, índice visto por ela como acima dos níveis habituais. “Em maio e junho último, por sinal, a produção do tipo de alta densidade (PEAD) foi recorde”, distingue. Por seu turno, assinala, os preços norte-americanos de exportação de PE caíram este ano abaixo dos preços de contrato. Na seara dos investimentos, a analista lembrou na palestra que a capacidade total de PE na América do Norte foi fixada em 20.300.000 toneladas em 2014, volume que, do quarto trimestre deste ano ao final de 2016, deve engordar com a entrada em funcionamento da operação mexicana da Braskem-Idesa e, nos EUA, dos complexos da Sasol, Nova e Ineos.
Entre 2015 e 2020, estima Rina, a demanda de PE deve suplantar 1,3 vez o PIB mundial, O excedente em curso na capacidade global do polímero, concentra-se em regiões de baixo custo de produção América do Norte, Oriente Médio e China. No reduto específico de polietileno de baixa densidade (PEBD), Rina espera por pressões nas margens a curto prazo, efeito da superoferta trazida por investimentos na tecnologia tubular, superiores aos aportes de recursos no sistema autoclave. Num relance  pela Europa (Leste Europeu exclusive), Rina informou na palestra que 8% da capacidade local de PE desceu as portas, por competitividade de menos.
Ainda na raia poliolefínica, Rina afirmou que, de 2015 a 2017, totalizam 1.500.000 toneladas os projetos de seis empresas dirigidos à  expansão da capacidade norte-americana de propano, ponto de  partida pela rota do gás para obtenção de propeno  e, na ponta, de poliproprileno (PP). A consultora apontou ainda a atual ausência de investimentos na capacidade norte-americana de PP até 2019. Ao cabo deste período, considerou em sua palestra, a oferta interna restrita e o consequente avanço das importações do polímero devem ensejar nova rodada de investimentos na capacidade local de PP. Quanto ao cenário global do termoplástico, Rina chamou a atenção para maciços aumentos na produção chinesa, deprimindo a curto prazo os preços da resina. Os aumentos na capacidade de PP da China e Oriente Médio, por sinal, levam petroquímicas europeias a esperar por pressões concorrenciais sobre as cotações de seus materiais, ponderou a  analista da IHS. Na América do Sul, ela sentenciou, a falta de projetos na capacidade de PP acentuará a dependência regional de resinas de origens que não a América do Norte.

Braskem: estímulos à transformação de plástico

Enquanto uns choram, outros aproveitam para vender lenços. Essa máxima do tino para negócios foi a tônica das palestras dos porta-vozes da Braskem no seminário: Luciano Guidolin, vice-presidente executivo de poliolefinas, vinílicos e renováveis e  Walmir Soller, diretor do negócio de polipropileno no Brasil.
O primeiro slide power point apresentado por Soller mostrava uma tempestade desabando na linha do tempo a partir de 2015 e serenando apenas em 2020. Raios e trovões, ele indicou, traduzem mazelas como a instabilidade política, a trava no desempenho econômico imposta pelo ajuste fiscal e monetário, expectativa de desaceleração e a inflação pressionada pelo realinhamento dos preços administrados. Mas em meio a essa prostração vascaína, ele reiterou, tremeluzem oportunidades para o transformador. Como exemplos, Soller brandiu o aumento da competitividade em preços para exportar, a queda em dólar do custo de mão de obra, a possibilidade o plástico deslocar outros materiais, na garupa do petróleo em baixa e a possibilidade para o transformador aproveitar a ociosidade de suas máquinas para imergir na inovação de produtos e tatear novos mercados. A mão na roda para tornar esse sonho realidade, amarrou Soller, chama-se Plano de Incentivo à Cadeia do Plástico (PicPlast), programa articulado pela Braskem e Abiplast.
Em sua palestra, Guidolin abriu a caixa de ferramentas do PicPlast. Conforme explicou, o programa se assenta em ações de incentivo à exportação de artefatos, competitividade & inovação e promoção das vantagens do plástico. Ele se conecta a outro anabiolizante da Braskem para fortalecer a cadeia – as plataformas de mercado, que seriam incubadoras de soluções à base de plásticos. Na foto do momento, colocou o vice-presidente, as atenções recaem sobre o agronegócio, construção, varejo e mobilidade/logística. Na mesma trilha, Guidolin frisou os préstimos de Wecycle, plataforma para fomentar negócios e iniciativas para valorizar refugos plásticos. Exemplo: parceria da Braskem e Starbucks resultou em lixeira injetada com PE verde e reciclado proveniente de copos  de café, chocolate, chá e refrescos recolhidos nas lojas. O arsenal para energizar a transformação também contém Braskem Labs. Na síntese de Guidolin, um programa de incentivo a projetos para melhorar a vida das pessoas através do plástico, como uma acessível prótese de PP para membros inferiores.
Exceção feita a PVC, notou Guidolin, as capacidades da Braskem em PE (3 milhões de t/a) e PP (2 milhões de t/a) superaram em 2014, na faixa individual de 500.000 t/a, o consumo brasileiro das duas poliolefinas. Para o período 2016-2020, o dirigente informou a intenção de seu grupo de investir na duplicação da capacidade de seu complexo no Rio de Janeiro, em desgargalamentos no âmbito de PP e na expansão do complexo de PVC em Alagoas.

Estratégias empresariais
O economista Sérgio Lazzarini, professor do Insper, focou sua exposição em estratégias para as empresas sobreviverem às crises. Ele repartiu o tema em dois enfoques: a parte do governo brasileiro e as linhas de ação para as companhias. Quanto à primeira, ele alinhou as pendências chave numa agenda de seis pontos: rigidez dos gastos públicos; reestruturação da Previdência e regime de aposentadoria; regulamentação da Lei de Responsabilidade Fiscal; transparência e governança nas políticas públicas;  simplificação do sistema tributário e, em prol da competitividade, abertura da economia mediante acordos bilaterais.
Para sugerir as políticas empresais condizentes com o ambiente recessivo, Lazzarini alojou os comentários em três blocos de estudos de casos. Título do primeiro: “Aquilo que não nos mata, nos fortalece”.  Entre as observações do palestrante, sobressaiu a de que as oportunidades de crescimento na crise são mais propícias para empresas de baixo endividamento (“flexibilidade financeira”, traduziu). Sob o título “Nunca desperdice uma boa crise”, Lazzarini brandiu constatações como firmas de gestão mais descentralizada serem menos afetadas por retrações da economia e que firmas mais endividadas tiram proveito maior ao descentralizar a gestão. Por fim, sob o título “Não fique atolado no meio”, Lazzarini condenou as companhias praticantes de preços médios . “Não conseguem competir em custos e carecem de produtos de alta qualidade”.

Cipoal tributário
É tão incontestável a competência arrecadatória do governo quanto sua ineficiência no gasto desses recursos.  O contraste foi usado como preâmbulo para a exposição sobre insegurança jurídica e conjuntura tributária do  advogado Oziel Estevão, sócio do escritório Honda/Estevão. Ele discorreu sobre como as indústrias devem se preparar para as novas obrigações acessórias: bloco k, nota fiscal eletrônica, livros contábeis e fiscais e o Sistema Público de Escrituração Digital (Sped) nas esferas fiscal, contábil e social. O advogado conjeturou ainda sobre as possibilidades de as novas regras de compliance (governança) afetarem as empresas pelos ângulos tributário, societário, trabalhista, regulatório e ambiental.
Apesar da cerração no momento intimidar as bolas de cristal, Estevão traçou perspectivas para o ambiente tributário para os próximos anos. Entre elas, deixou patente como primordial encontrar saídas para a guerra fiscal e política de incentivos e alertou para o aparato de ponta da Receita contra a informalidade.

Guerra Fiscal
No Brasil, reza a máxima, há as leis que pegam e as que não pegam. A guerra fiscal cai como luva para ilustrar a frondosa última categoria, deixou patente em sua palestra o economista e consultor Bernard Appy, diretor do Centro de Cidadania Fiscal. Entrou para os anais dos costumes nacionais, ele assinalou, a concessão dos benefícios do ICMS pelos Estados, sem aprovação do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz). Segundo o Supremo Tribunal Federal (STF), martelou Appy, esses estímulos são inconstitucionais. Para o consultor, são também uma forma ineficaz de política de desenvolvimento regional e geram insegurança jurídica para as empresas contempladas. Appy vê prós e contras na conjuntura para a necessária correção de rota. Em essência, jogam a favor a crise fiscal dos Estados, o temor das empresas quanto ao surgimento de uma súmula vinculante  do STF ratificando a posição do órgão e, por fim, o fato de parte dos Estados admitir que a guerra fiscal tornou-se disfuncional e frustrante para o desenvolvimento regional. Quanto aos pontos contra, ele apontou duas  dificuldades: de coordenação dos Estados rumo a soluções e  de alocação, pela União, de recursos seguros e suficientes nos fundos de desenvolvimento regional e de recomposição de perdas.
Não há solução ideal para a guerra fiscal, colocou Appy. A alternativa menos pior, defendeu na exposição, seria uma saída negociada via Confaz, resolução do Senado e aporte de recursos da União. Exceções à unificação da alíquota interestadual são ruins, mas são deglutidas como custo político para viabilizar uma saída organizada do enrosco. Fora o ICMS ser imposto nefasto, ponderou o analista, sobram ervas daninhas por serem arrancadas do matagal tributário brasileiro. Para isso, ele propõe fundir o ICMS com ISS, garantir crédito para todas compras de bens e desonerar os investimentos e  tratar com maneiras que não alíquotas diferenciadas questões específicas de desenvolvimento regional como a Zona Franca de Manaus, para Appy um exemplo de desatino.

Fábrica 4.0 vai bater à porta

O tornado da crise não vale como pretexto para a indústria brasileira se alhear de uma tendência em ascensão na Alemanha e que, sem escapatória, baterá à sua porta: a fábrica inteligente ou 4.0. Este lembrete serviu de mote para a palestra ministrada por Federico Tagliani, vice-presidente regional do Grupo Assa. Ele sumarizou a rota que leva à fábrica inteligente. Hoje, a automação fabril é suportada por comunicações; amanhã será por softwares inovadores para melhorar produtos e processos e, por fim, depois de amanhã darão o tom, a auto otimização e sistemas ciberfísicos baseados em modelos virtuais. Para acertar o passo com a nova onda, recomendou o consultor, o Brasil precisa participar dos processos relativos à normatização internacional, coordenar investimentos públicos/privados em prol de um ambiente propício ao florescimento local da fábrica 4.0 e, na retaguarda, aportar recursos consistentes na qualificação de sua mão de obra.

Nocaute da indústria
Ao longo do seminário, o dólar pulou acima de R$ 4 durante a manhã com recuo para R$ 3,90, ao final da tarde. O câmbio à beira do ataque de nervos serviu à perfeição de moldura prática ao enunciado de uma das palestras finais do evento, a cargo do professor Yoshiaki Nakano, da Escola de Economia da FGV-SP. A participação da indústria brasileira no PIB, ele mostrou com gráficos, desabou de 35,8% no anos 80 para atuais 9,1% e o país permanece um cisco – 0,3% – nas exportações mundiais de manufaturados. Nakano vê a economia nacional atolada no mangue de crises a curto e longo prazo. Quanto ao último caso, são referências a desindustrialização, baixa taxa de investimento e estagnação do aumento da produtividade. Indícios de crise a curto prazo: reversão súbita do fluxo de  capitais, falta de confiança no governo e a vigência de três subsistemas de drenagem da renda da indústria – pelo câmbio e  setores financeiro e tributário, expôs o analista.
Nakano não crê que este governo implante um ajuste fiscal como manda o figurino, suficiente para ativar uma retomada. O governo não só hesita, notou o palestrante, como depende para isso do Legislativo. A seu ver, 2016 também será recessivo e, com boa vontade, teremos em 2017 um exercício de semi estagnação com risco, na pior das hipóteses, de hiperinflação. Sem reformas a sério, continuarão os subsistemas de drenagem da renda da indústria. O professor frisou ainda que, na atual conjuntura, as despesas dos três poderes crescem mais rápido que as receitas e, sem ajuste fiscal e parada da expansão da dívida pública em relação ao PIB, o governo não atrai confiança. E se o Banco Central e o Tesouro não adotarem medidas mais drásticas para retomar o controle da taxa de câmbio, deixou avisado Nakano, virão a desvalorização do câmbio, destruição do valor do real, inchaço do custo da dívida externa e juros acima da atual estratosfera. Enquanto isso, em Brasília…  •

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