Gisele Barbin
Gerente comercial da Extrusa-Pack
No segmento de sacolas plásticas, onde minha empresa atua, o rótulo ‘descartável’ não se aplica. Afinal, grande parte delas é reutilizada e, quanto às não reaproveitadas, podem ser recicladas e, assim, gerar polímeros para segundo uso, proporcionando poupança de matéria-prima virgem e contribuindo para a inclusão social mediante a criação de empregos no manejo e triagem dos resíduos nas cooperativas, configurando assim uma oportunidade para catadores garantirem a subsistência. Além de práticas e econômicas, as sacolas plásticas são higiênicas e não se pode imaginar um canal de varejo sem elas para o consumidor transportar as compras. A indústria poderia ajudar a pressionar pela substituição da inadequada denominação descartáveis por reutilizáveis para as sacolas defendendo o emprego de plásticos pós-consumo reciclados (PCR) na composição dessa embalagem sem contato humano e cuja norma técnica de produção hoje admite apenas o emprego de aparas industriais em mistura com resina virgem. Este ajuste na regulamentação fortaleceria a conotação da sacola como uma embalagem multiuso e reciclável, totalmente em linha com os preceitos da sustentabilidade.
Andreia Ossig
Coordenadora de Tecnologia & Desenvolvimento da Innova
A questão terminológica em pouco ou nada contribui para a reflexão sobre o tema, pelo simples princípio de que os descartáveis são, sobretudo, recicláveis. Ou seja: a expressão ‘plástico de uso único’ é essencialmente incorreta e inverídica, levando em conta que a reciclagem é possível e abre caminho para a economia circular. Copos descartáveis são recicláveis. Essa, sim, poderia ser uma nova nomenclatura que levaria o consumidor a refletir e agir de forma sustentável. Nosso ECO-PS® (blend de poliestireno virgem e reciclado) é a prova de que o polímero retorna à cadeia após a reciclagem com excelentes propriedades em novas aplicações. Em algum momento, como meta, a reciclagem deverá se tornar política pública, com o fomento da coleta, separação e tratamento do plástico pós-consumo.
Clóvis Cortesia
Diretor Comercial do Grupo Copobras
Acredito que o termo descartável traz uma conotação pejorativa para produtos que oferecem praticidade, higiene e segurança com baixo custo e acessíveis a todas as classes sociais. O termo também remete à falsa impressão de que esse tipo de produto poderá ser descartado em qualquer lugar, poderá misturar-se com outro tipo de resíduo, além de não aludir à possibilidade de reciclagem.
A substituição do termo descartável por reciclável, por exemplo, poderá esclarecer a população que produtos plásticos de uso único possuem vida infinita quando separados de forma correta e remetidos à reciclagem.
As discussões para a mudança do termo devem caminhar em paralelo com a melhora da gestão dos resíduos (públicos e privados) e com a expansão da coleta seletiva – desde o descarte correto à promoção da reciclagem (marketing). O mesmo processo conjunto comporta ainda a desoneração da cadeia de reciclagem (redução de impostos, criação de incentivos fiscais e linhas de crédito para investimento em equipamentos), a valorização do material reciclado e o fortalecimento de seus novos mercados.
Medidas como coleta seletiva, logística reversa e outras estratégias de gerenciamento de resíduos sólidos são úteis e necessárias. Porém, não se pode apenas transferir a responsabilidade da solução para o transformador. A questão deve envolver educação (escolas), poder público (armazenagem, coleta seletiva e tributos) e o varejo (campanhas para aplicação de logística reversa, criação de Pontos de Entrega Voluntária – PEVs, premiações que promovam o retorno dessas embalagens pós-uso, etc). É preciso esta sinergia entre os atores envolvidos para que as características dos produtos de uso único sejam evidenciadas e abordadas de forma apropriada em debates sobre o uso do plástico, agregando valor à toda a cadeia.
Fernanda Soares
Analista de Marketing da Spumapac
O problema não está na denominação ‘descartável’. Ser um produto de uso único é importante para embalagens de poliestireno (PS), um plástico 100% seguro para estar em contato com alimentos. No entanto, se contaminado, compromete a segurança alimentar, a higiene e as propriedades térmicas das embalagens. Aos olhos da opinião pública, a principal dificuldade do material está na sua destinação para a reciclagem. A baixa comunicação para orientação da população sobre a possibilidade de reciclagem dos artefatos de PS ditos descartáveis é um dos principais fatores para o insucesso da ação. Além disso, pesa no cenário a necessidade de investimentos em equipamentos específicos para a reciclagem de PS, a dificuldade a esse processo causada por materiais contaminados com resíduos de alimentos e o reduzido atrativo econômico desses artigos de baixa densidade aparente para estimular a coleta por catadores em grande parte informais.
É preciso demonstrar também que o poliestireno expandido (EPS) pode ser facilmente reaproveitado, uma vez que tenha uma infraestrutura eficiente de coleta e reciclagem, podendo voltar à condição de matéria-prima para novos mercados fora da esfera dos alimentos. Uma referência nesse sentido é dada desde novembro último pela prefeitura de Belo Horizonte (MG), ao passar a incluir EPS em sua coleta seletiva, seja no sistema porta a porta ou em pontos de coleta.
Auri Marçon
Presidente executivo da ABIPET
Embora existam inúmeras e legítimas contestações circulando na midia, as Diretrizes da Comunidade Europeia definiram Plástico de Uso Único (single-use plastic product) da seguinte forma: “produto fabricado total ou parcialmente com plástico e não concebido, desenhado ou colocado no mercado para múltiplos usos com o mesmo propósito”.
Deixando de lado questões de semântica e partindo para o pragmatismo, o conceito embutido nessa definição tem muita relação com a economia circular e com o que, num passado recente, chamávamos de destinação pós-consumo ambientalmente adequada. As embalagens de PET pós-consumo atendem quaisquer das definições mencionadas. Além das dezenas de aplicações com base na destinação ambientalmente adequada – como materiais de construção, tintas, forrações, carpetes, componentes automotivos e peças técnicas como as de celulares – o recipiente de poliéster virgem para acondicionar alimentos pode, uma vez reciclado pela tecnologia bottle to bottle, ser utilizado no seu propósito original, autorizado pela saúde pública.
Por esse motivo, a embalagem PET não foi classificada como de ‘uso único’. Ao contrário, a Comunidade Europeia estabeleceu metas para o uso do material reciclado no conteúdo de uma nova embalagem (Recycled Content). Até 2025, esse índice deve ser de 25% e, até 2030, de 30%
No Brasil, já temos como principal aplicação para o PET reciclado a fabricação de novas embalagens. Em 2019, das 311.000 toneladas recicladas do poliéster, 24% foram parar em novas garrafas e, em 2021, essa porcentagem deve beirar 30%.
Sérgio Carneiro Filho
Diretor da SR Embalagens
Não acredito que o mais importante aqui seja a classificação inadequada, mas sim o descarte adequado. Em vários nichos são a descartabilidade, modernidade e/ou o custo (incluso o ambiental) que diferenciam a embalagem, quando esta ou aquela característica é justo o que se procura em determinados usos. Talvez o exemplo mais patente e recente disso sejam as embalagens e equipamentos protetivos na esfera médico-hospitalar, caso de máscaras e seringas plásticas, evidenciados no enfrentamento da pandemia. A cadeia plástica mundial tem evoluído muito em decorrência da conscientização relativa ao descarte correto.
Braskem
O mais importante não é o nome utilizado, mas a forma que utilizamos, descartamos e reaproveitamos o produto plástico. A imagem negativa vinda com o rótulo descartável está no fato de ter sido estimulado o consumo excessivo do artefato de uso único sem endereçar o seu descarte para um novo processo produtivo. É essencial que ele também se enquadre no conceito de consumo consciente e descarte adequado a fim de possibilitar a reciclagem e o retorno à cadeia como um novo artigo. A Braskem está empenhada na missão de gerar valor para a cadeia do plástico e promover a importância do descarte adequado e da reciclagem. Exemplo disso é que, em 2018, lançamos, em parceria com a empresa Dinâmica Ambiental, o Programa de Logística Reversa de Copos Descartáveis, voltado para orientar e incentivar organizações a destinarem adequadamente os copos plásticos pós-consumo. O programa inclui a coleta dos copos nas empresas e estabelecimentos comerciais, transporte do material coletado para recicladores e, posteriormente, transformação em resina reciclada pós-consumo, a ser utilizada na fabricação de produtos como tampas para cosméticos e utensílios domésticos.
Para entender o contexto do uso dos copos descartáveis e desenvolver o programa, a Braskem, em parceria com a consultoria ACV Brasil, realizou um estudo comparativo de Avaliação de Ciclo de Vida entre copos descartáveis de polipropileno (PP) e copos reutilizáveis após serem lavados. A pesquisa mostra que os copos descartáveis demandam 30% menos energia em seu ciclo de vida e usam menos água, ao consumirem apenas 26 ml em todo o seu ciclo (incluindo produção e reciclagem), enquanto os copos reutilizáveis podem utilizar até 1,2 L em cada lavagem manual. Até agosto de 2021, foram coletados através do programa mais de 33 milhões de copos, volume que equivale a 22 campos de futebol do estádio do Maracanã. Fica aqui o nosso convite para que outras empresas e estabelecimentos se juntarem a esta iniciativa de logística reversa.
Eduardo Van Roost
Diretor da Res Brasil, agente da Symphony, fabricante de aditivos como oxibiodegradável e antiviral
Recorro à História como antídoto ao negacionismo em relação aos plásticos. No século 19, a questão de lavar as mãos quase inexistia. Os hospitais, as conhecidas ‘Casas de Morte’, eram espaços em que doentes ficavam amontoados, em salas pouco ventiladas, sem acesso a higiene e água limpa. Naquela época, ir a um hospital era quase uma sentença de morte. Foi o que observou em 1846 Ignaz Semmelweis, recém-nomeado assistente do diretor e residente-chefe da Clínica de Maternidade do Hospital Geral de Viena. O médico húngaro conduziu o primeiro estudo experimental relacionando a doenças a falta de higienização das mãos e de equipamentos. Semmelweis ordenou que todos lavassem as mãos com uma solução de cal clorado antes de realizar qualquer exame e observou, em poucos meses, a taxa de mortes cair drasticamente. Hoje em dia, a relação entre doenças e contaminação por micro-organismos é reconhecida como problema de saúde pública e um desafio global pela Organização Mundial da Saúde. Nos meados do século 19, a recomendação de Semmelweis de que os médicos deveriam lavar as mãos e os instrumentos cirúrgicos enfrentou oposição.
Alguma semelhança com a situação atual dos descartáveis plásticos?
Atributos de higiene, praticidade e custo reduzido deram origem a diversos produtos e foram as pessoas que entenderam que alguns deles são descartáveis. Algumas destas vantagens desapareceu nos dias de hoje? Óbvio que não, muito ao contrário. As pessoas entendem que aquilo que usam em contato com a boca e outras partes do corpo com fluídos e secreções não deve ser usado por terceiros; deve ser descartado e daí o termo descartável.
Os mesmos produtos em papel, metal, vidro, madeira enfrentam oposição? Parece que não. O problema não é o termo descartável, mas as falsidades sobre o material plástico que são mais rápida e profundamente difundidas do que a verdade. A maioria das informações que recebemos das mídias sociais é falsa. As mentiras são mais excitantes do que a realidade e, quanto mais repetidas, mais as pessoas acreditam nelas.
Plásticos representam apenas 0,5% das matérias-primas que usamos e 0,4% do lixo que geramos. O que significa que 99,5% são outras matérias-primas e 99,6% do lixo que geramos não são plásticos. Ao contrário, o plástico reduz o lixo que geramos. Mas estas informações são ignoradas nas campanhas contra o plástico, forçando a sua substituição por materiais muito mais impactantes para o meio ambiente e, muitas vezes, não recicláveis.
A classificação de um produto descartável está na mente das pessoas, independente do material. A meu ver, mudanças na rotulagem ressaltando as qualidades de higiene, praticidade, economia e, em especial, a reciclabilidade, podem ajudar, mas não resolvem o mal-entendido. Mais do que uma mudança de classificação, é preciso contrapor com fatos o lobby dos compostáveis que patrocinam ONGs e fundações antiplásticos, como a Ellen MacArthur, somado à força de convencimento que os outros materiais possuem junto a influenciadores. Se isso não acontecer, quais serão os próximos plásticos a serem banidos por leis ou rejeitados pelas pessoas?