Tal como se dizia dos EUA em relação ao mercado mundial pré-globalização, se bens duráveis pegam gripe, os plásticos de engenharia caem de cama. O Brasil de hoje não escapa desta lógica, pois a embolação indigesta da inflação, juros na lua e endividamento das famílias jogam para escanteio a compra de produtos como carros, eletroeletrônicos e materiais de construção que fazem a alegria dos balanços de compostos de polímeros nobres. Mas há quem não cruze os braços e enxergue na maré baixa o momento para ganhar músculos para entrar em cena com força total na primeira volta por cima do mercado. É o caso das componedoras Dakhia e Krisoll, hoje dedicadas a expandir seu poder de fogo para singrar em novos mercados. Os investimentos em curso e as reformuiladas estratégias de expansão são abertos nesta entrevista por Josimar Fazolare e Vladimir de Oliveira, respectivamente diretores comerciais da Dakhia e Krisoll.
Segundo a associação Eletros, as vendas de eletroeletrônicos cresceram 10% no primeiro semestre contra o mesmo período em 2022, interrompendo um período de ano e meio de queda contínua. Sua empresa percebeu esta reação neste setor, através do aumento de pedidos de novos desenvolvimentos e da procura mais intensa por determinados produtos seus?
Josimar Fazolare: Sim, foi perceptível este aumento de volumes em clientes de eletroeletrônicos e linha branca, como no ramo de ar-condicionado e X-Box de caixa acústicas por exemplo. Em em alguns clientes o crescimento dos pedidos de materiais foi bastante significativo.
Vladimir de Oliveira: Sim, observamos uma recuperação neste segmento eletroeletrônico, muito alavancado por fabricantes de equipamentos de áudio em geral e de som automotivo. Nossos compostos Sollamid B, à base de poliamida (PA) 6, são muito empregados em componentes de módulos de amplificadores automotivos e numa grande gama de comutadores para o segmento de automação que também utilizam componentes injetados com PA.
Esta reação em eletroeletrônicos compensou ou não, para sua empresa, a demanda enfraquecida no primeiro semestre de materiais para autopeças originais? E mais: a demanda de materiais para autopeças de reposição foi ou não maior no primeiro semestre que a de materiais da sua componedora para eletroeletrônicos?
Josimar Fazolare: Nossa presença no setor de autopeças originais ainda não é tão forte e, por isso, não pudemos ter a percepção de demanda enfraquecida para este setor. Porém, como estamos em vias de obter o certificado IATF (credencial de gestão da qualidade para fornecedores de componentes automotivos), nossa meta é estarmos estrategicamente mais forte neste setor de autopeças originais em grandes empresas. Já o mercado de autopeças de reposição esteve forte e não apresentou queda de volume, porém a guerra de preços permanece grande.
Vladimir de Oliveira: Mesmo considerando este incremento, a demanda de materiais pelo segmento eletroeletrônico não foi suficiente para anular o baixo consumo da indústria de autopeças originais. Ela ainda cumula perdas no balanço deste ano, apesar da recente reação (nota- motivada pelo programa do governo vigente de junho a julho, liberando RS$ 650 milhões para venda atingida de 125.000 carros zero com desconto). Já o segmento de autopeças de reposição tem mostrado muito mais estabilidade desde o ano passado, representando uma parte importante de aplicações de materiais plásticos sustentáveis. Em volume o setor de autopeças de reposição ainda tem mais presença em nossas vendas que as aplicações em eletroeletrônicos.
Com base no observado nos primeiros seis meses e diante de eventos estimulantes para o seu negócio no segundo semestre, como Black Friday e Natal, qual a expectativa para o desempenho de sua empresa este ano versus 2022?
Josimar Fazolare: Estamos com uma visão muito conservadora do mercado. Não enxergamos um grande crescimento devido à questão da falta de consumo na ponta e alto juros de financiamento. Tudo isso atrapalha muito o consumo final e daí estarmos considerando um volume flat (estável) para este segundo semestre.
Vladimir de Oliveira: Historicamente, o segundo semestre se apresenta mais profícuo em termos de demanda de plásticos de engenharia. Considerando que algumas diretrizes político-econômicas também já tomam forma, acreditamos em melhores resultados para os meses que restam. Nosso objetivo é igualar os resultados de 2022 em peso, pois em faturamento é pouco provável uma recuperação de preço-base ou no câmbio.
Qual a opção mais atraente para sua empresa hoje em dia: comprar polímero de PA 6 da China, Europa ou EUA?
Josimar Fazolare: A China domina amplamente a questão de custos/preços de PA 6 no mundo, indicadores que hoje refletem, principalmente, a queda da demanda global. A Europa passa por uma crise muito séria de energia, uma conjuntura dificultada pela continuidade da guerra na Ucrânia e, por isso, o continente não é mais competitiva em PA 6. Quanto aos EUA, vêm tentando diminuir o gap entre seus preços e os da China. Os preços norte-americanos também têm baixado devido à queda de demanda local, porém ela ainda está muito distante da intensidade notada sob o declínio da economia na China e Europa.
Vladimir de Oliveira: Os elevados custos do gás na Europa comprometeram o custo de polimerização de PA 6, inviabilizando o uso de grades de baixa/média viscosidade. Os preços de PA 6 nos EUA de janeiro a junho também não foram atrativos, condição possível de mudar neste semestre. Dessa forma, a melhor opção para nós de fornecimento de polímero de PA 6 para injeção foi a China. Grades de PAs de alta viscosidade e os copolímeros ainda têm nicho de aplicação específico, onde desempenho é o critério de compra que fala mais alto e por isso fomenta importações desses materiais mais especiais da Europa, caso de alguns tipos da família Ultramid (nota – marca de poliamidas da Basf).
Como a Krisoll avalia a possibilidade de diminuir a concentração de seu negócio em PA ingressando no beneficiamento de outros plásticos de engenharia e/ou na importação de materiais nobres menos disputados no Brasil que os redutos de PA 6 e 6.6?
Vladimir de Oliveira: A Krisoll sempre fomentou uma vertente de prestação de serviços de mão de obra de extrusão para terceiros. Com a ampliação da capacidade produtiva, teremos mais espaço para crescer nesta modalidade. Os mesmos equipamentos utilizados para a produção dos compostos Krisoll e para o beneficiamento de resinas para terceiros. Desde 2021, estamos investindo na expansão do portfólio de resinas nobres, complementando nossa oferta com tie layer (adesivo para co-extrusão), poliamidas 6.10 e amorfas e, fora da categoria de PA, ácido polilático (PLA) para filamentos 3D e embalagens.
O mercado mundial e nacional de plásticos de engenharia acusa baixo crescimento. O cenário do setor no Brasil anda mais favorável para investimentos em capacidade ou para articular fusões ou aquisições de concorrentes?
Josimar Fazolare: Muito boa esta pergunta porque, apesar de um mercado recessivo em vários setores, incrementamos nossa fábrica este ano com equipamentos novos e acessórios para extrusão como dosadores gravitacionais em prol de melhor performance e desempenho. Os principais investimentos foram os equipamentos de controles gravimétricos para todas as extrusoras de escala comercial, verticalização do estoque de produto acabado, novo site industrial com 8.500 m² com cinco docas de carga/descarga, recertificação pela norma ISO 9001 e o já mencionado credenciamento IATF 9649 previsto para outubro próximo. Mas indo direto ao ponto da pergunta, compramos recentemente metade do controle societário da componedora Produmaster, pois vimos na transação uma oportunidade de sinergia em nosso mercado.
Vladimir de Oliveira: Vivemos o antagonismo de indicadores econômicos que ora apontam para um cenário mais conservador e ora para uma recuperação mais substancial em bens de consumo. A Krisoll ponderou sobre todos esses cenários e apostou na consolidação de sua família de compostos de PA 6.6 e 6 (Sollamid A e B) de alto desempenho adquirindo nova linha de extrusão dupla rosca visando ampliar o fornecimento de soluções para setores de alta exigência como o automotivo e o de implementos agrícolas.
No ano passado, a Dakhia anunciou parceria com a concorrente Produmaster, componedora de PP e PE com planta na Bahia. De que se trata especificamente essa parceria?
Josimar Fazolare: Sim, a Dakhia comprou 50% da Produmaster com o objetivo de reforçar o mostruário com um ganho de sinergia técnica e comercial. As vantagens da parceria são enormes. Olhando pelo lado técnico, conseguimos criar uma sintonia entre as engenharias, uma adequação de produção x portfólio e agregando valor para as duas empresas junto aos clientes – a Dakhia com uma penetração maior num mercado mais diversificado e a Produmaster mais focada no mercado automotivo. As empresas trabalham de forma independente, mas claro que estamos num processo de transição pensando em compras e outros setores. A Produmaster é focada nos compostos de PP e PE e a Dakhia em plásticos de engenharia.
Dakhia está completando 25 anos. Quantas extrusoras dispõe em sua capacidade instalada de 12.000 t/a em Diadema e quais os produtos que norteiam o desempenho atual da componedora?
Josimar Fazolare: Hoje contamos com cinco extrusoras de dupla rosca e a capacidade de 12.000 t/a contempla a parcela de nossos compostos e a fração de materiais (resinas) para revenda, muitas vezes submetidos à aditivação. Mas temos capacidade instalada para atender muito mais! Em relação a desenvolvimentos, a Dakhia tem sua principal família de produtos na categoria de PA, inclusos os tipos 6, 6.6 e a biopoliamida 5.6 cuja demanda, por sinal, vem crescendo rapidamente devido à entrega de redução de 50% da pegada de dióxido de carbono no comparativo com PA 6.6. Também trabalhamos com diversas especialidades de engenharia de apelo sustentável e com um grau de qualidade aprovada por clientes como sistemistas de autopeças originais Tier 1. •