Com projetos para incremento de produção de polietilenos (PE) transitando pela Arábia Saudita, passando por desgargalamento em Bahia Blanca, na Argentina, e chegando à expansão de crackers no Golfo dos Estados Unidos, a Dow tem credenciais para formar preços e fazer a cabeça de analistas ao esmiuçar tendências para a resina mais consumida e suas rotas de matéria-prima. Contudo, muitas águas rolaram desde o frenesi de anúncios de novas capacidades norte-americanas de PE, lastreadas em eteno obtido de etano extraído de gás de xisto (shale gas). O petróleo desde então despencou no pregão, tornando menos atraente fontes de exploração não convencionais, a Europa patina em deflação sem fim à vista, a China desacelerou e ganha autonomia em poliolefinas e, fora México, a América Latina virou um deserto de projetos petroquímicos onde o Brasil soçobra na tempestade perfeita da recessão envenenada com instabilidade política. De volta aos EUA, alguns investimentos em PE devem vingar, enquanto outros não sairão do papel, convergindo assim para um volume adicional mais palatável do termoplástico, abaixo das projeções originais, aposta nesta entrevista Diego Donoso, presidente global de PE e de embalagens da Dow.
PR – Quando e em qual patamar o preço do petróleo deve estabilizar?
Donoso – O preço não vai estabilizar. Historicamente, ele passa por etapas. Se olharmos os últimos dois anos, houve equilíbrio do barril entre US$ 100 e US$ 110. Esse patamar permaneceu por um bom tempo. A grande dificuldade da indústria petroquímica é tentar responder a essa pergunta, pois ninguém até hoje conseguiu dizer o motivo de o preço sair de US$ 110 e ir a US$ 45.
PR – Não foi o gás de xisto?
Donoso – Não. O gás de xisto não nasceu há seis meses. E, olhando para frente, temos diferentes argumentações. Algumas levam a crer que os preços voltarão aos US$ 90 ou US$ 80, enquanto outras defendem que o barril ficará em US$ 60 ou até menos.
PR – Mas, para os novos projetos em PE, a Dow trabalha com qual estimativa?
Donoso – A nossa estratégia de matérias-primas não se refere apenas a eteno. Há muitos anos, ela contempla uma ampla variedade de craqueamento, com propano, butano, nafta, etano etc. Sempre buscamos diversificação e ela custa dinheiro. Outras empresas querem apenas economizar. A indústria norte-americana se converteu ao etano e não a um mix, enquanto a Dow manteve a flexibilidade que já tinha. Ninguém acredita que o barril do petróleo ficará em US$ 50, mas em US$ 60 ou
US$ 70. Nos próximos dois ou três anos, a tendência é para cima, não para baixo. Do nosso lado, não fazemos grandes projetos com visão de três anos, mas de 40. No fim do ano passado, estávamos craqueando propano na Europa com vantagem competitiva frente aos players locais.
PR – Da produção global de PE da Dow, qual a parcela seguidora da rota nafta e qual a parcela adepta da rota gás?
Donoso – Em Sadara, na Arábia Saudita, por exemplo, a maior parte da produção de PE será alimentada por gás. Mas no todo é um projeto híbrido para permitir, via nafta, a retirada de polióis, isocianatos (MDI) e outros químicos. Nosso projeto no Golfo dos Estados Unidos é também rico em etano. Na Europa, temos produção via nafta, propano e butano. No entanto, gás tende a predominar cada vez mais.
PR – Com a baixa do preço do petróleo, a exploração de óleo e gás extraídos do xisto perdeu margens de lucro e empresas acumulam pesados endividamentos. Qual a consequência prevista da menor intensidade da exploração dessas reservas e do enxugamento do número dessas empresas exploradoras sobre o negócio de eteno/PE nos Estados Unidos?
Donoso – Na nossa indústria existem dois grupos. Há os projetos estratégicos de players tradicionais que querem crescer. A Dow nas Américas precisava desesperadamente expandir para atender as demandas dos clientes. O segundo grupo de empreendedores é o oportunista. Ele encontrou oportunidade para investir em PE naquele panorama de custo e juros baixos para exploração de óleo e gás das jazidas de xisto e agora vê que as contas não fecham.
PR – Esse cenário deve resultar na postergação dos novos complexos de produção de PE?
Donoso – Em um grupo não haverá atrasos. A Dow está na frente dele; queremos ser os primeiros na largada. O segundo grupo está atrasando os projetos. Há empresas dizendo que o conselho está revisando, outras alegam que o investimento está parado. Há muita indefinição.
PR – Até 2017, os Estados Unidos devem ter um excedente da ordem de 8 milhões de toneladas de PE. Além disso, a China está em deflação e com crescente autonomia na produção de resinas como PE e PVC. Oriente Médio exibe novos projetos de eteno/PE, como o da Dow. África e América Latina não têm demanda suficiente para colaborar de forma significativa na absorção desse excedente. Como fazer dinheiro com isso?
Donoso – Não concordo. Podemos debater quanto dos 8 milhões de toneladas vão realmente acontecer a partir de 2017. O que vai sair numa primeira ou em uma segunda leva. Na primeira, não acredito que serão 8 milhões de toneladas, mas a metade disso. A segunda pode acontecer no ano seguinte ou dois ou três anos depois. Se considerarmos o horizonte mais longo, o crescimento mundial, mesmo sendo mais lento, resultará em demanda adicional de PE. Estive na Índia em fevereiro e o consumo local cresce 1 milhão de toneladas a cada 18 meses. O PIB da Índia subia timidamente e agora avança 6% ao ano. Por mais que não seja a China, a Índia consome quase um projeto Sadara a cada 18 meses. Da mesma forma, o sudeste da Ásia continua avançando e a população aumenta. A China, ainda que registre variação de PIB de 4,5% ou 5,5%, cresce significativamente em comparação a outros mercados e ela deve chegar a apenas 60% ou 65% de autossuficiência em PE. Os projetos a partir da rota do carvão (coal to olefin) são pequenos e não colocam 1 milhão de toneladas por vez. Além disso, foi dada uma pausa em empreendimentos desse naipe porque muito volume foi adicionado na China nos últimos dois anos.
PR – Acredita, então, que há um equilíbrio dentro dessa expectativa de desovar a capacidade excedente?
Donoso – Sim. Nossos clientes continuam crescendo. Já vivenciamos crises em diversos países e a demanda de PE é muito mais robusta do que os analistas acreditam.
PR – A que atribui esse fatalismo dos analistas?
Donoso – O analista ou economista sempre precisa fazer uma projeção. Porém, eu gosto de ver a realidade dos clientes, se estão comprando ou não, ou se está havendo substituição de rígidos por flexíveis. Em supermercados da Indonésia não há embalagens rígidas. Há prateleiras e prateleiras, de todas as categorias, de pouches. Eles pularam do vidro e lata direto para o flexível.
PR – Segundo o Icis, os EUA ainda estão produzindo menos eteno que na década passada. Além disso, trata-se de um mercado maduro, de saltos comedidos no consumo de PE. Isso prenuncia um ciclo de fusões de aquisições entre produtores norte-americanos de PE ?
Donoso – Estamos usando a palavra errada. As capacidades que estão entrando nos EUA são novas, não excedentes. Os EUA sempre exportaram. Eles ensinaram Índia, China e todos os outros países da Ásia a construírem mercados para PE há 30 anos, quando a resina vinha da América do Norte. Todos os players tradicionais supriam a Ásia. Os EUA atuam globalmente, assim como a Arábia Saudita. As capacidades serão posicionadas no mundo.
PR – Em sua opinião, quanto dessa nova capacidade ficará nos Estados Unidos e quanto será exportado?
Donoso – Isso vai depender do crescimento da demanda norte-america. O nosso cliente que vai decidir se deve ou não investir em maquinário e se vai produzir para exportar. Além disso, pellets viajam muito bem em contêiner. Para um player global sério, essa exportação não é excedente e ele vai atender o crescimento de seu cliente em qualquer lugar do mundo.
PR – A partir do ano que vem, entra em campo uma nova planta local de PE no México (N.R.- Braskem/Idesa), mercado já atendido pela Dow. Isso muda sua posição naquele país?
Donoso – No México, a Dow tem uma participação estratégica. Não dominamos o mercado mexicano, atendido por muitos fornecedores, mas nossas posições são sólidas. O projeto de nosso concorrente no México não é só para o mercado local. Ele será um player multirregional. Ninguém hoje coloca 1 milhão de toneladas pensando em um só país. Provavelmente, irá fornecer até para os EUA.
PR – Isso altera a estratégia da Dow para o país?
Donoso – Não.
PR – Petrobras põe à venda sua participação na Braskem. Analistas consideram a venda complicada devido à questão do suprimento de nafta e gás de uma única fonte e do momento delicado vivido pelos acionistas da empresa. Do ponto de vista de um global player de PE, quais as condições básicas que um ativo petroquímico desse tipo teria de exibir para despertar interesse no mercado internacional?
Donoso – O olhar é de competitividade. O mundo não tem fronteiras e PE flui livremente. Se você não é competitivo nessa realidade, terá dificuldade. É sempre interessante estar dentro de grandes mercados, mas de nada adianta ter presença e não ser competitivo.
PR – Dow ventilou plano de expandir (N.R.- 400.000 toneladas, segundo a Polyolefins Consulting) Bahia Blanca. Qual o nexo dessa intenção e como viabilizar essa expansão sem gás e energia?
Donoso – O plano inclui várias etapas e o investimento com a YPF está andando bem. Nosso projeto é de encontrar gás natural nas reservas de Vaca Muerta e ajudar o país a resolver o déficit nesse suprimento no qual se encontra.
PR – Dow vendeu para a brasileira Valplast uma fábrica sua de filmes então aposentada nos EUA. Quais as demais atividades da Dow em transformação nos EUA e há intenção de vendê-las?
Donoso – Não posso fomentar rumores. Temos, sim, outras fábricas de transformação nos Estados Unidos e Europa.
PR –Cogita vender essas operações e focar apenas em seu core business, as resinas de PE?
Donoso – Isso eu não posso dizer. •