Cai na primeira sexta feira de outubro. Nesse dia, fábricas de todos os setores dos EUA abrem as portas a visitantes considerados estratégicos para sua sobrevivência. São estudantes trazidos em caravanas às plantas para atestarem, ali ao vivo, que a atividade fabril nada tem de suja, perigosa e enfadonha e, para as empresas anfitriãs, constitui uma oportunidade de ouro para construírem uma ponte com novos talentos e, quem sabe, seus funcionários no futuro. Denominado Manufacturing Day (Dia da Indústria numa tradução aproximada), esse evento anual foi iniciado em 2012 com 240 indústrias participantes. Na edição de 2016, ele foi prestigiado por cerca de 3.000 fábricas nos EUA, Canadá e México, que receberam em torno de 250.000 estudantes com seus professores a tiracolo. A importância conquistada pelo Manufacturing Day pode ser aquilatada pela presença de John King, Secretário da Educação dos EUA, na comitiva levada em 7 de outubro último a conhecer as dependências da transformadora de injeção e ferramentaria Proper Group International, em Warren, Estado de Michigan.
Corte para o Brasil: o trabalho em indústria hoje exerce sobre os jovens o mesmo fascínio que a política. Sobram relatos sobre o desinteresse de vestibulandos por cursar Química ou Engenharia Mecânica, em contraste com a identificação deles com as oportunidades no setor de serviços, desde TI e mercado financeiro ao comércio e gastronomia. É achar agulha em palheiro ler uma reportagem de empreendedorismo sobre um novo talento que abriu uma fábrica. Entre as razões para esse distanciamento, consta o desconhecimento da geração Y sobre a realidade industrial que, nos EUA, o Manufacturing Day vem combatendo com persistência.
Manda a lógica, portanto, recomendar-se a transposição com casca e tudo da ideia dos EUA para cá. Acontece que Deus ou o Diabo moram nos detalhes. Para começar, o Manufacturing Day transcorre em dia útil; não é pretexto para parlamentar algum babar ovo propondo sua inclusão no calendário nacional de feriados e pontos facultativos, praxe na vida pública tupiniquim. Se assim fosse, o Dia da Indústria teria fatalmente as fábricas às moscas, pois todo mundo estaria na praia curtindo a manufatura das ondas. Além do mais, nem o empresariado nem a indústria propriamente dita foram até hoje contemplados com um dia para chamar de seu, prova da sua irrelevância aos olhos dos legisladores. E é pura má vontade chamá-los de insensíveis ou inativos, demonstra a pluralidade de datas comemorativas já oficializadas. São referências o Dia do Orgasmo (31/07), Dia da Toalha (25/05), Dia do Gordo (10/09), Dia do Flamenguista (21/10), Dia do Samurai (24/04), Dia do Cotonete (25/06), e, para não ir mais longe, o Dia da Ressaca (28/02), da Sogra (28/04) e dos Solteiros (15/08).
Tem mais. Se nos EUA, a indústria está em franca reinvenção, rumo à manufatura avançada, por aqui se caminha para a manufatura recuada. A atual participação da indústria no PIB brasileiro (11,4%) é o mesmo patamar registrado nos jurássicos anos 1940, razão pela qual o termo desindustrialização entrou em voga. Culpa também de um superado modelo de política industrial cuja mais recente prova de ineficácia é no que deram aquelas companhias chamadas campeãs nacionais. Se a lição foi mesmo aprendida dessa vez, o país terá de adotar uma política industrial moderna, incentivadora da inovação, produtividade e P&D. Nela não cabe mais a concessão de crédito subsidiado a grandes empresas que não precisam do suporte do poder público.
Do jeito que está, a indústria nacional está virando uma espécie em extinção, um lobo guará da atividade produtiva. Se o Dia da Indústria for promulgado aqui, os estudantes não devem perder a chance. Não é toda hora que se pode visitar algo antes que acabe. •