Quando a indústria automobilística derrapa, os plásticos de engenharia batem pino. Desde o início da pandemia, gargalos no suprimento mundial de insumos emperram as linhas de montagem, um abacaxi azedado no Brasil pelo dólar na lua combinado com extrema dependência de resinas nobres importadas para injeção de peças técnicas. Entre os materiais unha e carne com autopeças nacionais, o reduto das poliamidas (PA) 6 e 6.6 capta o drama em cheio. Mesmo assim, um dos seus maiores protagonistas, a componedora Radici Plastics, subsidiária do italiano Radici Group, ás de ouros no polímero e suas especialidades, vem mantendo a expansão do negócio nos trilhos graças não só a este elo múlti, mas à caça a mercados fora do resort automotivo, deixa claro nesta entrevista Jane Campos, CEO da operação brasileira à frente da planta sede em Araçariguama, interior paulista.
Os gargalos no suprimento de insumos e chips vêm freando a produção automotiva brasileira, situação sem alívio a curto prazo. Como isso respingou no seu fornecimento de PA para autopeças em 2020? Quais as perspectivas para este ano?
No ano passado, a produção foi comprometida pela parada em função da pandemia, o que fez com que tivéssemos queda de quase 32% no volume comparado com o exercício de 2019. Já em 2021, quando tudo indicava que teríamos um excelente ano para o mercado automotivo, veio a falta de semicondutores, plásticos de engenharia, aço borracha etc. Isso fez com que a produção de veículos caísse novamente e, por tabela, nosso fornecimento de compostos foi afetado. Mas de outro ângulo, o super aquecimento da demanda por nossos produtos em outros mercados deu fôlego à nossa operação. Foi o caso de produtos como interruptores de luz, batedeiras, liquidificadores, lavadoras de roupa, cujas vendas têm sido impulsionadas pela melhoria do ambiente doméstico sob o imobilismo social. Daí porque nossa perspectiva é de crescimento forte para o período atual.
Com o alastramento da pandemia o segmento de fornecedores de PA 6 para barreira de embalagens flexíveis de alimentos superou ou não a demanda pelo polímero para peças técnicas, em especial componentes automotivos?
O segmento de embalagem teve forte alta em 2020 devido ao consumo, considerando que as pessoas ficaram em casa e consumiram mais embutidos. No caso da Radici ele representa por volta de 12% das nossas vendas e chegou a 20% durante a parada do mercado. Mas sua participação ainda é pequena comparada ao consumo de PA 6 para peças técnicas.
Numa estimativa no plano geral, poderia dar referências dos reajustes acumulados nos preços médios internacionais de PA 6 e PA 6.6 em 2020 e no primeiro quadrimestre de 2021?
No último quadrimestre de 2020 os preços na Europa da tonelada das principais poliamidas estiveram cotados assim: PA 6, 1.630 euros e PA 6.6, 2.870. Os preços cotados para as mesmas poliamidas em abril deste ano foram de 2.595 euros para PA 6 e 4.180s para PA 6.6.Ou seja, aumento de aproximadamente 59% para PA 6 e 61% para PA 6.6. Mesmo com o alto preço das poliamidas o abastecimento ainda não acompanha a demanda interna e a insuficiência de produto tem prejudicado o desenvolvimento dos negócios. Fomos obrigados a declinar de novos clientes para preservar os cativos.
Pela sua percepção, quantos componedores de PA de maior porte operam no Brasil? E de médio e menor porte?
No segmento de PA temos três empresas de maior porte, seguidas de aproximadamente mais quatro componedores nacionais de médio porte e muitos outros pequenos. A propósito, a histórica informalidade está cada vez menor, efeito dos controles rígidos do governo. Quem mais sofre neste período são os transformadores que não conseguem repassar para os clientes os reajustes recebidos nas especialidades de PA, matéria-prima importada e precificada em moeda forte. Isso, aliás, é um alerta para futuros problemas de crédito no mercado.
Como avalia a atuação dos distribuidores autorizados no Brasil de compostos importados no mercado interno de compostos de PA 6 e 6.6?
A intenção de um produtor é sempre conseguir escala, lotes econômicos e, neste caso, entra a posição dos distribuidores que conseguem manter estoques e atender a pequenas e médias demandas. Eles também contam com uma estrutura logística mais eficiente do que os componedores de PA 6 e 6.6. No balanço da Radici, a distribuição mobiliza em torno de 9% do nosso volume de vendas e seu trabalho é muito importante para colocar os materiais em vários pontos do país. Em regra, distribuidores de plásticos não trabalham apenas com PA; trata-se de mais elemento para enriquecer o portfólio. Eles lidam em geral com tipos básicos desses compostos.
Como avalia a competitividade em preços dos compostos produzidos aqui versus a concorrência importada no mercado sul-americano?
O preço dos compostos feitos no Brasil são bastante competitivos mas a grande vantagem é que podemos oferecer assistência técnica, produtos sob medida e um portfolio maior tendo a escora da fabricação local.
Qual o impacto da pandemia nas vendas internas dos fornecedores de compostos de PA 6 e 6.6 em 2020 e quais as perspectivas para este ano?
Em 2020 o consumo nacional de PA teve queda de aproximadamente 5% perante 2019 mas com forte retomada prenunciada para este ano. Quanto ao desempenho da Radici, fechamos 2020 com os mesmos volumes de 2019, porém com melhor resultado financeiro. Estamos estimando para este ano crescimento de 10% acima do budget.
O que pode adiantar sobre novos desenvolvimentos e aplicações de seus materiais de engenharia no Brasil este ano?
Iniciamos 2021 com grandes projetos principalmente para nossa especialidade Radilon® Mixloy, bem sucedida blenda de PA 6 com copolímero de acrilonitrila butadieno estireno (ABS), indicada em especial para itens do interior (habitáculo) de veículos e cujas características mais solicitadas são aparência e a resistência química e térmica. Por sua vez, a linha de compostos de polibutileno tereftalato (PBT) também abriu espaço em campos como manipuladores de fogões e já tem uma participação significativa nas nossas vendas. •