Força concentrada

Harsch: crescimento do setor automotivo é caminho sem volta.

Mesmo blindada como o setor mais protegido do Brasil, a indústria automobilística sente a cruz da economia em pandarecos pesar nas suas costas. Apesar das nuvens hoje carregadas, a previsão de bom tempo mais à frente não empalidece aos olhos da Borealis Brasil, ás de ouros em compostos de polipropileno (SP). Seu voto mais bombástico de confiança na virada do jogo a médio prazo tomará forma em abril de 2015, com a inauguração da segunda unidade no complexo em Itatiba, interior paulista. “Passarmos da área atual de 60.000 m² para 200.000 m², mediante a compra de um terreno vizinho, suficiente para alojar três plantas do nosso padrão”, antecipa Leonardo Harsch, presidente da subsidiária brasileira da corporação petroquímica sediada na Áustria.
Na constelação de fábricas de poliolefinas e compostos da Borealis, a operação no Brasil não tem par na ativa em mercados emergentes, reconhece Harsch. “O país é o único mercado em desenvolvimento no qual vemos possibilidades de expansão das vendas de carros”, sustenta o dirigente, apesar de admitir a existência de pedras no caminho. Para fora do portão da indústria automobilística, ele exemplifica os entraves com a escassez de crédito, juros na lua, baixa poupança interna, as sarnas do Custo Brasil e um grau de intervencionismo e dependência do governo nos negócios a ponto de estar para nascer a grande empresa que não convide político para cortar cordão inaugural de sua fábrica. Do lado de dentro do setor automotivo, Harsch admite um choque entre a capacidade produtiva acima de 5 milhões de veículos anuais, a cargo de dezenas de montadoras, e uma demanda da ordem de 3,5 milhões de unidades nos seus melhores dias – para emoldurar o drama, apenas de outubro de 2013 a outubro de 2014 a produção do setor ruiu 16%. No consenso de analistas como o ex-ministro e conselheiro de governos Delfim Netto, a pobreza da poupança interna conjugada com a capacidade excedente e o enterro do ciclo de crescimento da economia via estímulos ao consumo tornam o setor automotivo, mesmo hiperprotegido, digno de muita pena. Em clima contemporizador, Harsch afirma com diplomacia esperar dessa zona de turbulência por nada além de uma repaginada no pool de vendas do ramo, com alguma transferência percentual da fatia das maiores montadoras (Fiat, GM, VW e Ford) para a multidão dos concorrentes locais, entre eles os recém-chegados chineses .
Mas esses estorvos não desfocam a foto do nosso mercado automotivo, insiste o porta-voz da componedora, pois ele escora-se na solidez de pilares a exemplo da renda gerada no interior do país pelo agronegócio e mineração, o acabrunhante transporte urbano avivando a imagem do carro como salvação e status para o povaréu de baixa renda ou a efetiva implantação do sistema de inspeção veicular, contribuindo para varrer das ruas os fósseis sobre rodas e assim dar corpo à renovação da ala grisalha da frota nacional de carros de passeio. Harsch abre espaço em suas justificativas até para a montagem no Brasil de modelos premium, engatilhada pela Audi e BMW na região sul, com início agendado para 2015. “Isso também contribui para as vendas locais de matérias-primas e evita a remessa de divisas com carros de luxo importados”, acentua o presidente da Borealis Brasil.
Ao colocar prós e contras na balança, deixa claro Harsch, a Borealis não deixa apagar a chama da credibilidade conquistada pelo Brasil como mercado, mas reconhece a necessidade de ajustes no posicionamento mantido em 14 anos de milhagem de voo no país. Até então, a operação de compostos de PP cindia-se em duas unidades: em Itatiba e Triunfo, bem no cerne do polo petroquímico gaúcho. “Uma das incumbências da fábrica no Rio Grande do Sul era suprir clientes baseados na Argentina, como a Fiat”, alega o dirigente. Com o país vizinho a estrebuchar sob protecionismo e mandracarias econômicas, a unidade em Triunfo viu-se no meio dessa saia justa, deixa patente Harsch, agravada pela constatação de que, apesar do potencial de peso, o crescimento do mercado automotivo brasileiro não deve, como se trombeteava na passada alta da economia global, crescer com intensidade chinesa.
O redesenho desse panorama, aliado a complicações como frete caro, duplicação de funções e a demarcação do mix de produção de duas unidades motivaram a Borealis Brasil a por em campo, em 2010, o projeto de desativar a base em Triunfo e concentrar as forças em Itatiba, cuja logística racionaliza a cobertura da clientela de compostos tanto no Sul como no Sudeste. Matéria-prima não pesa na decisão. Tal como ocorria em Triunfo, a unidade paulista opera próxima da fábrica de polipropileno (PP) da sua acionista minoritária Braskem, no caso a planta em Paulínia. Da mesma forma, intercede Harsch, a questão das exportações para a Argentina não pintou como motivo por si suficiente para baixar as portas em Triunfo. “Afinal, essas vendas não vão além de 5% da nossa receita atual”, situa o dirigente, arisco a abrir o faturamento.
Orçada em R$120 milhões, a saída de Triunfo, com desligamento efetivo marcado para o primeiro trimestre de 2015, e o incremento da infra no interior paulista não afetará, de imediato, o potencial produtivo da Borealis Brasil. “A capacidade nominal permanece 60.000 t/a e, se preciso, pode ser aumentada em 4.000 toneladas”, asseguram Harsch e Vanessa Crespo, especialista em comunicação da empresa. Além de silos e linhas de ensaque, sobressai na nova instalação em Itatiba o contingente de extrusoras. “O quadro atual de três máquinas ganhará duas novas linhas além de um equipamento transferido de Triunfo”, revela o dirigente. Das duas extrusoras restantes na unidade gaúcha, uma foi aposentada e outra remetida para uma fábrica europeia da Borealis.
Na calculadora de Harsch, o país possui capacidade instalada da ordem de 180-200.000 t/a de compostos de PP e cruzou 2014 ocupado-a num nível de dar palpitação, na faixa de 70%. O excedente e a concorrência a ferro e fogo, ele aponta, levaram à saída do negócio no país de um nome global nesses compostos, a norte-americana PolyOne, ao fechar a unidade em Diadema, na Grande São Paulo, especifica o porta-voz da Borealis Brasil, revelando ter sido informado da decisão, verbalizada em julho último, pelo próprio presidente da componedora norte-americana. “O mercado nacional de compostos de PP caiu 10% em 2014 e nossa expectativa é recuperar esse índice em 2015”, estabelece Harsch. Para ajudar a empresa nesse intento, ele apresenta mais duas frentes de atuação. Antes com foco quase exclusivo em autopeças, a componedora ampliará seu assédio sobre o mercado da linha branca, cuja presença em seu faturamento hoje restringe-se a 15%, efeito de materiais para injeção de peças de lavadoras e aparelhos de ar condicionado. Nessa mesma vertente, outra estratégia refere-se à prospecção de oportunidades para agregar valor pelo caminho da inovação. Vanessa Crespo exemplifica com o desenvolvimento de compostos de PP para o carrinho de supermercado ofertado pela transformadora Plascar. A segunda frente para a Borealis Brasil manobrar, retoma o fio Harsch, é o enriquecimento do mix de formulações geradas em Itatiba. “Entre as novidades no portfólio , constam compostos com teores de PP reciclado e tipos com fibra longa, estes já empregados na Alemanha em tetos de carros da BMW”, indica o porta-voz. A propósito, sustenta, a Borealis Brasil é fornecedora de carteirinha para a maioria das montadoras em ação no país. Para aumentar esse cerco, ele antecipa, os planos para 2015 incluem ampliar a presença da Toyota em sua carteira de pedidos e cruzar a soleira da Hyundai. Quanto à BMW, parceira internacional da Borealis, Harsch informa que, no estágio inicial, a unidade que parte em Santa Catarina em 2015 recorrerá ao esquema CKD de produção, à base de montagem complementar de componentes importados.  •

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