“Sul e Sudeste têm culturas similares para o varejo de resinas, mas o Nordeste é outro país”, julga Odair Ruiz, presidente da Eteno, única distribuidora de poliolefinas da Braskem sediada na região ponto fora da curva. Ele fala com conhecimento de causa, pois embasado em 20 anos de aprendizado e fé para conseguir crescer num mercado cujas adversidades e o consumo semiárido de resinas explicam os exemplos de sobra de agentes autorizados e revendas de polipropileno (PP) e polietileno (PE) a deletar a ideia de competir no Nordeste, mesmo quando o açude de sua economia enchia com a chuva de recursos ali despejada, de 2002 a 2013, pelos programas de transferência de renda do governo.
Ruiz bandeou-se de São Paulo para o Nordeste nos anos 80, incumbido por sua empresa, a petroquímica baiana Poliolefinas, de montar escritório comercial no Recife, “pois Pernambuco é o centro de distribuição de mercadorias para a região”, ele justifica. Em 1986, a Poliolefinas foi adquirida pela Odebrecht e, a seguir, agregada à companhia OPP (incorporada à Braskem). Na década seguinte, um surto de enxugamento de custos entre os produtores de resinas no polo da Bahia, pôs a pique seus escritórios de vendas no Nordeste e a região passou a ser atendida, no plano geral, pelas operações comerciais em Salvador. Avesso à exigência de mudar para a Bahia, pois com a vida feita no Recife, Ruiz propôs para a OPP continuar em Pernambuco como seu agente autorizado na região. “Até então, a empresa nunca tivera distribuidor nordestino, mas topou. Eu me desliguei da OPP e ela cedeu a bandeira”.
A Eteno entrou em campo ao final de 1995, num galpão de 300 m² alugado no bairro de Caxangá. “Éramos eu, uma secretária e os peões para descarregarem a sacaria”, resume Ruiz. Um sócio capitalista, do ramo da construção civil, deixou a empresa em questão de meio ano, descrente das possibilidades de retorno.Sua participação no negócio foi adquirida por Maria Ester Brayner Fernandes, esposa de Odair, à frente da gestão financeira da distribuidora até 2008.
Em disputa com distribuidores paulistas e revendas de resina importada, a Eteno comercializava na largada 6 t/mês para meia dúzia de clientes ativos quando um presente caiu do céu. “A distribuidora SPP, controlada pela Suzano Petroquímica, rival da OPP, resolveu fechar seu depósito no Recife”. Reflexo condicionado, as vendas da Eteno duplicaram e, por tabela, Ruiz não conseguia mais dar conta sozinho do negócio. O espaço aumentou, mediante aluguel de imóvel vizinho, e foram criados departamentos comercial e financeiro.
Nesse estágio inicial, a Eteno sentiu no caixa o peso de algumas marcas registradas regionais. Uma delas era de cunho logístico. “As entregas rápidas já eram complicadas pelas grandes distâncias, a exemplo dos 800 km de Recife a Fortaleza ou Salvador”, conta Ruiz, cuja reação foi montar uma rede terceirizada e confiável de transportadores. Outra pedreira foi o despreparo do pessoal administrativo. “No Sul e Sudeste, os distribuidores podiam aproveitar profissionais experientes, formados em passagens por petroquímicas, enquanto na Eteno, dada a falta dessa mão de obra na região, tínhamos de treinar os contratados a partir da estaca zero; sequer sabiam distinguir PE de PP”. Para engrossar o caldo e salgar a ferida, a Eteno penou no começo para aprender a lidar com uma facção da clientela. “Tomamos muitos calotes em negócios fechados apenas na confiança da amizade, no fio do bigode, sem o respaldo da documentação hoje exigida”, lembra Ruiz. Na mesma trilha, pinta uma pedra no sapato comum à toda a distribuição no país. “O mercado nordestino é muito informal, com muita revenda marginal de resina por transformadores”, avalia o dirigente. Para um distribuidor oficial, avaliado com lupa pela petroquímica representada, a sonegação à solta tolhe as oportunidades de expandir no varejo. “Mas alguma coisa tem mudado, efeito dos recentes incentivos fiscais acenados a quem se dispõe a legalizar seus negócios”, suaviza o presidente da Eteno.
Apesar da informalidade e do duelo com distribuidores do Sul Maravilha, a Eteno foi em frente a ponto de, em 2002, mudar para sua sede atual, em Boa Viagem, mais perto da zona industrial recifense e da saída rodoviária para praças como João Pessoa. Ao mesmo tempo, Ruiz consolidou seu modelo operacional de gestão profissionalizada sob controle familiar. Em 2008, os filhos Rodrigo e Larissa Brayner Fernandes assumiram, respectivamente, as diretorias financeira e de compras e, desde 2007, Nelson Moreno (sem parentesco) atua como gestor comercial.
Na selfie do momento, a distribuidora aloja-se em área total de 2.000m², com capacidade de estocagem orçada em 1.500 toneladas e carteira de clientes ativos arredondada por Ruiz em 1.500 empresas, atendidas por 7 vendedores externos e 4 internos.
Passados cinco anos na ativa em Boa Viagem, a Eteno entrou em pulsação de hipertenso. “Em 2007, o surgimento de dois players em poliolefinas, Braskem e Quattor (incorporada à Braskem), trouxe ao mercado 17 agentes autorizados”, rememora o diretor Rodrigo Brayner. “À época, pregou-se como ideal o modelo do distribuir bem capitalizado, de grande escala e alcance nacional”. Na peneira de distribuidores a seguir, vários agentes foram descartados da rede ou comprados por concorrentes. A Eteno, por seu turno, andava nessa corda bamba empenhada em lapidar a rentabilidade sob o endurecimento da competição no Nordeste onde, além do pessoal de São Paulo, tinha agora na rede Braskem a baiana Sasil (fora do mercado). “Em prol da redução dos estoques, controle dos custos e rapidez no recebimento e entrega das resinas do polo local, abrimos em 2007 a filial em Camaçari, hoje responsável por 20% da nossa receita”, situa Rodrigo. “Nenhum outro agente da Braskem possui centro de distribuição na Bahia”.
Aquele padrão luxo de distribuidor, acalentado pela Braskem, afundou tragado pela crise financeira de 2008. “A queda do mercado levou a petroquímica a repensar seu modelo de distribuição, flexibilizando as exigências de acordo com a realidade e, por causa disso, hoje em dia convivem na rede os agentes de alcance nacional com os eficientes de foco regional”, argumentam pai e filho. Com a junção da Quattor à Braskem, de 2010 a 2012, a consequente triagem do time de agentes remeteu os expelidos para a resina importada e, entre quem ficou, a Eteno hoje paira sozinha como a face nordestina da distribuição de PP e PE do grupo.
A constituição da filial baiana, concorda o presidente, preparou a empresa, então bem mais enxuta, para os anos de ouro seguintes, de 2008 a 2012, quando o PIB do Nordeste surpreendeu ao bater o do Sul. “O Nordeste tornou-se um mercado e tanto, embora furos abaixo dos volumes vendidos no Sul, razão pela qual os agentes paulistas continuam a assediar com agressividade o Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, marcando o Nordeste também em cima, mas em especial quando aperta a disputa no Sul e São Paulo”, avalia Rodrigo.
Ele e Ruiz vêm a distribuição caminhar para agentes de âmbito nacional com atendimento regionalizado, findando com o atendimento centralizado na matriz. Quanto ao futuro da Eteno, ambos descartam a hipótese de diversificar o negócio entrando na industrialização, como o fazem diversos concorrentes. “Nosso negócio é comercializar resinas e auxiliares, tal como os masterbatches que revendemos”, determina o presidente. “Uma prova do espaço para crescer por essa via”, complementa Rodrigo, “ é a demanda ascendente no Nordeste por plásticos de engenharia”. •
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