Desde 2022, o México navega no estrelato como o epicentro mundial do nearshoring, movimento de realocação de fábricas de locais em crise, como China e Europa, para países perto de grandes e seguros mercados parceiros no livre comércio. Despencou então uma tempestade de investimentos industriais no México, inclusos aportes maciços do setor plástico, magnetizados pela oportunidade de vender dali em linha reta aos EUA e Canadá com menores custos de produção e logística e baixas tarifas para importações.
O fascínio despertado nos investidores foi intenso a ponto de fechar seus olhos para o segundo parágrafo do nearshoring mexicano, a começar pelas crônicas fragilidades estruturais do país refletidas no suprimento insuficiente e irregular de água e energia. Esta lacuna sobressaiu no segundo trimestre, quando a seca sazonal, tida como a pior em oito anos devido às mudanças climáticas, castigou com prolongada falta de água e eletricidade o sul do México, incluso o vital polo petroquímico de Altamira. A possibilidade de reprise entrou no radar.
À parte mudanças climáticas, insuficiência de água, energia e mão de obra especializada, os investidores vinham considerando o México um sombrero tão perfeito para projetos industriais que fecharam os olhos para outras marcas registradas do país, como o populismo, criminalidade e debilidade do estado de direito. O ponto nevrálgico é que, de tempos para cá, esses senões começaram a dar na vista demais para permanecer no segundo plano e seus efeitos ameaçam os atrativos do nearshoring.
O crime organizado não vê porque os adeptos do nearshoring não se submetam a suas regras. “Executivo da transformadora Ferroplásticos sobrevive a tentativa de assassinato em Querétaro”, bradava em 8/9 o título de matéria no site Plástics News. Aos fatos: Jesús Calderon Reyes, executivo e membro da família fundadora da empresa de injetados, foi baleado à luz do dia em 6/9 por emboscada armada por pistoleiros quando guiava seu SUV nos arredores do polo industrial do estado de Querétaro, sul do México. Levado a um hospital, ele está fora de perigo, mas um de seus seguranças foi ferido com gravidade. O atentado é o segundo sofrido pela família Calderón desde 2020, quando o fundador da empresa, Jesus Calderón Calderón, foi sequestrado e libertado uma semana depois, mediante pagamento de resgate.
Pelos cálculos do governo, mais de 200.000 assassinatos foram cometidos no México desde 2018. Nestes seis anos, o país foi presidido pelo líder esquerdista e populista Andrés López Obrador. No final de maio, ele disse que sua autoridade política e moral estava acima da lei. Essa declaração resvala em outro veneno para o nearshoring: insegurança jurídica.
Nessa toada, deu no Wall Street Journal (WSJ) em 9/9 que indústrias norte-americanas estão retendo planos orçados em US$ 35 bilhões de investimentos no México, temerosas de que uma iminente reforma no Judiciário afete negócios com os EUA e o destino do mercado comum. A remexida visa substituir 1.700 juízes federais, inclusas instâncias no topo, através de eleições nacionais e amolecimento das severas exigências para o cargo. A reportagem registra que investidores estrangeiros pressentem que os novos magistrados se sentirão mais em dívida com seus eleitores e considerações políticas do que apegados à letra da lei. López Obrador, registra o WSJ, disse que a reforma, ato do final de sua gestão, visa acabar com a proteção judicial às múltis. “Os juízes continuarão a defender essas companhias que vêm para roubar e afetar a economia dos mexicanos?”, ele indagou.
O WSJ aproveitou para convidar leitores a responder a esta pergunta: “Qual o impacto nos acordos de livre comércio se a reforma jurídica do México for adiante?”
Assinantes brasileiros do WSJ podem participar (com conhecimento de causa) dessa pesquisa de opinião. •
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