Embalagens flexíveis: um balanço para festejar sem euforia

Crescimento do setor em 2024 atenuado pelo esfriamento desde o 4º trimestre
Flexíveis: alto custo de energia e manutenção exigem renovação do parque industrial.
Flexíveis: alto custo de energia e manutenção exigem renovação do parque industrial.
A noção do plástico como um preciso sensor extraoficial da economia aparenta ter saído dos trilhos nas retrospectivas do Brasil em 2024. O consenso das análises reza que, no plano geral, o consumo interno fervilhou no ano passado, ao sabor da injeção de renda no bolso do povo, a cargo de programas assistencialistas do governo, e do aumento exponencial da mão de obra empregada. No balanço da Associação Brasileira da Indústria de Embalagens Plásticas Flexíveis (Abief), setor vital para uma constatação realista da demanda de bens de consumo e de giro rápido (alimentos lideram os segmentos usuários de flexíveis, com 41% de participação do mercado em 2024), a demanda a 100ºC, tão citada na imprensa, não aconteceu. Mas, mesmo com a inflação, câmbio e juros incomodando, o fato é que o grosso do mercado atendido pelas empresas representadas pela Abief cabe a produtos finais essenciais. Provêm daí, como deixa claro o relatório de desempenho anual do setor encomendado à consultoria MaxiQuim pela Abief, dados animadores de 2024 como a produção de 2.332 milhões de toneladas de embalagens flexíveis (2,5% acima de 2023); faturamento bruto de R$ 37,8 bilhões (7,6% acima de 2023) e o nível médio de 27% de ociosidade no último período, relativo a uma capacidade total estimada de 3.2 milhões de t/a, a cargo de 3.787 empresas. Na entrevista a seguir, a performance do setor no último período é dissecada por Rogério Mani, presidente da Abief e dirigente da transformadora Epema. A propósito, o sucessor de Mani no comando da Abief para o biênio 2025-2027 é, a partir de 9/4, Eduardo Berkovitz, diretor de relações institucionais e compliance da Valgroup.
Rogério Mani
Rogério Mani: importações de embalagens flexíveis crescentes e dominadas pela Ásia.

Na esteira do consumo interno, noticiado então como super aquecido e com alto nível de emprego, a indústria de embalagens plásticas flexíveis produziu 2.332 milhões de toneladas em 2024. Embora tenha crescido 2,5% sobre 2023, o setor rodou com 73 % de ocupação, um nível minimamente aceitável, do ponto de vista econômico, para uma conjuntura tão favorável. Qual a explicação?

Não vimos um consumo superaquecido em 2024; diria que esteve moderado e com último trimestre em declínio. Nós estimávamos poder repetir 2023 com um crescimento ao menos 1 ponto % maior e, consequentemente, com uma capacidade de taxa de ocupação também melhor. O quarto trimestre do ano passado nos mostrou um desaquecimento que, por sinal, deve ter afetado o desempenho do nosso setor no primeiro trimestre de 2025.

A indústria de embalagens plásticas flexíveis aproveitou a demanda em 2024 para investir na expansão da capacidade instalada ou deve fechar 2025 no mesmo patamar de 3.2 milhões de t/a registrado no ano passado?

Nós sempre estamos investindo, independentemente do momento econômico do Brasil. Aliás, nunca foi diferente. Os investimentos em 2024 foram menores no comparativo com 2023 e não acredito que mude muito o patamar de 3.2 milhões de t/a. Uma parte de máquinas mais antigas e improdutivas tende a parar de operar nos próximos anos, devido ao alto custo de manutenção e energia.
Relatorio ABIEF 2024 18

Em 2024, o consumo per capita de flexíveis chegou ao recorde de 11 kg ou 1.2 kg a mais que 10 anos antes. 2024 foi um ano regido por política econômica voltada para ampliar renda num ambiente sem ganhos de produtividade – um fator alimentador da inflação. Trata-se de um cenário sólido e confiável para a indústria de flexíveis cogitar investir na expansão de sua produção?

Não quero acreditar que o aumento do consumo per capita de 11 kg seja em função de políticas de estímulo econômico; claro que isso ajuda, porém se compararmos o Brasil aos países desenvolvidos e a nossos vizinhos na América Latina, ainda temos muito a crescer. Vale também salientar que a embalagem flexível tem muito espaço para expandir e conquistar a preferência das indústrias de bens de consumo e do público final, impulsionada pelos atributos da praticidade, peso, design, sustentabilidade e melhor opção econômica.
Relatorio ABIEF 2024 21

Nos últimos anos, o setor de flexíveis presenciou uma corrida de transformadores mais capitalizados do Sul/SE para montar filiais em Manaus, para desfrutar os benefícios fiscais e aduaneiros da Zona Franca. Esse movimento já enfraqueceu ou não em 2024 ou a tende ou não a esvaziar em 2025?

Em relação à Zona Franca, noto que as grandes empresas já se instalaram ali e as médias ainda buscam seu espaço. Como o grande volume de flexíveis está nos grandes fabricantes e as exigências estão maiores, a tendência é uma diminuição considerável de novas indústrias de flexíveis em Manaus este ano, não esquecendo que os custos logísticos, predial, mão de obra, energia e fiscalização tendem aumentar, o que vai tirar o atrativo do polo industrial. Em resumo, quem tinha de ir já foi.
Relatorio ABIEF 2024 24

Nos últimos anos, agrofilmes têm sido o reduto de flexíveis de maior pique de crescimento. Embora ele permaneça na linha de frente em termos de demanda por segmento, sua produção caiu 2,1% em 2024 versus 2023, pela aferição da Abief. Foi o único nicho de flexíveis a acusar queda na produção no ano passado. Por que isso aconteceu?

O segmento de agrofilmes tem estado em destaque nos nossos balanços recentes e, assim como nosso consumo per capita, tende a crescer muito nos próximos anos. Entre os acontecimentos que ajudaram na queda de 2,1% ressalto o impacto das enchentes ocorridas em 2024, afetando várias culturas – a produção de soja, por exemplo, acusou perdas entre 10% e 15%.
Relatorio ABIEF 2024 25

Ainda em termos de market share do consumo por segmento de mercado, o reduto do varejo, tão robusto no passado, fechou 2024 com participação reduzida 3,9% ou 74.000 toneladas. O declínio, notado nos levantamentos recentes, configura tendência resultante do repúdio ambientalista a sacolas plásticas descartáveis no autosserviço?

Não acredito mais, sinceramente, que esse fator do repúdio tenha afetado o segmento de flexíveis para o varejo. Há uma variação natural de mercado e estoques na cadeia produtiva e nos clientes que não entra nessa conta. Nos últimos anos, a performance desse segmento tem alternado dentro de um sobe e desce. Prefiro atribuir também uma parte do resultado aos efeitos climáticos que afetaram algumas regiões no ano passado, em particular o Rio Grande do Sul.

Relatorio ABIEF 2024 27

Apesar da envergadura menor, pet food foi, em 2024, o segmento que mais cresceu (24%) em market share do consumo de flexíveis por segmento. Por que ele conseguiu superar o desempenho acima de setores ligados a bens essenciais ou embalagens industriais?

Pet food é outro segmento ascendente, à medida em que os jovens estão tendo menos filhos e adotando mais pets. Na mesma perspectiva, o consumo de agrofilmes terá sempre crescimento expressivo.

Por que as importações de flexíveis cresceram 58% e as exportações caíram 4,2% em 2024? Além de BOPP e BOPET, quais os filmes e embalagens flexíveis mais internados no Brasil no ano passado?

Da mesma forma que há uma invasão de resinas importadas, o setor de flexíveis começa a mostrar em seus números embalagens importadas crescentes, principalmente de origens asiáticas. Apoiados em custo de resina, mão de obra, carga tributária e aumento exponencial de capacidade de produção acaba tornando-se natural para eles que busquem nosso mercado. Há um aumento significativo na internação de filmes especiais, embalagens para queijos e embutidos e flexíveis com barreira.
Relatorio ABIEF 2024 29

No momento, a inflação segue fora da meta, os juros são abusivos e o poder aquisitivo caiu. Em reação para animar vendas, indústrias finais como as de alimentos aderem a embalagens menores. Como isso pode influir no desempenho da indústria de flexíveis este ano?

Teremos realmente em 2025 um ano desafiador, com todos os problemas elencados na pergunta. Porém, as embalagens plásticas flexíveis são as de maior capacidade de adaptação às circunstâncias e a mais rápida para se adequar ao tamanho do bolso do consumidor. Duas coisas são importantes para ressaltar aqui: o peso das embalagens está cada vez mais leve e nossa métrica de aferição de desempenho é por volume (peso) produzido e não por unidade. Asseguro que cresceremos este ano 2,5% em volume e pelo menos o dobro em unidades, logo o quadro de dificuldades descrito na pergunta não influenciará no desempenho do nosso setor.

Inflação fora do controle e perda do poder de compra têm resultado na primazia dada pelo consumidor às compras de bens essenciais, com alimentos à frente. Quais os demais segmentos de flexíveis que tendem a ter demanda mais encolhida este ano em função desse racionamento de gastos pela população?

O segmento de alimentos é bem maduro e não deverá ter impactos, assim como agro, higiene e saúde. Os mais prejudicados serão os considerados supérfluos como embalagens para presente, pet food, e bebidas. Acredito que as embalagens plásticas flexíveis continuarão a crescer nos próximos anos pois, além de seus atributos, há uma mudança de hábito cada vez mais patente nas novas gerações que buscam praticidade e – o mais importante – a segurança dos produtos acondicionados, a exemplo de alimentos.
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