Devagar se vai (espera-se) ao longe

O consumo aparente pairou 1% acima do PIB de 2017 e tende a progredir com moderação, vaticina a MaxiQuim

A julgar pelas projeções iniciais da MaxiQuim, a consultoria referencial do setor plástico brasileiro, não só o consumo aparente de resinas commodities refletiu em 2017 uma reação de leve, +2%, sobre uma base de crescimento precária, como indicou a singular gravidade da situação ao destoar de um histórico preceito petroquímico: a taxa de elasticidade dos plásticos sempre corresponde de duas a três vezes o saldo do PIB de 1% em 2017. No balaio dos números da MaxiQuim, chamam a atenção dados como o consumo aparente de PET, com salto de 6% sobre 2016 e o maior percentual entre os termoplásticos. No entanto, a tonelagem de produção demonstra que a capacidade nacional do poliéster rodou perto de 50% ociosa no ano passado.

A construção civil há anos na UTI racionaliza a sangria do consumo aparente de PVC e a estagnação (0%) escancarada no compartimento de poliestireno (PS) diz muito a respeito da decorrente relevância dada pelos dois produtores locais do polímero, Unigel e Innova, ao negócio do monômero. Nesta entrevista, Marta Loss Drummond, especialista de inteligência de mercado para termoplásticos commodities da MaxiQuim, dá uma panorâmica do comportamento do setor.

Marta Loss Drummond da MaxiQuim
Marta Loss Drummond: descartáveis sentem o corte das refeições fora de casa.

PR – Qual o balanço do consumo aparente de resinas em 2017?
Marta Loss Drummond – O final do ano de 2017 caracterizou-se por uma retomada na maioria dos setores demandantes de resinas plásticas. Na comparação com o período anterior, houve crescimento em quase todas as resinas, principalmente por estarmos falando de uma base fraca de comparação, o ano de 2016. O consumo aparente de PP aumentou em 2017, pois vimos forte recuperação do setor automobilístico. O mercado de PET melhorou, mas ainda está em níveis abaixo do que foi observado em 2015. Os setores demandantes de PVC foram os mais afetados no período da crise e a retomada nessa resina ainda deve demorar. Em 2017, verificamos uma queda em torno de 3% no consumo aparente de PVC em comparação com 2016.

PR – Pesquisa do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC) Brasil sobre o comportamento do consumo relata drásticos cortes no orçamento doméstico em refeições fora do lar e compras de artigos categorizados como supérfluos. Como esses fatores se refletem nas estimativas da MaxiQuim sobre o consumo doméstico de resinas em 2017?
Marta Loss Drummond – Com a crise, o aumento dos índices de desemprego (ou redução da qualidade dos empregos), observa-se uma reorganização do orçamento familiar. Itens da cesta básica como arroz, feijão, macarrão, geralmente apresentam bom desempenho mesmo em tempos de crise. Porém, o consumidor final opta por marcas mais baratas. Gastos menores em refeições fora de casa resultam em menor consumo de embalagens como garrafas de água e refrigerante de menores tamanhos, em regra consumidas em restaurantes. Descartáveis seguem linha semelhante, atingindo por tabela resinas como polietilenos, polipropileno, PS e PET.

PR – Quais os possíveis efeitos sobre as exportações brasileiras de PE devido à entrada no mercado internacional da maior parte do excedente de PE dos EUA, em razão do acréscimo na capacidade norte-americana da ordem de 5,8 milhões de toneladas entre 2017 e 2019?
Marta Loss Drummond – Elas diminuirão a longo prazo, inevitavelmente. Alguns dos países importadores de PE do Brasil ficam na América Latina e constam entre alguns mercados que, em parte, passarão a ser abastecidos pelos EUA. Por sua veza, as importações brasileiras da resina oriunda dos EUA devem aumentar. Mesmo que alguns projetos de acréscimo de capacidade erguidos no Golfo do Texas atrasem, sentiremos seu efeito no Brasil quando eles estiverem operando. Em janeiro deste ano as exportações brasileira de PE já foram 1% menores que o mesmo período de 2017.

PR – Com a retração em vigor há quatro anos em lançamentos prediais e nas reformas residenciais, qual alternativa economicamente tem sido mais sedutora para a cadeia do cloro: enfatizar a produção de soda ou de PVC?
Marta Loss Drummond – Mesmo com a demanda retraída, o balanço de PVC no Brasil ainda é negativo, ou seja, falta produção para atender a demanda local. Assim que os setores de construção civil e infraestrutura retomarem o crescimento, a demanda de PVC volta a crescer, o que já é esperado para o período atual. Por sua vez, a soda cáustica está atrelada a mercado mais maduros, caso de papel/celulose, e dependentes do desempenho das exportações.

Coplast: consumo aparente cresceu 5%

Pela calculadora da Comissão Setorial de Resinas Termoplásticas (Coplast) da Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim), o consumo aparente do total desses materiais (desempenho por resina não divulgado) desencabulou em 2017. Fechou com salto de 5,2% versus 2016, totalizando 6.058.976 toneladas e vendas internas (consumo cativo+ VIPE) de 4.510.080 toneladas ou 2,3% acima do exercício antecedente, aliás o mesmo percentual de avanço flagrado no volume de produção de termoplásticos: 6.378.073 toneladas em 2017. No comércio exterior, o ano passado foi deficitário, com importação de 1.517.283 toneladas de resinas ou 5% acima do período anterior e exportação inferior em -4,5%, fechando em 1.836.380 toneladas no radar da Coplast.

PR – Além do impacto da crise, PS no Brasil arca com capacidade excessiva e perde mercados para outras resinas (PP e PET, em especial). Com base no quadro dos últimos anos, qual alternativa tem sido economicamente mais sedutora para a cadeia estirênica: vender estireno ou PS?
Marta Loss Drummond – PS tem mais valor agregado que estireno, apesar de sua margem baixa devido ao mercado maduro e às fortes flutuações de preços do monômero no mercado internacional. Já estireno permanece com grande potencial no Brasil, atrelado a mercados a exemplo de tintas, construção civil e automotivo. A opção por um ou por outro material é quase sempre conjuntural; depende de fatores como demanda, preço e logística.

PR – Por que entraves como a insegurança jurídica, custos industriais e o rebaixamento da nota do Brasil por agências de classificação de risco de crédito aparentam não esfriar o interesse de múltis pela compra de indústrias transformadoras brasileiras, em especial de embalagens?
Marta Loss Drummond – Trata-se de uma tendência mundial no âmbito de concentração, aumento de escala e, por extensão, de competitividade e internacionalização do setor transformador. O Brasil, apesar de todas as incertezas, é país de grande potencial de consumo, principalmente em setores de bens não duráveis, usuários de embalagens plásticas. Aliado a isso tudo, os ativos brasileiros estão baratos, devido ao impacto da recessão na saúde financeira das empresas, o que os torna interessantes ao investidor de fora e, assim, o momento para comprá-los não poderia ser melhor.

Braskem crava coluna 1

Os prognósticos sobre a conjuntura e o consumo de plásticos este ano serpenteiam entre um cabo de guerra. De um lado, a Selic está no seu menor valor nominal, o PIB saltitou 1% em 2017 e a empregabilidade e o poder aquisitivo têm reagido. Do outro, a crise fiscal piorou com o enterro da reforma da Previdência e o setor público continua a gastar – e mal – muito mais do que arrecada, na garupa da carga tributária em obesidade mórbida que mina a produtividade da economia- a única forma de o Brasil elevar o pique do crescimento sem aumento da inflação. Diante desse jogo de forças, a Braskem, maior petroquímica nacional, crava coluna 1. “Trabalhamos com um cenário de recuperação econômica”, expõe Edison Terra, vice-presidente da unidade de negócio de poliolefinas, renováveis e Europa. “Há sinais nesse sentido, como o aumento do do consumo das famílias e do nível de investimento, beneficiados pela inflação e taxa de juros reduzidas”.

Na esfera dos plásticos, ele apoia seu otimismo constatando melhora na demanda de resinas e químicos por um caldeirão de segmentos de bens duráveis e não duráveis. “Prevemos crescimento de 2,8% na economia este ano e esperamos resultados marginalmente superiores para nossos produtos”, confia Terra . “Por exemplo, após três anos a fio de queda, a produção de veículos leves, reduto consumidor de polipropileno (PP), cresceu no ano passado e antevemos reprise no período atual com aumento de dois dígitos. Por sua vez, o agronegócio, mercado de nossas poliolefinas, é o destaque da economia brasileira e assim deve seguir em 2018, quando a construção civil, balizadora da demanda de PVC, deve sair da retração”.

Ao longo de 2017 e com sequência prevista para este ano, sobressaíram na indústria de transformação de plástico, em especial no reduto de embalagens, as aquisições de empresas nacionais por múltis, estes atraídos pelo mercado avantajado e pelos preços atraentes dos ativos locais em moeda forte. “A consolidação de players do segmento de embalagens com a participação de empresas estrangeiras pode ser uma ótima oportunidade de trazer tecnologias e acesso ao desenvolvimento de aplicações consagradas no exterior e capazes de serem replicadas com mais rapidez por aqui”, interpreta o executivo. “O ponto de atenção nesse cenário, ele distingue, é a busca da competitividade dos transformadores. “É grande o espaço para atuarmos em projetos de melhorias de processos, produtividade e ações sustentáveis, focos dos investidores múltis no Brasil”, avalia Terra. “Outro ponto relevante trazido por essa abertura da indústria é o acesso à inovação, que transcorre em velocidade crescente pelas mãos de tecnologias disruptivas”.

PR – 2018 é ano eleitoral e a praxe política brasileira é injetar ânimo pontual na economia com crédito facilitado e verbas oficiais. Acontece que o governo está quebrado e a classe de baixa renda não sente o vigor da retomada iniciada. Qual deverá ser o impacto disso sobre o consumo aparente e o mercado interno de resinas commodities este ano?
Marta Loss Drummond – Há algum tempo presenciamos certo descolamento da política e economia no Brasil. Acredito que a economia deverá seguir o seu lento caminho de retomada, independentemente do processo eleitoral e do resultado das eleições de outubro. Nesse cenário as indústrias ficam, sim, mais receosas em realizar grandes investimentos, como aquisição de maquinário e consequente contração de dívidas. Mas estamos constatando que o consumo de resinas vem crescendo mesmo com a sequência de reviravoltas na política. No longo prazo, o efeito é danoso, pois a indústria brasileira perde cada vez mais espaço para o produto importado, e a reversão fica mais difícil, pois depende de investimentos em capital, tecnologia, inovação e capacitação de pessoas, o que não se faz de um dia para o outro.

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