Canos fumegantes

Reação do mercado de PVC atropela a lógica econômica
Valentim: demanda reprimida e mudanças no consumo reerguem o mercado de PVC.

Escolham o rótulo para 2020: ano atípico ou típico do novo normal. PVC que o diga. Um mandamento da lógica econômica rezava que, com o país em crise, a construção civil era o primeiro setor a cair e o último a levantar. Pois no cenário atual, em plena pandemia e recessão, pegam fogo as vendas de materiais de construção e ganham impulso as compras de imóveis a tiracolo da Selic em seus menores patamares históricos. Esse inédito frenesi coincide com uma fase de escassez internacional e brasileira de PVC, esta última resultante da capacidade instalada da Braskem, maior produtor do vinil no país, abalada pelo desastre geológico em Alagoas. “Não estamos fechando negócios com o Brasil por causa da oferta restrita de PVC”, disse um trader norte-americano em relatório da plataforma Platts no início de setembro. “O problema não é o preço do material, mas sua disponibilidade”. Nos EUA, furacões paralisaram plantas de PVC em setembro, num momento de alta da construção civil inebriada por juros no piso para a compra de imóveis. De volta ao Brasil, o novo marco regulatório do saneamento básico promete dourar o horizonte do vinil, uma vez suplantados alçapões e lombadas do ordenamento jurídico, conferindo a médio prazo ao segmento de tubos de infraestrutura uma musculatura mais próxima da hoje exibida pelo movimento de tubos prediais. Na entrevista a seguir, Nilton Valentim, gerente responsável pelo segmento de construção civil na unidade de vinílicos e especialidades da Braskem, comenta a combustão da atual conjuntura.

Uma significativa recuperação é notada, desde a segunda metade de julho, nos lançamentos imobiliários e vendas de materiais de construção. Com base nessa reação, qual a sua estimativa para as vendas internas totais de PVC este ano?
Passada a fase inicial da pandemia, quando havia muitas incertezas, nas últimas semanas temos observado com otimismo sinais de recuperação econômica na indústria. Neste contexto, a demanda de PVC se recuperou bastante, em nível superior ao registrado antes da pandemia. A Braskem anunciou recorde histórico de vendas de polietileno, polipropileno e PVC em agosto, totalizando 350.000 toneladas, e já normalizou as taxas de utilização operacional para atender à demanda interna por resinas em diversos setores, entre eles o de construção civil. Qualquer previsão neste momento de instabilidade é passível de erro, mas, como estimativa inicial, entendemos que a demanda por PVC deve ficar este ano um pouco inferior à de 2019.

Saneamento

Contagem regressiva para uma vergonha nacional

Reduto mais atrasado da infraestrutura do Brasil, o saneamento básico ganhou alento em julho último, com a sanção presidencial ao novo marco regulatório desse segmento. Para alívio da população carente e júbilo do setor de PVC, o Plano Nacional de Saneamento Básico impõe aos municípios metas de universalização dos serviços até 2033, com coleta de esgoto para 90% da população e água potável para 99%. Uma vez vencidas as lacunas e controvérsias de cunho jurídico hoje apontadas por investidores nos meandros das norma, calcula-se que o setor de saneamento atraia R$ 700 bilhões. Na foto atual tirada pelo Instituto Trata Brasil, uma parcela de apenas 46% do esgoto recebe tratamento; falta acesso ao suprimento de água tratada para 35 milhões de habitantes e mais de 100 milhões não contam com a cobertura da coleta de esgoto. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) 1.935 dos 5.570 municípios do país acusam endemias ou epidemias ligadas à ausência ou falhas de saneamento básico.

Segundo a plataforma Platt’s, a demanda brasileira de PVC para construção civil esquentou bastante no início de agosto e a oferta doméstica do vinil mostrou-se então bem limitada, levando o mercado a buscar importações complementares. Como justifica esta reação numa conjuntura de pandemia, recessão e dólar caro e instável?
O segmento de construção civil mostra-se reprimido há alguns anos. Afinal, até 2015 havia excesso de oferta mundial de vinílicos, o que restringiu novos investimentos em aumento da capacidade de PVC. Hoje em dia, observamos o mercado superaquecido, o que pode ser explicado por fatores como a demanda reprimida no início da pandemia e mudanças no comportamento de consumo, com investimentos em reformas e melhorias nas habitações. Facilidades no acesso ao crédito e baixas taxas de juros nos financiamentos também contribuem para a manutenção e crescimento deste mercado de habitação. Além da parcela imobiliária, se antevê um provável aumento no setor de infraestrutura, efeito do novo marco regulatório do saneamento.

Segundo a Associação Brasileira da Indústria de Cloro, Álcalis e Derivados (Abiclor), a rede de tubulação de PVC disponível para saneamento atingia 542.000 km em 2012. E hoje, oito anos depois?
Essa é uma pergunta bastante complexa por envolver diversas variáveis. Para mensurar o acesso ao saneamento básico, é precisa envolver fatores além da extensão das tubulações de PVC. O Sistema Nacional de Informação do Saneamento (SNIS), do Ministério do Desenvolvimento Regional, coleta dados dos prestadores de serviços de abastecimento de água e esgoto sanitário desde 1995 e pode ser uma boa fonte de informação. De acordo com a edição atual, que contempla dados de 2018, 53% dos brasileiros têm acesso à coleta de esgoto. Já o Censo 2010, anunciado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), indica que 55,5% da população possui acesso a redes de esgoto, um aumento de 6,9% em relação aos dados de 2000 (48,6%).
Vale reforçar que é preciso ter cautela ao analisar estes dados, visto que o Censo analisa informações concedidas pelas próprias pessoas, que podem não ter clareza se suas casas estão realmente ligadas a uma rede de esgoto. Dito isso, avaliamos que o saneamento básico no Brasil não é insignificante, em especial considerando a extensão do território nacional. Contudo, há muito o que melhorar, levando acesso às redes coletoras de esgoto para regiões distantes e ampliando o tratamento do volume coletado, por exemplo. Tais ações impactam positivamente na qualidade de vida da população, visto que o saneamento é uma medida essencial para o controle sanitário de doenças, assim como à preservação do meio ambiente.

Qual foi, no ano passado, o volume consumido de PVC em tubos em geral no Brasil? E qual a atual capacidade instalada no país para tubos vinílicos em geral?
Estimamos que cerca de 600.000 toneladas foram direcionadas em 2019 para tubulações e acessórios de PVC. A taxa de operação da cadeia de transformação de tubulações e acessórios de PVC dos nossos clientes foi em torno de 75%.

Quantos transformadores de tubos de PVC hoje fornecem para obras de saneamento no Brasil?
Considerando as indústrias de tubos de abrangência nacional e regional, bem como de grandes obras de infraestrutura até pequenos reparos nas tubulações de pequenas cidades e loteamentos, o número de transformadores gira em torno de 15 empresas.

Por quais motivos, mesmo em fases boas da economia e estabilidade política, o reduto de tubos de PVC para infraestrutura nunca atraiu investimentos significativos na sua produção?
Como já comentei, o saneamento básico ainda tem muitos desafios e espaço para crescer, mas não pode ser considerado insignificante no Brasil. Existiram investimentos relevantes nos últimos anos. O mercado também seguiu essa linha, investindo em tecnologia e na capacidade de produção. Alguns bons exemplos que podem ser citados são os investimentos da Amanco Wavin em PVC-O (biorientado) e, tal como fez a Corr Plastik, em ampliações importantes para tubos de parede estruturada até diâmetros elevados. A Corr Plastik, por sinal, avançou em bitolas de até DN 600 para adução de água. Outra referência de investimento no reduto de infraestrutura foi a subsidiária brasileira implantada pelo grupo português Politejo, centrado em tubos e conexões.

Para a prestação do serviço de esgotamento sanitário, os materiais de tubulações utilizados são: plásticos (PVC, PEAD e PRFV), ferro fundido (FoFo), aço, cerâmica, concreto e plásticos – PVC, polietileno de alta densidade (PEAD) e termofixo (PRFV). Como reparte por material a rede de tubulação para saneamento existente no Brasil?
Existem algumas sutilezas entre os materiais utilizados nas diferentes necessidades do setor de saneamento básico, mas PVC e PEAD são os principais. Eu elenco aqui os materiais mais utilizados, mas, infelizmente, não temos dados específicos de percentuais ou quilometragem de cada um.
• Adução de água: redes de diâmetro > 100 mm (típico entre 100 e 300 mm, chega até > 1000 mm dependendo do projeto) – PVC é o principal material nessas redes, seguido de PEAD e ferro fundido. Aço e PRFV são usados em projetos mais especiais.
• Distribuição de água: redes que passam nas portas de nossas casas/prédios e fazem a alimentação pontual da água potável: redes de diâmetro < 100 mm – PVC é o principal material nessas redes, seguido de PEAD e ferro fundido. Aço e PRFV não são utilizados nessas aplicações.
• Esgotamento/afastamento: redes coletoras de esgoto fora de nossas casas/prédios, bitolas variam de 100 mm (típico entre 100 e 250 mm, chegando a > 1000 mm dependendo do projeto) – PVC é o principal material nessas redes, seguido de PEAD. Nas bitolas maiores a presença de concreto é grande. Tubulações em cerâmica são raras hoje em dia, tendo perdido muito espaço para PVC e PEAD. Ferro fundido é usado em projetos especiais, esgoto pressurizado, passagens abertas (rede exposta), etc. Aço é sempre para projeto especial.

Como dimensiona a parcela de PVC na composição desta rede de tubulação?
Em adução, PVC chega a ter 60% de participação, já em distribuição e redes de esgoto, pode alcançar mais 75%. Aqui vale ponderar que a presença do plástico é embasada por sua alta performance nestas aplicações, extensa vida útil e possibilidade de reciclagem. Entre os benefícios dos produtos, destaco o transporte adequado de água, evitando a contaminação e com boa performance contra vazamentos, devido à eficiente soldagem entre tubos e conexões. •

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