Em 2015, a Braskem vai flanar nas nuvens ao viver situação sem paralelo em sua história. “Sua capacidade mexicana de polietilenos (PE) já nasce vendida”, sustenta Simone de Faria, dirigente da consultoria 2U. No momento, explica, a única produtora local do polímero é a petrolífera estatal Pemex, à frente de uma capacidade nominal de 815.000 t/a da resina. “Dadas as condições de processo e tecnologia, operar a uma taxa de 75-80% de ocupação é considerada ótima”, informa a analista. A foto do México é completada por Simone com um déficit situado acima de 1 milhão de toneladas de PE desde 2012. “Mesmo com 1.050 milhão de t/a de capacidade ao partir no próximo ano, o complexo Braskem Idesa não fechará essa conta e o mercado mexicano seguirá importador do termoplástico para abastecer a contento uma demanda projetada em 1.840 milhão de toneladas em 2014”, junta os pontos a consultora.
Orçado em US$3,2 bilhões, o futuro complexo no estado de Veracruz gerará eteno via gás natural para produzir 300.000 t/a de polietileno de baixa densidade (PEBD) e 750.000 do tipo de alta densidade (PEAD). Ao esquadrinhar a petroquímica mexicana, a analista local Pipa Consulting fixa em 330.000 t/a o potencial doméstico para (PEBD) e, quanto aos grades lineares (PEBDL) e de PEAD, os contempla com respectivas capacidades de 250.000 t/a. O esquadrão mexicano de poliolefinas fecha com a capacidade de 680.000 t/a para polipropileno. A mesma consultoria atribui ainda capacidade instalada de 400.000 t/a para poliestireno; 520.000 para PVC e 1.100 milhão de t/a para PET.
Entre 2011 e 2013, expõe Simone, a demanda de PE cresceu à taxa média de 3% ao ano no México, índice sem motivos para mandar vir o champanhe. Em contrapartida, ela coloca, a reforma energética em andamento no país, ponto final para o fossilizado monopólio da Pemex, a confiança inspirada pela política econômica (aposta-se em aumento de 2,6% do PIB este ano) e a ampliação da oferta doméstica contam pontos para a engorda constante dos percentuais de consumo de PE no país.
Tema de debates eivados de inconformismo no Brasil, os preços internos de PE são, no México, inferiores aos das resinas importadas, atesta Simone. “O grande negócio da Pemex não é petroquímica, mas óleo e gás”, delimita a expert. Além do mais, o crônico déficit na oferta interna tornou o país cativo dos excedentes de PE dos EUA e Canadá, resina remetida em poucos dias por trem ou caminhão. “Essa proximidade e as isenções tarifárias desfrutadas pelo México como participante do bloco Nafta facilitam a importação não só de resinas, mas do gás natural para sua atividade petroquímica, razão pela qual a equação dos custos de produção da Braskem Idesa deverá fechar. Em seus levantamentos, a consultoria IHS já alterou a geografia: mudou o México da América Central para a do Norte. No embalo, sustenta a mesma fonte, o fim de mais de 70 anos de monopólio estatal do petróleo e o esboçado reerguimento da indústria norte-americana, movida pelo barateamento da eletricidade e matérias-primas, na garupa do gás de xisto, dão substância à crença generalizada de crescimento robusto e linear para o México a partir de 2015.
“Embora os transformadores prefiram comprar localmente, ainda há instabilidade no fornecimento e a qualidade da resina da Pemex não é considerada páreo para a concorrência importada”, aponta Simone. A propósito, Carlos Fadigas, presidente executivo da Braskem, considera básicos e universais, sem atentar para especificidades e avanços de processos ou aplicações, os grades do portfólio de PE da Pemex. Trata-se de uma brecha, deixa claro o dirigente, pela qual a Braskem penetrará com resinas desenhadas para aplicações mais específicas. Pelos olhos do bolso, retoma o fio Simone, o preço da estatal é, em geral, cerca de 2% inferior ao da resina importada, “mas há casos de a redução chegar a 10%”. No negócio petroquímico, ela comenta, o surgimento de um novo player sempre perturba as cotações de resinas e, pela lei do mercado, o corolário de um aumento na oferta é a queda nos preços. Nesse contexto, é de intrigar o comportamento do governo mexicano, tomando o complexo Braskem Idesa como argumento, ao gravar com tarifa de 6% as compras de PE saudita. A alíquota zero predomina no México para importações da maioria das resinas (PE incluso), assinala a consultoria local Pipa Consulting. “A Arábia Saudita é dos poucos países sem acordo comercial com o México, cujo governo não arriscaria criar problema com nações com as quais já possua relação de livre comércio”, revela a consultora da brasileira 2U . “Além do mais, o volume trazido de resina saudita não é representativo e a maioria dos clientes mexicanos sequer se deu conta dessa alteração agendada para vigorar em 2015”.
Megafone da transformação local, a Asociación Nacional de Industrias del Plástico (Anipac) calcula em 4.530 as empresas do setor na ativa no México. Mas especialistas baixam a bola para a marca máxima de 2.750 indústrias, interpõe Simone, das quais 58% nas categorias pequena e micro. Em média, ronda 10 anos a vida útil do parque de máquinas da transformação. “Em 2013, no entanto, o setor importou US$2.267 milhões em bens de capital, dos quais 45% em máquinas e equipamentos e o restante em moldes e ferramentaria”, separa Simone, chamando a atenção também para a grita generalizada contra a falta de pessoal qualificado (uma oportunidade para os técnicos do Brasil). De 2005 a 2013, ela pormenoriza, o consumo aparente de PE cresceu apenas 2,1%. “PEBDL destacou-se com aumento de 5,8% no mesmo período e sua adoção foi a causa da queda de 1,1% então sofrida por PEBD”.
Numa panorâmica, a ênfase no fator preço sobressai no México, opina Simone, embutindo algumas similaridades com o Brasil. “Como todo mercado tecnologicamente menos desenvolvido e com população de menor poder aquisitivo e mão de obra de preparo a desejar, o preço é mandatório pela conveniência do bolso e pela dificuldade para se perceber a qualidade superior de um material em maquinário antigo e de baixa produtividade”. Em contraponto, ela salienta a existência de transformadores mexicanos de tecnologia em dia com o mundo e dispostos a adquirir resinas até 10% mais caras e prezadas pela performance, como PEBDL base metaloceno. “Entre eles, figuram indústrias exportadoras de artefatos como autopeças, tampas, frascos e filmes para embalagens e artigos agrícolas”, exemplifica a analista, notando a superioridade em volume dos artefatos mexicanos exportados versus os indicadores do Brasil. “Eles exportam 6 vezes mais em volume de produto acabado e quase 4 vezes mais em valor.” Essa supremacia, óbvio, decorre das delícias do bloco Nafta e das dezenas de acordos comerciais assinados pelo México, que impõe regras e exige qualidade. Por seu turno, as exportações brasileiras de transformados sempre foram esqueléticas, culpa não só do câmbio e das chagas do Custo Brasil. Também contam pontos o distanciamento tupiniquim das cadeias globais de produção e, conforme amostragem do Banco Mundial com 178 nações no período 2009-2013, a sagração do Brasil como o país mais fechado para o comércio.
“São muitas as diferenças entre os mercados brasileiro e mexicano”, retoma o fio Simone de Faria, “a começar pelo acesso facilitado, sem impostos, à matéria-prima importada”. Na sua calculadora, 70% do comércio de PE, seja material importado ou local, transcorrem por distribuidores. No Brasil, o movimento de agentes oficiais não passa de 10% das vendas totais de termoplásticos (PE à frente), calcula Laércio Gonçalves, presidente da Associação Brasileira dos Distribuidores de Resinas e Bobinas Plásticas de BOPP e BOPET (Adirplast) e comandante da Activas, alicerce do varejo nacional de resinas. Simone vai em frente. “Em volumes de PE, a Pemex vende mais de 50% da sua produção por meio de distribuidores e, em geral, apenas clientes de compras mensais acima de 800 toneladas são atendidos diretamente pela estatal”. Um contingente de transformadores, aparteia a consultora, adquire volumes menores direto da Pemex por figurar há muito tempo na carteira de vendas de PE da estatal.
Em relação às resinas importadas, a distribuição responde por 80-90% do comércio no México. “Em geral, o material é entregue a granel, graças à facilidade logística e muitos transformadores possuem silos”, indica a pesquisadora. “Paga-se mais pela resina ensacada e, em regra, o embalamento cabe a centros de distribuição ou empresas incumbidas desse serviço pelo distribuidor”. Ultra dependente dos volumes comercializados, algumas empresas vendem mais de 10.000t/mês, a distribuição mexicana atua com margens tão estreitas quanto seu espaço para manobrar preços, observa Simone. A hipótese, por ora remota, de um fornecedor de resinas adotar a modalidade de venda direta, ela estabelece, está condicionada ao saldo do confronto entre o custo adicional de se montar uma estrutura de atendimento adequada e o efetivo retorno financeiro e institucional proporcionado pelo mercado mexicano.
Produtores e distribuidores de resinas, agrupa Simone, operam em geral com prazo de pagamento em 60 dias. “Mas o transformador mexicano não é muito fiel à data de vencimento e atrasos são considerados normais e, em regra, justificados por problemas do sistema operacional”. Para salpicar pimenta na tequila, a informalidade come solta. “Muitas empresas pequenas não estão formalmente constituídas e recorrem à energia clandestina ou até de resina obtida de roubo ou contrabando”, ilustra a expert. Em contrapartida, ela arremata, a sonegação de impostos é muito menor, em razão de uma medida para a qual o Brasil sempre se fez de cego e surdo: a cobrança de apenas um tributo – o IVA (16%) – sobre a venda de um produto, um pedregulho no caminho das manobras fiscais.
Por essas e (muitas) outras, amarra Simone de Faria, o México já demanda mais transformados plásticos que o Brasil. “Foram 8 milhões de toneladas em 2013 perante 7,2 milhões brasileiras”. O desnível estende-se ao consumo per capita do material. O indicador mexicano, crava a diretora da 2U, já chega a 50 quilos contra nossos 34. Em termos de ambiente para negócios, a bola rola para a Braskem Idesa num país onde o Brasil já foi campeão do mundo e hoje apanha de 7 a 1. •
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