“Alta proposta de impostos para importar químicos e plásticos vai repercutir na inflação”, alerta Paulo Engler, da Abipla

Aumento da tarifa agrava custos da cadeia produtiva nacional
Aumento da tarifa agrava custos da cadeia produtiva nacional

Entre suas principais ações no primeiro semestre, a Associação Brasileira de Produtos Químicos (Abiquim) pleiteou ao governo o aumento do imposto de importação para dezenas de materiais, com base em “desequilíbrios comerciais conjunturais”. Na versão inicial, a reivindicação abrangia 77 itens, 30 deles referentes a materiais  plásticos, distinguiu a Associação Brasileira da Indústria do Plástico. O Brasil delimita para resinas alíquota de importação de 12,6%, ultra acima da média de 6,5% vigente em países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Mesmo assim, a Abiquim defende a elevação do tributo a 20%, sublinhando portanto a negativa imagem de mercado fechado do Brasil. A solicitação tem sido contestada como danosa à competitividade da indústria nacional (usuária de químicos e plásticos em todos os setores) e encarecedora do custo de vida e dos próprios programas do governo, além de privar o país de desfrutar as condições mais acessíveis das resinas internacionais, efeito dos excedentes mundiais ofertados por um punhado de fornecedores. A reivindicada piora da barreira tarifária entala na garganta de setores finais de consumo de massa, de margens ditadas pela produtividade e com alta dependência de insumos importados, como mostra nesta entrevista Paulo Engler, diretor executivo da Associação Brasileira da Associação Brasileira das Indústrias de Produtos de Higiene, Limpeza e Saneantes de Uso Doméstico e de Uso Profissional (Abipla).

Paulo Engler: taxar sem discussão e política formada leva a aumento de preços sem promover desenvolvimento.
Paulo Engler: taxar sem discussão e política formada leva a aumento de preços sem promover desenvolvimento.

Como avalia os fundamentos do pedido da Abiquim para aumento das já ultra altas alíquotas brasileiras de produtos químicos, entre eles os plásticos das embalagens de produtos de limpeza?
Entendemos que o pleito de algumas entidades pela sobretaxação de matérias-primas tem relação com o aumento da ociosidade na indústria química em um período recente, algo a ser analisado com muita atenção. Mas o receio da Abipla é de que a alta de impostos sobre produtos químicos importados eleve os custos de toda a cadeia produtiva nacional, pois a química está presente em todos os setores industriais. É por isso que as propostas de sobretaxação devem ser revisadas com critérios técnicos, concorrenciais e econômicos adequados.

O governo mais que dobrou este ano as tarifas de importação de aço para proteger a siderurgia nacional e descartou o argumento das indústrias finais usuárias do metal de que a barreira comercial contribui para a inflação e encarecimento dos produtos acabados.  A seu ver, o governo seguiu critérios estritamente técnicos ao adotar esta medida ou os lobbies e conveniências políticas falaram mais alto?
Não há como opinar sobre setores dos quais não temos informações completas e confiáveis, caso do siderúrgico. De maneira geral, as políticas de Estado são muito complexas e passíveis de discussão – e isso é saudável na busca do desenvolvimento do país. Afinal, visões diferentes fortalecem a democracia. No setor de produtos de limpeza, uma taxação de insumos químicos importados provocaria aumento de custos ao consumidor em curto e médio prazos. É um fato.

Numa economia globalizada, é muito raro que um setor sofisticado como o nosso tenha toda a sua cadeia nacionalizada. Adotamos enzimas, probióticos e insumos que ainda possuem uma produção localizada (fora do Brasil). Caso a taxação esteja ligada a uma política industrial de fomento a novos entrantes em áreas que possam suprir a dependência internacional, mesmo que haja aumento de preços em curto prazo, isso pode ser algo a se analisar. No entanto, taxar sem discussão e política formada leva a aumento de preços sem promover desenvolvimento.

Como a Abipla encara a possibilidade de se formar uma frente ampla de representações de indústrias finais e do setor de transformação de embalagens plásticas para apresentar com mais contundência seu posicionamento contra barreiras protecionistas perante o governo?
Em primeiro lugar, é preciso destacar que não há ruptura na indústria nacional. O que propomos é um debate sobre as reais implicações de medidas que não estejam atreladas a uma política industrial de Estado. Este é um momento de busca de equilíbrio na taxação de produtos químicos importados e de união da indústria nacional. Estamos dispostos a colaborar com todo o setor produtivo para que tenhamos um debate saudável e enriquecedor. A Abipla é favorável ao uso de instrumentos de política industrial que incentivem a inovação na indústria doméstica, em vez de punir os itens fabricados no exterior.

Impulsionadas pelo excedente doméstico, as exportações da China constituem um argumento corriqueiro de quem pede no Brasil barreiras às importações dos mais diversos produtos. No caso dos plásticos, os volumes trazidos da China/Ásia são pouco expressivos, atestam os indicadores do governo. Além do mais, o frete dessas importações ficou caríssimo e escasso com a guerra no Oriente Médio. Como explica então a grita da indústria nacional contra importações de resinas chinesas ou asiáticas em geral?
O equilíbrio entre a produção local e as importações é importante para a equalização de preços. O debate sobre a taxação de cada tipo de produto pede uma análise sistêmica. Os setores devem defender suas visões sobre as políticas mais benéficas ao país, assim como nós estamos fazendo ao alertar que a alta de impostos proposta para produtos químicos vai repercutir na inflação brasileira.

A produção nacional de alguns tipos de polietileno (PE) e polipropileno (PP) foi superada pela demanda doméstica e a lacuna é preenchida por importações. A enchente do Rio Grande do Sul abalou o fornecimento desses plásticos no polo gaúcho e é grande a probabilidade de reprise das cheias nos próximos anos. Esse risco advindo das mudanças climáticas e as paradas por elas causadas na oferta doméstica de PP e PE não constitui justificativa para baixar as alíquotas de importação desses materiais, de modo a garantir o abastecimento sem sustos e traumas?
Mesmo perdurando por muitos dias seguidos, a tragédia das chuvas no Sul, que é um dos principais centros de produção de plástico do país, não provocou desabastecimento de embalagens para o nosso setor, apesar de termos tido notícias de alguns atrasos – provocados mais por conta da dificuldade logística na região que por falta de produto. E aqui voltamos à necessidade de equilíbrio nas políticas de Estado. Baixar impostos de importação de setores consolidados e que suprem a demanda nacional pode tirar a competitividade das empresas instaladas no país, tal como sobretaxar pode levar a aumento de preços.

Numa situação de parada total de produção nacional de algum material, por exemplo, a diminuição da alíquota poderia ser uma saída temporária. Mas não acredito que este seja o caso.

Os plásticos democratizaram o consumo de produtos finais, caso de muitos itens de higiene e limpeza. No passado, o acesso popular a eles era restrito por causas como a escala limitada/custo maior dos materiais tradicionais de embalagem. Se o governo subir as tarifas de importação de químicos e plásticos, quais os típicos exemplos de produtos de limpeza não básicos e presentes na classe C com possibilidades de se distanciarem desse consumidor, por causa do decorrente aumento no seu preço final?
Nosso setor vive um processo deflacionário. Os saneantes, segundo o INPC, ficaram 2,57% mais baratos nos últimos 12 meses. Dessa forma, fica claro que, para os produtos de limpeza, penalizados por grande alta de custos nos últimos anos, a majoração de impostos poderia mudar a tendência recente de queda de preços. Além disso, reforço que a taxação de químicos afeta toda a cadeia industrial brasileira, não apenas embalagens e saneantes, o que pode acelerar o processo inflacionário de praticamente todos os setores econômicos. E isso, por si, já pede uma discussão mais profunda.

 

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