Abief: Eduardo Berkovitz assume presidência focando governança e sustentabilidade

Preocupação com importações robustas de flexíveis da Ásia também está no radar
Abief: Eduardo Berkovitz assume presidência focando governança e sustentabilidade
Eduardo Berkovitz, diretor de relações institucionais e compliance da Valgroup, encara com cautela as pedras no caminho de sua gestão como presidente da Associação Brasileira da Indústria de Embalagens Plásticas Flexíveis (Abief) para o biênio 2025-2027. As incertezas internacionais detonadas pelo tarifaço de Trump e, no Brasil, os impactos da economia vítima do cabo de guerra entre o governo, obcecado por estimular o consumo, e o Banco Central, dedicado a esfriar a demanda com juros nas alturas para repor a inflação dentro da meta, indicam momentos de prender a respiração para o setor de flexíveis, na garupa de uma capacidade instalada hoje na faixa de 3.2 milhões de t/a, produção de 2.332 milhões de toneladas e receita de R$ 37.8 bilhões, resultados de 2024 providos por um efetivo de 3.787 empresas. Na entrevista a seguir, Berkovitz abre uma panorâmica dos planos do seu mandato e do jogo de forças com que a indústria de flexíveis, tal como todas, tem de conviver sem esmorecer.
Eduardo Berkovitz
Eduardo Berkovitz: aumento das importações de flexíveis também deve ser considerado na conjuntura atual.

Na gestão anterior da Abief, intensificou-se a montagem em Manaus de filiais de transformadores capitalizados de flexíveis do Sul/SE. Este movimento tende a se esgotar a partir de 2025 ou deve continuar no mesmo pique presenciado nos últimos anos? Por quais motivos?

Grande parte das empresas já se instalou na região. Contudo, ainda temos outros transformadores estudando o mesmo movimento. A justificativa é simples: de alguma maneira todos buscam trabalhar em regiões que ofereçam incentivos, especialmente em momentos como o atual em que a macroeconomia segue incerta e há desaceleração no consumo das famílias. Além disso, cabe considerar a a reforma tributária, prevista para entrar em vigor, na sua totalidade, em 2033 e pela qual a Zona Franca permanecerá com todos os incentivos legais vigentes. Como bem lembrou meu antecessor, Rogério Mani, em recente entrevista a Plásticos em Revista, “as grandes empresas já se instalaram na região e as médias buscam seu espaço. Como o grande volume está nos grandes fabricantes e as exigências estão maiores, acredito que a tendência seja de uma diminuição considerável a partir de 2025, não esquecendo que os custos logísticos, de instalações, mão de obra, energia são elevados em Manaus, o que poderá reduzir essa atratividade.” Reforço a opinião do Rogério, pontuando que a decisão sobre o que produzir no polo de Manaus é uma equação que envolve custo x mercado x logística. Nesta ou em qualquer outra região, os transformadores sempre buscarão atender aos clientes da melhor forma possível; não importa onde produzam. É importante que todos os fatores envolvidos, incluindo a localização, resultem na melhor rentabilidade para ambos os lados.

À sombra do Mercosul, a Argentina tem sido o maior destino das exportações brasileiras de transformados de plástico, lideradas por bobinas de filmes. Quais as oportunidades e desafios percebe para nossas exportações de flexíveis na hipótese de o presidente Milei levar adiante sua intenção de afastar a Argentina do Mercosul em favor de opções como um acordo bilateral comercial com os EUA?

A Argentina, tal qual o Brasil, monitora e aguarda os próximos movimentos globais decorrentes das diversas tarifações dos EUA. Portanto, trabalhar com a hipótese de saída do país do Mercosul é pura especulação na equação atual. É preciso acompanhar, esperar e analisar os fatos e seus desdobramentos para ver como os cenários se apresentarão e, aí sim, traçar as estratégias cabíveis.

Tem diminuído o número de jovens interessados em cursos técnicos profissionalizantes ou no ensino superior ligado aos plásticos. Devido a isso, setores como o de flexíveis deparam com dificuldades para preencher vagas nas linhas de produção com pessoas da nova geração. Como a Abief poderia contribuir na prática para mudar este quadro preocupante?

Se por um lado, os jovens têm olhado mais para áreas como mercado financeiro e TI, por conta de um retorno mais imediato, por outro vemos que escolas técnicas como as unidades do Senai têm se esforçado para modernizar sua plataforma de cursos e áreas de atuação, justamente para atrair esses talentos mais digitais para setores tradicionais como a indústria de transformação do plástico. Por mais que as oportunidades das novas áreas sejam interessantes, ainda é fato que a indústria, inclusive a nossa, é uma grande geradora de postos de trabalho. Apenas no setor de embalagens plásticas flexíveis são quase 4.000 empresas gerando empregos. Estudo recém divulgado pela ABRE/FGV também mostrou que, em dezembro de 2024, foram registrados 273.967 trabalhadores no setor de embalagens como um todo, representando 3,4% da indústria de transformação. Se considerarmos que o segmento de embalagens plásticas (rígidas e flexíveis), responde por quase 35% do valor total da produção, dá para imaginar que o volume de postos de trabalho realmente é expressivo.

Por tudo isso, incentivo os associados da Abief e os fabricantes de embalagem em geral a apoiarem o desenvolvimento de novos talentos a partir das escolas técnicas. Iniciativa da mesma importância é trabalharmos a imagem do plástico para desmistificar o preconceito ente os jovens e evidenciarmos o valor do material. Boa parte da evolução da sociedade se deve ao plástico e o futuro do material pode ser valioso se associarmos seus benefícios intrínsecos à responsabilidade da indústria na construção de soluções ambientais que envolvam a cadeia de valor da embalagem, governo e sociedade.

Apesar das mudanças climáticas e do mega déficit na armazenagem de grãos, aplicações de flexíveis no agronegócio, como silos-bolsas, geomembranas e estufas, não deslancham com intensidade satisfatória devido à carência e complexidades de linhas de financiamento. Como a Abief poderia contribuir para ajudar a facilitar o acesso do agricultor menos capitalizado às soluções de flexíveis?

O desenvolvimento do plástico na agricultura é um tema recorrente e trabalhado ao longo dos anos pelos players da cadeia de plasticultura. Já está provado que o plástico, seja flexível ou rígido, tem um papel preponderante no manuseio das culturas e no armazenamento e conservação dos produtos. Novamente, precisamos desmistificar o uso do plástico, conscientizar os usuários sobre os seus benefícios, e incentivar o mercado de transformação a investir em tecnologias que o torne ainda mais competitivo. A presença do plástico na agricultura tem aumentado, mas é preciso acelerar este processo. Uma alternativa, além dos esforços das próprias empresas, é um trabalho como setor, realizado em conjunto com outras entidades e com as petroquímicas; é preciso criar a cultura e alavancar as soluções e inovações tecnológicas.

Em 2024, o governo elevou para 20% as alíquotas de importação de resinas. O ano fechou com a entrada de mais de 1 milhão de toneladas acima do saldo de 2023. Por que essa medida para refrear as importações não funcionou? Deveremos deparar, no setor de flexíveis, com resultados dessa mesma magnitude no exercício de 2025?

Primeiro, precisamos contextualizar: esta elevação de tarifas foi uma demanda da entidade que representa as petroquímicas, a Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim). Do seu lado, a Associação Brasileira da Indústria do Plástico (Abiplast), que representa os transformadores de plásticos, tem levado a visão do setor, mostrando que todos, indústrias de artefatos rígidos e flexíveis, têm sua competitividade comprometida com estes aumentos. Hoje, contudo, frente às recentes medidas adotadas pelos EUA, a movimentação global começa a mudar. Não sabemos ainda quais serão os resultados e seguimos sem tempo para esperá-los; precisamos continuar evidenciando a competitividade da indústria brasileira de transformação do plástico e, no caso da Abief, do segmento de embalagens plásticas flexíveis. Aguardamos a reavaliação desse processo (eventual prorrogação das alíquotas) prometida pelo governo federal a partir de outubro.

A Abiquim pediu em 2024 abertura de investigação antidumping para polietileno dos EUA, o maior fornecedor internacional dessa resina para o Brasil em 2024. Como avalia as possibilidades de a medida antidumping se concretizar este ano, sob o risco anunciado de réplica norte-americana, pela política de reciprocidade comercial instituída pelo presidente Trump?

Este é outro ponto que a Abief está avaliando com a Abiplast a fim de evitar que a indústria brasileira de transformação do plástico perca competitividade. Para contextualizar, é preciso lembrar que há duas visões para o dumping. A primeira é a liberação de uma alíquota provisória, até o primeiro semestre, com liberação do pleito até final do ano. A segunda visão parte do princípio de que, com as medidas do governo Trump, o incremento de uma alíquota adicional poderá soar como um protecionismo extremo do Brasil. Nos dois casos, é preciso lembrar que o processo de dumping referente ao polietileno é contra as petroquímicas dos EUA e Canadá.

Quais são as metas e principais ações de sua gestão no comando da Abief e quais os principais desafios concretos que enxerga pela frente?

Entre os pilares da minha gestão, destaco governança e sustentabilidade dentro de um modelo de trabalho que prevê um maior – e melhor – relacionamento entre todos os elos da cadeia de valor das embalagens plásticas flexíveis e do plástico em geral. Precisamos mostrar todos os atributos das embalagens flexíveis e valorizar o plástico e suas inúmeras vantagens. A partir de uma comunicação eficiente com o público interno (associados da Abief) e externo (mercado, consumidor final e governo), precisamos explorar conteúdos e canais que ajudem a educar a sociedade sobre o plástico e desconstruir inverdades ou preconceitos.

Também enxergo ser de extrema relevância nos preocuparmos com a entrada, em larga escala, de produtos transformados no Brasil, face ao ‘momento Trump’. Estamos lidando com fretes internacionais favoráveis, preço do petróleo estável e disponibilidade de matérias-primas a partir de novas plantas petroquímicas na Ásia. Ou seja, elementos que facilitam a viagem dos flexíveis para o Brasil. É sobre isso que precisamos estar atentos também.

Além disso, julgo fundamental para o meu mandato a interação com outras associações setoriais, para atender aos interesses em comum. Espero abrir as portas da Abief para entidades parceiras, cujos projetos e ações tenham um denominador comum: entregar os melhores produtos e as melhores embalagens para a sociedade, com foco na redução do desperdício de alimentos (save food) e na garantia de segurança alimentar (food safety), dois pilares cada vez mais fortes em termos globais totalmente alinhados aos princípios de ESG.

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