O plástico foi uma das forças motrizes que, em 100 anos de Brasil, contemplaram a Nestlé com a liderança como brand owner nos alimentos do seu portfólio. Afinal, se sua marca hoje festeja penetração absoluta nos lares de todas as classes sociais e se seus produtos giram nos cantos mais longínquos com condições para consumo inalteradas pelo transporte a longa distância e variações térmicas inerentes a um território continental, grande parte do mérito por esses feitos é do bem casado de economia e tecnologia contido nas embalagens plásticas. Por sinal, a Nestlé forma entre os precursores mundiais em um punhado de avanços na produção, visual e praticidade na apresentação de seus alimentos. No rol destes predicados, a corporação suíça vem abrindo com afinco espaço para a sustentabilidade como ponto de partida e de chegada para a presença do plástico virgem em suas embalagens. Um comprometimento que motiva a influente corporação suíça a questionar várias aplicações do material, mas, nas entrelinhas e sob a ótica do copo meio cheio, isso também pode trazer à luz mais oportunidades para ele, como se pode deduzir da entrevista de Cristiani Vieira, gerente de sustentabilidade da Nestlé Brasil.
Qual a posição da embalagens plásticas no portfólio atual de alimentos da Nestlé no Brasil?
Hoje em dia, as principais embalagens plásticas que temos são as de biscoitos e bombons e os sachês, que vieram ao longo dos anos para atender à demanda de menor peso, melhor transporte e acomodação de produtos com menos uso de materiais, seguindo uma tendência de mercado.
Desde quando a Nestlé utiliza embalagem plástica em seus 100 anos de Brasil?
Temos embalagens plásticas há muitos anos, como os envoltórios de polipropileno (biorientado) metalizados dos biscoitos São Luiz, que datam dos anos 1960. A embalagem plástica foi uma opção surgida ao longo da história para tornar os produtos mais acessíveis, permitir questões como porcionamento, conservação e transporte por maiores distâncias, além de trazer praticidade. Nosso uso de plásticos tem sido impulsionado por sua combinação única de recursos, incluindo durabilidade, baixo custo, higiene e segurança. As propriedades do plástico também fornecem muita flexibilidade e liberdade no design, ao mesmo tempo em que o material é leve, mas forte, permitindo que a embalagem seja personalizada para o produto.
Progressos consideráveis foram feitos nos últimos anos para garantir que uma quantidade mínima adequada de embalagem seja usada para embalar os produtos com segurança e garantir que ela seja recuperada no final de sua vida útil. No entanto, mais ainda precisa ser feito.
As categorias de produtos da Nestlé envolvem lácteos, cereais, culinários, achocolatados, sorvetes, café etc. Nesses 100 anos de Brasil, quais delas introduziram embalagens plásticas consideradas inovadoras e/ou inéditas no país?
Em1982, as tampas metálicas de Nescafé foram substituídas pelas de plástico e, em 1996, Nescau também trocou sua tampa metálica pela de plástico com peel off metálico, mais fácil de abrir. O leite condensado Mocinha (flexível laminado), lançado em 2000 e o Moça Serve Fácil (tubo de polietileno), introduzido em 2005, também inovaram as embalagens plásticas para a marca Moça.
O setor nacional de chocolates é ávido consumidor de embalagens de polipropileno biorientado (BOPP). Segundo estimativas, a Páscoa responde por 25% das vendas anuais desse filme. Pois bem, a Nestlé Brasil divulga seu empenho em continuar a reduzir a participação do plástico na apresentação de seus ovos de Páscoa. Isso envolve a possibilidade de substituir o material na embalagem?
Sim, estamos estudando os melhores materiais que podem ser utilizados ou mesmo a redução dos plásticos. Hoje em dia, temos dois produtos sazonais de Páscoa com embalagem de papel, lançados em 2020 e os estamos testando pelo segundo ano seguido para entender a reação do mercado e aceitabilidade do consumidor. Além disso, temos estudos para substituição em grande escala de embalagens plásticas do tipo empregado nos ovos de Páscoa em curso no Nestlé Institute of Packaging Sciences, constituído em 2018 na Suíça. Em paralelo, a Nestlé Brasil lançou uma iniciativa que concilia a reciclagem de embalagens laminadas de chocolates e biscoitos com o repasse de recursos a entidade sociais, levando cooperativas de catadores a enxergarem valor na reciclagem das embalagens flexíveis, desde a etapa inicial de separação dos resíduos para posterior encaminhamento para a reciclagem . Desenvolvido em parceria com a TerraCycle, este programa de reciclagem inclusiva envolve capacitação de cooperativas de catadores em São Paulo e o engajamento de consumidores para a correta destinação e reaproveitamento das embalagens pós-consumo de BOPP metalizado.
A Nestlé mundial se compromete a tornar todas as suas embalagens recicláveis e reutilizáveis até 2025. Como esta estratégia já influencia o uso de plásticos em embalagens da subsidiária brasileira?
A Nestlé está intensificando suas ações para tornar 100% de suas embalagens recicláveis ou reutilizáveis até 2025 e reduzir, no mesmo período, em um terço o uso de plásticos virgens. Fiel a este compromisso, a empresa busca alternativas de materiais e embalagens. Trata-se de um processo desenvolvido no contexto de economia circular e com um olhar para algumas frentes: o melhor design das embalagens; como elas podem ser reutilizáveis; como elas podem ser recicladas e como a Nestlé pode influenciar na melhoria do sistema de gerenciamento de resíduos pós-consumo. Prova dessa preocupação é a atuação do Nestlé Institute of Packaging Sciences. Seu foco é avaliar e conceber materiais e soluções sustentáveis de embalagens, inclusive mediante a colaboração com parceiros industriais.
Como parte do comprometimento com a sustentabilidade a Nestlé trabalha no Brasil com representantes da cadeia de valor e associações de classe para explorar soluções nesse sentido. São exemplos os programas Cataki, da ONG Pimp My Carroça; o Reciclar pelo Brasil, que apoia mais de 250 cooperativas, e o Cidade+, do Instituto Recicleiros, que amplia a atuação em municípios para uma coleta seletiva integrada às cooperativas com serviços ambientais. A Nestlé também desenvolveu a ferramenta EcoBot, para tirar dúvidas e orientar as pessoas pelo whatsapp sobre descarte correto e destinação do lixo.
A Nestlé está empenhada em reduzir o uso de embalagens plásticas de uso único. Poderia dar exemplos concretos de alimentos e bebidas da empresa no Brasil cujas embalagens já demonstram este comprometimento global?
Além da ambição de tornar 100% de nossas embalagens recicláveis ou reutilizáveis até 2025, entendemos que precisamos “fazer o que falamos” com relação ao uso de plásticos em todas as nossas unidades operacionais, escritórios, fábricas, centros de distribuição. Com esse espírito, no comprometemos internamente a eliminar o quanto possível os plásticos de uso único, conhecidos como descartáveis, difíceis de reciclar e desnecessários no dia a dia. Cada gesto conta na jornada de sustentabilidade. Se podemos usar uma caneca reutilizável no escritório e eliminar a geração de um resíduo, por que não fazê-lo? Assim, evoluímos nesse compromisso e desde junho de 2020, não se usa mais descartáveis plásticos de uso único como copos, mexedores, pratos, talheres e sacolas em todas as nossas unidades.
Qual o tipo de produto que substituiu na empresa esses descartáveis plásticos?
Substituímos esses produtos por itens reaproveitáveis, como canecas de vidro ou porcelana – inclusive a mundialmente famosa Red MUG de Nescafé, que foi distribuída para todos os nossos colaboradores. Também adotamos as sacolas de papelão na nossa loja própria, o Empório Nestlé, além de utilizarmos talheres de metal nos refeitórios, por exemplo.
Como a Nestlé planeja reduzir em 1/3 seu consumo mundial de plástico virgem até 2025?
Contamos com investimentos globais, como o aporte de dois bilhões de francos suíços anunciado em janeiro de 2020, para liderar a transição de plásticos virgens para reciclados apropriados para uso em embalagens de alimentos e acelerar o desenvolvimento de soluções inovadoras para embalagens sustentáveis.
A Nestlé elaborou uma lista de plásticos que pretende parar de usar mundialmente nas embalagens, devido às dificuldades na sua reciclagem. Quais são eles? A empresa também pretende reduzir o uso de filme shrink. O que pode adiantar a respeito?
Identificamos uma lista de plásticos difíceis de reciclar que deixaremos de usar para ajudar nos esforços de reciclagem. Introduzimos uma “Lista Negativa” desses materiais e um cronograma para descontinuar seu uso em todas as nossas embalagens. Esta lista inclui plásticos como PVC, poliestireno (PS) e poliestireno expandido (EPS). No caso dos filmes shrink, estamos tocando projetos envolvendo desde a identificação e desenvolvimento de materiais alternativos até a transformação da cadeia para internalizar as mudanças em relação a essa sobreembalagem. Um case muito representativo é o de Nescau. Após pesquisas e investimentos, foi possível eliminar os plásticos que mantêm unidas as embalagens de NESCAU Prontinho na versão tri-pack (com três unidades), substituindo-os por envoltórios de papel. A troca resultou na redução do uso de 278 toneladas de plástico. A companhia também conseguiu retirar os plásticos (filme stretch) que envolviam os pallets de produtos que saíam da fábrica para distribuição, utilizando um novo sistema, com uso de cola, para manter as caixas unidas aos pallets. Com isso, são eliminadas mais 16 toneladas de materiais plásticos por ano.
Como a Nestlé avalia a possibilidade de proliferação de leis vetando o uso de descartáveis plásticos em municípios e/ou Estados do Brasil?
Essa substituição de canudos e outros materiais plásticos de uso único é uma tendência que se expandiu pelos estados brasileiros e deve ganhar cada vez mais espaço na agenda de sustentabilidade. No entanto, são necessárias soluções mais profundas para evitar a questão do descarte incorreto de plásticos. Afinal, outras opções trazidas para substituir os plásticos de uso único podem gerar questões ambientais, como é o caso dos aditivos oxibiodegradáveis que se microfragmentam, causando um problema ainda maior de microplásticos. Ao final das contas, o objetivo tem de ser o de mobilizar e conscientizar a população para o elevado desperdício e para o desenvolvimento de mecanismos de economia circular. É o que temos buscado fazer por meio da Iniciativa RE para promover a mudança de comportamento, ao educar, engajar e mobilizar o cidadãos.
Nestlé Brasil já utiliza plástico pós-consumo reciclado em embalagens de seus produtos?
A legislação brasileira não permite uso de plástico reciclado pós-consumo em embalagens em contato direto com alimento, exceto PET reciclado de grau alimentício. No caso deste material, estamos estudando alternativas que necessitam de validação de performance para entregar o alimento ao consumidor com as características preservadas e a segurança que são marcas registradas dos nossos produtos. •