A música do ronco do turbo

O setor automotivo começa a sair do acostamento
Autopeças

Plásticos de engenharia e compostos de polipropileno já podem soltar os rojões. O volume de vendas da indústria automobilística saltou 19,5% no primeiro bimestre para 338.000 unidades, fortalecendo a crença no setor de aumento de 13,2% na produção total de veículos leves e pesados este ano, culminando em 3.055 milhões de unidades contra 2.700 milhões em 2017. O viés de alta é espelhado nas projeções da Associação Brasileira da Indústria de Autopeças (Abipeças) e do Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores (Sindipeças).

As duas representações prevêm fechar 2018 com faturamento anual de R$ 82,6 bilhões contra R$ 77 bilhões anteriores, virando a página de quedas seguidas nos resultados de 2014 a 2016. A receita antevista para o exercício atual é repartida entre montadoras, com 63,9%; peças de reposição, com 20,2%; exportação, com 10,1% e mercado intrassetorial, com 5,8%. Um estímulo agridoce – avinagrado para peças destinadas às montadoras e benfazejo para as de reposição – provém da projeção oficial de envelhecimento da frota automotiva brasileira. No momento, roda com idade média de nove anos e dois meses, um ano a mais que a faixa etária de 2013.

Nesta entrevista, Dan Ioschpe, presidente da Abipeças e Sindipeças, justifica o anil das expectativas, após a reação em 2017, quando enfim as vendas de peças às montadoras subiram 25,2% e compuseram mais de 60% do faturamento auferido então pelo setor.

PR – Sobram analistas assegurando que, apesar do adiamento das vitais reformas estruturais, o crescimento da ordem de 3% em 2018 está garantido, à sombra da inflação e juros básicos baixos. Estudo do SPC Brasil sobre as expectativas do consumidor revela que a maioria dos entrevistados entrou no ano constatando piora nas finanças e disposta a cortar compras a prazo, inclusive porque os juros bancários permanecem altíssimos. Diante desse cenário, como o Sindipeças digere as otimistas previsões de vendas em 2018 trombeteadas pelas montadoras, ultra dependentes de vendas a crédito?
Ioschpe – Após ter enfrentado sua pior crise, o setor de autopeças iniciou a retomada. Projetamos faturamento nominal de mais de R$ 82,6 bilhões este ano, além do que prevíamos meses atrás. Os investimentos também devem crescer e chegar a R$ 2,19 bilhões ou 23,7% mais que em 2017. O principal impulsionador da recuperação têm sido as exportações, tanto de veículos quando de autopeças diretamente. Mas o mercado doméstico também tem registrado indicadores de crescimento.

Gol de placa

Após festejar alta acumulada de 1,3% no total de emplacamentos em 2017, a Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave) não faz por menos. Estribada nas quedas de juros e inadimplência, acesso melhor ao crédito e aumento da empregabilidade, a entidade prevê um salto de 10,3% este ano perante as 3.216.761 unidades emplacadas em 2017 de veículos de todos os segmentos: automóveis, comerciais leves, caminhões, ônibus, motos e implementos rodoviários. Os destaques são os dois segmentos iniciais, com projeção de aumento de 11,9% sobre os indicadores de 2017.

PR – Segundo o Instituto Nacional de Recuperação Empresarial, 340 fabricantes de autopeças pediram recuperação judicial e extrajudicial entre 2012 e 2016 e 373 faliram nesse mesmo período. Exceto as grandes empresas, o setor de autopeças hoje tem problemas financeiros e carece de capital para investir de acordo com as exigências das montadoras. Como o Sindipeças avalia o risco de a indústria automobilística ter de operar com menos fornecedores de autopeças devidamente qualificados para atendê-la?
Ioschpe – Não fazemos levantamento sobre empresas em recuperação judicial e não conhecemos os critérios usados pelo Instituto Nacional de Recuperação Empresarial. Mas podemos afirmar que, no universo das empresas associadas ao Sindipeças, que respondem por mais de 90% da produção brasileira de autopeças, esse cenário não existe. Temos cerca de 500 associados, quantidade que tem se mantido nos últimos anos. Além disso, todos os nossos números (ver quadros) demonstram a resiliência do setor. Mesmo nos piores momentos da crise que enfrentou, nunca houve gargalo para a produção de veículos nem para o mercado de reposição. Os problemas que atingem os fabricantes de autopeças são horizontais e afetam igualmente outros setores industriais brasileiros.

PR – Por que, segundo a pesquisa conjuntural do Sindipeças, o mercado de reposição tenderá a perder participação para as montadoras no decorrer deste ano, mas continuará se expandindo, embora a taxas decrescentes?
Ioschpe – O setor de reposição perde participação percentual na distribuição do faturamento por segmento de mercado à medida em que crescem as vendas para montadoras. Mas segue crescendo em valores absolutos.

PR – Pesquisa Conjuntural do Sindipeças prevê para 2018 investimentos totais do setor 34,8% maiores que em 2017 e faturamento nominal 7,4% superior a 2017. Como concilia essas projeções com os índices de ociosidade no setor de autopeças e o gap entre a produção de 2,7 milhões de veículos em 2017 versus uma capacidade anual da ordem de 5 milhões de veículos no país?
Ioschpe – Pelos nossos dados, recentemente atualizados, a capacidade ociosa média da indústria de autopeças passou de 50% em 2016 e agora está em cerca de 32% (foi de 37% em dezembro passado, por conta da sazonalidade típica do mês). Como resultado direto da significativa capacidade de recuperação de nosso setor, estamos preparados para acompanhar o crescimento de produção das montadoras, o que demanda mais investimentos. Já havíamos nos preparado, antes da crise, para a produção de cinco milhões de veículos por ano. •

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